D.E. Publicado em 30/05/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016375-78.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | DARCI DUARTE FARIA |
ADVOGADO | : | Lamir Jose Reistacke |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. DESCONTINUIDADE. VOCAÇÃO RURAL. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
3. Havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, poderá ser admitida a descontinuidade. Deve ser observado todo o período contributivo do segurado, de modo a qualificá-lo efetivamente como trabalhador rural e não urbano, vocacionado às lides agrícolas, justificando, dessa maneira, a redução do requisito etário.
4. O termo inicial da aposentação há de ser a data do requerimento administrativo, por expressa dicção legal (art. 49, inc. II, da Lei n. 8.213/91) e em atenção ao direito adquirido (art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição Federal), pouco importando que a prova do trabalho rural tenha sido completada em juízo.
5. A implantação de benefício previdenciário, à conta de tutela específica, deve acontecer no prazo máximo de 45 dias.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão, restando prejudicado o requerimento de concessão da tutela de urgência, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 17 de maio de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8960981v12 e, se solicitado, do código CRC A6AE1CC0. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
Data e Hora: | 18/05/2017 14:01 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016375-78.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | DARCI DUARTE FARIA |
ADVOGADO | : | Lamir Jose Reistacke |
RELATÓRIO
DARCI DUARTE FARIA ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural a contar do requerimento administrativo, formulado em 27/09/2012 (fl. 13).
Na sentença (09/02/2015) foi julgado procedente o pedido, condenando-se o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural a partir de 27/09/2012. A Autarquia foi condenada, ainda, ao pagamento das despesas processuais ("observada a isenção da taxa judiciária") e dos honorários advocatícios fixados em 10% das parcelas vencidas até a data da sentença.
A sentença foi submetida ao reexame necessário.
O INSS apelou sustentando, em síntese, não estar comprovado o exercício de atividade rural no decorrer do período de carência exigido em lei, sendo insuficientes as provas existentes nos autos. Alegou, ainda, que, considerando as provas produzidas para instrução do processo administrativo, a condenação, se mantida, não poderia retroagir à data de requerimento do benefício. Requereu, por fim, a isenção do pagamento das custas processuais.
Foram apresentadas contrarrazões.
De acordo com a decisão da fl. 153, foi solicitada ao MM. Juiz, considerando a falha da mídia que acompanhou os autos, a transcrição dos depoimentos prestados em audiência ou o envio de nova cópia dos arquivos digitais.
Atendida a solicitação, e com as petições de prioridade e antecipação dos efeitos da tutela apresentadas pela parte autora (fls. 160-162 e 165), os autos vieram para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa Oficial
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido, as sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou assegurassem ao autor direito equivalente ao valor de sessenta salários mínimos ou mais.
A superveniência dos novos parâmetros (NCPC, art. 496, § 3º), aumentando o limite para reexame obrigatório da sentença, traz a indagação quanto à lei aplicável às sentenças publicadas anteriormente e ainda não reexaminadas. Uma das interpretações possíveis seria a de que, em tendo havido fato superveniente à remessa - novo CPC - a suprimir o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos, não seria caso de se julgar a remessa. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o seu conhecimento.
No entanto, em precedente repetido em julgamentos sucessivos, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, o conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observará os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.
Registre-se que no caso dos autos não se pode invocar o preceito da Súmula 490 do STJ, segundo a qual a dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
No caso concreto, o valor do proveito econômico outorgado em sentença à parte autora da demanda é mensurável por simples cálculo aritmético.
