| D.E. Publicado em 19/08/2016 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0000414-63.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADAO VARGAS DA SILVA |
ADVOGADO | : | Alda Cristina de Souza Freitas e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE TAQUARI/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS CUMPRIDOS.
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. O exercício eventual de atividade urbana é comum em se tratando de trabalhadores rurais do tipo diarista, safrista ou boia-fria, visto que não possuem emprego permanente, e não descaracterizam o trabalho rural, cuja descontinuidade é expressamente admitida pela Lei de Benefícios, se não ocorrerem por largo período.
3. Cumprido o requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei n. 8.213/91), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial para isentar a autarquia previdenciária do pagamento de custas, e, de ofício, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos juros e da correção monetária, restando prejudicado o recurso do INSS e à remessa necessária no ponto, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de agosto de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8463166v3 e, se solicitado, do código CRC 7C776E8C. | |
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| Data e Hora: | 10/08/2016 19:31 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0000414-63.2016.4.04.9999/RS
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação e reexame necessário contra sentença publicada na vigência do CPC/73, em que o magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido inicial para declarar e determinar a averbação como tempo de serviço rural em regime de economia familiar os períodos de 09/12/1971 a 26/06/1972, 10/01/1976 a 22/08/1977, 15/09/1977 a 31/03/1978, 01/02/1979 a 09/02/1979, 15/04/1980 a 22/04/1980, 20/05/1980 a 12/02/1981, 03/03/1981 a 30/06/1981, 01/09/1981 a 17/11/1981, 01/01/1983 a 30/11/1986, 02/03/1987 a 09/11/1989, 03/02/1994 a 03/10/1994 e de 07/04/1995 a 31/01/1999, e condenar o INSS a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por idade rural, computando-se aos períodos reconhecidos administrativamente e o tempo em que o autor recebeu o benefício de auxílio doença (26/10/1994 a 13/03/1995 e de 17/03/2008 a 10/07/2008), antecipando os efeitos da tutela. Condenou ainda o INSS ao pagamento das parcelas atrasadas, descontados os pagamentos administrativos realizados no período em razão de benefício inacumulável, desde a data do requerimento administrativo (19/07/2013), bem como ao pagamento das custas e despesas processuais, por metade, e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento).
Em suas razões de apelação a Autarquia Previdenciária sustentou, em síntese: (a) preliminarmente, a suspensão do cumprimento da decisão de antecipação de tutela; b) no mérito, ausência de comprovação do efetivo exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo; c) que a autora não estava mais no meio rural quando efetuou o requerimento administrativo; d) que há uma lacuna de vários anos entre as provas materiais carreadas aos autos; e) subsidiariamente, em sendo mantida a condenação, a isenção do pagamento de custas e a aplicação da Lei 11.960/09, em relação à correção monetária e juros de mora.
Foram apresentadas contrarrazões. Processados e por força da remessa oficial, subiram os autos a esta Corte.
É o sucinto relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente a recurso interposto/remessa oficial em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por conseqüência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Conforme já referido linhas acima, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73, inaplicável o disposto no art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a aposentadoria por idade rural: a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (artigo 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91); b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício.
Quando implementadas essas condições, aperfeiçoa-se o direito à aposentação, sendo então observado o período equivalente ao da carência na forma do art. 142 da Lei nº 8.213/91 (ou cinco anos, se momento anterior a 31/08/94, data de publicação da MP nº 598, que modificou o artigo 143 da Lei de Benefícios), considerando-se da data da idade mínima, ou, se então não aperfeiçoado o direito, quando isto ocorrer em momento posterior, especialmente na data do requerimento administrativo, tudo em homenagem ao princípio do direito adquirido, resguardado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91.
O benefício de aposentadoria por idade rural será, em todo caso, devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp nº 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. nº 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp nº 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Do trabalho rural como segurado especial
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do caso concreto
Tendo a parte autora implementado o requisito etário em 06/01/2013 e requerido o benefício em 19/07/2013, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 meses anteriores aos respectivos marcos indicados (1998 a 2013).
