| D.E. Publicado em 30/05/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024555-20.2014.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | JOÃO CORREA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Geremias Bueno do Rosario |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. EXTENSÃO DAS PROPRIEDADES. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. LEI Nº 1.060/50. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. PRESUNÇÃO LEGAL EM FAVOR DO REQUERENTE.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Não comprovado o exercício da atividade agrícola como segurado especial no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), não faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria por idade rural.
3. A extensão das propriedades rurais, conforme analisado, constitui óbice ao reconhecimento da condição de segurado especial.
4. A presunção legal é estabelecida em favor da pessoa que faz expressamente a declaração, nos termos do art. 4º da Lei n. 1060 (mediante simples afirmação).
5. Incumbe à parte contrária, por meio de impugnação, a prova de que o autor não se encontra na condição assegurada na lei.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor apenas para manter a concessão do benefício da gratuidade de justiça, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 17 de maio de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8904373v12 e, se solicitado, do código CRC 58A9C220. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 24/05/2017 14:12 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024555-20.2014.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | JOÃO CORREA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Geremias Bueno do Rosario |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
JOÃO CORREA DE LIMA ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural a contar do requerimento administrativo, formulado em 03/05/2010 (fl. 08).
Na sentença (29/11/2013) foi julgado improcedente o pedido. Foi revogado o benefício da gratuidade da justiça, e a parte autora foi condenada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$678,00 (seiscentos e setenta e oito reais).
A parte autora apelou sustentando, em síntese, estar comprovado o exercício de atividade rural, na condição de segurado especial, no período de carência exigido em lei, sendo suficientes a prova documental e a prova testemunhal. Alegou, ainda, que necessita do benefício da gratuidade de justiça. Por fim, requereu, com a reforma da sentença, a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 22 de abril de 2010 (fl. 07) e requereu o benefício na via administrativa em 03 de maio de 2010 (fl. 08). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 174 (cento e setenta e quatro) meses anteriores ao implemento de qualquer dos requisitos, mesmo que de forma descontínua.
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam:
a) notas fiscais, em seu nome, de venda de produção agrícola, bovinos e suínos, referentes ao período de 1989 a 2011 (fls. 09-39-v. e 43-45-v.);
b) notas fiscais, em nome de Daniel Bogo de Lima, de venda de produção agrícola, referentes ao período de 2000 a 2001 (fls. 40-42-v.);
c) certidão de seu casamento, em 18/01/1975, com Marli Bogo, na qual é qualificado como agricultor (fl. 70);
d) declaração de propriedade de imóvel rural (área de 68 hectares) firmada pelo autor (fl. 70-v.).
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
A entrevista rural, realizada pelo INSS para instrução do requerimento administrativo (fl. 86), registra que: [atividade e período] "1989 a 2010, trabalhador rural em regime de economia familiar na localidade de Macieira, interior de Nova Ramada/RS"; "teve atividade de motorista de caminhão, iniciada em 1973 quando adquiriu caminhão, até meados de 1978. Depois utilizou caminhão somente para lavoura própria"; [sobre a propriedade das terras] "terras próprias, possui cerca de 60 hectares de terra. Terra mista. Tem trator, implementos, colheitadeira. Teve empregados até meados de 1997, tinha registrado os empregados em livro de empregados, descontava o INSS dos funcionários, todos devidamente registrados. Depois disso os filhos passaram a ajudar na lavoura, são 3 filhos, pelo que dispensou os empregados. Preparo da terra com maquinário próprio, colheita com maquinário próprio. Declara que nunca arrendou terra para outrem. Maquinário conduzido pelo requerente e pelos filhos. Ordenha com ordenhadeira, mas o trabalho de ordenha é feito pelo filho. A esposa também ajuda nas atividades rurais"; "Não possui outra fonte de renda. Não tem imóvel urbano. A esposa é também somente agricultora"; "Há cerca de 9 anos atrás vendeu uma fazenda de 200 hectares que possuía em Tupanciretã e adquiriu cerca de 1.700 hectares no Estado do Maranhão. A fazenda em Tupanciretã possuiu por cerca de 12 anos. Não tinha moradia, as terras eram plantadas pelo requerente. No Maranhão não tinha ninguém trabalhando na terra, comprou mas não conseguiu trabalhar, sr. Raimundo Gaspar, acabou vendendo a terra para um lindeiro, em 2009".
Na audiência de instrução, realizada em 19/11/2013, foram ouvidas três testemunhas (fls. 109-110).
