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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. DESCARACTERIZAÇÃO PELO PERCEBIMENTO DE PROVENTOS. AUSÊNCIA DE REQUISITO DE INDI...

Data da publicação: 29/06/2020, 04:53:21

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. DESCARACTERIZAÇÃO PELO PERCEBIMENTO DE PROVENTOS. AUSÊNCIA DE REQUISITO DE INDISPENSABILIDADE DA RENDA AUFERIDA COM O LABOR RURAL. 1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual. 2. Para que o produtor rural em regime de economia familiar faça jus ao benefício de aposentadoria rural por idade, na forma do art. 143 da Lei n. 8.213/91, é necessário que a atividade agrícola seja indispensável à sua sobrevivência e a de seu grupo familiar. 3. Descaracterização da qualidade de segurado especial, porquanto o autor percebe proventos originários de aposentadoria estatutária. Reconhecimento de que as atividades agrícolas da parte autora não são indispensáveis ao sustento familiar. (TRF4, AC 0009028-57.2016.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 11/07/2017)


D.E.

Publicado em 12/07/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009028-57.2016.4.04.9999/RS
RELATORA
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
FRANCISCO PAULATA
ADVOGADO
:
Marcio Cesar Sbaraini e outros
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO
:
Procuradoria Regional da PFE-INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. DESCARACTERIZAÇÃO PELO PERCEBIMENTO DE PROVENTOS. AUSÊNCIA DE REQUISITO DE INDISPENSABILIDADE DA RENDA AUFERIDA COM O LABOR RURAL.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Para que o produtor rural em regime de economia familiar faça jus ao benefício de aposentadoria rural por idade, na forma do art. 143 da Lei n. 8.213/91, é necessário que a atividade agrícola seja indispensável à sua sobrevivência e a de seu grupo familiar.
3. Descaracterização da qualidade de segurado especial, porquanto o autor percebe proventos originários de aposentadoria estatutária. Reconhecimento de que as atividades agrícolas da parte autora não são indispensáveis ao sustento familiar.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 05 de julho de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9045742v12 e, se solicitado, do código CRC 44A80E72.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Salise Monteiro Sanchotene
Data e Hora: 06/07/2017 16:46




APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009028-57.2016.4.04.9999/RS
RELATORA
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
FRANCISCO PAULATA
ADVOGADO
:
Marcio Cesar Sbaraini e outros
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO
:
Procuradoria Regional da PFE-INSS
RELATÓRIO
Francisco Paulata interpôs apelação contra sentença (29-02-2016) que julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural, em razão da ausência de comprovação do exercício do trabalho rural em regime de economia familiar no período de carência, condenando-o ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), os quais restaram suspensos em razão do benefício da assistência judiciária gratuita.

O apelante sustenta, em síntese, que o exercício da atividade rural no período correspondente à carência resta demonstrado pelos documentos acostados aos autos, razão pela qual faz jus à concessão do benefício.

Não foram apresentadas as contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.

Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 25 de abril de 2014 (fl. 13) e requereu o benefício na via administrativa em 28 de abril de 2014 (fl. 11). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 (cento e oitenta) meses anteriores ao implemento de qualquer dos requisitos, mesmo que de forma descontínua.

Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam, conforme consta na sentença (fl.163/163v):

"[...]
a) Carteira de Trabalho e Previdência Social (fl. 14).
b) Certidão de óbito da sua esposa (fl. 15).
c) Cadastro Nacional de Informações Sociais do INSS em nome do autor (fls. 16-19).
d) Declaração de propriedade rural em nome do autor (fl. 21).
e) Carta de Anuência da Cooperativa de Crédito Rural com Internação Solidária Cresol em nome do autor (fl. 22).
f) Notas fiscais de produtor emitidas nos anos de 2010 a 2012 em nome do autor (fl. 24).
g) Notas fiscais de produtor rural e de comercialização de produtos agrícolas em nome do autor, datadas de 1994 a 2009 (fls. 25-52).
h) Certidão do Município de Humaitá que demonstra o exercício laboral do autor junto ao Município até a data da sua aposentadoria em 1998 (fl. 57).
i) Notas fiscais de produtor rural e de comercialização de produtos agrícolas em nome do autor, datadas de 1980 a 1988 (fls. 58-74) e 2012, 2007, 2000 a 2009 (fls. 84-120). [...]"

