| D.E. Publicado em 11/03/2015 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008767-97.2013.404.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ROSA GOULART DA SILVA |
ADVOGADO | : | Jeovani Bonadiman Blanco |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. NÃO CONCOMITÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 48, CAPUT E § 3º, DA LBPS. IMPOSSIBILIDADE. FALTA DE IDADE MÍNIMA.
1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Não é possível, em caso de aposentadoria por idade rural, dispensar a necessidade de implementação simultânea dos requisitos de idade e trabalho durante o interregno correspondente à carência, uma vez que o benefício, no caso, não tem caráter atuarial, e não se pode criar regime híbrido que comporte a ausência de contribuições e a dispensa do preenchimento concomitante das exigências legais.
3. A descontinuidade prevista no § 2º do art. 48 da LBPS não abarca as situações em que o trabalhador rural para com a atividade rural por muito tempo e depois retorna ao trabalho agrícola, uma vez que dispõe expressamente que a comprovação do labor rural deve-se dar no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício.
4. Exceção à regra seriam os casos dos empregados rurais em que houve o recolhimento de contribuições previdenciárias, hipótese em que o tempo poderia, em tese, ser computado para efeito de implemento do número de meses correspondente à carência da aposentadoria por idade rural prevista no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91. Contudo, não existia previsão, na legislação previdenciária que precedeu à Lei n. 8.212/91, de contribuição, pelo empregador rural pessoa física, que incidisse sobre a folha de salários dos empregados rurais, obrigação esta exclusiva das empresas.
5. Não tendo a parte autora logrado comprovar o efetivo exercício de atividade rural durante o período equivalente à carência necessária à concessão do benefício, é inviável a outorga deste.
6. Não contando a parte autora com 60 anos, descabe averiguar a eventual comprovação do trabalho urbano por ela alegadamente exercido para fins de aplicação do caput ou do § 3º do art. 48 da LBPS.
7. Embora indevido o benefício pleiteado, deve o tempo reconhecido ser averbado para futura concessão de benefício previdenciário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo reconhecido, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de fevereiro de 2015.
Des. Federal CELSO KIPPER
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6764026v5 e, se solicitado, do código CRC 95D19CA3. | |
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| Signatário (a): | Celso Kipper |
| Data e Hora: | 26/02/2015 19:13 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008767-97.2013.404.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ROSA GOULART DA SILVA |
ADVOGADO | : | Jeovani Bonadiman Blanco |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido para conceder a aposentadoria por idade rural à parte autora a contar da data do requerimento administrativo (18-08-2010), em razão do exercício do labor rural como boia-fria, condenando o Instituto Previdenciário ao pagamento das parcelas vencidas.
Em suas razões de apelação, a Autarquia Previdenciária sustentou, em síntese, a ausência de comprovação do exercício de atividades rurais no período correspondente à carência, imediatamente anterior ao requerimento do benefício ou implementação do requisito etário. Afirmou que os documentos juntados não servem como início de prova material. Alegou, ainda, que a autora recolheu diversas contribuições como doméstica no período de carência. Por fim, pediu a reforma da sentença no tocante à correção monetária e juros moratórios.
Oportunizado o oferecimento de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Em relação à remessa oficial, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934.642/PR, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 30-06-2009; EREsp 701.306/RS, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 07-04-2010; EREsp 600.596/RS, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 04-11-2009), prestigiou a corrente jurisprudencial que sustenta ser inaplicável a exceção contida no § 2.º, primeira parte, do art. 475 do CPC aos recursos dirigidos contra sentenças (a) ilíquidas, (b) relativas a relações litigiosas sem natureza econômica, (c) declaratórias e (d) constitutivas/desconstitutivas insuscetíveis de produzir condenação certa ou de definir objeto litigioso de valor certo (v.g., REsp. 651.929/RS).
Assim, em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, dou por interposta a remessa oficial.
Considerações gerais sobre a aposentadoria rural por idade
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 anos de idade, se homem, ou 55, se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei n. 8.213/91, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei n. 8.213/91 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de labor rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios, art. 102, §1°).
Nada obsta, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Assim, a título de exemplo, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 meses antes de 1997; b) 120 meses antes de 2001, c) períodos intermediários (102 meses antes de 1998, 108 meses antes de 1999, 114 meses antes de 2000).
