| D.E. Publicado em 24/05/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003414-08.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | ELAINE MARIA SIQUEIRA |
ADVOGADO | : | Sandro Tiogavares Binello e Silva |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA OU PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POR MEMBRO DA FAMÍLIA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
3. O desempenho ou a percepção de benefício previdenciário decorrente de atividade urbana por seu cônjuge não afasta o enquadramento da autora como segurada especial, desde que seja demonstrado que a remuneração é insuficiente para tornar dispensável o trabalho agrícola exercido pela esposa ou pelo núcleo familiar.
4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e determinar o cumprimento imediato do acórdão no que diz respeito à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 17 de maio de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8932983v6 e, se solicitado, do código CRC 7B0FF58C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 18/05/2017 14:01 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003414-08.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | ELAINE MARIA SIQUEIRA |
ADVOGADO | : | Sandro Tiogavares Binello e Silva |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
ELAINE MARIA SIQUEIRA ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, mediante o reconhecimento do labor agrícola nos intervalos de 01-01-1988 a 30-05-1992 e de 01-01-1999 a 31-07-2013, a contar do requerimento administrativo, formulado em 02-08-2013.
Na sentença (19-12-2014) foi julgado improcedente o pedido, condenando-se a autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios fixados em R$ 800,00 (oitocentos reais), restando suspensa a exigibilidade em face da assistência judiciária gratuita.
A parte autora recorreu alegando existir início de prova material quanto ao período de 01-01-1988 a 30-05-1993, consistente na Declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e pesquisa externa homologada pelo INSS.
Com relação ao segundo período, de 01-01-1999 a 31-07-2013, afirmou ter juntado inúmeros documentos que confirmam a atividade rural, tendo o INSS reconhecido administrativamente (fl. 117, verso), porém não fez constar no resumo de cálculo de tempo de serviço.
Requereu a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural ou, assim não sendo entendido, a averbação dos períodos postulados.
Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 31-07-2013 (fl. 13) e requereu o benefício na via administrativa em 02-08-2013 (fl. 15). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 (cento e oitenta) meses anteriores ao implemento de qualquer dos requisitos, mesmo que de forma descontínua.
Ressalto que a autora possui vínculo com o Município de Jóia de 15-06-1992 a 30-12-1998 (certidão narratória de tempo de serviço - fl. 64), razão pela qual o pedido de reconhecimento de atividade rural restringe-se aos intervalos de 01-01-1988 a 30-05-1992 e de 01-01-1999 a 31-07-2013.
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam:
a) ficha da autora como associada ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jóia, desde 23-03-1999, com registro de pagamento de anuidades até 2010 (fl. 16);
b) notas fiscais de comercialização da produção agrícola, emitidas em nome da autora, de 2001 a 2013 (fls.18-43);
c) ficha cadastral da autora junto à Prefeitura Municipal de Jóia-RS, datada de 15-06-2000, onde consta como profissão agricultora (fl. 44);
d) comprovantes de pagamento de contribuição sindical - agricultor familiar, em nome da autora, como arrendatária, nos exercícios de 2012/2013 (fls. 57-58);
e) comprovante de recebimento de auxílio-doença pela autora, de 13-08 a 13-09-2010 como segurada especial (fl. 65).
Consta, ainda, declaração de Josina da Silva Conceição, mãe da autora, firmada em 06-11-2006, dando conta de que Elaine Maria Siqueira, explora uma fração de terras de 2 hectares, parte da área de 8,1 hectares de que a declarante é proprietária, a fim de que possa promover sua inscrição como produtora rural e solicitar talões de produtor rural para comercializar a produção oriunda deste imóvel (fl. 59).
Veio aos autos, também, declaração de exercício de atividade rural pela parte autora, nos períodos de 01-01-1988 a 30-05-1992 e de 01/999 a 07/2013, firmada em 02-08-2013, pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jóia-RS (fls. 61-63). Tal declaração, contudo, não consubstancia início de prova material, uma vez que representa mera manifestação unilateral, não sujeita ao crivo do contraditório.
