APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5008026-93.2018.4.04.9999/PR
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA PINHEIRO DE GODOI |
ADVOGADO | : | GEMERSON JUNIOR DA SILVA |
: | ALCIRLEY CANEDO DA SILVA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
NÃO COMPROVADA ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. RENDIMENTOS ELEVADOS PERCEBIDOS PELO CÔNJUGE EM DECORRÊNCIA DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA. RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
1. Sendo escassa a prova material, é necessário, para a comprovação da atividade rural, que a prova testemunhal seja consistente.
2. Não comprovado o exercício da atividade agrícola como segurado especial no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), não faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria por idade rural.
3. Indicando o conjunto probatório a descaracterização da vitalidade do trabalho rural da parte autora em regime de economia familiar para o sustento da família, nos termos do art. 11, VII, § 9º, da Lei nº 8.213/1991, não deve ser concedida a aposentadoria por idade rural.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e dar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de agosto de 2018.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9427743v47 e, se solicitado, do código CRC 79EEBFEF. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
| Data e Hora: | 03/09/2018 15:16 |
APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5008026-93.2018.4.04.9999/PR
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA PINHEIRO DE GODOI |
ADVOGADO | : | GEMERSON JUNIOR DA SILVA |
: | ALCIRLEY CANEDO DA SILVA |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta por MARIA PINHEIRO DE GODOI contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando a concessão de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo, ocorrido em 26/02/2010 (ev. 1 - INIC1, fl. 13).
O juízo a quo proferiu sentença em 15/08/2017, julgando procedente o pedido, para condenar o réu a conceder à autora o benefício de aposentadoria por idade rural desde a data do requerimento administrativo. Determinou sobre as parcelas vencidas a incidência de correção monetária e juros de mora. Condenou o INSS ao pagamento de custas e despesas judiciais, bem como de honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vencidas após a sentença (Súmula 111 do STJ) (ev. 76 - SENT1).
O INSS apela sustentando não haver início de prova material contemporâneo aos fatos alegados. Afirma que a parte autora não demonstrou o exercício de atividade rural pelo período equivalente à carência e imediatamente anterior ao requerimento do benefício, uma vez que há grande lapso temporal sem qualquer documento que comprove a atividade rural. Aduz, ainda, que a condição financeira da família não permite concluir que se trata de trabalhadora rural, segurada especial (ev. 82 - PET1).
Com contrarrazões, e por força do reexame necessário vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A apelação preenche os requisitos de admissibilidade.
REMESSA NECESSÁRIA
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
A nova lei processual prevê que serão salvaguardados os atos já praticados, perfeitos e acabados na vigência do diploma anterior, e que suas disposições aplicam-se aos processos em andamento, com efeitos prospectivos.
As sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou em face dela assegurassem direito controvertido de valor excedente a 60 salários mínimos.
O CPC de 2015 definiu novos parâmetros de valor, no art. 496, § 3º, para reexame obrigatório das sentenças. O texto afastou o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas decisões que a condenem ou garantam o proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos.
No caso concreto, o valor do proveito econômico, ainda que não registrado na sentença, é mensurável por cálculos meramente aritméticos, o que caracteriza como líquida a decisão, para efeitos de aferição da necessidade de reexame obrigatório.
O INSS foi condenado ao pagamento de benefício previdenciário de prestação continuada, fixando-se a data de início dos efeitos financeiros, bem como todos os consectários legais aplicáveis.
Embora ainda não tenha sido calculada a renda mensal inicial - RMI do benefício, é possível estimar, a partir da remuneração que será auferida pela parte, equivalente a um salário mínimo mensal, que o valor do benefício resultante, multiplicado pelo número de meses correspondentes à condenação, entre a DER e a sentença, resultará em valor manifestamente inferior ao limite legal para o reexame obrigatório.
