| D.E. Publicado em 21/03/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021234-74.2014.4.04.9999/SC
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | LOURDES FRANZEN TOBIAS |
ADVOGADO | : | Claudiomir Giaretton |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA OU PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POR MEMBRO DA FAMÍLIA. RENDIMENTOS ELEVADOS.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Não comprovado o exercício da atividade agrícola como segurado especial no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), não faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria por idade rural.
3. O desempenho de atividade urbana pelo cônjuge, e a percepção do benefício previdenciário decorrente, afasta o enquadramento da autora como segurada especial, por estar demonstrado que os rendimentos são suficientes para tornar dispensável o trabalho agrícola exercido pela esposa ou pelo núcleo familiar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações das partes, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 13 de fevereiro de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8830216v17 e, se solicitado, do código CRC E9EFFAF3. | |
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| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 09/03/2017 15:27 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021234-74.2014.4.04.9999/SC
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | LOURDES FRANZEN TOBIAS |
ADVOGADO | : | Claudiomir Giaretton |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
LOURDES FRANZEN TOBIAS ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural a contar do requerimento administrativo, formulado em 04/05/2011 (fl. 62).
Na sentença (12/06/2014) foi julgado parcialmente procedente o pedido, condenando-se o INSS a averbar os períodos de trabalho rural reconhecidos (04/05/1968 a 31/12/1971; 01/01/1980 a 21/03/1982).
O INSS apelou sustentando, em síntese, não estar comprovado o exercício de atividade rural em regime de economia familiar nos períodos reconhecidos, sendo insuficientes a prova documental e a prova testemunhal existentes nos autos.
A parte autora, por sua vez, apelou sustentando, em síntese, restar comprovado o trabalho rural no período não reconhecido na sentença (27/10/2005 a 03/04/2011). Requereu, ainda, "caso não seja reconhecido o tempo rural", a anulação da sentença.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 04 de maio de 2011 (fl. 15) e na mesma data requereu o benefício na via administrativa (fl. 62). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 (cento e oitenta) meses anteriores ao implemento dos requisitos, mesmo que de forma descontínua.
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam:
a) notas fiscais de venda de produção agrícola (milho, arroz, feijão) e suínos pelo pai da autora (Guilherme Franzen) nos períodos de 1971 a 1972 e 1975 a 1979 (fls. 20, 22, 25, 29-30 e 32-33);
b) notas fiscais de venda de produção agrícola (milho, feijão) por Valdomiro Tobias, no período de 2006 a 2011 (fls. 37-47) (o nome da autora consta nas notas das fls. 38 [2006], 40 [2007], 44 [2009] e 46 [2010]);
c) declaração de imposto de renda de Guilherme Franzen (qualificado como agricultor) nos exercícios 1974 e 1975 (fl. 21 e 23);
d) escritura de compra e venda, lavrada em 19/08/1975, de imóvel rural com área de 250.000 m2 (situada em Fazenda Ressaca, Linha Ressaca, no município de Ponte Serrada/SC), em que consta como adquirente Guilherme Franzen (fl. 27);
e) certidão do INCRA a respeito do imóvel dos pais da autora, em que constam as informações: anos 1978 a 1991: declarante: Guilherme Franzen; anos 2005 a 2010: declarante: Gema Mangoni Franzen; área: 3 hectares; assalariado: nenhum (fl. 31);
f) histórico escolar da autora (período de 1966 a 1969) em escola situada na localidade de Ressaca Alta, emitida pela Prefeitura Municipal de Ponte Serrada (fl. 34);
g) matrícula de imóvel rural (área de 56.409,12 m2 na Vila Pouso dos Tropeiros, em Ponte Serrada/SC) adquirido por Valdomiro Tobias (marido da autora) em 2005, em razão do falecimento de sua mãe, Tereza Barbosa Tobias (fl. 35);
h) ficha de inscrição da autora no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ponte Serrada/SC [não consta o ano da emissão] (f. 36).
Veio aos autos, também, declaração de exercício de atividade rural pela parte autora, nos períodos de 03/10/1968 a 06/08/1975, 07/08/1975 a 22/03/1982 e 27/10/2005 a 04/05/2011, emitida, em 04/05/2011, pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ponte Serrada/SC (fls. 17-18). Tal declaração, contudo, não consubstancia início de prova material, uma vez que representa mera manifestação unilateral, não sujeita ao crivo do contraditório.