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos: a) Certidão de casamento, datada de 29/11/1975, onde o autor é qualificado como agricultor (fl. 18); b) Declaração de Exercício de Atividade Rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Taquari e Tabaí no sentido de que o autor exerceu a atividade rural, nos períodos de 03/02/1982 a 30/11/1986, 02/03/1987 a 09/11/1989 e de 07/04/1995 a 31/01/1999, em terras de propriedade de Adão Duarte Martins (sogro), e de 2001 a 2013, em terras próprias (fl. 19); c) Ficha de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Taquari/RS, datada de 17/12/1982 (fl. 20); d) Certidão emitida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA informando que o Sr. Adão Duarte Martins possuía imóvel rural cadastrado naquele Instituto no período de 1966 a 1992 (fl. 22); e) Notas fiscais emitidas pelas empresas adquirentes da produção agrícola e/ou pelo autor no período de 02/08/2001 a 28/02/2013 (fls. 23/49); f) Certificado de Dispensa da Incorporação onde encontra-se ilegível o campo destinado à sua qualificação (fl. 50); g) Cópia da CTPS onde há registro de vínculo empregatício em estabelecimento rural (fl. 52), bem como se constata que, na data de 01/03/1999, se deu a rescisão do último contrato de trabalho com anotação em CTPS.
Ressalto que a declaração emitida por sindicato de trabalhadores rurais, sem a devida homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), bem assim as declarações de terceiros não constituem início de prova material do exercício de atividade rurícola, pois extemporâneas aos fatos narrados, equivalendo apenas a meros testemunhos reduzidos a termo. Nesse sentido a jurisprudência: (STJ, AgRg no Resp nº 416.971, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, T6, U. DJ 27-03-06, p. 349, e AR nº 2.454, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, S3, U. DJ 03-11-04, p. 131).
Os documentos acima elencados correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento do benefício de aposentadoria rural por idade.
Em sede de audiência de instrução foram ouvidas 03 testemunhas, constando, em síntese, o seguinte (transcrição de fls. 200/201):
Luis Andre Pacheco afirmou: "que conhece o autor há vinte anos e que, quando o conheceu, o autor trabalhava na roça. Disse que trabalhava nas terras o autor e a esposa dele e que as terras eram do autor. Referiu que eles plantavam milho, aipim, mandioca e criavam gado, porco, galinha. Contou que o autor não tinha empregados e que não tinham maquinários, era braçal, com boi. Salientou que pelo que sabe o autor sempre trabalhou na roça desde que o conhece, referindo que parece que o autor teve um período de carteira assinada, não sabendo onde, mas continuou trabalhando na roça. Aduziu que o autor planta e cria animais para consumo próprio e o excedente vende. Salientou que o autor ainda trabalha hoje (CD fl. 184)."
Osvaldo de Souza Oliveira, ouvido como informante, afirmou: "conhece o autor desde que o autor era pequeno, quando ele plantava com o pai dele desde piá, no Campo do Estado, interior de Taquari, nas terras do pai do autor de 17 hectares. Contou que o pai do autor plantava milho, aipim, feijão, criava animais e vendiam leite. Referiu que trabalhavam nas terras os filhos do pai do autor, não tinha empregados, e que não tinha maquinário agrícola, só a boi. Falou que vendiam o que sobrava. Disse que não sabe precisar quando o autor saiu de lá, mas refere que ele saiu de lá e foi morar na Fazenda Lengler, numa terra do autor de 7 hectares. Falou que nessas terras o autor planta cana, aipim, cria animais, vaca, e vende leite. Contou que o autor tem que vender e que só a família trabalha, não tendo empregados. Relatou que conheceu o autor trabalhando na agricultura e que, se ele trabalhou em atividade urbana, continuou com a agricultura. Salientou que a esposa do autor vai na roça com o autor e que o autor tira o sustento da lavoura e que agora está vendendo leite (CD fl. 184).