Desse modo, para aferir a aplicabilidade ou não do disposto no § 2º do art. 475 do CPC/73 em comento, é irrelevante o valor que tenha sido atribuído pela parte sua peça inicial, servindo como parâmetro o valor econômico expresso na sentença condenatória que julga a causa.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO. INTELIGÊNCIA DO § 2º DO ART. 475 DO CPC, COM A REDAÇÃO DA LEI 10.352/01. 1. Nos termos do art. 475, § 2º, do CPC, a sentença não está sujeita a reexame necessário quando "a condenação, ou o direito o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos". Considera-se "valor certo", para esse efeito, o que decorre de uma sentença líquida, tal como prevê o art. 459 e seu parágrafo, combinado com o art. 286 do CPC. 2. Os pressupostos normativos para a dispensa do reexame têm natureza estritamente econômica e são aferidos, não pelos elementos da demanda (petição inicial ou valor da causa), e sim pelos que decorrem da sentença que a julga. (...) 5. Embargos de divergência providos. (EREsp 600.596/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2009, DJe 23/11/2009)
A sentença de 09 de fevereiro de 2015 condenou o INSS ao pagamento de aposentadoria no valor de um salário mínimo desde a data de 27 de setembro de 2012, quando manejado o requerimento administrativo (DER). De acordo com a Planilha de Cálculos da Justiça Federal (Programa JUSPREV II - cálculo que acompanha este voto), de 27 de setembro de 2012 a 09 de fevereiro de 2015, a Autarquia Previdenciária não pagou à parte autora o valor de R$22.798,71 (vinte e dois mil, setecentos e noventa e oito reais e setenta e um centavos), atualizados monetariamente, quantia equivalente a 28,9 (vinte e oito vírgula nove) salários mínimos em 2015, resultando, portanto, na condenação em montante manifestamente inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos.
Trata-se, como visto, de valor facilmente estimável, o que atribui liquidez ao julgado.
Cabe salientar que se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pública em valor não excedente a sessenta salários mínimos, impõe-se aferir o montante da condenação na data em que proferida. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido.
Não por outra razão é que se toma o valor das parcelas vencidas até a data da decisão de procedência, para fins de aferição do montante da condenação sobre o qual incidirão os honorários advocatícios, nos termos da Súmula 111 do STJ. Não se aplicam à hipótese, as regras de estimativa do valor da causa. Trata-se, no momento, de condenação.
A propósito, vale colacionar as palavras do Ministro Humberto Martins no Resp 1577902 (decisão de 16-02-2016) que bem espelha a hipótese dos autos:
(...) aplica-se o entendimento de que "É líquida a sentença que contém em si todos os elementos que permitem definir a quantidade de bens a serem prestados, dependendo apenas de cálculos aritméticos apurados mediante critérios constantes do próprio título ou de fontes oficiais públicas e objetivamente conhecidas." (REsp 937.082/MG, Rei. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONA QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 13/10/2008).
(...) Dessa forma, tratando-se de titulo judicial líquido, cujo valor da condenação não supera 60 (sessenta) salários mínimos, a aplicação do disposto no art. 475, §2º, do CPC é medida que se impõe.
Ademais, apesar de o discurso da autarquia previdenciária normalmente girar em torno do argumento de que defende o interesse público, fato é que sua atuação é restrita à defesa do próprio INSS, e não do interesse público ou da sociedade." (...) (grifei)
Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor inferior a sessenta salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.
Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em vinte e seis de julho de 2009 (fl. 09) e requereu o benefício na via administrativa em 27/09/2012 (fl. 13). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 168 meses (cento e sessenta e oito) meses anteriores ao implemento do requisito etário, ou nos 180 (cento e oitenta) meses que antecedem o requerimento administrativo, ou ainda nos períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam, conforme relatado na sentença:
"a) o pedido de aposentação, protocolado em 27/9/2012 (fl. 13); b) a CTPS, que comprova que à época do pedido o(a) autor(a) não estava formalmente empregado(a), já que demitido(a) da Agrospe Agro Indl. São Pedro Vacaria em 15/2/2008 (fls. 53v.-57); c) ficha da Secretaria Estadual de Agricultura, atestando ser o autor proprietário de 2 vacas em 2012.
Junta-se a este contexto: d) as declarações dos testigos, que informam que o(a) autor(a) ainda produz e comercializa queijos na cidade, sem notícia do auxílio de empregado, ainda que eventual; e) ausência de comprovação nos sistemas do INSS de que o(a) autor(a) tenha recolhido contribuição previdenciária de terceiro empregado rural; f) a inspeção judicial, na qual foi verificada a produção rudimentar de queijo no imóvel residencial do autor.