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
Na audiência de instrução realizada em 25-11-2014, foram ouvidas três testemunhas (fl. 129):
Roni Barcelos afirmou que conhece a autora desde pequeno porque eram vizinhos. Na época ela morava com os pais. O depoente saiu de lá há cerca de 28 anos, ela ficou cuidando da mãe porque o pai faleceu. Tem uma propriedade lá perto e sempre passa por lá. Afirmou que a autora mora na mesma propriedade, é casada com Sebastião, que trabalhava em um mercado e depois foi trabalhar em um escritório na cidade, como escrivão de cartório. Não soube dizer há quanto tempo ele se aposentou. Disse que a propriedade tem dois hectares e pouco, eles plantam um pedacinho só de soja, não tem maquinário, quando ela casou foi morar na cidade um tempo e depois voltaram. Referiu que ela está morando lá fora há uns quatro ou cinco anos, às vezes ela ficava na cidade, às vezes ela ficava ali. Ela trabalhou um período na prefeitura e acha que eles sempre plantaram nessa propriedade. Disse que o cunhado mora na casa deles na cidade e não sabe se paga aluguel. Não soube dizer a época em que ela trabalhou na prefeitura.
Leopolda Massuquine Conceição afirmou que conhece a autora há 32 anos, quando a conheceu ela morava no interior, ela sempre morou lá, ela tem uma asa na cidade, mas não mora na cidade, é uma filha que vem de fora que fica mais lá. A propriedade tem 2 hectares, ela herdou do pai, é ali que ela mora. O pai faleceu há uns dez anos mais ou menos. O terreno era do pai dela, a renda dela era isso aí, ela tirava leite, plantava mandioca, não sabe dizer se vendia alguma coisa. O marido dela trabalhava no cartório, a propriedade fica a 3 quilômetros da cidade. Quando a depoente foi para lá o marido já não convivia muito com eles. Questionada se a autora trabalhou em outro lugar afirmou não saber depois que a Juíza afirmou que ela trabalhou na prefeitura, disse que sim, mas que nesse tempo ela trabalhava na escola, ia e vinha todos os dias, foi por uns seis ou sete anos. Esse tempo que ela trabalhou na prefeitura ela manteve as terras, tirava leite para o gasto.
Antonio Dirceu Bonzane Sartori disse que conhece a autora há bastante tempo, pois ela tem uma propriedade perto da do depoente, mora ali há 38 anos, a autora nasceu e se criou ali. Afirmou que a autora nunca morou na cidade, ela tem uma casa que a filha dela fica na cidade, ela sempre morou ali. Não sabe a idade da filha, é adulta e casada. Acha que ela trabalhou um tempo na prefeitura, ela ia e voltava na agricultura, não sabe o que ela fazia, lembra que ela ia a pé. Disse que o marido dela trabalhava na agricultura também, houve uma época em que o marido dela trabalhou no cartório, não sabe dizer se ele se aposentou, acha que saiu do cartório há uns quatro anos. A terra ela herdou do pai, ele morreu e parece que não fizeram o inventário. Ela vendia, plantava milho, feijão, batata, mandioca e criava galinha e porco, o marido trabalhava na cidade e trabalhava lá também. Disse que eles até iam e ficavam uns dias com a filha na cidade, mas morar mesmo era para fora. Às vezes ela planta soja na propriedade, o irmão do depoente planta para eles porque não têm maquinário, eles pagam a mão de obra.
Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cuja pesquisa acompanha este voto, observa-se que a autora possui apenas o vínculo junto à Prefeitura de Jóia, já mencionado, no intervalo de 15-06-1992 a 30-12-1998, fortalecendo-se a indicação de que, de fato, excetuando-se tal período, sobrevive unicamente das lidas rurais.
Seu cônjuge, por sua vez, possui vínculos urbanos e contribuições como contribuinte individual em diversos intervalos, de 1974 até 11-12-2012 (fls. 107-108) e percebe aposentadoria por tempo de contribuição, ramo de atividade comerciário, com início em 01-05-2007, tendo recebido um salário mínimo relativamente à competência julho de 2013 (fl. 112, verso).