De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.

A controvérsia no caso em tela não diz respeito à comprovação do exercício de atividade rural da parte autora, mas à descaracterização ou não do regime de economia familiar.

Na justificação administrativa realizada em 29/07/2015, foram ouvidas três testemunhas (fls. 157/158), conforme consta na sentença (fl.163/164v):

"[...]
Ezequiel Cardoso Ribeiro: Disse que conhece o justificante desde que eram crianças, que moravam no mesmo Município. Diz que o justificante trabalhou para a prefeitura do Município de Humaitá, sendo motorista do transporte escolar desde aproximadamente 1990 até 1998, quando se aposentou, parando de trabalhar para a prefeitura após se aposentar. Declara que concomitantemente com a atividade da prefeitura o justificante exercia atividade de agricultor, continuando a exercer essa atividade após se aposentar até os dias de hoje. Declara que desde 1998 até hoje ele planta 8 hectares de terras localizadas em Linha Paulata, Humaitá, terras de seu pai Oscar Paulata, a qual planta em parceria. Que de 2002 até 2008 o justificante também plantava em parceria 2 hectares de terra localizados na linha Frizzo, Humaitá, terras de Celestino Rossato. Diz que o justificante planta, soja, milho, mandioca, verduras. (...) Diz que os produtos que não vendia eram para a sua subsistência. Diz que o justificante é viúvo, mas que está com uma companheira desde de aproximadamente 2005, a qual trabalha como merendeira em uma escola de Humaitá. Declara que o justificante desde 1998 até hoje mora na cidade de Humaitá, mas que ia trabalhar na agricultura quase todos os dias (...). Diz que além da agricultura, o justificante possui a renda da sua aposentadoria paga pela prefeitura de Humaitá e que recebe uma pensão. Que após parar de trabalhar na prefeitura, a única atividade exercida pelo justificante é a agricultura.

Isidoro Steiger: Disse que conhece o justificante desde de 1970, quando a testemunha foi trabalhar no Banrisul de Humaitá, tendo contato com o justificante desde aquela época até hoje. Diz que o justificante trabalhou para a Prefeitura do Município de Humaitá de motorista do transporte escolar, desde aproximadamente 1986 até 1998, quando se aposentou e parou de trabalhar para a prefeitura. Declara que concomitantemente com a atividade da prefeitura, o justificante exercia atividade de agricultor, pois tinha tempo para isso pelo fato do serviço como motorista do transporte escolar ocupar somente 3 a 4 horas diárias. Diz que continuou a exercer a atividade rural após se aposentar, trabalhando até os dias de hoje. Declara que desde 1998 até hoje ele planta 9 hectares de terra localizadas em Linha Oaulata, Humaitá, terras de seu pai Oscar Paulata, a qual planta em parceria. Declara que o justificante também plantou até 2014 em parceria 2 hectares de terra localizadas na Linha Frizzo, Humaitá, terras de Celestino Rossato. Diz que o justificante planta soja, milho, mandioca. (...) Que os produtos que não vendia eram para a subsistência. Diz que o justificante é viúvo, mas que está com uma companheira faz 10 anos aproximadamente, a qual trabalha em uma escola de Humaitá. Declara que o justificante mora na cidade de Humaitá, mas que ia trabalhar na agricultura quase todos os dias. (...) Diz que além da agricultura, o justificante possui renda da sua aposentadoria paga pela prefeitura de Humaitá e que recebe uma pensão. Que após parar de trabalhar na prefeitura, a única atividade exercida pelo justificante é a agricultura. (...).