Paulo Renato Couto de Almeida relatou: "que conhece o autor desde criança, não sabendo precisar a idade, mas já frequentavam a escola. Disse que os pais do autor morreram cedo, tendo ele vivido com irmãos e tios no Campo do Estado, referindo que as terras eram dos tios. Disse que o autor trabalhava direto nas terras dos tios, na roça, e que só a família trabalhava, não tinham empregados. Declarou que não tinham maquinários, era só braço e boi. Falou que eles plantavam de tudo, aipim, mandioca, milho, e que o excesso era para venda, pois plantavam para consumo próprio. Salientou que eles criavam animais porco, galinha, boi. Contou que não sabe dizer até quando o autor ficou lá, referindo que ele se criou lá, no tempo de rapaz. Aduziu que o autor sempre viveu da roça, mas ele teve um tempo empregado, não sabendo o período, mas, mesmo nessa época, em dia de folga, final de semana e feriado, continuou mexendo com a terra, sempre trabalhando na roça na Fazenda Lengler, para sobreviver. Falou que faz uns dez ou quinze anos que o autor está na Fazenda Lengler, mas sempre teve terra arrendada do sogro dele para poder sobreviver. Disse que o autor tem terras na Fazenda Lengler e que planta, vende leite, tendo ido para ali depois de um tempo que já estava casado, mas sempre mexendo na terra. Contou que o autor nessas terras o autor planta de tudo e cria os bichos para subsistência. Disse que a esposa dele sempre ficava "tocando" a roça, enquanto ele estava empregado para compor o que precisava em casa, sendo que ele ajudava nas folgas, não tendo empregados, apenas trabalham o autor, os dois filhos e a esposa. Disse que, nos períodos em que o autor não estava trabalhando de carteira assinada, ele se sustentava da roça, sempre trabalhou na roça desde guri para se sustentar, vendia aipim, milho, mandioca, criava porco para vender para o sustento da família (CD fl. 184)."
Conclusão
A prova testemunhal é precisa e convincente do labor rural do autor em regime de economia familiar, no período de carência legalmente exigido (1998 a 2013).
Salienta-se que, eventuais vínculos urbanos não descaracterizam a qualidade de segurado especial do autor, cuja descontinuidade é expressamente admitida pela Lei de Benefícios, se não ocorrerem por largo período.
Do contexto dos autos, conclui-se que a vocação do autor é para o trabalho na roça, o que foi devidamente provado pela documentação e corroborado pela prova testemunhal.
Assim, é devida a admissão da condição da parte autora como segurado especial no período equivalente ao da carência (1998 a 2013), motivo pelo qual é de ser mantida a sentença de procedência, com a concessão da aposentadoria por idade rural desde o requerimento administrativo.
Consectários
Juros Moratórios e Correção Monetária.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014 - grifei).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, não prevalecendo os índices eventualmente fixados na fase de conhecimento, ocasião em que provavelmente já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos juros e da correção monetária, restando prejudicado o recurso do INSS e à remessa necessária no ponto.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do CPC/2015, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Mantenho os honorários advocatícios devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado, conforme definidos nas Súmulas nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Tutela Antecipada
No tocante à antecipação dos efeitos da tutela, entendo que deve ser mantida a sentença no ponto, uma vez que presentes os pressupostos legais para o seu deferimento.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial para isentar a autarquia previdenciária do pagamento de custas, e, de ofício, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos juros e da correção monetária, restando prejudicado o recurso do INSS e à remessa necessária no ponto.
É o voto.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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| Data e Hora: | 10/08/2016 19:31 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/08/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0000414-63.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00048792120138210071
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADAO VARGAS DA SILVA |
ADVOGADO | : | Alda Cristina de Souza Freitas e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE TAQUARI/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 10/08/2016, na seqüência 308, disponibilizada no DE de 26/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E À REMESSA OFICIAL PARA ISENTAR A AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA DO PAGAMENTO DE CUSTAS, E, DE OFÍCIO, DIFERIR PARA A FASE DE EXECUÇÃO A FORMA DE CÁLCULO DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA, RESTANDO PREJUDICADO O RECURSO DO INSS E À REMESSA NECESSÁRIA NO PONTO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 12/08/2016 12:20 |
