APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5011363-95.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ZELIA APARECIDA DE SOUZA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS CUMPRIDOS. USO EVENTUAL DE MAQUINÁRIO AGRÍCOLA .
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Cumprido o requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei n. 8.213/91), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
3. No caso dos autos, é de se prestigiar a percepção da magistrada a quo no que refere às conclusões do conteúdo probatório.
4. "A utilização de maquinário agrícola, por si só, não desconfigura a condição de segurado especial, porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente." (APELREX n.º 2008.70.05.002795-6/PR).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS exclusivamente quanto à forma de cálculo dos juros e da correção monetária, bem como quanto aos honorários advocatícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 15 de junho de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8206736v6 e, se solicitado, do código CRC 8D3798BD. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
| Data e Hora: | 16/06/2016 11:22 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5011363-95.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ZELIA APARECIDA DE SOUZA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença publicada na vigência do CPC/73, em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural à parte autora, a contar da data do requerimento administrativo (04/05/2012), em razão do exercício do labor rural em regime de economia familiar, condenando o INSS ao pagamento das parcelas vencidas.
Em suas razões de apelação a Autarquia Previdenciária requereu, preliminarmente, fosse cassada a tutela antecipada. No mérito, (a) a ausência de comprovação do efetivo exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo; (b) que a prova material apresentada é insuficiente à comprovação do labor pretendido, por extemporânea ou dentro do período já homologado pela autarquia; (c) que o genitor da requerente constituiu empresa no ano de 1978 (Serraria Nossa Senhora Aparecida), o que descaracterizaria a condição de segurada especial da parte autora; (d) que a própria autora, tendo se mudado para área urbana em 2005, constituiu uma empresa (E R Praxedes & Cia Ltda ME) cujo objeto era o transporte de passageiros, de escolares e fretamento; (e) que as notas fiscais de produtos agrícolas têm origem em arrendamento das terras da família a terceiros e (f) que o grupo familiar possuía e se utilizava de um trator nas lides rurais.
Sucessivamente, em sendo mantida a condenação, (a) fossem os honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a prolação da sentença e (b) que permaneceria hígida a aplicação dos critérios de atualização dos débitos da Fazenda Pública previstos na Lei 11.960/09, que alterou a redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, enquanto não disciplinados os efeitos da declaração de inconstitucionalidade.
Processados, e também em função de remessa oficial, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente a recurso interposto em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Conforme já referido linhas acima, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73, inaplicável o disposto no art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a aposentadoria por idade rural: a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (artigo 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91); b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício.
Quando implementadas essas condições, aperfeiçoa-se o direito à aposentação, sendo então observado o período equivalente ao da carência na forma do art. 142 da Lei nº 8.213/91 (ou cinco anos, se momento anterior a 31/08/94, data de publicação da MP nº 598, que modificou o artigo 143 da Lei de Benefícios), considerando-se da data da idade mínima, ou, se então não aperfeiçoado o direito, quando isto ocorrer em momento posterior, especialmente na data do requerimento administrativo, tudo em homenagem ao princípio do direito adquirido, resguardado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91.
O benefício de aposentadoria por idade rural será, em todo caso, devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp nº 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. nº 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp nº 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Do trabalho rural como segurado especial
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de bóia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao bóia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do caso concreto
Tendo a parte autora implementado o requisito etário em 13/03/2011 e requerido o benefício em 04/05/2012, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 meses anteriores aos respectivos marcos indicados.
Convém ressaltar que os períodos entre 01/01/1984 a 31/12/2002 e 01/01/2003 a 30/06/2005 já foram reconhecidos administrativamente (Evento 24, 'Out5').
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora, entre outros, os seguintes documentos:
a) Notas fiscais de venda de produtos agrícolas do ano de 2006, 2007 e 2008, em nome da requerente (Evento 1, 'Out3'; (Evento24, 'Out3);
b) Registros do Departamento de Saúde da Prefeitura de Assaí, primeiras intercorrências nos anos de 1994 e 1996, onde referida sua residência em área rural (Evento 1, 'Out5');
c) Carteira de filiação no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Assai, em nome da requerente, do ano de 2005 (Evento 24, 'Out11');
d) Registro de aquisição de imóvel rural em formal de partilha, do ano de 2002, transmitente o espólio do genitor (Evento 24, 'Out13');
e) Diversos documentos, escrituras e notas fiscais de venda de produtos agrícolas em nome do genitor da requerente (Eventos 01 e 24).