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
A entrevista rural realizada pelo INSS para instrução do requerimento administrativo (fls. 52-53) registra: "período a ser comprovado: 1968 a 1982 e de 2005 a 2011"; "afirma que residia no meio rural desde a infância até o casamento na Localidade de Linha Ressaca Alta e que inicialmente eram arrendatários e depois foram adquiridas terras. Que ficou trabalhando com seus pais até aos 25 anos de idade quando casou. Que afirma que no ano de 2005 retornou para a atividade rural por conta própria na localidade de CTG Pouso dos Tropeiros, na cidade de Ponte Serrada"; "[sobre as pessoas que colaboram ou colaboraram no desempenho da atividade rural no período que se pretende comprovar] pai, mãe e irmãos e atualmente o marido da requerente"; "que na época em que trabalhava com os pais produziam: milho, feijão, arroz, mandioca, batata. Que depois de 2005 passou a produzir feijão e milho"; "[se possui outra fonte de renda ou outro membro do grupo familiar] marido aposentado e exerce atividade na Prefeitura"; "[outros esclarecimentos] que afirma que no período de 2005 em diante, produzem cerca de 15 sacas de milho por safra e 05 sacas de feijão por safra. E são vendidos uma parte somente. Vendem somente o que sobra. Que afirma que possui uma casa nesta propriedade e que não tem morador".
Na audiência de instrução, realizada em 11/04/2012, foram ouvidas duas testemunhas (fls. 162-163), as quais confirmaram o trabalho rural da parte autora, mencionando as propriedades em que desempenhou atividade agrícola e as culturas laboradas.
A testemunha Dalila Bazi declarou que já residia na localidade onde o grupo familiar dos pais da autora se instalou. Informou que os pais da autora trabalhavam na lavoura, plantando arroz, trigo e soja. Disse que a autora, como era costume, começou a trabalhar desde pequena, quando contava cerca de 12 anos de idade. Declarou que a autora trabalhou com os pais até casar, quando foi morar na Serra da Paca. Informou que na Serra da Paca a autora exercia atividade rural juntamente com o marido e o sogro. Disse que o marido, nos dias de folga do emprego - pois trabalhava no meio urbano -, ajudava na lavoura. Questionada se o salário do marido era suficiente para o sustento do casal, a testemunha respondeu negativamente. Informou, ainda, que a autora residiu e trabalhou na Serra da Paca cerca de 8 anos (até 1990 ou 1992, aproximadamente), após o que passou a residir na cidade [Ponte Serrada], mas permaneceu exercendo atividade rural, diariamente, na localidade de "CTG" [CTG Pouso dos Tropeiros, na cidade de Ponte Serrada, de acordo com as informações da entrevista rural].
A testemunha Avelino Candido Silva declarou que conheceu a autora "bem antes" de 1980. Disse que a autora trabalhava com os pais em atividade agrícola. Informou que a autora residiu e trabalhou na localidade de Ressaca Alta, com os pais, até os "vinte e poucos anos". Depois, aproximadamente até 1990, residiu na Serra da Paca, onde exerceu atividade rural. Declarou que a autora, desde, aproximadamente, 1990, mora em Ponte Serrada e trabalha na lavoura, na localidade de CTG.
O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural, em regime de economia familiar, no período reconhecido na sentença: 04/05/1968 a 21/03/1982.
Relativamente ao termo inicial deste período de atividade rural, importa referir que a idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Relator Ministro Gilson Dipp, terceira seção, julgado em 28/8/2002, DJ 23/9/2002). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho). Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC 2001.04.01.025230-0/RS, Relator Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12/3/2003; STF, AI 529694/RS, Relator Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU 11/3/2005).
Como termo final do período a sentença justificadamente estabeleceu 21/03/1982, dia imediatamente anterior àquele em que a autora, casada, passou a residir com seu cônjuge.
Para análise da alegada condição de segurada especial no período de trabalho rural iniciado em 2005, deve ser verificada a renda auferida pelo cônjuge da autora.
Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cuja pesquisa acompanha este voto, observa-se que a autora não possui registro de vínculos empregatícios.
Relativamente a seu cônjuge, Valdomiro Tobias, constam informações referentes a vínculos e contribuições nos períodos:
- Município de Ponte Serrada: data de início: 19/08/1977; última remuneração em 12/2003;
- Município de Ponte Serrada: 01/02/2004 a 31/10/2004; 02/05/2005 a 30/11/2005;
- Construtora Daniela Ltda ME: 01/06/2006 a 01/08/2006;
- Município de Ponte Serrada: 01/12/2006 a 31/08/2007; 05/02/2009 a 30/06/2009; 05/04/2010 a 11/11/2011.
Consta ainda a concessão, a Valdomiro Tobias, de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 1288476172) em 22/05/2003, com valor atual de R$1.973,55 (um mil, novecentos e setenta e três reais e cinquenta e cinco centavos) (conforme pesquisa no sistema Plenus/INSS, que acompanha este voto).