Impõe-se, para tal efeito, aferir o montante da condenação na data em que proferida a sentença. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido. Não se confundem valor da condenação e valor da causa. Se é a sentença que está ou não sujeita a reexame, é no momento de sua prolação que o valor da condenação, para tal finalidade, deve ser estimado.
Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor manifestamente inferior a mil salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.
Ante o exposto, com base no disposto no artigo 496, § 3º, I, do NCPC, não conheço da remessa oficial.
CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
Da aposentadoria por idade rural
A apreciação de pedido de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei n.º 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher), e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida nas aposentadorias em geral, sendo, porém, dispensável o recolhimento de contribuições.
O trabalhador rural que atua como boia-fria, diarista ou volante, deve ser equiparado, para os fins da aposentadoria rural por idade, ao segurado especial, aplicando-se-lhe, em consequência, o disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/91, sem as limitações temporais previstas no art. 143 da mesma lei. Com efeito, não há o que justifique tratamento diferenciado, especialmente se considerada a maior vulnerabilidade social a que está sujeito o trabalhador rural sem vínculo empregatício e desprovido dos meios para, por conta própria, retirar seu sustento e de sua família do trabalho na terra.
O artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei n.º 8.213/91 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completa a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios. Assim, se ao completar a idade no ano de 2006 o segurado precisava de 150 meses de tempo/carência e, nessa data, ainda lhe faltavam 12 meses, deve-se posicioná-lo na tabela a partir do ano em que completaria os 150 meses, ou seja, 2007. Neste ano, a carência será de 156 meses (6 meses além do período inicial), de forma que o segurado implementa os requisitos em 2008 (TRF4, APELREEX 5008945-59.2012.404.7100, Quinta Turma, Relatora p/ Acórdão Dês. Cláudia Cristina Cristofani, julgado em 08/08/2012).
A disposição contida no art. 143 da Lei n.º 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima (TRF4, AC 0006711-23.2015.404.9999, 5º Turma, Relator Des. Rogério Favreto, julgado em 30/06/2015).
Nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994, data da publicação da Medida Provisória n.º 598 (posteriormente convertida na Lei n.º 9.063/95), que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91, e sim a redação original do art. 143, II da mesma lei, em respeito ao direito adquirido (STF, RE 168.191, Segunda Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio, julgado em 01/04/1997).
A aposentadoria do trabalhador rural por idade, porém, no regime anterior à lei 8.213/91 é devida ao homem e, excepcionalmente à mulher, quando na condição de chefe ou arrimo de família (art. 297 do Decreto 83.080/79).
Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I, sem limite de data.
Da comprovação do tempo de atividade rural e da prova da atividade na condição de boia-fria
Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.
Com relação à prova do exercício da atividade rural, na condição de segurado especial, como regra geral, exige-se, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (STJ - REsp 1.348.633/SP, Primeira Seção, Rel.Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 28/08/2013).
Embora exigido, o início de prova material relativamente aos trabalhadores rurais do tipo boia-fria, o requisito pode e deve ser abrandado, de acordo com a análise do caso concreto, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, sob pena de frustrar a concessão do direito fundamental à aposentadoria (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
O Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive o informal (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
Além disso, o início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
Ressalte-se que não constituem início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando não tiverem a homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), pois equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo (STJ- EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Quinta Turma, Rel.Ministro Marco Aurélio Bellize, julgado em 06/11/2012; STJ, AgRg no REsp 1.291.466/MG, Quinta Turma, Rel. Ministro Newton Trisotto, julgado em 18/11/2014; STJ, AR 3.202/CE, Terceira Seção, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 23/04/2008).
Quanto à classificação da atividade como urbana ou rural é questão de apreciação da prova material produzida pelo interessado, não decorrendo de prévia definição ou categorização legal. Conforme a prova que foi produzida, pode-se reconhecer trabalho rural na cidade, bem como trabalho urbano no meio rural. (Trf-4 - apelreex 2005.71.00.044110-9, 5º Turma, Rel. Juiz Artur César de Souza, julgado em 10/02/2009).
