Apelação Cível Nº 5014309-93.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LAURA PEREIRA DE SOUZA
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido de aposentadoria por idade rural a contar da DER.
Alega o INSS que a condição de segurada especial não restou devidamente comprovada porquanto existe vínculo do esposo na área urbana, o que descaracteriza sua condição de segurada especial. Assim, requer a improcedência da demanda,
Juntadas as contrarrazões vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Remessa necessária
Tendo sido o presente feito sentenciado na vigência do atual Diploma Processual Civil, não há falar em remessa oficial, porquanto foi interposto recurso voluntário pelo INSS, o que vai de encontro ao disposto no art. 496, § 1º, do vigente CPC. Com efeito, a redação do mencionado dispositivo é clara e inequívoca, não admitindo o seu texto outra interpretação, que seria ampliativa do condicionamento do trânsito em julgado da sentença ao reexame necessário. Trata-se de instituto excepcional e, sendo assim, há de ser restritivamente interpretado.
A propósito, Humberto Theodoro Júnior percucientemente observa que a novidade do CPC de 2015 é a supressão da superposição de remessa necessária e apelação. Se o recurso cabível já foi voluntariamente manifestado, o duplo grau já estará assegurado, não havendo necessidade de o juiz proceder à formalização da remessa oficial. (in Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum. 57. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 1101).
Nesta exata linha de conta, colaciona-se o seguinte aresto do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO DO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO DE JURISDIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE LÓGICA ENTRE REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO FAZENDÁRIA NA SISTEMÁTICA PROCESSUAL NOVA (ART. 496, § 1º, DO CPC VIGENTE). REMESSA NÃO CONHECIDA. AUXÍLIO-ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO NA ESPÉCIE. REDUÇÃO FUNCIONAL SUFICIENTEMENTE EVIDENCIADA. 1. Reexame necessário. De acordo com o artigo 496 ,§ 1º, do novo Código de Processo Civil, é descabida a coexistência de remessa necessária e recurso voluntariamente interposto pela Fazenda Pública. Com efeito, a nova codificação processual instituiu uma lógica clara de mútua exclusão dos institutos em referência, resumida pela sistemática segundo a qual só caberá remessa obrigatória se não houver apelação no prazo legal; em contrapartida, sobrevindo apelo fazendário, não haverá lugar para a remessa oficial. Precedentes doutrinários. Caso em que a apelação interposta pelo ente público dispensa o reexame oficioso da causa. Remessa necessária não conhecida. [...]. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDA. (TJ/RS, 9ª Câmara Cível, Apelação e Reexame Necessário nº 70076942127, Rel. Des. Carlos Eduardo Richinitti, julg. 30-05-2018)
No mesmo sentido, inclusive, já pronunciou-se esta Turma Julgadora:
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME (DES)NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO EM CASO DE RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS COMPROVADOS E NÃO QUESTIONADOS PELO APELANTE. ANULAÇÃO DA PERÍCIA. DESCABIMENTO. IMPUGNAÇÃO À PESSOA DO PERITO EM MOMENTO INOPORTUNO. PRECLUSÃO.
1. O reexame necessário é instituto de utilidade superada no processo civil diante da estruturação atual da Advocacia Pública, que inclusive percebe honorários advocatícios de sucumbência. Nada obstante, persiste positivado com aplicabilidade muito restrita. Considerada a redação do art. 496, § 1º, do NCPC, somente tem cabimento quando não houver apelação da Fazenda Pública. São incompatíveis e não convivem o apelo da Fazenda Pública e o reexame necessário, mera desconfiança em relação ao trabalho dos procuradores públicos, que compromete o tempo da Justiça, sobretudo da Federal.
2. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter temporário da incapacidade.
3. In casu, pretendendo o INSS impugnar a nomeação do perito designado pelo juiz, deveria tê-lo feito, sob pena de preclusão, na primeira oportunidade em que tomou conhecimento de que a perícia seria realizada por aquele profissional. A impugnação do perito realizada após a perícia - a qual foi desfavorável ao Instituto - não tem o condão de afastar a preclusão.