Tais informações foram bem examinadas na sentença, conforme trechos abaixo transcritos:
"Ocorre que, conforme extratos do CNIS de fls. 50/51, o marido da requente, Sr. Valdomiro Tobias, passou a exercer atividade urbana ainda no ano de 1977, atividade esta que desenvolveu em praticamente todo o período postulado (de 1977 a 2003, 2004 2005, 2006, 2007, 2009 e 2010 a 2011, na Prefeitura Municipal de Ponte Serrada e na Construtora Daniela Ltda)."
"No presente caso, entendo que a percepção de salário urbano pelo marido da autora, em valor que gira em torno de dois salários mínimos (fl. 50/51), mais os proventos de aposentadoria que o cônjuge percebe desde maio/2003, no valor de R$ 1.316,48 (um mil e trezentos e dezesseis reais e quarenta e oito centavos - fl. 48), descaracterizam o regime de economia familiar e a condição de segurada especial, pois indicam que o trabalho rural não constitui a principal fonte de renda do grupo familiar, se resumindo em atividade complementar, dispensável à subsistência da família."
Com efeito, verifica-se que o desempenho de atividade urbana por seu cônjuge, e a percepção do benefício previdenciário decorrente, afasta o enquadramento da autora como segurada especial, porquanto tais rendimentos mostram-se suficientes para tornar dispensável o trabalho agrícola exercido pela esposa ou pelo núcleo familiar.
Os rendimentos obtidos na agricultura, ainda que consideráveis, não eram indispensáveis à subsistência familiar, como exigido pelo art. 11, § 1º, da Lei nº 8.213, de 1991, restando, pois, descaracterizada a condição de segurada especial da autora.
A propósito, confira-se recente julgado da Terceira Seção desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. ELEVADOS RENDIMENTOS PERCEBIDOS PELO CÔNJUGE. 1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 2. Indicando o conjunto probatório a descaracterização do regime de economia familiar em que exercido o labor rural da requerente, por remuneração incompatível com a condição de segurado especial, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, não é devida a concessão da aposentadoria por idade rural. (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018188-14.2013.404.9999, 3ª SEÇÃO, Des. Federal CELSO KIPPER, POR MAIORIA, D.E. 17/03/2015, PUBLICAÇÃO EM 18/03/2015)
Desse modo, nas hipóteses como a dos autos, em que demonstrado que o trabalho agrícola não constitui fonte de renda imprescindível à subsistência da família, mas se resume à atividade complementar, resta afastada a condição de segurada especial, sendo inviável tanto a outorga de aposentadoria por idade rural como a averbação do período para qualquer fim.
Veja-se, por exemplo, que, se interpretado isoladamente o disposto no parágrafo 9º do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91, poder-se-ia concluir ser possível a concessão de aposentadoria por idade rural à segurada cujo cônjuge perceba renda de elevada monta, o que iria de encontro à própria definição jurídica do segurado especial, em que a subsistência depende da própria força de trabalho.
Tendo em vista os termos do recurso da parte autora, ressalta-se que, diversamente do alegado à fl. 188, não há comprovação de que o cultivo da terra constitua o "principal sustento da família". Neste sentido aponta a análise dos rendimentos do cônjuge e, ainda, a prova oral, visto que uma das testemunhas informou que o marido, nos dias de folga do emprego na cidade, ajudava a autora na lavoura.
Por fim, constou no recurso de apelação da parte autora: "caso não seja reconhecido o tempo rural, requer seja anulada a sentença e julgado sem resolução de mérito, a fim de oportunizar a autora buscar novos elementos de prova para comprovação do período rural" (fl. 189).
Tal pedido não pode ser acolhido, por falta de qualquer fundamento legal. Outrossim, não verificou-se cerceamento da produção probatória, e, conforme exposto, a condição de segurada especial restou descaracterizada em razão da demonstração de que o trabalho rural não constitui fonte de renda imprescindível à subsistência do grupo familiar.
Com essas considerações, entendo que deve prevalecer a sentença, a qual, reconhecendo inexistir direito ao benefício pretendido, julgou parcialmente procedente o pedido.
Considerando que o INSS, no processo administrativo, reconheceu o período de 01/01/1972 a 31/12/1979 (fls. 54-55), deverão ser averbados em favor da parte autora, conforme determinou a sentença, os períodos de 04/05/1968 a 31/12/1971 e 01/01/1980 a 21/03/1982.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações das partes.
Os períodos de trabalho rural, sendo insuficientes para a concessão do benefício postulado, deverão ser averbados pelo INSS.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 08/03/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021234-74.2014.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 00008974620118240051
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Fábio Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | LOURDES FRANZEN TOBIAS |
ADVOGADO | : | Claudiomir Giaretton |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 08/03/2017, na seqüência 115, disponibilizada no DE de 20/02/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DAS PARTES.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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