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994 (data da publicação da Medida Provisória n. 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei n. 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n. 8.213/91.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei n. 8.213/91, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação (STJ, REsp n. 1450119-MT, Primeira Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves).
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
No que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do Resp n. 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos:
Transcrevo o acórdão:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Oportuno referir, ainda, que, conforme jurisprudência consolidada, para a concessão de aposentadoria rural por idade (Lei n. 8.213/91, art. 48, §§ 1º e 2º), o trabalhador deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, por tempo equivalente ao da carência, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (STJ, Pet n. 7476, Rel. para o acórdão Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, DJ 29-07-2011; Ag n. 1424137, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 24-04-2012; RESP n. 1264614, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJ 03-08-2011; TRF - 4ª Região, EIAC n. 0010573-75.2010.404.9999, Rel. Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, Terceira Seção, DE 17-08-2011; AR n. 2009.04.00.008358-9, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Terceira Seção, DE 18-06-2010), ressalvando-se, de um lado, por aplicação do art. 102, § 1º, da mesma Lei, a possibilidade de ser considerada como marco inicial da contagem retroativa do período de labor rural a data do implemento da idade necessária, ainda que bastante anterior à do requerimento, ou mesmo datas intermediárias entre esta e aquela, haja vista que, desde então, o segurado já teria o direito de pleitear o benefício, e, de outro, a descontinuidade da prestação laboral, entendida como um período ou períodos não muito longos sem atividade rural (TRF - 4ª Região, EIAC n. 0016359-66.2011.404.9999, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, DE 15-05-2012; TRF - 4ª Região, AC n. 2006.71.99.001397-8, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Quinta Turma, DE 26-08-2008). Dentro dessa perspectiva, não tem direito ao benefício o trabalhador que não desempenhou a atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento ou ao cumprimento do requisito etário, ainda que perfaça tempo de atividade equivalente à carência se considerado o trabalho rural desempenhado em épocas pretéritas (STJ, AgRg no RESP n. 1.242.720, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 15-02-2012; AgRg no RESP n. 1.242.430, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJ 09-05-2012; AgRg no RESP n. 1.298.063, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 25-04-2012; e, ainda, TRF - 4ª Região, EIAC n. 2004.70.03.002671-0, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. de 28-07-2008).
Se o objetivo da lei fosse permitir que a descontinuidade da atividade agrícola pudesse consistir em um longo período de tempo - muitos anos ou até décadas -, o parágrafo 2º do art. 48 da LBPS não determinaria que o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mas sim disporia acerca da aposentadoria para os trabalhadores rurais que comprovassem a atividade agrícola exercida a qualquer tempo. A locução "descontinuidade" não pode abarcar as situações em que o segurado deixa de desempenhar a atividade rural por muito tempo.
O argumento da desnecessidade de concomitância dos requisitos aplica-se à aposentadoria por idade urbana, consagrada pelo art. 48, caput, da Lei n. 8.213/91. Afinal, em tal tipo de benefício por idade, fala-se em carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício pretendido) e se leva em conta a quantidade de contribuições vertidas pelo segurado ao sistema (art. 50 da LBPS). É diante dessas características que este Regional e o Superior Tribunal de Justiça vêm admitindo, de forma reiterada, o preenchimento não simultâneo dos requisitos etário e de carência para a concessão de benefício do gênero, haja vista que a condição essencial para o deferimento é o suporte contributivo correspondente, posição que restou consagrada pelo art. 3º, § 1º, da Lei n. 10.666/03. Nesse sentido: STJ, ERESP n. 502420, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Terceira Seção, DJ de 23-05-2005, p. 147; STJ, ERESP n. 551997, Rel. Min. Gilson Dipp, Terceira Seção, DJ de 11-05-2005, p. 162; TRF - 4ª Região, EDAC n. 2003.04.01.000839-2, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, Sexta Turma, DJU de 30-06-2004; TRF - 4ª Região, AC n. 2005.04.01.008807-4, Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona, Quinta Turma, DJU de 13-07-2005; TRF - 4ª Região, AC n. 2004.04.01.017461-2, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, Sexta turma, DJU de 01-12-2004; TRF - 4ª Região, EIAC n. 1999.04.01.007365-2, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, Terceira Seção, DJU de 17-07-2002.