4. Embora de acordo com o novo CPC não seja cabível agravo de instrumento da decisão interlocutória que rejeitou a impugnação do INSS ao perito, o que, em tese, poderia ensejar a aplicação do disposto no § 1º do art. 1.009, de modo a permitir que a matéria fosse reiterada em apelação, no caso, a referida impugnação ocorreu depois da realização da perícia, e não assim que o Instituto teve conhecimento de que a perícia seria realizada pelo profissional contestado, o que afasta a possibilidade de aplicação daquela regra. (TRF4, NONA TURMA, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, unânime, julg. 12-12-2018).
Logo, conforme a regra da singularidade estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil, tendo sido, no caso, interposta apelação pela Autarquia Previdenciária, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária.
Mérito
Da aposentadoria prevista no art. 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91
A Lei nº 11.718/2008, dentre outras alterações, modificou o § 2º e instituiu os §§ 3º e 4º do art. 48 da Lei de Benefícios da Previdência Social, nos seguintes termos:
Art. 48. Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social.
Como se vê, a Lei nº 11.718/2008 instituiu a possibilidade de outorga do benefício de aposentadoria por idade com o preenchimento da carência mediante o cômputo do tempo de serviço urbano e rural, desde que haja o implemento da mínima de 60 (sessenta) anos para mulher e 65 (sessenta e cinco) anos para homem.
O mesmo tratamento conferido ao segurado especial (trabalhador rural) que tenha contribuído sob outra categoria de segurado, para fins de obtenção de aposentadoria por idade (Lei nº 8.213/1991, §3º do art. 48), deve ser alcançado ao trabalhador urbano, que fará jus ao cômputo de período rural para implementar os requisitos necessários à obtenção da aposentadoria prevista no caput do art. 48.
A interpretação do § 3º do art. 48 deve ser feita à luz dos princípios constitucionais da universalidade e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, de forma que não há justificativa para se negar a aplicação do artigo 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91 ao trabalhador que exerceu atividade rural, mas no momento do implemento do requisito etário está desempenhando atividade urbana.
A questão é objeto da Súmula nº 103 deste Tribunal, literis:
A concessão da aposentadoria híbrida ou mista, prevista no art. 48, §3º, da Lei nº 8.213/91, não está condicionada ao desempenho de atividade rurícola pelo segurado no momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo, sendo, pois, irrelevante a natureza do trabalho exercido neste período.
Ademais, seja qual for a predominância do labor misto no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo, o trabalhador tem direito a se aposentar com as idades citadas no § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, desde que cumprida a carência com a utilização de labor urbano ou rural (STJ, REsp 1605254/PR, Segunda Turma, Rel.Ministro Herman Benjamin, julgado em 21-06-2016).
Ressalto, ainda, que a aposentadoria mista ou híbrida, por exigir que o segurado complete 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, é, em última análise, uma aposentadoria de natureza assemelhada à urbana. Assim, para fins de definição de regime, deve ser equiparada à aposentadoria urbana. Com efeito, a Constituição Federal, em seu art, 201, § 7º, II, prevê a redução do requisito etário apenas para os trabalhadores rurais. Exigidos 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a aposentadoria mista, pode-se dizer, constitui praticamente subespécie da aposentadoria urbana, ainda que com possibilidade de agregação de tempo rural sem qualquer restrição.
Dessa forma, considerando a natureza do benefício, deve ser conferido à aposentadoria por idade híbrida o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, não havendo, portanto, exigência de preenchimento simultâneo dos requisitos idade e carência. Caso ocorra a implementação da carência exigida antes mesmo do preenchimento do requisito etário, é irrelevante e não constitui óbice para o seu deferimento a eventual perda da condição de segurado.
A respeito dessa questão, § 1º do artigo 3º da Lei nº 10.666/03, assim dispõe:
Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§ 1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.
Conclui-se, pois, que o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício, nos termos do já decidido pela 3ª Seção desta Corte, nos Embargos Infringentes nº 0008828-26.2011.404.9999 (Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 10-01-2013).