Já quanto exercício da atividade rural por 15 anos a partir de 24/7/1991, a prova material está constituída na:
1 - certidão de casamento, lavrada de 5/1/1975, que qualifica o(a) autor(a) como "agricultor", bem como seu cônjuge como "das lides domésticas" (fl. 11);
2 - certidão de nascimento de Rodrigo da Silva Faria, lavrada em 18/6/1993 (fl. 71), que qualifica o(a) autor(a) como "agricultor";
3 - CTPS, que registra o emprego nos períodos de: 2.1 - 1°/3 a 20/5/1999 (1 mês e 20 dias) com Artur Michelon; 2.2 - 2/2 a 13/7/2004 (5 meses e 11 dias) com Agropecuária Schio Ltda.; 2.3 - 1°/3 a 31/3/2006 (1 mês) com Artur Michelon; 2.4 - 21/1 a 15/2/2008 (25 dias) com Agrospe Agro Indl. São Pedro Vacaria.
[...]
5 - certidão da 63ª Zona Eleitoral demonstra que o(a) autor(a) está domiciliado(a) em Bom Jesus desde 18/9/1986 (fl. 21);
6 - certidões de nascimentos dos filhos do autor (Luciane da Silva Faria, nascida em 15/8/1977 - fl. 69v.; Luciano da Silva Faria nascida em 14/11/1975 - fl. 70v.; Deise da Silva de Faria, nascida em 6/1/1990 - fl. 70v.; Rodrigo da Silva Faria, nascido em 29/4/1992 - fl. 71), bem como a retromencionada certidão de casamento, indicam que o autor vivia em Bom Jesus, mesma localidade onde estão lotados seus animais, conforme certidão da Secretaria de Estado da Agricultura (fl. 71v.).
7 - ocorrência policial n° 574, lavrada em 11/08/2006, que comunica que quatro bovinos do autor estavam pastando pelas ruas da cidade, criando risco de acidentes de trânsito (fls. 118-119);
8 - ocorrência policial n° 1266, lavrada em 22/12/2008, comunicando que o autor foi caluniado por abigeato de um cavalo, onde há referência de que cuidava de animais na mangueira (fl. 120);
9 - ocorrência policial n° 1628, lavrada em 11/12/2009, informando que o autor colocou duas vacas e um terneiro na propriedade de vizinho para pastar sem autorização (fls. 121-122)".
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
Veio aos autos, também, declaração de exercício de atividade rural pela parte autora, no período de 1992 a 2012, emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bom Jesus (fl. 68). Tal declaração, contudo, não consubstancia início de prova material, uma vez que representa mera manifestação unilateral, não sujeita ao crivo do contraditório.
Na audiência de instrução, realizada em 17/09/2014, foi colhido o depoimento pessoal e foram ouvidas duas testemunhas (fls. 107-108), as quais confirmaram o trabalho rural da parte autora no período correspondente à carência.
A sentença sintetizou de forma clara o depoimento pessoal do autor e a inquirição das testemunhas:
"A um, o(a) autor(a), durante a entrevista administrativa, embora admita "que teve alguns períodos que se afastou da atividade rural para trabalhar em empresas urbanas" e que "às vezes, quando sobre serviço trabalha nos pomares como biscate, sem carteira assinada", esclareceu que "desde criança, nasceu e se criou na roça, trabalhando em regime de economia familiar", bem como que celebrou "contrato de boca" de arrendamento com o Sr. Vilson Ramos Barcelos, não formalizado em razão do vínculo de amizade. Disse, ainda, que "paga o arrendamento ajudando o proprietário nas lidas do gado" (fls. 15-16);
A dois, Itevaldo Itor da Rosa referiu:
"Parte autora: de onde que o senhor conheceu o Darci? Testemunha: no Caraúna. Parte autora: e o quê que é esse Caraúna aí, tu podia explicar pra nós? Testemunha: é um Distrito. Primeiro Distrito de Bom Jesus. Parte autora: e quando o senhor conheceu ele lá... quanto tempo atrás, mais ou menos? Testemunha: é uns cinquenta anos que eu... Parte autora: e o quê que ele fazia? Testemunha: ah, eles trabalhavam na... na agricul... naquele tempo era roça, agricultura, assim... Parte autora: quando o senhor fala 'eles', 'eles' é quem? Testemunha: os irmão dele, o pai dele... Parte autora: o senhor tinha conhecimento se eles tinham propriedade lá? Testemunha: tinham. As propriedade assim... naquele tempo era... como se diz... era agregado assim. Eles davam pra eles plantarem. Parte autora: o quê que eles plantavam na época? Testemunha: plantavam feijão, milho, abóbora, moranga, essas coisas assim da agricultura. Parte autora: tem conhecimento se eles tinham empregados? Testemunha: não. Empregado não tinham. Parte autora: tem conhecimento se ele trabalhou de empregado naquela época? Testemunha: não, também não. (...) Parte ré: à época em que o senhor conheceu ele, há cinquenta anos atrás, o senhor... qual era a atividade que ele exercia? Testemunha: era na agricultura. Pelo Juiz: já foi respondido doutora. Parte ré: com quem que ele fazia isso? Testemunha: com os pais dele. Parte ré: e eles contavam com a ajuda de empregados? Testemunha: não, era só os familiares mesmo trabalhando. Parte ré: tá. Sem mais, Excelência."
