D.E. Publicado em 09/03/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004303-93.2014.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | IONE DE FÁTIMA ASSUNÇÃO PAULO |
ADVOGADO | : | Ivan Rogerio da Silva |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA. DESCONTINUIDADE. VOCAÇÃO RURAL.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
3. Havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, poderá ser admitida a descontinuidade. Deve ser observado todo o período contributivo do segurado, de modo a qualificá-lo efetivamente como trabalhador rural e não urbano, vocacionado às lides agrícolas, justificando, dessa maneira, a redução do requisito etário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão no que diz respeito à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 22 de fevereiro de 2017.
Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7034717v11 e, se solicitado, do código CRC 9E7658E7. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Marina Vasques Duarte de Barros Falcão |
Data e Hora: | 28/02/2017 20:55 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004303-93.2014.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | IONE DE FÁTIMA ASSUNÇÃO PAULO |
ADVOGADO | : | Ivan Rogerio da Silva |
RELATÓRIO
IONE DE FÁTIMA ASSUNÇÃO PAULO ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Na sentença (20/08/2013) foi julgado procedente o pedido, condenando-se o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da citação, ocorrida em 02/09/2011 (fl. 86-v.). A Autarquia foi condenada, ainda, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% das parcelas vencidas até a data da sentença.
O INSS apelou sustentando, em síntese, não estar comprovado o exercício de atividade rural no período de carência exigido em lei. Alegou que a propriedade rural do grupo familiar foi adquirida apenas em 2004, e que a autora, em períodos entre 1994 e 2001, exerceu atividade urbana como costureira, o que descaracteriza sua condição de segurada especial.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 29 de março de 2011 (fl. 10) e requereu o benefício na via judicial em 15 de agosto de 2011 (o requerimento administrativo ocorreu apenas em 26/02/2013, de acordo com a decisão de indeferimento constante à fl. 159). Assim, a parte autora deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 (cento e oitenta) meses anteriores ao implemento de qualquer dos requisitos, mesmo que de forma descontínua.
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam:
a) certidão de casamento, em 1993, com João Carlos de Paulo (fl. 11);
b) escritura de compra e venda e matrícula da propriedade rural adquirida em 2004 por João Carlos de Paulo, no município de Rancho Alegre/PR (fls. 14-18);
c) documentos referentes às declarações de Imposto sobre Propriedade Territorial Rural - ITR nos períodos de 1995 a 1998, 2000 a 2001 e 2003 (fls. 21-32);
d) notas fiscais de venda de produção agrícola (soja e milho) em nome da autora e/ou seu marido nos períodos de 1992 a 1993, 1995, 1997, 2003, 2007, 2009 a 2011 (fls. 33-35, 37-41, 44-48, 52, 54-61, 63 e 66);
e) extrato de conta corrente de João Carlos de Paulo na Coop. Cred. Rural da Região Norte do Paraná (período de 2001 a 2002) (fl. 49);
f) nota fiscal de compra de sementes em 1987 e 1993 a 1995 (fls. 53, 62, 65 e 71);
g) adiantamento para colheita, fornecido pela Coprocafé em 1992 (fl. 67);
h) compra de produtos para produção agrícola junto à Coprocafé em 1987, 1989 e 1991 (fls. 68-69 e 72);
i) contrato particular de arrendamento agrícola, em que João de Oliveira Preto fornece a João Carlos de Paula, em 1978, área de 4 alqueires para plantio pelo período de 1 ano (fl. 43).
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
Na justificação administrativa, realizada em 25 de setembro de 2012 para instrução destes autos (fls. 119-123), foi colhido o depoimento pessoal e foram ouvidas duas testemunhas, as quais confirmaram o trabalho rural da parte autora, na condição de segurada especial, no período correspondente à carência, mencionando as propriedades em que desempenhou atividade agrícola e as culturas laboradas.
