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Apelação Cível Nº 5015712-34.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CENIRA DOS SANTOS BOLICO
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta da sentença na qual o Juízo a quo julgou procedente o pedido da parte autora de concessão de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo (06-07-2016). Condenou o INSS ao pagamento da parcelas vencidas atualizadas pelo IPCA-E, e acrescidas de juros de mora observado o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, a contar da citação. Foi antecipada a tutela e o benefício foi implantado em 23-02-2021 (Ev.20-OFIC3).
O INSS recorreu postulando a reforma da sentença. Sustenta, em síntese, que a parte autora não apresentou início de prova material hábil a comprovar o labor rural no período necessário. Aduz que a postulante recebeu benefício por incapacidade, não intercalado com períodos contributivos, não podendo o mesmo ser computado para efeito de concessão de aposentadoria por idade. Alega que a postulante não produziu prova do seu retorno ao labor rural após o período em que esteve em gozo de auxílio-doença (29/01/2015 a 30/06/2016). Subsidiariamente, requer a aplicação do INPC como índice de correção monetária e o prequestionamento da matéria para fins recursais.
Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Da aposentadoria rural
Tratando-se de rurícola, deve o julgador valorar os fatos e as circunstâncias evidenciados, com ênfase no artigo 5.º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB, e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, na qual predomina a informalidade na demonstração dos acontecimentos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos, quando de outra forma atingirem a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 277 do CPC/2015.
Dispõe o art 201, II, § 7º da CF, que é assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal, aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019).
Os requisitos para a aposentadoria por idade rural, para os filiados ao RGPS à época da edição da Lei nº 8.213/91, estão dispostos nos §§ 1º e 2º do art. 48 e no art. 39, I, da LB, que exigem: (a) idade mínima de 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher (art. 48, § 1.º ); e (b) o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido. Portanto, independente do recolhimento de contribuições. Para o segurado especial que comprovar o efetivo exercício de atividade rural pelo período da carência, o valor do benefício equivalente a um salário mínimo.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completa a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subsequentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios.
Não é possível dispensar a necessidade de implementação simultânea dos requisitos da idade e tempo de serviço durante o interregno correspondente à carência, uma vez que esse benefício não tem caráter atuarial, sendo vedado criar regime híbrido que comporte a ausência de contribuições e a dispensa do preenchimento concomitante das exigências legais.
Em qualquer caso, desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).
Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.
Da demonstração da atividade rural
Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91; Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13-12-2010, DJe 15-04-2011).
A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012)
No que se refere à prova do tempo de serviço exercido nesse tipo de atividade, se deve observar a regra do art. 55, § 3.º, da LB: "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
Para a análise do início de prova material, associo-me aos seguintes entendimentos:
Súmula n.º 73 deste Regional: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Súmula n.º 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
Também devem ser observados os precedentes vinculantes do STJ, nos temos das seguintes teses firmadas:
Tema 532: O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
Tema 533: A extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria". "O STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)
Tema 629: A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
Tema 638 - Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal.
Tema 642: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.
O §1.º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural.
Não há necessidade de que a prova material abarque todo o período de trabalho rural, uma vez que se deve presumir a continuidade do labor rural. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP (Tema 638, do STJ), foi editada a tese de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
Por outro lado, comprovado o desempenho de atividade rural por meio de documentos em nome do segurado ou de ente familiar que permaneça na lida rural, corroborado por prova testemunhal, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. Assim, o fato por si só do cônjuge ter exercido labor urbano e hoje perceber aposentadoria de origem urbana ou permanecer trabalhando em atividade que não a rural, não afasta a condição de segurado especial, da parte interessada, desde que esta disponha de início de prova material independente do cônjuge.
Conforme decidido na Ação Civil Pública nº 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, proposta pelo Ministério Público Federal em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), é possível o cômputo de período de trabalho rural realizado antes dos 12 anos de idade, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei 8.213/91, em maior amplitude, sem a fixação de requisito etário (TRF4, AC 5017267-34.2013.4.04.7100, Sexta Turma, Relatora para Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, julgado em 09-04-2018).