A testemunha Nelio Serbi declarou conhecer o autor há cerca de 40 anos. Disse que o autor sempre foi agricultor. Declarou que conhece a propriedade rural do autor, e confirmou que a área corresponde a 200 hectares. Afirmou que parte da área pertence aos filhos (os quais residem na área, são casados e têm casas separadas). Informou que o autor e seus filhos cultivam as terras. Disse que 70% da área é cultivada. Questionado, disse que a área cultivada exclusivamente pelo autor corresponde a 50 hectares. Declarou que o autor teve empregados, mas não nos últimos 15 anos. Afirmou que os filhos do autor também não contam com empregados. Declarou que o autor e os filhos dispõem de 1 ou 2 máquinas.
A testemunha Osvaldo Tamiozo declarou conhecer o autor desde criança. Questionado, respondeu que o autor não foi caminhoneiro, teve apenas caminhão para uso próprio na lavoura. Disse que o autor tem 2 filhos (que trabalham juntamente com ele) e uma filha. Informou que o autor cultiva em torno de 50 ou 60 hectares, e que no resto da área trabalham os filhos. Declarou que, quando os filhos eram mais novos, o autor contava com empregados. Disse que 70% da área da propriedade é cultivável. Questionado, afirmou, sobre a existência de maquinário agrícola, que os filhos do autor são proprietários das máquinas.
A testemunha Adjalmo Gaspar afirmou conhecer o autor há cerca de 30 anos. Disse serem vizinhos. Afirmou que o autor não teve atividade diversa da agrícola. Informou que o autor usa seu caminhão no serviço da lavoura. Questionado, respondeu que, dos 200 hectares, 160 ou 170 hectares são cultiváveis. Declarou que o autor cultiva 50 ou 60 hectares, e o restante é cultivado pelos filhos. Afirmou que o autor dispõe de uma colheitadeira, e que seus filhos têm maquinário para cultivo da terra. Declarou que o autor não conta com empregados.
Passo à análise das provas.
Conforme observado na sentença, o autor "ostenta condição de médio a grande produtor rural" (fl. 119).
De acordo com as alegações e os documentos apresentados pelo INSS, o autor é proprietário de extensas áreas rurais.
Com efeito, na entrevista rural, declarou exercer atividade agrícola em propriedade situada na localidade de Macieira, interior de Nova Ramada/RS. Os dados apresentados pelo INSS demonstram que esta propriedade abrange área de cerca de 200 hectares (fls. 90-v.-92-v.), informação corroborada pelas testemunhas. Ressalto, tendo em vista a alegação de que "são apenas 60 hectares que são cultivados, sendo que essas são repartidas com os dois filhos e suas famílias" (fl. 129), que as testemunhas inquiridas declararam que uma área de 50 ou 60 hectares é cultivada exclusivamente pelo autor, e que a área total cultivável equivale a 140 a 170 hectares do total de 200 hectares.
Além desta propriedade, o autor declarou, na entrevista rural, que "há cerca de 9 anos atrás vendeu uma fazenda de 200 hectares que possuía em Tupanciretã". Consta ainda que "a fazenda em Tupanciretã possuiu por cerca de 12 anos. Não tinha moradia, as terras eram plantadas pelo requerente".
Sendo assim, percebe-se que o autor explorava, além da propriedade localizada em Nova Ramada/RS, uma área de 200 hectares em Tupanciretã/RS (vendida em 2001, aproximadamente).
Após a venda da fazenda em Tupanciretã, o autor adquiriu "cerca de 1.700 hectares no Estado do Maranhão". No processo administrativo constam informações precisas sobre esta propriedade rural (fls. 89-v.-90).
Conforme observado na sentença, "sequer houve impugnação pelo autor no tocante à alegação da autarquia com relação às terras de sua propriedade no Estado do Maranhão" (fl. 119). A este respeito, apenas em recurso de apelação houve manifestação: "urge esclarecer a situação da propriedade de 1.724 hectares de terras no Estado do Maranhão, que na verdade, não pertencem ao Apelante. O registro do CAFIR de fl. 90 registra apenas a situação documental daquela propriedade (terras desérticas e não cultivadas) que envolve negócios imobiliários de seu filho Daniel Bogo de Lima que transferiu (ainda em tramitação) a propriedade para Raimundo Nonato Pinheiro Gaspar, conforme procuração pública e substabelecimento em anexo" (fl. 125). Verifica-se, contudo, que não há comprovação de que se trate de "terras desérticas e não cultivadas". Também não há comprovação de que o autor não seja proprietário da área de 1.724 hectares no Maranhão. A procuração da fl. 133 demonstra apenas que o autor e sua esposa outorgaram poderes a Daniel Bogo de Lima para que os represente em contrato de alienação de direitos sobre: área de 1.724 hectares no município de Turilândia, no Maranhão; área de 420 hectares ("referente aos direitos de posse") em Bacabeira, município de Turilândia, no Maranhão. A procuração da fl. 134, por sua vez, demonstra que Daniel Bogo de Lima substabeleceu a Raimundo Nonato Pinheiro Gaspar os poderes outorgados na procuração antes mencionada. Vale ressaltar, ainda, que a procuração da fl. 133 e o substabelecimento da fl. 134 registram que Daniel Bogo de Lima é residente e domiciliado na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, na cidade de Guiratinga/MT, não havendo esclarecimento quanto ao momento em que deixou de residir na propriedade rural do autor em Nova Ramada/RS.