Aliás, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).
No entanto, segundo precedente do Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo, embora possível para fins de comprovação da atividade rural, a extensão de prova material em nome de um dos membros do núcleo familiar a outro, a extensibilidade da prova fica prejudicada no caso de o cônjuge em nome do qual o documento foi emitido passar a exercer labor incompatível com o trabalho rural, como no meio urbano (STJ, RESP 1.304.479/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
No caso do trabalhador rural boia-fria, é necessário compatibilizar-se este julgado do STJ com o entendimento do RESP 1321493/PR, no sentido de que, embora não seja suficiente a prova exclusivamente testemunhal, a exigência de prova material do tempo de serviço deve ser abrandada, admitindo-se qualquer documento que indique vinculação ao meio rural. Assim, neste caso, ausentes outras possibilidades de prova material, não se deve desprezar documentos em nome do cônjuge, que em período posterior tenha passado à atividade urbana, desde que a prova oral produzida seja substancial (STJ, RESP 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
Por outro lado, comprovado o desempenho de atividade rural, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. Dessa forma, o fato por si só do cônjuge ter exercido labor urbano e hoje perceber aposentadoria de origem urbana ou permanecer trabalhando em atividade que não a rural, não afasta a condição de segurado especial.
É de se ressaltar ainda que o exercício de pequenos períodos de labor urbano, não retira do interessado a condição de trabalhador rural. O exercício da atividade rural pode ser descontínuo (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 297.322/PB, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 13/08/2013).
É de se destacar ainda que, com relação à idade mínima para exercício de atividade laborativa, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que é possível o cômputo de tempo de atividade rural a partir dos doze anos, em regime de economia familiar, visto que a lei ao vedar o trabalho infantil do menor de 14, visou estabelecer a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo (STJ, REsp 573.556/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 16/02/2006; STJ, AR 3629/RS, Terceira Seção, Rel.Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 23/06/2008).
DO CASO CONCRETO
A parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 14/04/2008, pois nascida em 14/04/1953 (ev.1-INIC1, fl.11). O requerimento administrativo foi apresentado em 26/02/2010 (ev.1 - INIC1, fl. 13). Dessa forma, deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 162 meses ainda que de forma descontínua, devendo estar em atividade no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, ou no período de 174 meses (contínuos ou intercalados) imediatamente anterior ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
No caso concreto a requerente alega ter laborado na condição de boia-fria.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, foram acostados os seguintes documentos:
a) certidão de casamento da autora, qualificando seu marido como lavrador, datada de 1971 (ev.1-INIC1, fl. 19);
b) escritura de dois lotes rurais, em nome do sogro da autora, qualificado como lavrador, datada de 1959 (ev.1-INIC2, fl. 6);
c) ficha de alistamento militar do marido da autora, qualificado como agricultor, datada de 1971 (ev.1- INIC2, fl. 7);
d) certidões de nascimento das filhas da autora, onde aparecem qualificados como lavradores a autora, seu marido, seu avô paternos, avós maternos, bem como uma das testemunhas, datadas de 1972 e 1974 (ev.1-INCI2, fl. 9/12);
e) notas fiscais de produtora rural, em nome da autora, datadas de 2008 a 2010 (ev.1-CONTES5, fls. 13/18/20-21 e CONTES6, fls. 3-4);
f) contrato particular de arrendamento de terras rurais para área de 2,42 ha, em nome da autora, referente ao período de 2008 a 2010 (ev.1-CONT5, fls. 14-15);
g) ficha geral de atendimento, em nome da autora, qualificada como lavradora, com registro no ano de 2008 (ev.1-CONTE5, fl. 16);
h) comprovante de inscrição no cadastro de produtor rural em nome da autora, referente ao período de 2009 a 2010 (ev.1-CONT5, fl. 19);
i) escritura pública de terreno rural, com área de 10.773,32 m², em nome da autora e de seu marido, datada de 2009 (ev.1-CONT5, fls. 22-23);
j) comprovante de imposto sobre a propriedade territorial rural, com área de 1ha, referente ao ano de 2009 (ev.1-CONT5, fl. 24 e CONTES6, fls.1-2).