Destaco que a qualificação da mulher como "doméstica" ou "do lar" em certidões de registro civil é muito comum. Não se pode, no entanto, concluir a partir disso que as mulheres dedicavam-se apenas às tarefas da casa; ao contrário, sabe-se que na maioria das vezes elas acumulavam tais responsabilidades com o trabalho no campo.
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Do caso concreto
Da idade e da carência
No caso em tela, observa-se que a parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 01-01-2015 (DN: 21-02-1961) e requereu o benefício na via administrativa em 06-07-2016. Assim, deve comprovar o efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 180 meses anteriores ao implemento do requisito etário ou que antecedem o requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
Da comprovação do trabalho rural
Para demonstrar o labor agrícola no período equivalente à carência, foram acostados aos autos, dentre outros, os seguintes documentos (Ev.5-INIC1, Ev.2 - PROCADM2, Ev. 10 - PROCADM2):
- Certidão de casamento da autora, realizado na data de 24/05/1986, na qual o cônjuge e seu genitor foram qualificados como agricultores;
- Certidão de nascimento do filho da autora, Anderson dos Santos Bólico, de 18/02/1987, onde consta a profissão do genitor a de agricultor;
- Atestado de escolaridade, certificando que a autora estudou em escola rural situada no interior de Redentora-RS, nos anos de 1969 e 1970;
- Ficha de associado no STR de Redentora/RS, em nome do marido da requerente,onde consta a data da filiação em 18-08-1995, estando a autora qualificada como agricultora, contendo registro de recolhimento de contribuições sindicais de 1995 a 2006;
- Contratos particulares de arrendamento de imóvel rural, firmados entre o Sr. Jaime do Amaral Viana (arrendante) e o cônjuge da autora (arrendatário), referentes à área de 3,0 ha., pelos períodos de 30-09-2001 a 30-09-2003 e 11-02-2014 a 11-02-2019;
- Notas fiscais de produtor em nome do esposo da autora, dos anos de 2002 a 2007, 2009 e 2011 a 2017;
- Informação do benefício, noticiando que a parte autora recebeu salário-maternidade no ramo de atividade rural/segurado especial, no período de 27-12-1998 a 25-04-1999;
- Informação do benefício, noticiando que a parte autora recebeu auxílio-doença na atividade rural/segurado especial, no período de 29-01-2015 a 30-06-2016;
- Resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição em nome da autora, onde consta o registro de períodos de atividade rural, de 01-01-2002 a 31-12-2007, 01-01-2009 a 31-12-2009 e 01-01-2011 a 31-12-2015, computando 144 de carência em atividade rural.
Tais documentos, porque contemporâneos ao período almejado pela autora, bem como por terem sido emitidos em nome próprio e de integrantes do seu grupo familiar (pai e cônjuge), são aptos ao preenchimento do requisito de início de prova material.
Para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem ano a ano o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, considerando-se que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, sendo inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental.
Quanto ao fato da prova ser extemporânea, em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos, firmou-se entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
Da prova testemunhal
A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente quanto ao labor rural desempenhado pela demandante no período controverso.
Na justificação administrativa (Ev. 10PROCADM10, p. 76/78), as testemunhas afirmaram que autora exerce atividade rural em regime de economia familiar por longa data, de forma ininterrupta. A testemunha Daniel Alves Obregon elucidou que que conhece a autora desde solteira quando ela residia os pais, que eram agricultores, na localidade de Sítio Casemiro, interior de Redentora-RS. Relatou que a autora casou com cerca de 25 anos de idade e continuou residindo na mesma localidade, passando a exercer atividade rural com seu esposo e filho. Que eles sempre trabalharam em terras de terceiros, na forma de arrendamento, sendo que desde 2001 plantam numa área de 3,5 ha, pertencente a Jaime Amaral Viana, sem auxílio de empregados, de forma manual, utilizando apenas tração animal. Disse que eles plantam soja, milho, feijão, mandioca, entre outros produtos, criam porcos, galinhas, vacas de leite e alguns bovinos, sendo a produção para a subsistência e as sobras comercializadas. Informou que o marido da autora trabalhou fora em períodos de entre safras, mas que a autora nunca se afastou da atividade rural, a qual exerce até a presente data. No mesmo sentido foram os depoimentos de Valdomiro Nunes Fernandes e Ernestina Fernandes Viana.