Esse entendimento, aliás, está em conformidade com a jurisprudência do STJ (STJ, REsp 1605254/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 21-06-2016; REsp 1476383/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 01-10-2015; AgRg no REsp 1531534/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 23-06-2015).
Da comprovação do tempo de atividade rural
Para a comprovação do tempo de atividade rural faz-se necessário início de prova material, não sendo admitida, via de regra, prova exclusivamente testemunhal (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91; Súmula 149 do STJ).
A respeito, está pacificado nos Tribunais que não se exige comprovação documental ano a ano do período que se pretende comprovar, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental (TRF - 4ª Região, AC n. 0021566-75.2013.4.04.9999, Sexta Turma, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 27-05-2015; TRF - 4ª Região, AC n. 2003.04.01.009616-5, Terceira Seção, Rel. Des. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. de 19-11-2009; TRF - 4ª Região, EAC n. 2002.04.01.025744-2, Terceira Seção, Rel. para o Acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 14-06-2007; TRF - 4ª Região, EAC n. 2000.04.01.031228-6, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJU de 09-11-2005).
Ainda, está pacificado que constituem prova material os documentos civis (STJ, AR n. 1166/SP, Terceira Seção, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 26-02-2007; TRF - 4ª Região, AC 5010621-36.2016.4.04.9999, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado em 14-12-2016; TRF - 4ª Região, AC n. 2003.71.08.009120-3/RS, Quinta Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. de 20-05-2008; TRF - 4ª Região, AMS n. 2005.70.01.002060-3, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJ de 31-05-2006) - tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, dentre outros - em que consta a qualificação como agricultor tanto da parte autora como de membros do grupo parental. Assim, os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural (Súmula 73 desta Corte).
No entanto, não existe consenso sobre o alcance temporal dos documentos, para efeitos probatórios, nem se há ou não necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado. Para chegar a uma conclusão, parece-me necessário averiguar a função da prova material na comprovação do tempo de serviço.
A prova material, conforme o caso, pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade rural, bastando, para exemplificar, citar a hipótese de registro contemporâneo em CTPS de contrato de trabalho como empregado rural. Em tal situação, não é necessária a inquirição de testemunhas para a comprovação do período registrado.
Na maioria dos casos que vêm a juízo, no entanto, a prova material não é suficiente à comprovação de tempo de trabalho, necessitando ser corroborada por prova testemunhal. Nesses casos, a prova material (ainda que incipiente) tem a função de ancoragem da prova testemunhal, sabido que esta é flutuante, sujeita a esquecimentos, enganos e desvios de perspectiva. A prova material, portanto, serve de base, sustentação, pilar em que se apoia (apesar dos defeitos apontados) a necessária prova testemunhal.
Em razão disso, entendo que, no mais das vezes, não se pode averiguar os efeitos da prova material em relação a si mesma, devendo a análise recair sobre a prova material em relação à prova testemunhal, aos demais elementos dos autos e ao ambiente socioeconômico subjacente; em outras palavras, a análise deve ser conjunta. A consequência dessa premissa é que não se pode afirmar, a priori, que há necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado, ou que a eficácia probatória do documento mais antigo deva retroagir um número limitado de anos. O alcance temporal da prova material dependerá do tipo de documento, da informação nele contida (havendo nuances conforme ela diga respeito à parte autora ou a outrem), da realidade fática presente nos autos ou que deles possa ser extraída e da realidade socioeconômica em que inseridos os fatos sob análise.
Em 18-01-2019 foi editada a MP n. 871, convertida na Lei n. 13.846, de 18-06-2019, que alterou os artigos 106 e 55, § 3º, da LBPS, e acrescentou os artigos 38-A e 38-B, para considerar que o tempo de serviço rural será comprovado por autodeclaração do segurado, ratificada por entidades ou órgãos públicos credenciados. Ausente a ratificação, a autodeclaração deverá estar acompanhada de documentos hábeis a constituir início de prova material.