No caso, contudo, da aposentadoria rural por idade, devida independentemente do aporte contributivo (arts. 26, inciso III, e 39, inciso I, ambos da Lei de Benefícios) e garantida com uma idade reduzida, releva justamente a prestação do serviço agrícola no período imediatamente anterior à época da aquisição do direito à aposentação, em número de meses idêntico ao período equivalente à carência. Em situações tais, pretender a concessão do benefício previdenciário sem o preenchimento simultâneo das exigências legais, consistiria, em verdade, na combinação de dois sistemas distintos de outorga de aposentadoria, o que não é possível, porquanto acarretaria um benefício não previsto em lei. Essa, aliás, foi a posição adotada pela Terceira Seção deste Tribunal por ocasião do julgamento dos EIAC n. 2004.70.03.002671-0, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. de 28-07-2008 e, ainda, dos EIAC n. 2007.71.99.010262-1, Rel. Juiz Federal Alcides Vettorazzi, D.E. de 29-06-2009.
No tocante à necessidade da observância simultânea dos seus requisitos (desempenho de atividade rural no período equivalente ao da carência e implemento da idade) para a concessão da aposentadoria rural por idade, além dos precedentes acima citados (em especial o da Terceira Seção do STJ na decisão da Petição n. 7.476/PR), veja-se recente julgado da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, de relatoria do Ministro Herman Benjamin:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM ATIVIDADE RURAL PARA FINS DE APOSENTADORIA URBANA. INOBSERVÂNCIA DO CUMPRIMENTO DO REQUISITO DA CARÊNCIA DURANTE A ATIVIDADE URBANA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE.
1. Hipótese em que o Tribunal de origem concedeu ao agravante o benefício previdenciário de aposentadoria por idade ao somar o tempo de serviço rural, sem o correspondente suporte contributivo, ao tempo de serviço urbano.
2. A jurisprudência do STJ pacificou o entendimento de que inexiste óbice legal ao cômputo do tempo de serviço rural exercido anteriormente à edição da Lei 8.213/1991, independentemente do recolhimento das contribuições respectivas, para a obtenção de aposentadoria urbana, se durante o período de trabalho urbano é cumprida a carência exigida para a concessão do benefício.
3. No caso dos autos, o requisito da carência somente teria sido cumprido se contados os períodos da atividade rural exercida pelo agravante, uma vez que as contribuições do período urbano não seriam suficientes para atender a tal exigência. Sendo assim, é incabível a concessão do benefício, tendo em vista o não cumprimento do requisito carência.
4. O STJ pacificou o entendimento de que o trabalhador rural, afastando-se da atividade campesina antes do implemento da idade mínima para a aposentadoria, deixa de fazer jus ao benefício previsto no art. 48 da Lei 8.213/1991. Isso porque o regramento insculpido no art. 3º, § 1º, da Lei 10.666/2003, referente à desnecessidade de observância simultânea dos requisitos para a aposentação, restringiu sua aplicação somente às aposentadorias por contribuição, especial e por idade, as quais pressupõem contribuição.
5. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no REsp 1468762/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 31/10/2014)
(grifei)
Ademais, nas hipóteses em que a ausência de efetivo trabalho rural, por um período considerável, for decorrente do exercício de trabalho urbano, este só pode ser considerado para a concessão da aposentadoria por idade mista (Lei de Benefícios, art. 48, §3º), que exige o implemento da idade de 65 anos, se homem, ou 60 anos, se mulher. O deferimento de aposentadoria rural por idade, em casos de expressiva interrupção da atividade campesina no período equivalente à carência, período no qual houve trabalho urbano, consubstanciaria, na verdade, a concessão da aposentadoria por idade mista com idade reduzida (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), em afronta ao parágrafo terceiro do art. 48, acima mencionado.
De outro lado, se a larga interrupção no trabalho rural consistir em simples e pura inatividade, a não concessão da aposentadoria rural por idade decorrerá justamente do não cumprimento de um dos dois únicos requisitos para a concessão do benefício, a saber, o efetivo exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade (ou do requerimento) em número de meses idêntico à carência.
