APELAÇÃO CÍVEL Nº 5034739-76.2016.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | TEREZINHA BERTASSOLI CONTREIRAS |
ADVOGADO | : | EDSON DAL POZ JUNIOR |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. BOIA-FRIA. REQUISITOS CUMPRIDOS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM PENSÃO POR MORTE.
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Cumprido o requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei n. 8.213/91), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
3. Conforme entendimento firmado pelo STJ e por este Tribunal, a lei previdenciária não impede a cumulação dos proventos de aposentadoria com a pensão por morte, tendo em vista serem benefícios com pressupostos fáticos e fatos geradores diversos (AgRg no REsp 1180036/RS, DJe 28/06/2010).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, mantendo a decisão do juízo monocrático no sentido de conceder o benefício de aposentadoria rural por idade, a contar da data do requerimento administrativo (29/04/2010), bem como, de ofício, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, julgando prejudicada a remessa oficial, no ponto, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de setembro de 2016.
Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8550616v4 e, se solicitado, do código CRC 581548B5. | |
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Signatário (a): | Marina Vasques Duarte de Barros Falcão |
Data e Hora: | 15/09/2016 18:32 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5034739-76.2016.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | TEREZINHA BERTASSOLI CONTREIRAS |
ADVOGADO | : | EDSON DAL POZ JUNIOR |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença publicada na vigência do CPC/73, em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural à parte autora, a contar da data do requerimento administrativo (29/04/2010), em razão do exercício do labor rural como boia-fria e em regime de economia familiar, condenando o Instituto Previdenciário ao pagamento das parcelas vencidas, a partir da data do requerimento na esfera administrativa, atualizadas e acrescidas de juros moratórios, bem como dos honorários advocatícios e das custas processuais.
Em suas razões de apelação a Autarquia Previdenciária sustentou, em síntese, que a prova material apresentada é insuficiente à comprovação do labor pretendido, sendo vedada a prova exclusivamente testemunhal.
Sucessivamente, em sendo mantida a condenação, pugnou pela aplicação dos critérios de atualização previstos na Lei 11.960/09, que alterou a redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, haja vista que a declaração de inconstitucionalidade do uso da TR abrangeria apenas os débitos fazendários inscritos em precatório/RPV.
Processados, subiram os autos a esta Corte.
É o sucinto relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente a recurso interposto em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por conseqüência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Conforme já referido linhas acima, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73, inaplicável o disposto no art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a aposentadoria por idade rural: a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (artigo 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91); b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício.
Quando implementadas essas condições, aperfeiçoa-se o direito à aposentação, sendo então observado o período equivalente ao da carência na forma do art. 142 da Lei nº 8.213/91 (ou cinco anos, se momento anterior a 31/08/94, data de publicação da MP nº 598, que modificou o artigo 143 da Lei de Benefícios), considerando-se da data da idade mínima, ou, se então não aperfeiçoado o direito, quando isto ocorrer em momento posterior, especialmente na data do requerimento administrativo, tudo em homenagem ao princípio do direito adquirido, resguardado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91.
O benefício de aposentadoria por idade rural será, em todo caso, devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp nº 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. nº 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp nº 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Do trabalho rural como segurado especial
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do enquadramento do trabalhador "boia-fria" no regime da Previdência Social
Inicialmente, destaco que o fato de o trabalhador rural qualificar-se como "boia-fria" (ou volante, ou diarista) não nos induz a concluir que o mesmo esteja inserido em uma específica e determinada relação de trabalho, a apontar para uma determinada forma de vinculação à Previdência Social, e que, portanto, o classifique automaticamente em uma das espécies de segurado elencadas nos incisos do artigo 11 da Lei 8.213/91.
Com efeito, sob a denominação genérica de "boia-fria" - expressão que não foi cunhada no universo jurídico e que tem sido objeto de estudo de diversos ramos das ciências sociais e humanas - encontram-se trabalhadores rurais que exercem sua atividade sob diversas formas, seja como empregados, como trabalhadores eventuais, ou como empreiteiros. (OLIVEIRA, Oris. Criança e Adolescente: O Trabalho da Criança e do Adolescente no Setor Rural. In: BERWANGER, Jane Lúcia Wilhelm. Previdência Rural e Inclusão Social. Curitiba: Juruá, 2007, p. 90).