Os documentos apresentados em nome do genitor comprovam a origem rural da requerente. Os demais documentos relacionados correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento do benefício de aposentadoria rural por idade.
Buscando corroborar a prova material apresentada foi produzida prova testemunhal, em audiência de instrução, nos seguintes termos (Eventos 40 e 63):
Sr. Levi Batista Gonçalves:
"Que conhece a requerente porque o depoente trabalhava na saúde e, como o pai da requerente era enfermo, o depoente ia buscá-lo no sítio para fazer hemodiálise; que o sítio ficava em Palmital; que eles plantavam soja, feijão, milho, arroz; que o depoente começou a buscar o pai da requerente em 1984 e isto foi até 2007, mais ou menos; que o depoente não tem conhecimento do uso de empregados mas que no sítio tinha um tratorzinho; que a requerente continuou no sítio e saiu de lá em 2010 ou 2012 por aí; que o pai da requerente faleceu em 2007, 2008, por aí."
Sr. José Maria de Souza:
"Que conhece a requerente de muito tempo lá em Palmital, no sítio do pai da requerente; que eles plantavam algodão, pouquinha coisa, feijão; que não tem conhecimento do uso de empregados e que eles tinham um trator; que a requerente trabalhava como caseira e na roça também; que ela trabalhava desde pequena, que ela era moça meio nova mas já era."
Sra. Maria Rosa Araújo (informante):
"Que conhece a requerente há 40 anos, lá do Palmital, toda a vida conheceu eles; que o sítio que ela morava era do pai dela; que não tinha empregado; que plantava milho, feijão e soja, depois; que tinha um tratorzinho, só; que conhece a requerente há uns 40 anos; que a requerente era solteira, moça solteira; que a requerente trabalhava na roça; que a requerente ficou na propriedade desde que ela nasceu, e depois o pai dela ficou doente e faz uns dois anos, com o irmão e o menino dela, que eles vieram embora pra cidade."
Tenho para mim que suficientemente comprovada a condição de segurada especial da parte autora a partir da prova carreada aos autos.
Afasto, inicialmente, o argumento de que não foi apresentado início de prova material contemporâneo ou de que este seja referente aos períodos já reconhecidos administrativamente.
Efetivamente, como acima observado, dos 15 anos que correspondem ao período de carência (1996 até 2011 ou 1997 até 2012), dez anos já foram reconhecidos pelo INSS, contudo as notas fiscais de venda de produtos agrícolas, referentes aos anos de 2006, 2007 e 2008, não estão abarcados pelo interregno.
A autarquia alega que tais notas fiscais procederiam do arrendamento a terceiros das terras rurais do grupo familiar. Mas não fez prova do alegado nem impugnou os depoimentos testemunhais que atestaram que a requerente apenas se afastou do campo recentemente. Duas testemunhas afirmam que o êxodo deu-se entre 2010 e 2012.
Com relação à empresa Serraria Nossa Senhora Aparecida, constituída pelo genitor da requerente entre os anos de 1979 e 1986, conforme informado também na apelação, refere-se a interregno distante do período de carência.
Cumpre ressaltar acerca do fato de existir empresa em nome da parte autora.
Assim foi tratado o tema no depoimento pessoal da requerente (Evento 63, 'Video3', começando em 1'43''):
"Eu queria saber se o filho da autora tem uma empresa.
- O filho da Senhora tem uma empresa?
- Ele tem uma empresa.
- A empresa E.R. Praxedes e companhia é no nome dele?
- É dele. É dele.
- Quem que abriu a empresa? Quem que assina pela empresa?
- É eu.
- E porque que a Sra. assina pela empresa?
- Porque ele não teve condição de ter a firma no nome dele. Então eu só dei o nome para ele. Mas a firma é dele, ele que resolve, né, eu só dei o nome. Para ele ter um jeito de vida para viver. Mas eu não tenho nada da firma.
- A Sra. já trabalhou alguma vez nesta empresa?
- Não."
A depoente, registre-se, foi firme e direta em reconhecer a existência da empresa, assim como quanto ao fato de que seu nome nos registros constitutivos do empreendimento deu-se exclusivamente em função de dificuldades pessoais do filho. Tal conduta demonstra adequação com a prova produzida nos autos e também com o largo período já reconhecido na esfera administrativa, confirmando que a parte autora efetivamente retirava das lides rurais a sua subsistência.