Embora escassa, há prova material mínima para o período de labor rural que a autora pleiteia o reconhecimento, qual seja 1995 a 2008.
No entanto, a prova testemunhal não é robusta frente à escassez documental, para fazer prova do alegado.
Em audiências de instrução e julgamento, realizadas em 10/07/2014 e 18/10/2012, foram ouvidas a autora e as testemunhas Nelson Costa de Oliveira, Celeste dos Santos Lopes e Filadelfo Alves de Melo (ev.1-TERMOAUD11/ev.27-TERMOAUD1/ev.50-VIDEO1-4).
O informante Filadelfo Alves de Melo, pois amigo íntimo da autora, declarou que a conhece há aproximadamente 40 anos. Asseverou que a autora trabalhava juntamente com seus familiares no sítio que hoje pertence a ele. Disse que a autora após casar-se trabalhou alguns anos nestas terras e então mudou-se da região. Disse que o esposo da autora também trabalhava na área rural, trabalhavam em terras próprias, compraram uma chácara pequena no município do Embaú há aproximadamente 4 anos. Sabe que por um tempo arrendaram terras, pois seu sítio era muito pequeno. Criavam porcos, galinha, eventualmente trabalhavam algum dia para os vizinhos, vendiam o excedente. Disse que a autora possui apenas esta Chácara. Não tem conhecimento de o marido da autora ter trabalhado na área urbana.
A informante Celeste dos Santos Lopes, pois amiga da autora, declarou que conhece a autora há mais de 30 anos, tendo trabalhado juntas na roça. Conhece a autora de Lageado Bonito/RS, onde a autora morava com sua família em um sítio, trabalhava juntamente com seu marido, plantando milho, feijão e vendiam o excedente da produção. Trabalhavam apenas a família, sem auxílio de empregados ou maquinário. Saíram de lá, há aproximadamente 20 anos e foram morar em outro sítio, nunca visitou este local. Então, mudaram-se para próximo do Embaú, onde a informante já foi visitá-los, lá criam galinha e plantam milho, feijão. Não tem conhecimento de que o marido da autora tenha trabalhado na área urbana, nem que ele esteja aposentado. Asseverou que a família não tinha boa condição financeira e que não possuem outros imóveis.
A testemunha Nelson Costa de Oliveira declarou que conhece a autora há aproximadamente 35 anos. Disse que a autora tinha um sítio onde ela trabalhava na roça, carpia e plantava milho, mandioca, para sobreviver, pois o terreno era pequeno. Asseverou que seu marido também trabalhava apenas no sítio. Após quatro anos, mudaram-se de lá para Telemaco Borba, compraram uma Chácara, tendo a testemunha conhecido o local. Não tem conhecimento de que o marido da autora tenha trabalhado em atividade urbana. Sabe que trabalhavam sem empregados ou uso de maquinário, que era uma plantação pequena. Então, mudaram-se para outro local, após aproximadamente seis anos, quando perdeu o contato com eles. Sabe que atualmente moram perto do Embaú e que continuam trabalhando com lavoura. Acredita que não tenham outras propriedades além da chácara onde moram. Durante todo o período que conheceu a autora ela sempre trabalhou na roça, exercendo trabalho manual, sendo sua produção mais voltada para o sustento, pois eram uma família simples. Asseverou que era costume da região que, quando sobrava um tempo, os vizinhos trabalhassem para os outros recebendo por dia trabalhado.