A três, Antônio Policastro da Silva acrescentou:
"Parte autora: seu Antônio, o senhor conhece o Darci de onde? Testemunha: eu conheci no Caraúna. É uma família muito grande, viviam na roça. Depois eu vim embora antes, pra fora e mais tarde eles saíram de lá também. Parte autora: que época foi isso, que o senhor conheceu eles? Testemunha: ah, pois isso aí eu acho que foi... faz mais de cinquenta anos. Eles era gurizada. Uns mais velhos, outros mais novo do que ele. Parte autora: o quê que eles faziam lá? Testemunha: plantavam milho, feijão... é o que dava lá. Era feito à mão, carpido, roçado, não tinha máquina. Parte autora: na época... na época lá o senhor tinha conhecimento se eles trabalhavam pra eles, eram empregados? O quê que eles... Testemunha: não, eles trabalhavam pra eles. Plantavam pro consumo da família, né. Parte autora: nada mais Excelência. Pelo Juiz: réu? Parte ré: nada Excelência. Pelo Juiz: há quanto tempo eles saíram de lá do Caraúna? Mais de 40 anos ou não? Testemunha: doutor, pra dizer ao certo... eu não posso lhe mentir, eu não tenho assim... mas acho que é... eu acho que é mais ou menos, mais de 35, 40 anos. Agora isso aí eu não... Pelo Juiz: ele veio morar na cidade? Testemunha: veio. Depois eu vi ele aqui na cidade, então ele... Pelo Juiz: e aqui na cidade ele trabalhava com o quê? Testemunha: eu vejo ele lidando com umas vaquinhas tirando leite. Pelo Juiz: lidando com umas vacas. O senhor já viu ele... o senhor já viu ele lidando com as vacas? Testemunha: sim. Pelo Juiz: quantas vacas ele tem? Testemunha: ah, isso eu não vou lhe dizer bem certo se é duas ou três... é pouca, né. Pelo Juiz: duas ou três. E onde é que ele guarda essas vacas? Testemunha: ele deve ter algum amigo, não sei, nalguma chácara aí que ele deixa essas vacas. Pelo Juiz: não, mas aonde que o senhor viu? O senhor falou que viu. Testemunha: sim, mas eu vejo ele na casa, porquê ele traz as vacas pra tirar... Pelo Juiz: as vacas estão na casa? Testemunha: sim, ele tira na casa o leite. Agora essas vacas... Pelo Juiz: certo. tem um estábulo pra tirar o leite... Testemunha: tem, tem. Um galpãozinho pra tirar o leite. Essas vacas ficam num potreiro. Não sei se ele aluga, se dão pra ele... (...) Pelo Juiz: então ele vende queijo, né? Testemunha: não, acho que não. Não sei se ele... Pelo Juiz: o senhor já comprou alguma vez queijo dele? Testemunha: não, eu faço lá no sítio meu. Pelo Juiz: ah, o senhor também faz... Testemunha: não eu moro no interior. Não ele... Acho que... acho que se ele vende é uma sobra de leite. Que ele tira pro consumo e ele sabe... talvez vende alguma sobra. Pelo Juiz: tá certo. Encerro o depoimento."