Há de se lembrar que, em regra, nosso sistema previdenciário tem caráter contributivo (Constituição Federal, art. 201, caput), sendo razoável, no entanto, excepcioná-lo no caso de aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais, dadas as condições de trabalho normalmente desfavoráveis, a depender das condições do solo e das intempéries, e a exigir, muitas vezes, esforço desmedido e jornada estafante, isso sem falar do descaso, em termos de proteção social, a que aqueles foram relegados por décadas, em contraposição à sua relevante contribuição para o desenvolvimento nacional. Entretanto, razoável também que a legislação exija, para o deferimento do benefício - que é garantido, repito, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias e com o implemento de uma idade reduzida - que no período equivalente ao da carência, imediatamente anterior ao cumprimento da idade, haja o efetivo desempenho das lides rurícolas, salvo descontinuidade consistente em curto ou curtos períodos de inatividade ou de trabalho não rural, que não afasta a condição de segurado especial do lavrador (STJ, Primeira Turma, AgRg no Agravo em Recurso Especial n. 167.141/MT, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 25-06-2013). Não vislumbro, portanto, inconstitucionalidade na lei que daquela forma dispôs, nem desvalorização do trabalho rural desempenhado em tempo pretérito, desvinculado e não simultâneo com o período equivalente ao da carência, na mesma medida em que não é desvalorizado, por exemplo, o trabalho (urbano) de um pedreiro autônomo pelo fato de lhe ser recusada a aposentadoria em razão de ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias. São dois regimes distintos, com pressupostos e requisitos próprios: neste último (urbano), privilegia-se o recolhimento de contribuições e se exige o cumprimento de uma idade maior; no primeiro (rural), desobriga-se o segurado do recolhimento de contribuições e garante-se a aposentadoria com uma idade reduzida, mas, em contrapartida, exige-se o efetivo exercício de atividade rural em período (equivalente ao da carência) imediatamente anterior à época da aquisição do direito à aposentação.
A respeito do interregno que pode ser considerado como curto período de não exercício do trabalho campesino, para o efeito de não descaracterizar a condição de segurado especial e possibilitar a perfectibilização do período equivalente ao da carência, ficando a interrupção, dessa forma, albergada no conceito de descontinuidade, tenho o entendimento de que deve ser associado, por analogia, ao período de graça estabelecido no art. 15 da Lei de Benefícios, podendo chegar, portanto, conforme as circunstâncias, ao máximo de 38 meses [24+12+2]. Esta exegese, no tocante à utilização do período de graça do art. 15 da Lei de Benefícios como parâmetro de aferição do tempo de descontinuidade permitido, tem ressonância no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, como se observa de recente julgamento da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, § 9º, III, DA LEI 8.213/91 COM A REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 11.718/08. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA NO PERÍODO DE CARÊNCIA. ADOÇÃO, POR ANALOGIA, DOS PRAZOS DO PERÍODO DE GRAÇA. ART. 15 DA LEI 8.213/91. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Os arts. 39, I, e 143 da Lei 8.213/91 dispõem que o trabalhador rural enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social na forma da VII do art. 11 [segurado especial], tem direito a requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
2. A norma previdenciária em vigor à época do ajuizamento da ação, antes do advento da Lei 11.718/08, não especificava, de forma objetiva, quanto tempo de interrupção na atividade rural seria tolerado para efeito da expressão legal "ainda que de forma descontínua".
3. A partir do advento da Lei 11.718/08, a qual incluiu o inciso III do § 9º do art. 11 da Lei 8.213/91, o legislador possibilitou a manutenção da qualidade de segurado especial quando o rurícola deixar de exercer atividade rural por período não superior a cento e vinte dias do ano civil, corridos ou intercalados, correspondentes ao período de entressafra. Todavia, a referida regra, mais gravosa e restritiva de direito, é inaplicável quando o exercício da atividade for anterior à inovação legal.
4. A teor do disposto nos arts. 4º e 5º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro - LINDB, diante da ausência de parâmetros específicos indicados pelo legislador originário, mostra-se mais consentânea com o princípio da razoabilidade a adoção, de forma analógica, da regra previdenciária do art. 15 da Lei 8.213/91, que garante a manutenção da qualidade de segurado, o chamado "período de graça".