Por fim, vale salientar que as testemunhas inquiridas na audiência judicial prestaram informações apenas sobre o trabalho do autor na propriedade localizada em Nova Ramada/RS, nada esclarecendo, por desconhecimento ou omissão, sobre a exploração das demais propriedades rurais.
Diante do exposto, o conjunto probatório demonstra que, considerando a extensão das propriedades rurais antes referidas, o autor não pode ser caracterizado como segurado especial em regime de economia familiar.
Assim, inexistindo direito ao benefício pretendido, mantém-se a sentença de improcedência e a condenação da parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios.
Gratuidade da justiça
A concessão do benefício da gratuidade da justiça foi revogada na sentença, sendo levado em consideração que "o autor ostenta situação financeira incompatível com o benefício da AJG " (fl. 119-v.).
Contudo, verifica-se que há nos autos declaração de hipossuficiência econômica (fl. 46), não havendo demonstração da existência de renda mensal que permita ao autor arcar com as custas do processo sem prejudicar seu sustento e de sua família. Da mesma forma, não houve alegação ou apresentação de documentos, a este respeito, pela parte contrária.
Oportuno ressaltar, com relação aos parâmetros a serem observados quando da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, que a Corte Especial deste Tribunal uniformizou entendimento nos seguintes termos:
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. LEI 1.060/50. ART. 4ª. ESTADO DE MISERABILIDADE. PRESUNÇÃO PELA SIMPLES AFIRMAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. PARTE CONTRÁRIA.
1. Para a concessão da assistência judiciária gratuita basta que a parte declare não possuir condições de arcar com as despesas do processo sem prejuízo do próprio sustento ou de sua família, cabendo à parte contrária o ônus de elidir a presunção de veracidade daí surgida - art. 4º da Lei nº 1060/50.
2. Descabem critérios outros (como isenção do imposto de renda ou renda líquida inferior a 10 salários mínimos) para infirmar presunção legal de pobreza, em desfavor do cidadão.
3. Uniformizada a jurisprudência com o reconhecimento de que, para fins de assistência judiciária Gratuita, inexistem critérios de presunção de pobreza diversos daquela constante do art. 4º da Lei nº 1060/50. (TRF4, Incidente de Uniformização de Jurisprudência na Apelação Cível nº 5008804-40.2012.404.7100, Corte Especial, Relator Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Relator para Acórdão Desembargador Federal Néfi Cordeiro, por maioria, julgado em 22-11-2012)
Diante do exposto, deve ser mantida a concessão, ao autor, do benefício da gratuidade de justiça.
Honorários advocatícios e custas processuais
Resta suspensa a exigibilidade do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, nos termos do artigo 12 da Lei n. 1.060/50.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do autor apenas para manter a concessão do benefício da gratuidade de justiça.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8904372v18 e, se solicitado, do código CRC 75E77223. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 20/04/2017 15:44 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024555-20.2014.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | JOÃO CORREA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Geremias Bueno do Rosario |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
VOTO-VISTA
Pedi vista para melhor analisar a controvérsia e convencido do acerto do voto da eminente Relatora, decido acompanhá-la.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do autor apenas para manter a concessão do benefício da gratuidade de justiça.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, , na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8961795v2 e, se solicitado, do código CRC EDE5AF4D. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 18/05/2017 12:00 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/04/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024555-20.2014.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00004793620128210123
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | JOÃO CORREA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Geremias Bueno do Rosario |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/04/2017, na seqüência 580, disponibilizada no DE de 03/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DA DES. FEDERAL SALISE MONTEIRO SANCHOTENE NO SENTIDO DE DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR APENAS PARA MANTER A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA, PEDIU VISTA O DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA. AGUARDA A DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA.
PEDIDO DE VISTA | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8951802v1 e, se solicitado, do código CRC 13A2191A. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 24/04/2017 14:39 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024555-20.2014.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00004793620128210123
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | JOÃO CORREA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Geremias Bueno do Rosario |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA APRESENTADO PELO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, ACOMPANHANDO A RELATORA, E DO VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA, NO MESMO SENTIDO, A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR APENAS PARA MANTER A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTO VISTA | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9002100v1 e, se solicitado, do código CRC C40972AD. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 19/05/2017 16:45 |