A prova testemunhal é precisa e convincente da atividade rural da parte autora no período de carência legalmente exigido.
Ademais, constata-se que as alegações do INSS em seu recurso são afastadas pelos esclarecimentos da prova testemunhal a respeito dos seguintes aspectos controvertidos: local de residência do autor, existência de contrato de arrendamento, atividades agrícolas, criação de vacas leiteiras, produção de leite e queijos, venda do eventual excedente da produção e importância da produção para o consumo e sustento próprio.
Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (documentos do processo administrativo e pesquisas que acompanham este voto), observa-se que o autor possui registro dos seguintes vínculos empregatícios:
- ADEMAR COSTA DUTRA FAZENDA QUERÊNCIA (Empregado; 15/04/1973 a 15/07/1973);
- COMÉRCIO DE ALIMENTOS BOM JESUS LTDA (Empregado; 01/12/1974 a 13/01/1976);
- MUNICÍPIO DE BOM JESUS (Empregado; 10/07/1979 a 30/06/1982);
- ANTONIO JACI MIGLIANACCA (Empregado; 20/06/1982 a 15/11/1982);
- MUNICÍPIO DE BOM JESUS (Empregado; termo inicial: 07/10/1985 [sem termo final]; última contribuição em 12/1989);
- MUNICÍPIO DE BOM JESUS (Empregado; 17/10/1985 a 05/05/1990);
- ARTUR MICHELON (Empregado; 01/03/1999 a 20/05/1999);
- AGROPECUÁRIA SCHIO LTDA (Empregado; 02/02/2004 a 13/07/2004);
- ARTUR MICHELON (Empregado; 01/03/2006 a 31/03/2006);
- AGROSPE - AGRO INDUSTRIAL SÃO PEDRO DE VACARIA LTDA (Empregado; 21/01/2008 a 15/02/2008).
Tendo em vista as informações expostas, é necessário verificar se a descontinuidade do labor rural, nos períodos mencionados, autorizaria ou não a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
É certo que, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, os artigos 39, inciso I, e 143, ambos da Lei de Benefícios determinam que o trabalhador rural deverá comprovar o efetivo exercício da atividade, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ou número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício.
A legislação previdenciária exige, portanto, que o segurado seja efetivamente trabalhador rural no momento do implemento das condições, não se admitindo a benesse a quem não retornou às lides agrícolas ou se afastou por longo tempo. Segundo entendimento já consolidado no âmbito do STJ, inclusive sob o regime de julgamento de recurso repetitivo, à aposentadoria por idade rural não contributiva prevista nos artigos 143 e 39, I, da Lei 8213/91, não se aplica o artigo 3º, § 1º, da Lei 10.666/03:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Outrossim, a lei em tela admite a descontinuidade do tempo de serviço rural, sendo certo que, pelo menos durante o período da manutenção da qualidade de segurado previsto no artigo 15, II, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, é possível considerar o afastamento das atividades sem configurar o abandono do meio rurícola. Para os demais casos, deve ser valorada a vocação rural, caso a caso.
Havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, é que poderá ser admitida a descontinuidade nos termos acima propostos. Exige-se, assim, um período de tempo razoável entre o retorno e o requerimento capazes de resgatar sua origem/identidade campesina.
Deve ser observado todo o período contributivo do segurado, de modo a qualificá-lo efetivamente como trabalhador rural e não urbano, vocacionado às lides agrícolas, justificando, dessa maneira, a redução do requisito etário.
À vocação rural pode-se também agregar o preenchimento da regra prevista no artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, no sentido de que, havendo interrupção do labor rurícola no período da carência, o segurado comprove, após o seu retorno, pelo menos um terço do período total necessário para o implemento do benefício, o qual, somado ao intervalo anterior, seja suficiente ao seu deferimento. Este critério objetivo no período de carência parece razoável para embasar a preponderante inclinação agrícola do trabalhador.
De outra parte, inexistindo demonstração da efetiva retomada do trabalho rural, nada impede que o segurado venha a postular a aposentadoria com a utilização do tempo rural e/ou urbano. Porém, os requisitos a serem preenchidos serão diversos, conforme previsão do artigo 48, §§ 3 e 4º, da Lei 8213/91.