Normo José Fritzen: conhece o justificante desde que eram crianças, que moravam na mesma localidade tendo contato com o justificante desde aquela época até hoje. Declara que o justificante sempre trabalhou na agricultura, sendo que em períodos também trabalhou na Prefeitura de Humaitá, sendo motorista do transporte escolar. Que trabalhou na prefeitura até 2005. Declara que o justificante se aposentou como servidor da prefeitura. Declara que no período em que trabalhou na prefeitura, concomitantemente também exercia a atividade de agricultor nos períodos de folga. Diz que continuou a exercer a atividade rural após se aposentar, trabalhando até os dias de hoje. Declara que desde 1998 até hoje ele planta 9 hectares de terra pertencentes ao seu pai localizadas em Linha Paulata, Humaitá, terra que planta em parceria. Declara que o justificante também plantou de 2005 até 2014 em parceria 2 hectares de terra localizados na Linha Frizzo, Humaitá, terra de Celestino Rossato. Diz que o justificante planta soja, milho, mandioca. (...) Diz que o justificante é viúvo, mas que está com uma companheira Marta Frizzo, que trabalha como doméstica. Declara que o justificante mora na cidade de Humaitá, mas que vai trabalhar na agricultura todos os dias, que é uma distância de 1Km. (...) Diz que além da agricultura, o justificante possui a renda de sua aposentadoria e que recebe uma pensão em razão do falecimento da esposa. Que após trabalhar na prefeitura, o justificante somente trabalhou na agricultura. [...]"

A prova testemunhal, portanto, é precisa e convincente da atividade rural da parte autora.

Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cuja pesquisa acompanha este voto, observa-se que o autor possui registro de vínculos empregatícios, em período curto dentro da carência. Em pesquisa ao sistema Plenus/INSS (pesquisa em anexo), o autor percebe, desde 07/04/1998, pensão por morte previdenciária (NB 1089059687; valor em maio de 2017: R$937,00) e, conforme documento de fl. 124, percebe aposentadoria pelo Regime Próprio da Previdência Social no valor de R$ 989,68 no exercício de 2014.

Os documentos aludidos indicam, em princípio, que o autor exerceu atividade rural durante o prazo de carência para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.

No entanto, para que tenha direito ao benefício conforme o art. 143 da Lei n. 8.213/91, é necessário que o autor possua a qualidade de segurado especial, cuja definição encontra-se no art. 11 da Lei de Benefícios, verbis:

Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: (...)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2o da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 1o Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008) (grifei)

É imperioso, portanto, para a caracterização da condição de segurado especial em regime de economia familiar, dentre outros requisitos, que a atividade rural seja indispensável à subsistência do autor e de sua família.

Sendo assim, essa situação não é evidenciada no caso em tela, pois o autor relata, em entrevista rural, que trabalhou na Prefeitura de Humaitá nos períodos de 1991 a 1997 e 2001 a 2004 e nos demais períodos alega ter trabalhado como segurado especial. Percebe-se que o autor exerceu atividade urbana em um período de três anos dentro da carência, o mesmo percebe proventos de aposentadoria pelo Regime Próprio da Previdência Social desde 2008, no valor de 989,68 em novembro de 2014, na condição de estatutário (fl. 124) e pensão por morte de segurado especial no valor de um salário mínimo (fl.139).

Nota-se que, o período urbano exercido pela parte autora caracterizaria pequena descontinuidade de condição de segurado especial, plenamente aceitável, sem prejuízo do reconhecimento da vocação às atividades rurais. O consequente percebimento de pensão por morte pela própria pessoa, que hoje requer o seu enquadramento como segurado especial, não afastaria sua qualificação como tal, porquanto tais rendimentos, não superam um salário mínimo para tornar dispensável o trabalho agrícola exercido (art. 11, § 9º, inciso I, da Lei 8213/91).