Certo é que os "boias-frias" constituem, em regra, a camada mais pobre dentre os trabalhadores rurais. Diversamente dos segurados especiais, eles não têm acesso a terra, trabalhando para terceiros, vendendo sua força de trabalho para a execução de etapas isoladas do ciclo de produção agrícola. Contudo, diferentemente dos empregados rurais, suas relações de trabalho não se revestem de qualquer formalização, ficando à margem, no mais das vezes, dos institutos protetivos dirigidos ao trabalho assalariado.
Assim, considerando a complexidade e diversidade das relações de trabalho e de formas de organização da produção em que estão imersos, num universo em que a informalidade e a ausência de documentação são a regra (e não por culpa dos trabalhadores, diga-se de passagem), o seu efetivo e seguro enquadramento no rol de segurados da Previdência Social demandaria extensa e profunda dilação probatória, incompatível com a necessidade de efetivação dos direitos sociais mais básicos das parcelas mais pobres da população, e mesmo com as parcas condições econômicas do trabalhador para fazer frente a processo tão complexo.
Esses fatores estão subjacentes ao entendimento dominante nesta Corte, segundo a qual o trabalhador rural volante/diarista/bóia-fria é equiparado ao segurado especial quanto aos requisitos necessários para a obtenção dos benefícios previdenciários, focando-se então a questão na prova do exercício da atividade rural no respectivo período de carência. Nesse sentido: REOAC 0000600-28.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/04/2012; AC 0020938-57.2011.404.9999, Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 15/03/2012; APELREEX 0017078-48.2011.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogério Favreto, D.E. 16/02/2012).
Do caso concreto
Tendo a parte autora implementado o requisito etário em 29/04/2010 e requerido o benefício na mesma data, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 174 meses anteriores àquele marco.
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:
a) certidão de óbito de Domingos Contreiras, ocorrido em 28/01/1995, qualificado como agricultor pelo declarante, Nélio Piva, também agricultor (E1 - OUT7 - p.4);
b) declaração do STR de Campina da Lagoa - PR de exercício de atividade rural pela autora no período de 1982 a 1999 como segurada especial nas terras de Domingo Contreiras e como boia-fria de 2000 a 2010 nas terras de José Pintos dos Santos (E1 - OUT7 - p.5);
c) comprovação de pagamento de ITR da área rural de propriedade de Domingos Contreiras nos anos de 1991/1992 (E1 - OUT7 - p.7), de 1993/1994 (E1 - OUT7 - p.8), de 1995/1996 (E1 - OUT7 - p.9), de 2000/2002 (E1 - OUT7 - p.10), de 2003/2005 (E1 - OUT7 - p.11);
d) declaração da Cooperativa Agroindustrial União de que Domingos Contreiras foi cooperante entre 04/10/1982 e 27/06/1994 (E1 - OUT7 - p.13);
e) comprovante de titularidade de pensão por morte rural em nome da autora desde 28/01/1995 (E1 - OUT7 - p.21);
f) matrícula 2.656 de imóvel rural pertencente a João Pinto dos Santos (E1 - OUT7 - p.25/26);
g) certificado de cadastro de imóvel rural de propriedade de João Pinto dos Santos (E1 - OUT7 - p.29) nos anos de 2006/2009;
h) matrícula 4.129 de imóvel rural adquirido por Domingos Contreiras em 17/03/1993 (E1 - OUT7 - p.30).
Tais documentos, à exceção do listado no item b, correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento do benefício de aposentadoria rural por idade, sobretudo por tratar-se de trabalhador boia-fria.
A prova material juntada aos autos foi devidamente corroborada pela prova testemunhal colhida em audiência de instrução.