A autora, em seu depoimento pessoal, declarou: "que se casou com João Carlos de Paulo e mudou-se para o bairro Córrego Rico, onde o marido já trabalhava na propriedade de um Sr. Pedro, que depois foi vendida para o Sr. Frederico, ocasião em que saíram e foram morar no sítio do Sr. Arruda, perto da Fazenda Paredão; que ali trabalhava carpindo soja onde permaneceram 3 anos e depois foram para a Água da Floresta onde trabalharam no sítio de Antônio Gonçalves; que teve 3 filhos, sendo os 2 mais velhos nascidos quando a autora trabalhava na lavoura; que depois mudaram para a cidade de Rancho Alegre, por volta de 1977 e passou a trabalhar de boia fria, ganhando por dia; que nessas condições trabalhou no sítio de Lourenção, em lavouras de algodão e soja; que o marido da autora também era trabalhador rural, tendo se aposentado como pequeno produtor numa propriedade de pouco mais de 2 alqueires, adquirida há uns 3 ou 4 anos; que a autora ultimamente trabalha junto com o marido nessa propriedade, em lavoura de soja; indagada se pleiteou auxílio doença há uns 3 anos atrás, disse que sim, que na época estava muito doente, já tinha a propriedade mas não entrou com documentos da lavoura; indagada se trabalhou como costureira, conforme CTPS no benefício por incapacidade (1994/1995 e de 1997/2001-Cantynella Confecções), disse que sim que levava para casa para costurar; que até hoje trabalha na propriedade da família, distante uns 4,5 km da cidade e que trabalha também em propriedades vizinhas; que seu marido trabalha somente no sítio da família."
A testemunha Audacir Pereira dos Santos declarou: "que conhece a autora há mais de 20 anos, desde que ela morava na Água do Córrego Rico e era já casada; que na ocasião o declarante morava no sítio vizinho; que tanto o declarante quanto a autora moravam em propriedades de terceiros, mas em sítios pequenos e por isso tinham que trabalhar em outras propriedades para complementar a renda; que trabalharam juntos na Fazenda do Cunha, Fazenda Paredão, em sítios na Água da Floresta e em muitas outras propriedades; que as lavouras em que trabalharam juntos eram de soja, algodão, rami, milho; que depois o declarante se mudou para a cidade e em seguida a autora também; que passaram a trabalhar juntos, como boias frias; que somente muito depois o declarante passou a exercer a profissão de pintor; que sabe que a autora depois adquiriu um lote de terras de uns 2 alqueires e o marido é que trabalha ali até hoje; que sabe que a autora trabalhou como costureira em uma fábrica de confecções em Rancho Alegre, por um período; que depois disso ela voltou para a lavoura e até hoje ainda vai no sítio dela distante uns 5 a 6 km da cidade; que o marido tinha um Fusca; que ali trabalha praticamente somente o marido em plantação de milho/soja."
A testemunha José Benedito Rosa declarou: "que conhece a autora há mais ou menos 30 anos, e desde que ela morava no sítio de Décio Tomazini; que ambos se casaram naquela propriedade, localizada na Água da Floresta; que a autora saiu dali primeiro e passou a trabalhar de boia fria nas propriedades da região; que o declarante se casou em 1977 e depois em 19780 [sic] mudou-se para o sítio do Sagae, onde a autora trabalhou em colheita de café; que a autora trabalhou também catando milho na Fazenda Paredão, Fazenda São José, como boia fria; que o marido da autora também trabalha na lavoura e tem um sítio pequeno onde cultiva soja/milho; que tem conhecimento que a autora até hoje trabalha de boia fria; que sabe que a autora trabalhou por um período como costureira, mas depois voltou para a lavoura."
A prova testemunhal, portanto, é precisa e convincente da atividade rural da parte autora, na condição de segurada especial no período de carência legalmente exigido.
Tendo em vista a atividade exercida, tais conclusões não são afastadas pela alegação do INSS de que "a propriedade rural da família só foi adquirida em 2004" (fl. 164).
O INSS sustenta, ainda, que a parte autora exerceu atividade urbana no período equivalente à carência do benefício requerido.
Sendo assim, é necessário verificar se o período descontínuo de labor rural autorizaria ou não a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural pleiteado na inicial.
É certo que, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, os artigos 39, inciso I, e 143, ambos da Lei de Benefícios determinam que o trabalhador rural deverá comprovar o efetivo exercício da atividade, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ou número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício.