Em face disso, a jurisprudência dessa Corte passou a entender que a autodeclaração prestada pelo segurado é suficiente para, em cotejo com a prova material, autorizar o reconhecimento do tempo agrícola pretendido, sendo devida a oitiva de testemunhas apenas em casos excepcionais: AC n. 5023671-56.2021.4.04.9999, Décima Turma, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, julgado em 07-06-2022; AC n. 5023852-57.2021.4.04.9999, Décima Turma, Rel. Des. Federal Marcio Antonio Rocha, julgado em 10-05-2022; AC n. 5003119-70.2021.4.04.9999, Nona Turma, Rel. Des. Federal Sebastião Ogê Muniz, julgado em 08-04-2022; AC n. 5001363-77.2019.4.04.7127, Sexta Turma, Rel. Des. Federal Taís Schilling Ferraz, julgado em 09-03-2022; e AG n. 5031738-34.2021.4.04.0000, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado em 22-09-2021.
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Do caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 22-10-2018 (ev. 1, RG4) e requereu o benefício na via administrativa em 24-10-2018 (ev. 52, INF4). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 meses anteriores a 2018.
Para a comprovação do efetivo trabalho agrícola, foram trazidos aos autos documentos, dentre os quais se destacam os abaixo arrolados em sentença:
Em relação ao início de prova material acerca do exercício de atividade rural, a parte apresentou os seguintes documentos (Ev. 1, COMP6):
a) Matrícula de Imóvel Rural, com averbação datada do ano de 2011 em nome da autora e de seu marido, onde consta a profissão dele como agricultor;
b) Declaração assinada por Ari Vieira de Macedo datada de 28/06/2004, afirmando que a autora residiu e trabalhou em sua propriedade na Fazenda Morro Grande no período de 1999 a 2004 exercendo atividade rural na condição de comodatária rural;
c) Contratos de Comodato de Imóvel Rural assinado por Juvelino Vieira de Macedo datados de 01/04/2004, 14/06/2004 e 28/08/2007, cedendo 2,0 ha do imóvel rural situado na Localidade Fazenda Morro Grande - Luizinho, pelos períodos de 01/04/2004 a 01/04/2009, 14/06/2004 a 14/06/2009 e 29/08/2007 a 29/08/2013;
c) Notas fiscais de produtor em nome da autora e de seu esposo, referentes a Fazenda Morro Grande e Fazenda São João do Pelotas dos anos de 2006, 2008, 2009, 2011, 2012, 2013, 2014, 2016, 2018 relativos à venda de pinhão, batata, maçã e bovino;
Na audiência de instrução realizada, foram ouvidas três testemunhas que afirmaram, de forma coerente e uníssona, que a autora é segurada especial, exercendo atividade em regime de economia familiar.
Inicialmente, cabe destacar que o fato de o marido da autora ter desempenhado atividades remuneradas na condição de empregado urbano não constitui óbice, por si só, ao enquadramento da autora como segurada especial. Nesse sentido já decidiu a Terceira Seção desta Corte nos Embargos Infringentes n. 2003.71.00.013565-8, publicados no D.E. de 30-01-2008, cujo Relator foi o Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, e Superior Tribunal de Justiça, no Resp 1.304.479-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, publicado no D.E. de 19-12-2012, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos.
Por oportuno, cabe destacar o teor dos enunciados sumulares 7 do STJ e 41 da TNU, respectivamente:
O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias.
A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto.
Alega o INSS que o marido da autora exerce atividade urbana, com salário superior ao mínimo, o que impediria a concessão de benefício rural à autora. No caso em tela, verifico que a prova material está em nome da parte autora (notas fiscais) e que a prova testemunhal corrobora, de maneira coerente e robusta, o alegado pela requerente, de modo que é de ser reconhecida a condição de segurada especial.
De acordo com documentação juntada, a renda mensal percebida pelo esposo na época do implemento etário era de R$ 1713,42 (ev. 29, PET2), o equivalente a menos de 2 salários mínimos. Tal valor não é o suficiente para descaracterizar a condição de segurada especial da autora diante da não comprovação da dispensabilidade do labor rural.