5. Demonstrado que a parte recorrente exerceu atividade urbana por período superior a 24 (vinte e quatro) meses no período de carência para a aposentadoria rural por idade, forçosa é a manutenção do acórdão recorrido.
6. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1354939/CE, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/06/2014, DJe 01/07/2014)
Ressalte-se, ainda, que a interpretação acima é plenamente aplicável nas seguintes circunstâncias: a) aos períodos equivalentes à carência compreendidos, total ou parcialmente, em tempo anterior à publicação da Lei n.º 11.718/2008, independentemente de a descontinuidade no trabalho rural consistir em completa inatividade ou decorrer de atividade urbana remunerada; b) aos períodos equivalentes à carência que se seguirem à publicação da aludida lei (total ou parcialmente), quando a descontinuidade no trabalho rural consistir em inatividade.
Tratando-se, porém, (c) de período equivalente à carência que se perfectibilizar sob a égide da Lei n.º 11.718/2008, que acrescentou o parágrafo 9º ao art. 11 da Lei de Benefícios, e da Lei n.º 12.873/2013 (que alterou a redação do seu inciso III), no tocante à porção de tempo posterior a tais leis, quando a descontinuidade for decorrente de atividade urbana remunerada, deve-se ter como norte o estabelecido nas aludidas leis, ou seja, considera-se possível a interrupção no trabalho rural sem descaracterizar a condição de segurado especial se o exercício de atividade remunerada não exceder a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil.
Da aposentadoria por idade com fulcro no art. 48, § § 3º e 4º, da Lei n. 8.213/91
A aposentadoria por idade híbrida está prevista nos parágrafos 3º e 4º do art. 48 da Lei nº 8.213/91, introduzidos pela Lei nº 11.718/2008. Tal artigo possui a seguinte redação:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei.
§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§ 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social.
A Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento dos Embargos Infringentes nº 0008828-26.2011.404.9999/PR, decidiu, por maioria, que a modificação legislativa permitiu, para o caso específico de aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem), o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo no que toca ao período rural, ainda que o exercício da atividade rural tenha se dado apenas em período anterior ao equivalente à carência e que o segurado não mais tenha retornado às lides rurais. A decisão foi assim ementada:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR IDADE. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. LEI Nº 11.718/2008. LEI 8.213, ART. 48, § 3º. TRABALHO RURAL E TRABALHO URBANO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO A SEGURADO QUE NÃO ESTÁ DESEMPENHANDO ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. POSSIBILIDADE.
1. É devida a aposentadoria por idade mediante conjugação de tempo rural e urbano durante o período aquisitivo do direito, a teor do disposto na Lei nº 11.718, de 2008, que acrescentou § 3º ao art. 48 da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumprido o requisito etário de 60 anos para mulher e de 65 anos para homem.
2. Ao § 3º do artigo 48 da LB não pode ser emprestada interpretação restritiva. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar contribuir, o que seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês para fazer jus à aposentadoria por idade.
3. O que a modificação legislativa permitiu foi, em rigor, para o caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem), o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo no que toca ao período rural.
4. Não há, à luz dos princípios da universalidade e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, e bem assim do princípio da razoabilidade, como se negar a aplicação do artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/91, ao trabalhador que exerceu atividade rural, mas no momento do implemento do requisito etário (sessenta ou sessenta e cinco anos), está desempenhando atividade urbana. (TRF4, EINF 0008828-26.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 10/01/2013)
Dessa forma, é possível a concessão de inativação por idade, mediante contagem conjunta de tempo de serviço urbano e rural, no período necessário à concessão do benefício, desde que implementado o requisito etário exigido para a aposentadoria por idade urbana (60 anos para mulher e 65 anos para homem).
Inocorrência de sentença extra petita
Em matéria previdenciária, devem ser mitigadas algumas formalidades processuais, haja vista o caráter de direito social da previdência e assistência sociais (Constituição Federal, art. 6º), intimamente vinculado à concretização da cidadania e ao respeito à dignidade da pessoa humana, fundamentos do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, inc. II e III), bem como à construção de uma sociedade livre, justa e solidária, à erradicação da pobreza e da marginalização e à redução das desigualdades sociais, objetivos fundamentais daquele Estado (CF, art. 3º, inc. I e III), tudo a demandar uma proteção social eficaz aos segurados e seus dependentes, e demais beneficiários, inclusive quando litigam em juízo.