Embora as testemunhas tenham informado que a autora exerceu atividade rural em regime de economia familiar, suas informações foram vagas e são contraditórias com demais documentos juntados aos autos. Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (ev.1-CONT6, fl.7), observa-se que o cônjuge da autora, Amilton Vieira de Godoi, possuiu vínculo de emprego urbano com diversas empresas no período de 1978 a 1994. Registro, ainda, que consoante INBEN- informações de benefício juntadas aos autos, o marido da autora percebe aposentadoria por tempo de contribuição, no ramo industriário, desde 1999, tendo recebido no ano de 2010 o equivalente a 3,5 salários mínimos (ev.1-CONT6, fl. 8).
O trabalho urbano do marido da autora, com rendimentos elevados, afasta a possibilidade do reconhecimento do trabalho rural em regime de economia familiar.
A propósito, confira-se recente julgado da Terceira Seção desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. ELEVADOS RENDIMENTOS PERCEBIDOS PELO CÔNJUGE. 1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 2. Indicando o conjunto probatório a descaracterização do regime de economia familiar em que exercido o labor rural da requerente, por remuneração incompatível com a condição de segurado especial, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, não é devida a concessão da aposentadoria por idade rural. (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018188-14.2013.404.9999, 3ª SEÇÃO, Des. Federal CELSO KIPPER, POR MAIORIA, D.E. 17/03/2015, PUBLICAÇÃO EM 18/03/2015)
Desta forma, ainda que as testemunhas tenham relatado o desempenho do labor rurícola por parte da família da autora, o mesmo se deu em período anterior ao período de carência que se pretende comprovar.
Conforme já afirmado, a exigência de início de prova material pode ser abrandada em relação aos trabalhadores rurais do tipo boia-fria. Contudo, nenhuma das testemunhas declarou que a autora desenvolveu atividade rural como boia-fria. Tampouco foram capazes de comprovar o labor rurícola entre os anos de 1974 e 2008, lapso temporal entre os documentos apresentados.
Ademais, o fato de o marido da autora perceber aposentadoria urbana com valor elevado, torna claro que eventual labor rural teria caráter subsidiário, descaracterizando o regime de economia familiar.
Assim, embora a autora tenha atingido a idade mínima necessária à concessão do benefício pleiteado em 2008, não comprovou a atividade rural, em regime de economia familiar ou na condição de boia-fria pelo período de carência exigido, e nem mesmo que tenha retornado ao desempenho de atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou ao implemento da idade mínima, que se mostre significativo, ou seja, de no mínimo 1/3 do total da carência necessária.
Necessário assim, dar provimento ao apelo do INSS.
Honorários advocatícios
Tendo havido a inversão da sucumbência, são aplicáveis as normas do novo CPC.
Fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, inciso III do NCPC. Sem custas, por ser a parte autora beneficiária de AJG.
CONCLUSÃO
Não conhecida da remessa necessária, porquanto, sendo a condenação do INSS fixada em valor inferior a mil salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório.
À vista do provimento do recurso do INSS, alterada a sentença no sentido de afastar a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural à parte autora. Invertidos os ônus da sucumbência, na forma da fundamentação supra.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e dar provimento ao apelo do INSS.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9427741v45 e, se solicitado, do código CRC 7AFE719D. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
| Data e Hora: | 03/09/2018 15:16 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/08/2018
APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5008026-93.2018.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00011500920108160078
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. João Heliofar de Jesus Villar |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA PINHEIRO DE GODOI |
ADVOGADO | : | GEMERSON JUNIOR DA SILVA |
: | ALCIRLEY CANEDO DA SILVA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/08/2018, na seqüência 193, disponibilizada no DE de 13/08/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E DAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Paulo Roberto do Amaral Nunes
Secretário em substituição
| Documento eletrônico assinado por Paulo Roberto do Amaral Nunes, Secretário em substituição, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9458604v1 e, se solicitado, do código CRC A8FEB25. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Roberto do Amaral Nunes |
| Data e Hora: | 29/08/2018 19:12 |