Por fim, vale referir recente julgado desta Turma (APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004303-93.2014.404.9999, 6ª TURMA, Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, POR UNANIMIDADE, D.E. 08/03/2017, PUBLICAÇÃO EM 09/03/2017) que admitiu a descontinuidade do trabalho rural por 4 (quatro) anos e 1 (um) mês no período de carência, sem prejuízo do reconhecimento da vocação às atividades rurais e consequente concessão do benefício.
No caso dos autos, a descontinuidade do trabalho rural, no decorrer do período de carência, corresponde aos intervalos de 01/03/1999 a 20/05/1999, 02/02/2004 a 13/07/2004, 01/03/2006 a 31/03/2006 e 21/01/2008 a 15/02/2008, totalizando 9 (nove) meses e 28 (vinte e oito) dias.
Considerando a situação descrita, é possível concluir que o autor comprovou a sua vocação aos trabalhos rurais, pois em sua grande maioria, no período de carência, exerceu tal atividade. Outrossim, considerando o conjunto probatório, verifica-se que os períodos de afastamento constituem exercício eventual de atividade urbana, sendo exceção ao histórico laboral de atividades rurais do autor.
O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural desde longa data até, no mínimo, a ocasião em que requerido o benefício perante o INSS.
Assim, havendo o autor completado 60 (sessenta) anos em vinte e seis de julho de 2009 (fl. 09) e demonstrado o efetivo exercício de atividade rural por período superior a 180 (cento e oitenta) meses (com curtos intervalos de descontinuidade), contados, retroativamente, de 2012, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da data do requerimento administrativo (27 de setembro de 2012).
Termo inicial do benefício
Quanto ao marco inicial da inativação, os efeitos financeiros devem, em regra, retroagir à data de entrada do requerimento do benefício (ressalvada eventual prescrição quinquenal), independentemente de, à época, ter sido aportada documentação comprobatória suficiente ao reconhecimento do tempo de serviço pleiteado, tendo em vista (1) o caráter de direito social da previdência social, intimamente vinculado à concretização da cidadania e ao respeito da dignidade humana, a demandar uma proteção social eficaz aos segurados, (2) o dever constitucional, por parte da autarquia previdenciária (enquanto Estado sob a forma descentralizada), de tornar efetivas as prestações previdenciárias aos beneficiários, (3) o disposto no art. 54, combinado com o art. 49, ambos da Lei n. 8.213/91, no sentido de que a aposentadoria é devida, em regra, desde a data do requerimento e (4) a obrigação do INSS - seja em razão dos princípios acima elencados, seja a partir de uma interpretação extensiva do art. 105 da Lei de Benefícios ("A apresentação de documentação incompleta não constitui motivo para a recusa do requerimento do benefício") - de conceder aos segurados o melhor benefício a que têm direito, ainda que, para tanto, tenha que orientar, sugerir ou solicitar os documentos necessários.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADInº 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual nº 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497 do Código de Processo Civil de 2015, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 9 de agosto de 2007), determino o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício devido à parte autora (NB 158.788.078-1), a ser efetivada em 45 (quarenta e cinco) dias.
Tutela de urgência
Devido ao caráter provisório da tutela pretendida (petição das fls. 160-161), ainda que a parte autora tenha implementado os requisitos necessários ao seu deferimento, mostra-se mais indicada a concessão da tutela específica, uma vez que se cuida de medida de caráter definitivo.
Diante disto, julga-se prejudicado o requerimento da parte autora para concessão da tutela de urgência.
Conclusão
A remessa oficial não deve ser conhecida.
O apelo da Autarquia resta parcialmente provido para reconhecer que o INSS é isento do pagamento das custas.
Determinado o cumprimento imediato do acórdão, restando prejudicado o requerimento da parte autora para concessão da tutela de urgência.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão, restando prejudicado o requerimento de concessão da tutela de urgência.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8960980v21 e, se solicitado, do código CRC DFA14CA1. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016375-78.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00023672920138210083
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | DARCI DUARTE FARIA |
ADVOGADO | : | Lamir Jose Reistacke |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 1043, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO, RESTANDO PREJUDICADO O REQUERIMENTO DE CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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