A Autarquia Previdenciária, enquanto Estado sob a forma descentralizada, possui o dever constitucional de tornar efetivas as prestações previdenciárias e assistenciais a todos os legítimos beneficiários, que se traduz, tanto na esfera administrativa quanto judicial, na obrigação de conceder o benefício previdenciário ou assistencial a que tem direito o requerente ou demandante.
Ressalte-se que à Autarquia Previdenciária continua competindo, mesmo em juízo, a efetividade dos direitos previdenciários e assistenciais. A condição de parte não lhe retira o dever de prestação positiva consistente na concessão do benefício a que tem direito o segurado, dependente ou beneficiário.
Dentro desse contexto - que se pode resumir pela relevância social que envolve a matéria -, e considerando, ainda, o caráter instrumental do processo, com vistas à realização do direito material, deve-se compreender o pedido, em ação previdenciária, como o de obtenção do benefício previdenciário ou assistencial a que tem direito a parte autora, independentemente de indicação da espécie de benefício ou de especificação equivocada deste.
À mesma conclusão chega-se a partir de uma interpretação extensiva do art. 105 da Lei de Benefícios - o que, aliás, deve ser feito, tendo em vista, mais uma vez, a relevância da questão social e a íntima ligação entre a previdência e assistência sociais e a dignidade da pessoa humana -, no sentido de que não apenas a apresentação de documentação incompleta não constitui motivo para recusa do requerimento de benefício, como também a formulação de pedido administrativo de qualquer espécie de prestação previdenciária não exime o INSS de examinar a possibilidade de concessão de benefício previdenciário diverso, ou mesmo de benefício assistencial, sempre que mais vantajoso para o beneficiário, ainda que, para tanto, tenha que orientar, sugerir ou solicitar os documentos necessários. Ora, se é assim no âmbito administrativo, não pode ser diferente na esfera judicial, eis que presentes os mesmos elementos asseguradores de uma atividade estatal direcionada à concretização de direitos sociais.
Considerando, pois, que o pedido, nas causas previdenciárias, é o de obtenção do benefício a que tem direito o autor da ação, inexiste, em caso de concessão de benefício diverso do mencionado na inicial, afronta ao princípio da congruência entre pedido e sentença, insculpido nos arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil. Nem poderia ser diferente, haja vista que o fator subjacente à eventual violação daquele princípio - o elemento surpresa, que redundaria em situação de injustificada desigualdade entre as partes - não se encontra presente, pois se a autarquia previdenciária possui, a priori (isto é, inclusive antes da demanda judicial), o dever de concessão da prestação previdenciária ou assistencial a que tem direito o segurado, dependente ou beneficiário, não se pode considerar surpreendida por deferimento de benefício diferente do pleiteado.
Por tais razões, não é extra petita, v. g., a decisão (a) que concede aposentadoria por invalidez quando pleiteado auxílio-doença (STJ, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, AgRg no REsp 1305049, DJe de 08-05-2012; STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, REsp n. 293659, DJ de 19-03-2001); (b) que defere auxílio-doença quando requerida aposentadoria por invalidez (STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, AgRg no REsp 868911, DJe de 17-11-2008; STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, REsp n. 255776, DJ de 11-09-2000; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, REsp n. 169567, DJ de 02-05-2000; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Vicente Leal, REsp n. 193220, DJ de 08-03-1999; STJ, Quinta Turma, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, REsp n. 105003, DJ de 22-02-1999; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Vicente Leal, REsp n. 177267, DJ de 21-09-1998; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Anselmo Santiago, RESp n. 124771, DJ de 27-04-1998); (c) que concede auxílio-acidente quando o pleito formulado era o de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez (STJ, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, AgRg no REsp 155067, DJe de 26-06-2012; STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, AgRg no Ag 1232820, DJe de 22-11-2010; STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, REsp n. 267652, DJ de 28-04-2003; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, REsp n. 385607, DJ de 19-12-2002; STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, REsp n. 226958, DJ de 05-03-2001; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, EDcl no REsp n. 197794, DJ de 21-08-2000); TRF4, Sexta Turma, Rel. Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, AC n. 0005332-23.2010.404.9999/RS, D.E. de 18-02-2011; (d) que defere aposentadoria por invalidez quando pleiteado auxílio-acidente (STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Paulo Galotti, REsp n. 541695, DJ de 01-03-2004; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Vicente Leal, REsp n. 412676, DJ de 19-12-2002; TRF4, Sexta Turma, minha relatoria, AC n. 5021579-58.2010.404.7100/RS, julgado em 15-06-2011); (e) que concede renda mensal vitalícia quando formulado pedido de aposentadoria por invalidez (STJ, Quinta Turma, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, EDcl no REsp n. 193218, DJ de 06-12-1999; STJ, Quinta Turma, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, REsp n. 180461, DJ de 06-12-1999; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Vicente Leal, REsp n. 202931, DJ de 24-05-1999; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Vicente Leal, REsp n. 193110, DJ de 01-03-1999); (f) que concede auxílio-doença quando requerida renda mensal vitalícia (STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, REsp n. 177566, DJ de 20-09-1999); (g) que defere benefício assistencial em vez de renda mensal vitalícia (STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Nilson Naves, AgRg no Ag n. 585216, DJ de 06-02-2006; STJ, Sexta Turma, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, AgRg no Ag n. 540835, DJ de 05-09-2005); (h) que concede benefício assistencial quando pleiteado aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença (STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 01-12-2008); (i) que concede aposentadoria por idade rural quando pleiteado benefício assistencial (STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, AgRg no REsp n. 801193, DJ de 15-05-2006); (j) que concede aposentadoria por idade, com base em tempo de trabalho urbano, quando pleiteada aposentadoria por idade rural (TRF-4ª Região, Quinta Turma, de minha relatoria, AC n. 2004.04.01.046095-5, DJU de 05-04-2006; TRF-4ª Região, Quinta Turma, Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona, AC n. 2002.04.01.052292-7, DJU de 28-09-2005; TRF-4ª Região, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, AC n. 2004.70.00.015423-0, DJU de 28-06-2006; TRF-4ª Região, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, AC n. 2002.71.03.000202-4, DJU de 31-08-2005; TRF-4ª Região, Quinta Turma, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, AC n. 2002.70.01.000043-3, DJU de 23-03-2005; TRF-4ª Região, Sexta Turma, Rel. Des. Federal Néfi Cordeiro, AC n. 2001.70.04.000958-6, DJU de 25-06-2003); (k) que concede aposentadoria por idade quando requerida aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, AgRg no REsp 861680, DJe de 17-11-2008; TRF-4ª Região, Terceira Seção, em que fui Relator para o acórdão, EAC n. 2000.04.01.107110-2, DJU de 02-08-2006; TRF-4ª Região, Segunda Turma Suplementar, Rel. Des. Federal Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, AC n. 2002.70.05.003638-4, DJU de 14-06-2006; TRF-4ª Região, Segunda Turma Suplementar, Rel. Juíza Federal Eloy Bernst Justo (convocada), AC n. 2001.04.01.080922-7, DJU de 05-04-2006; TRF-4ª Região, Segunda Turma Suplementar, Rel. Juíza Federal Eloy Bernst Justo (convocada), AC n. 2000.70.07.001152-9, DJU de 29-03-2006); (l) que concede aposentadoria por tempo de serviço/contribuição quando requerida aposentadoria por idade urbana ou aposentadoria especial (STJ, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, REsp 1019569, DJe de 21-02-2008; TRF4, Sexta Turma, minha relatoria, AC n. 5015358-59.2010.404.7100/RS, julgada em 21-06-2012).
Da análise do caso concreto
Fixados os parâmetros para a concessão do benefício, passo ao exame da situação específica dos autos.
Para a comprovação do efetivo trabalho agrícola, foram trazidos aos autos: a) certidão de casamento, celebrado em 07-07-1970, em que o marido da autora foi qualificado como lavrador (fl. 23), e b) comprovante de percepção, pelo marido, de aposentadoria por idade rural (fl. 27).