No caso dos autos, impõe-se prestigiar a percepção da magistrada de origem que, em relação ao ponto, concluiu, literis:
"Ainda, quanto à alegação de constituição de empresa no nome da segurada, há que se ressaltar que esta magistrada, em audiência de instrução, não se convenceu acerca do real desempenho de atividade empresária pela autora. Valorando as provas carreadas aos autos, e pautando-me o livre convencimento motivado, concluo que a autora, pessoa humilde, sobrevive através da renda obtida no campo, mormente quando analisados os documentos acostados, os quais, inclusive, são contemporâneos à constituição da empresa.
Interpretar a constituição de empresa em seu nome como prova absoluta de rompimento com a atividade rural seria, em último grau, negar ao magistrado a possibilidade de analisar a realidade, sopesando as provas de que dispõe, aptas a proporcionarem o decreto que mais se aproxima da justiça no caso concreto."
No que tange à utilização de maquinário pela requerente (um trator), entendo que não afasta, por si só, a caracterização do regime de economia familiar, pois a legislação previdenciária não exige que o trabalho rural seja desenvolvido de forma exclusivamente manual. Por oportuno, transcrevo os seguintes julgados desta Corte, atinentes a essa questão:
PREVIDENCIÁRIO APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. UTILIZAÇÃO DE MAQUINÁRIO AGRÍCOLA. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. EMPREGADOR RURAL II-B. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. São requisitos para a concessão do benefício rurícola por idade: a comprovação da qualidade de segurado especial, a idade mínima de 60 anos para o sexo masculino ou 55 anos para o feminino, bem como a carência exigida na data em que implementado o requisito etário, sem necessidade de recolhimento das contribuições (art. 26, III e 55, §2º da LBPS).
2. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea.
3. A utilização de maquinário agrícola, por si só, não desconfigura a condição de segurado especial, porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente.
4. A jurisprudência entende que a extensão da propriedade não constitui óbice para reconhecimento da condição de segurado especial.
5. O fato de constar empregador II-B nos respectivos recibos de ITR não significa a condição de empregador rural. A denominação, como consta dos certificados de cadastro perante o INCRA, não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar.
6. Omissis.
7. Omissis. (APELREX n.º 2008.70.05.002795-6/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DE em 11-06-2010).
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. CONCESSÃO. IRREVERSIBILIDADE. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PRESENÇA DOS REQUISITOS EXIGIDOS PELO ART. 273 DO CPC.
1. Omissis.
2. Não há que se falar em desnaturação do regime de economia familiar, porquanto o uso eventual de um maquinário para colheita não dispensa o trabalho dos membros da família na exploração da atividade campesina, aos quais incumbem as tarefas de plantio, colheita e armazenagem da produção.
(...). (Agravo de Instrumento n.º 2004.04.01.030120-8/PR, Quinta Turma, Rel. Juiz Néfi Cordeiro, DJU, Seção 2, de 09-12-2004, p. 729). (Grifou-se).
Conclusão
Assim, presente início de prova material, complementada por prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial no período equivalente ao da carência.
Consectários
Correção Monetária e Juros de Mora
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sequer há que se falar em reformatio in pejus.
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91);
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009).
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, no período antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que no julgamento das ADIs em referência a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Quanto aos juros de mora, até 29-06-2009, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois no exame do recurso extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
É de se prover a apelação do INSS quanto à incidência de juros e correção monetária.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do CPC/2015, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado, conforme definidos nas Súmulas nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ.
Dou provimento à apelação, no ponto.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p.único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Antecipada
No tocante à antecipação dos efeitos da tutela, entendo que deve ser mantida a sentença, uma vez que presentes os pressupostos legais para o seu deferimento.
Nega-se, quanto ao ponto, provimento à apelação do INSS.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS exclusivamente quanto à forma de cálculo dos juros e da correção monetária, bem como quanto aos honorários advocatícios.
É o voto.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 15/06/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5011363-95.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00032537720138160047
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ZELIA APARECIDA DE SOUZA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 15/06/2016, na seqüência 315, disponibilizada no DE de 30/05/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS EXCLUSIVAMENTE QUANTO À FORMA DE CÁLCULO DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA, BEM COMO QUANTO AOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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