A legislação previdenciária exige, portanto, que o segurado seja efetivamente trabalhador rural no momento do implemento das condições, não se admitindo a benesse a quem não retornou às lides agrícolas ou se afastou por longo tempo. Segundo entendimento já consolidado no âmbito do STJ, inclusive sob o regime de julgamento de recurso repetitivo, à aposentadoria por idade rural não contributiva prevista nos artigos 143 e 39, I, da Lei 8213/91, não se aplica o artigo 3º, § 1º, da Lei 10.666/03:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Outrossim, a lei em tela admite a descontinuidade do tempo de serviço rural, sendo certo que, pelo menos durante o período da manutenção da qualidade de segurado previsto no artigo 15, II, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, é possível considerar o afastamento das atividades sem configurar o abandono do meio rurícola. Para os demais casos, deve ser valorada a vocação rural, caso a caso.
Havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, é que poderá ser admitida a descontinuidade nos termos acima propostos. Exige-se, assim, um período de tempo razoável entre o retorno e o requerimento capazes de resgatar sua origem/identidade campesina.
Deve ser observado todo o período contributivo do segurado, de modo a qualificá-lo efetivamente como trabalhador rural e não urbano, vocacionado às lides agrícolas, justificando, dessa maneira, a redução do requisito etário.
À vocação rural pode-se também agregar o preenchimento da regra prevista no artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, no sentido de que, havendo interrupção do labor rurícola no período da carência, o segurado comprove, após o seu retorno, pelo menos um terço do período total necessário para o implemento do benefício, o qual, somado ao intervalo anterior, seja suficiente ao seu deferimento. Este critério objetivo no período de carência parece razoável para embasar a preponderante inclinação agrícola do trabalhador.
De outra parte, inexistindo demonstração da efetiva retomada do trabalho rural, nada impede que o segurado venha a postular a aposentadoria com a utilização do tempo rural e/ou urbano. Porém, os requisitos a serem preenchidos serão diversos, conforme previsão do artigo 48, §§ 3 e 4º, da Lei 8213/91.
Tendo em vista tais premissas, passo a analisar a situação dos autos.
Conforme anteriormente exposto, a parte autora implementou o requisito etário em 29 de março de 2011 (fl. 10) e requereu o benefício na via judicial em 15 de agosto de 2011 (fl. 01), devendo comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 (cento e oitenta) meses anteriores ao implemento de qualquer dos requisitos, mesmo que de forma descontínua.
Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (fl. 94), observa-se que a autora possui registro de vínculos empregatícios nos períodos de 01/09/1994 a 09/07/1995 e 01/04/1997 a 30/04/2001 (empresa CAMISA CHARMY´S LTDA.)
Desta forma, o trabalho urbano corresponde a 4 anos e 1 mês (01/04/1997 a 30/04/2001) no decorrer do período de 180 meses.
Considerando a situação descrita é possível concluir, conforme acima, que a parte autora comprovou a sua vocação aos trabalhos rurais, pois em sua grande maioria, no período de carência e antes dela, exerceu tal atividade. Destaco, para isso, inclusive, que após o exercício de atividade urbana retornou ao meio agrícola por período superior aos 60 (sessenta) meses a que o artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91 refere.
O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural desde longa data até, no mínimo, a ocasião em que ajuizada a demanda.
Assim, havendo a autora completado 55 (cinquenta e cinco) anos em 29 de março de 2011 (fl. 10) e demonstrado o efetivo exercício de atividade rural por período superior a 180 (cento e oitenta) meses, contados, retroativamente, de 2011, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da citação válida (02/09/2011).
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497 do Código de Processo Civil de 2015, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 9 de agosto de 2007), determino o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício devido à parte autora (CPF 742.167.169-20), a ser efetivada em 45 (quarenta e cinco) dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão no que diz respeito à implantação do benefício.
Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO
Relatora
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Data e Hora: | 28/02/2017 20:55 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 08/10/2014
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004303-93.2014.404.9999/PR
ORIGEM: PR 00019198020118160175
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Márcia Neves Pinto |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | IONE DE FÁTIMA ASSUNÇÃO PAULO |
ADVOGADO | : | Ivan Rogerio da Silva |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 08/10/2014, na seqüência 376, disponibilizada no DE de 22/09/2014, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
ADIADO O JULGAMENTO.
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/02/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004303-93.2014.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00019198020118160175
RELATOR | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | IONE DE FÁTIMA ASSUNÇÃO PAULO |
ADVOGADO | : | Ivan Rogerio da Silva |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/02/2017, na seqüência 1291, disponibilizada no DE de 09/02/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO QUE DIZ RESPEITO À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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