Veio aos autos, também: a) declaração de exercício de atividade rural pela parte autora, como boia-fria, nos períodos de 02-01-1979 a 28-12-1992, 02 a 31-05-2001, 01 a 30-06-2002, 01 a 31-07-2003 e 01 a 31-07-2010, firmada em 25-08-2010, pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Cidade Gaúcha/PR (fls. 24/26), e b) declaração, firmada em 18-08-2010 por Jesuíno Joaquim Ciriaco, de que a autora trabalhou em sua propriedade rural, como volante, nos períodos acima referidos. Tais declarações, contudo, não consubstanciam início de prova material, uma vez que constituem mera manifestação unilateral, não sujeita ao crivo do contraditório.
Na audiência de instrução realizada em 25-04-2012, foi colhido o depoimento pessoal da demandante e ouvidas duas testemunhas, as quais atestam o labor rural da autora como volante (fls. 69/72).
No caso concreto, para fazer jus à aposentadoria por idade rural prevista no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei de Benefícios, a requerente deveria comprovar o exercício de atividades agrícolas nos 168 meses anteriores ao implemento do requisito etário (20-06-2009 - fl. 19), ou nos 174 meses que antecedem o requerimento administrativo (18-08-2010 - fl. 22), ou ainda nos períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Sucede que, dos registros do CNIS, juntados a fls. 53/57, se verifica que a demandante exerceu atividade urbana, como doméstica, no período de 01-08-1993 a 30-06-1999, o que ela mesma confirma no depoimento pessoal. Veja-se, ainda, que, conforme consulta ao Plenus, cujas informações determino a juntada aos autos, foi-lhe concedido, de 08-08-2006 a 15-04-2007, o benefício de auxílio-doença previdenciário (espécie 31).
Diante dessas circunstâncias, resta obstado o deferimento da aposentadoria com fulcro no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91, uma vez que o conjunto probatório indica que a autora não exerceu atividade rural em grande parte do período equivalente à carência, não sendo possível aplicar o conceito de descontinuidade previsto no art. 143 da Lei n. 8.213/91.
Considerando que a demandante manteve vínculos urbanos, resta analisar a possibilidade de concessão da aposentadoria por idade prevista no art. 48, §3º, da Lei n. 8.213/1991.
Uma vez que a parte autora não contava 60 anos na data do ajuizamento (29-03-2011), descabe averiguar a eventual comprovação do trabalho urbano por ela exercido para fins de aplicação do caput ou do § 3º do art. 48 da LBPS, que versam, respectivamente, sobre a concessão de inativação por idade mediante cômputo de tempo de serviço urbano ou mediante contagem conjunta de tempo de serviço urbano e rural.
Não sendo devida a aposentadoria pleiteada, fica reconhecido, em razão da prova dos autos, o tempo rural de 01/1979 a 31-07-1993, véspera do vínculo urbano como doméstica. Frise-se que os períodos posteriores ao referido vínculo empregatício não podem ser considerados ante a ausência de início de prova material do exercício da atividade rural.
Tal período, pois, deve ser averbado, para fins de futura concessão de benefício previdenciário.
Sendo recíproca e proporcional a sucumbência, devem os honorários advocatícios, ora fixados em R$ 788,00, ser suportados de forma equivalente pelas partes, e compensados.
As custas devem ser suportadas na mesma proporção, estando suspensa, contudo, a parte concernente à autora, por ser beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita.
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo reconhecido (CPF 609.690.089-53), a ser efetivada em 45 dias.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo reconhecido.
Des. Federal CELSO KIPPER
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/06/2014
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008767-97.2013.404.9999/PR
ORIGEM: PR 00006174020118160070
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Fábio Bento Alves |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ROSA GOULART DA SILVA |
ADVOGADO | : | Jeovani Bonadiman Blanco |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/06/2014, na seqüência 698, disponibilizada no DE de 06/06/2014, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
RETIRADO DE PAUTA.
Elisabeth Thomaz
Diretora Substituta de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Elisabeth Thomaz, Diretora Substituta de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6820039v1 e, se solicitado, do código CRC 53E57E8E. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/02/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008767-97.2013.404.9999/PR
ORIGEM: PR 00006174020118160070
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal CELSO KIPPER |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ROSA GOULART DA SILVA |
ADVOGADO | : | Jeovani Bonadiman Blanco |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/02/2015, na seqüência 324, disponibilizada no DE de 10/02/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À AVERBAÇÃO DO TEMPO RECONHECIDO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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