Assim, comprovado o labor rural em período superior a 180 contribuições anteriormente ao requerimento administrativo, a autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural desde DER (24-10-2018), mantida a sentença quanto ao mérito.
Correção monetária e juros
A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período compreendido entre 11-08-2006 e 08-12-2021, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp nº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Quanto aos juros de mora, entre 29-06-2009 e 08-12-2021, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, por força da Lei n. 11.960/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE n. 870.947 (Tema STF 810).
A partir de 09-12-2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, impõe-se a observância do art. 3º da Emenda Constitucional n. 113/2021, segundo o qual, "nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente".
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, tendo em conta os parâmetros dos §§ 2º, I a IV, e 3º, do artigo 85 do NCPC, bem como a probabilidade de o valor da condenação não ultrapassar o valor de 200 salários mínimos, mantenho os honorários advocatícios em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte), consoante as disposições do art. 85, § 3º, I, do NCPC, ficando ressalvado que, caso o montante da condenação venha a superar o limite mencionado, sobre o valor excedente deverão incidir os percentuais mínimos estipulados nos incisos II a V do § 3º do art. 85, de forma sucessiva, na forma do § 5º do mesmo artigo.
Doutra parte, considerando o disposto no § 11 do art. 85 do NCPC, bem assim recentes julgados do STF e do STJ acerca da matéria (v.g. ARE971774 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. Edson Fachin, Primeira Turma, DJe 19-10-2016; ARE 964330 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 25-10-2016; AgInt no AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp 1.357.561/MG, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 19-04-2017), majoro a verba honorária para 12%, devendo ser observada a mesma proporção de majoração sobre eventual valor que exceder o limite de 200 salários-mínimos.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS, modificando de ofício os consectários legais.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004354065v5 e do código CRC 0f437cd5.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5014309-93.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LAURA PEREIRA DE SOUZA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. CÔNJUGE SEGURADO URBANO. PROVA MATERIAL EM NOME PRÓPRIO.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.
2. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
3. Tendo a autora comprovado o exercício de atividade rural na qualidade de segurada especial durante o período de carência necessário, através de prova material em nome próprio, resta mantida a sentença que julgou procedente o feito.
4. Hipótese em que a parte autora preencheu os requisitos necessários à concessão da aposentadoria por idade rural, a contar do requerimento administrativo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, modificando de ofício os consectários legais. Advogada dispensou a sustentação oral tendo em vista o resultado favorável, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de abril de 2024.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004354066v3 e do código CRC 64ab53eb.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 18/4/2024, às 19:10:52
Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2024 04:02:16.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 05/03/2024 A 12/03/2024
Apelação Cível Nº 5014309-93.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LAURA PEREIRA DE SOUZA
ADVOGADO(A): CARMEM DE LIZ DA SILVA (OAB SC047699)
ADVOGADO(A): SALESIANO DURIGON (OAB SC027373)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 05/03/2024, às 00:00, a 12/03/2024, às 16:00, na sequência 322, disponibilizada no DE de 23/02/2024.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
RETIRADO DE PAUTA.
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2024 04:02:16.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 17/04/2024
Apelação Cível Nº 5014309-93.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR
SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: CARMEM DE LIZ DA SILVA por LAURA PEREIRA DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LAURA PEREIRA DE SOUZA
ADVOGADO(A): CARMEM DE LIZ DA SILVA (OAB SC047699)
ADVOGADO(A): SALESIANO DURIGON (OAB SC027373)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 17/04/2024, na sequência 11, disponibilizada no DE de 08/04/2024.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, MODIFICANDO DE OFÍCIO OS CONSECTÁRIOS LEGAIS. ADVOGADA DISPENSOU A SUSTENTAÇÃO ORAL TENDO EM VISTA O RESULTADO FAVORÁVEL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 91 (Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) - Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ.
Acompanho o voto do i. Relator no sentido de negar provimento à apelação do INSS, modificando de ofício os consectários legais.
Se todos estiverem de acordo, é possível DISPENSAR a sustentação oral.
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 93 (Des. Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ) - Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ.
Acompanho o(a) Relator(a)
Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2024 04:02:16.