Contudo, o recebimento de renda proveniente de benefício previdenciário estatutário, com provas de que o valor recebido mostra-se suficiente para tornar dispensável o trabalho agrícola exercido pelo autor à subsistência do grupo familiar, não configura assim a qualidade de segurado especial. Isso porque a atividade rural deixa de ter o caráter de essencialidade para o sustento familiar, exigido para configurar o regime de economia familiar, e, se torna mero complemento à renda da família.

O Superior Tribunal de Justiça vem decidindo, a saber:

PROCESSO CIVIL. OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. INCOMPETÊNCIA DESTA CORTE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DAS SÚMULAS 282 E 356/STF. PREVIDENCIÁRIO. ACUMULAÇÃO DE APOSENTADORIAS ESTATUTÁRIA E RURAL. RECEBIMENTO DE PROVENTOS. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1. Mostra-se inviável a apreciação de ofensa a dispositivos constitucionais, uma vez que não cabe a esta Corte, em sede de recurso especial, o exame de matéria constitucional, cuja competência é reservada ao Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, inciso III, da Carta Magna. 2. As matérias referentes aos arts. 39, 48, §§ 1º e 2º, 124, inciso II, e 143, todos da Lei nº 8.213/91, não foram ventiladas no acórdão combatido e tampouco foram opostos embargos declaratórios para que o Tribunal a quo se pronunciasse sobre as omissões. Ausente, portanto, o indispensável prequestionamento. Aplicação, por analogia, das Súmulas 282 e 356/STF. 3. A discussão dos autos? acumulação de aposentadoria do Regime Próprio de Previdência dos Servidores Públicos e aposentadoria rural? foi pacificada pela Terceira Seção desta Corte de Justiça, no sentido de que o trabalho rural exercido em regime de economia familiar não se coaduna com a percepção de proventos decorrentes de aposentadoria estatutária ou de qualquer outra atividade remuneratória, porquanto este deve ser imprescindível à sobrevivência do segurado e de sua família. 4. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 242570/RS RECURSO ESPECIAL 1999/0115728-5, T6 - SEXTA TURMA, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA em 28/06/2007, DJ 06/08/2007 p. 703). (sem grifo)

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO DE ATO CONCESSÓRIO DE APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA. NÃO-OCORRÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. IMPOSSIBILIDADE DE SE CONCEDER EFEITO RETROATIVO. APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA. APOSENTADORIA POR IDADE PELO INSS. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. SEGURADO ESPECIAL. CONDIÇÃO INEXISTENTE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 4. Hipótese em que, embora provado o trabalho rural, a circunstância de ser o autor, ora recorrido, titular de aposentadoria estatutária afasta a indispensabilidade do labor rurícola para a sua subsistência, requisito sem o qual não há como reconhecer a condição de segurado especial. Por conseguinte, descaracterizada a relação de segurado especial, não há direito à aposentadoria obtida nessa condição. (REsp 521735/RS RECURSO ESPECIAL 2003/0062717-7, T5 - QUINTA TURMA, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA em 28/11/2006, DJ 18/12/2006 p. 463). (com grifo)

Diante disso, resta descaracterizada a condição de segurado especial do demandante, não sendo possível o reconhecimento da atividade agrícola no período pleiteado, devendo ser mantida a sentença de improcedência.

Assim, inexistindo direito ao benefício pretendido, mantém-se a sentença de improcedência e a condenação da parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, conforme nela fixados (que restam com a exigibilidade suspensa por tratar-se de beneficiário da assistência judiciária gratuita).

Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009028-57.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00032691220148210094
RELATOR
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
PRESIDENTE
:
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR
:
Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira
APELANTE
:
FRANCISCO PAULATA
ADVOGADO
:
Marcio Cesar Sbaraini e outros
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO
:
Procuradoria Regional da PFE-INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/07/2017, na seqüência 390, disponibilizada no DE de 19/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
VOTANTE(S)
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
:
Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
:
Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma


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