Do extrato do CNIS juntado aos autos (Ev. 10-PROCADM2, p. 39), observa-se que a parte autora não possui registro de vínculos empregatícios, fortalecendo-se a indicação de que, de fato, sobreviveu unicamente das lides rurais.
Por outro lado, o CNIS do marido da autora (Ev.10-PROCADM2, p. 42) registra a existência de vínculos empregatícios por curtos períodos,inclusive durante o prazo de carência do benefício pretendido, ou seja, de 17-03-2004 a 03-2004, 15-10-2009 a 13-11-2009, de 04-02-2010 a 19-02-2010, 26-01-2011 a 17-02-2011, 20-03-2011 a 18-04-2011 e 09-10-2012 a 14-11-2012. Observa-se que, em tais períodos, o segurado recebeu remuneração inferior ao valor mínimo. Com efeito, comprovado o desempenho de atividade rural, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo familiar possuir renda própria não afeta a situação dos demais.
Reconhece-se a atividade agrícola na condição de segurado especial, quando os rendimentos do cônjuge não retiram a indispensabilidade da renda auferida na agricultura para a subsistência da família (na praxis judicial, rendimentos não superiores a dois salários mínimos. (Embargos Infringentes Nº 2005.72.13.003086-0, 3ª Seção, Des. Federal Celso Kipper, por unanimidade, D.E. 16-05-2011; Apelação Cível Nº 0002162-09.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal Celso Kipper, por unanimidade, D.E. 27-10-2011; Apelação Cível Nº 0007446-32.2010.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal João Batista Pinto Silveira, por unanimidade, sessão de 20-10-2010)
No extrato do INFBEN/Sistema Plenus verifica-se que o INSS reconheceu o labor rural da demandante, uma vez que lhe foi concedido o benefício de salário-maternidade no ramo de atividade rural/segurado especial, no período de 27-12-1998 a 25-04-1999.
No caso, é possível a formação de uma convicção plena, após a análise do conjunto probatório, no sentido de que, efetivamente, houve o exercício da atividade laborativa rurícola em regime de economia familiar por período superior à carência exigida.
Do reconhecimento do tempo em gozo de auxílio-doença previdenciário como tempo de exercício de atividade rural
O tempo em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, só pode ser computado para fins de carência, se intercalado com períodos de trabalho efetivo (Lei 8.213/91, art. 55, II).
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. CABIMENTO. 1. É possível a contagem, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade, desde que intercalado com períodos contributivos (art. 55 , II , da Lei 8.213 /91). Precedentes do STJ e da TNU. 2. Se o tempo em que o segurado recebe auxílio-doença é contado como tempo de contribuição (art. 29 , § 5º , da Lei 8.213 /91), consequentemente, deve ser computado para fins de carência. É a própria norma regulamentadora que permite esse cômputo, como se vê do disposto no art. 60 , III , do Decreto 3.048 /99. 3. Recurso especial não provido. (REsp 1334467 RS - STJ - Data de publicação: 05/06/2013)
A questão restou cristalizada nesta Corte, com a edição da Súmula 102, com o seguinte teor:
"É possível o cômputo do interregno em que o segurado esteve usufruindo benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) para fins de carência, desde que intercalado com períodos contributivos ou de efetivo trabalho."
Na hipótese vertente, observa-se do CNIS (Ev.. 10-PROCADM2, p. 39) que a parte autora recebeu benefício por incapacidade de 29-01-2015 a 30-06-2016, intercalado com período de atividade rural, devendo, portanto, referido período ser computado para efeitos de carência e concessão de aposentadoria por idade.
Com efeito, preenchido o requisito da idade exigida (55 anos em 01-01-2015) e comprovado o exercício da atividade rural no período correspondente à carência (180 meses), considerada a data do requerimento administrativo, deve ser mantida a sentença que concedeu o benefício de Aposentadoria Rural por Idade à parte autora, a contar da DER, em 06-07-2016, nos termos dispostos no art 201, II, § 7º da CF, e nos artigos 48, §§ 1º e 2º, 39, I, e 49, II, da Lei 8.213/91.