O desempenho ou a percepção de benefício previdenciário decorrente de atividade urbana por seu cônjuge não afasta o enquadramento da autora como segurada especial, desde que demonstrado nos autos que a remuneração não era suficiente para tornar dispensável o trabalho agrícola exercido pela esposa ou pelo núcleo familiar. Nesse sentido já decidiu a Terceira Seção desta Corte nos Embargos Infringentes n. 2003.71.00.013565-8, publicados no D.E. de 30 de janeiro de 2008, cujo Relator foi o Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, e o Superior Tribunal de Justiça no Resp 1.304.479-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, publicado no D.E. de 19 de dezembro de 2012, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos.
O primeiro período, de 01-01-1988 a 30-05-1992 não pode ser reconhecido, tendo em vista que inexiste início de prova material, tendo sido juntada apenas a declaração do Sindicato, a qual não constitui início de prova, como já referido acima.
Contudo, entendo que, com relação ao segundo período, de 01-01-1999 a 31-07-2013, restou comprovado o exercício de atividade rural pela parte autora, tendo direito à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
O próprio INSS considerou comprovado o exercício de atividade rural pela autora no referido período, porém entendeu descaracterizado o regime de economia familiar em virtude de receber aluguel de imóvel na cidade, conforme se extrai do documento da fl. 117, verso:
Realizamos pesquisa que confirmou a atividade rural da requerente, fls. 79 e considerando que possui provas para homologação do STR de Jóia a partir de 01/99 e provas plenas, blocos de produtor rural a partir de 2001 a 2013, entendemos que a requerente possui comprovada a atividade rural de 01/99 ao requerimento, 02/08/13, o que não completa a carência de 180 meses de acordo com o art. 142 da Lei 8.213/91, porém o fato de possuir aluguel de casa que possui na cidade de Jóia, descaracteriza o regime de economia familiar de acordo com o art.11, inciso VII, § 1º da Lei 8.213/91, portanto indeferimos o pedido por falta de carência e por não comprovar o regime de economia familiar.
Na entrevista administrativa (fls. 113-114), em 06-08-2013, a autora afirmou que possuem casa na cidade de Jóia e é alugada para o cunhado por R$ 250,00, quando o salário mínimo era de R$ 678,00, representando tal renda, portanto, pouco mais de 1/3 do salário mínimo, o que não é suficiente para afastar a indispensabilidade do trabalho rural para o sustento da família.
Com efeito, há início de prova material já desde o início do ano de 1999, quando a autora deixou de trabalhar na Prefeitura, o que restou corroborado pela prova testemunhal, perfazendo 14 anos e 7 meses de tempo de serviço, quando exigida a carência de 180 meses (15 anos), sendo, contudo, possível a comprovação da atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos termos do artigo 143 da Lei n. 8.213/91.
O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural desde longa data até, no mínimo, a ocasião em que requerido o benefício perante o INSS.
Assim, havendo a autora completado 55 (cinquenta e cinco) anos em 31-07-2013 e demonstrado o efetivo exercício de atividade rural por 180 (cento e oitenta) meses, contados, retroativamente, de 2013, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da data do requerimento administrativo (02-08-2013).
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida para a fase de cumprimento do julgado em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016, e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, a teor das Súmulas 111 do Superior Tribunal de Justiça e 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADInº 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual nº 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497 do Código de Processo Civil de 2015, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 9 de agosto de 2007), determino o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício devido à parte autora (NB 162.869.151-1), a ser efetivada em 45 (quarenta e cinco) dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e determinar o cumprimento imediato do acórdão no que diz respeito à implantação do benefício.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003414-08.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00015900620148210149
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | ELAINE MARIA SIQUEIRA |
ADVOGADO | : | Sandro Tiogavares Binello e Silva |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 1067, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO QUE DIZ RESPEITO À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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