Dos Consectários
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5.º e 6.º, da Lei 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11.08.2006, e art. 31 da Lei 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/1997, foi afastada pelo STF no julgamento do RE 870.947, Tema 810 da repercussão geral, o que restou confirmado no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos.
No julgamento do REsp 1.495.146, Tema 905 representativo de controvérsia repetitiva, o STJ, interpretando o precedente do STF, definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, e que, aos benefícios previdenciários voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29.06.2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3.º do Decreto-Lei 2.322/1987, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/1997, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP).
Por fim, a partir de 09/12/2021, data da publicação da Emenda Constitucional n.º 113/2021, incidirá a determinação de seu art. 3.°, que assim dispõe:
Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
Assim, deve ser dado provimento ao recurso do INSS para que seja aplicado no cálculo das parcelas vencidas o INPC.
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei 9.289/96).
Tratando-se de feitos afetos à competência delegada, tramitados na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, a autarquia também é isenta do pagamento dessas custas (taxa única), de acordo com o disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual n.º 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não a exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único do art. 2.º da referida lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Da Verba Honorária
Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
No caso, tendo sido o benefício concedido na sentença, a base de cálculo da verba honorária fica limitada às parcelas vencidas até a sua prolação.
A questão relativa à possibilidade de majoração da verba honorária nos casos em que o Tribunal dá parcial provimento ao recurso do INSS, ou, embora negando provimento ao recurso, altera a sentença de ofício em relação aos consectários legais, foi afetada pelo STJ, em 26/08/2020, à sistemática dos recursos repetitivos, sob o Tema 1059, assim delimitado:
"(Im) Possibilidade de majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada em primeira instância contra o INSS quando o recurso da entidade previdenciária for provido em parte ou quando o Tribunal nega o recurso do INSS, mas altera de ofício a sentença apenas em relação aos consectários da condenação."
Em que pese haja determinação de suspensão do processamento de todos os feitos pendentes que versem acerca da questão delimitada e tramitem no território nacional (acórdão publicado no DJe de 26/08/2020), considerando tratar-se de questão acessória frente ao objeto do processo, e com vistas a evitar prejuízo à sua razoável duração, a melhor alternativa, no caso, é diferir a decisão sobre a questão infraconstitucional afetada para momento posterior ao julgamento do mencionado paradigma, sem prejuízo do prosseguimento do feito quanto às demais questões, evitando-se que a controvérsia sobre consectários possa produzir impactos à prestação jurisdicional principal.
Assim, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.
Tutela específica - implantação do benefício
Já cumprida pelo INSS a determinação de implantação do benefício contida em sentença, desnecessária nova ordem no mesmo sentido.
Prequestionamento
A fim de possibilitar o acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas no recurso, nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do que está declarado.
Dispositivo
Frente ao exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso do INSS.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003026430v30 e do código CRC 9e9b1b2f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
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Apelação Cível Nº 5015712-34.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CENIRA DOS SANTOS BOLICO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE rural. segurado especial. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL idônea. trabalho urbano de um integrante do grupo familiar (Tema 532, do STJ). PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. CABIMENTO. concessão do benefício. TUTELA ESPECÍFICA.
1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado mediante início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, o que não restou demonstrado nos autos. 3. Na hipótese, o cônjuge da autora manteve vínculos empregatícios durante o período de carência, tendo auferido remuneração de valor mínimo, o que não descaracteriza a condição de segurada especial da postulante. 4. Comprovado nos autos o requisito etário e o exercício de atividade rural, no período de carência é de ser concedida a Aposentadoria por Idade Rural à parte autora, a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei 8.213/91. 5. É possível a contagem para fins de carência de período em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade, desde que intercalado com períodos contributivos (Súmula 102, deste Tribunal).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de fevereiro de 2022.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003026431v5 e do código CRC 343a0412.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 09/02/2022 A 16/02/2022
Apelação Cível Nº 5015712-34.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CENIRA DOS SANTOS BOLICO
ADVOGADO: JONATHAN LUIZ BRIGO (OAB RS098500)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 09/02/2022, às 00:00, a 16/02/2022, às 14:00, na sequência 367, disponibilizada no DE de 28/01/2022.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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