Em seu depoimento pessoal a requerente relatou que "seus pais eram lavradores. Que não possuíam propriedade, trabalhando para terceiros. Que desde pequena auxiliava os pais. Que se mudou para Cornélio Procópio quando tinha cerca de 10 anos, junto com sua família, para buscar melhores condições de trabalho, não se recordando o nome do proprietário da fazenda em que foram morar. Que em Cornélio ficaram cerca de três anos. Que depois, em Itaporã, continuaram a trabalhar como boia-fria. Que seu pai recebia percentual da produção como pagamento. Que depois disso se mudaram para Itambé, também trabalhando na roça, em cultivo de algodão. Que se casou em Itambé. Que morou lá até 1973. Que quando se casou foi morar no sítio do marido, herdado do pai dele. Que a propriedade media cerca de dez alqueires. Que na propriedade era a família de seu marido quem trabalhava. Que não havia maquinário agrícola. Que em 1973 mudaram-se para Campina da Lagoa, vendendo a propriedade anterior e adquirindo uma nova no mesmo regime de economia familiar. Que a produção era destinada ao consumo da família, sendo o excedente comercializado. Que havia uma "cerealista" na região para quem vendiam a produção. Que seu marido não se aposentou. Que seu marido faleceu com 53 anos de idade. Que quando ele faleceu a autora permaneceu residindo no local. Que seus filhos, após a maioridade, mudaram-se para a cidade. Que recebe pensão pela morte de seu marido. Que mesmo assim continuou trabalhando até o ano de 2010. Que passou a trabalhar no sítio de João. Que a área que possuía junto com os irmãos de seu marido foi vendida no ano de 1995. Que no sítio de João também trabalhava como boia-fria, residindo no local. Que começou a trabalhar como boia-fria depois de ter saído do sítio de propriedade da família de seu marido. Que no sítio de João fazia de tudo um pouco. Que morava sozinha no local. Que começou a trabalhar para João em 2000. Que em razão de sua doença cessou sua atividade e passou a residir com as filhas em Campina da Lagoa. Que não possui bens. Que junto com suas filhas mora em casa alugada".
Romilda Dalavalle Silveira respondeu que "passou a conhecer a autora em um sítio onde ela trabalhava, na região de Erveira. Que os maridos se conheciam. Que conhecia a autora "só de vista". Que a autora residia em imóvel da família do marido dela, junto com os irmãos dele. Que a área media cerca de 10 alqueires. Que plantavam arroz, feijão, milho, soja. Que não possuíam maquinário agrícola. Que acredita que a autora não mais possui aquele sítio, pois pensa que depois que o marido dela faleceu, a autora passou a trabalhar "por dia" no sítio de João. Que ali a autora fazia de tudo, cuidando da criação dos animais, da horta e da plantação. Que ela morava no local. Que ficou lá por cerca de oito ou dez anos. Que ela saiu de lá porque ficou doente e se mudou para Campina. Que não sabe como a autora sobrevive atualmente".
Antonio Martins da Silva, por sua vez, admitiu que "conhece a autora desde a época em que residiam na mesma localidade, em Erveira, onde a autora residia em um sítio da família do marido dela. Que ela trabalhava no sítio junto com eles. Que não se recorda do que plantavam nem de como comercializavam. Que o depoente saiu da região em 1987. Que depois disso, em razão de sua atividade profissional, o depoente continuou a avistar a autora na região. Que não sabe se a autora ainda mantém a propriedade daquele sítio ou se ela mora lá ainda. Que mesmo com o falecimento do marido, em 1994, a autora continuou residindo no sítio. Que ficou sabendo que a autora, após um tempo do falecimento do marido, foi residir em outro sítio. Que lá ela trabalhava "por dia". Que autora trabalha dessa forma no sítio a partir de 2000, 2001. Que não sabe se a autora possui outra fonte de renda".
José Francisco Mafra, a seu turno, referendou que "conhece a autora há muito tempo. Que a autora residia num sítio na Erveira junto com o marido. Que o marido dela faleceu e, depois disso, viu a autora na fazenda do Sargento João. Que a autora trabalhava na lavoura. Que a autora morou numa casinha no fundo da fazendo de João e trabalhava na roça. Que não faz muito tempo que a autora passou a morar na cidade, que acredita que é menos de 5 anos. Que a autora mora com a filha hoje em dia. Que a autora não está trabalhando "para fora" porque está doente".
Plínio Armindo Seemund asseverou que "conhece a autora há cerca de 20 anos. Que a conheceu na Erveira. Que ela morava com o marido dela na região. Que não sabe se a autora possuía terras lá. Que sabe que depois da morte do marido dela a autora passou a residir num sítio por cerca de 8 a 10 anos. Que plantava numa pequena área nesse sítio, que era de João Pinto. Que acredita que a autora era diarista e trabalhava para ela mesma. Que não sabe qual é a fonte de renda atual da autora".
Por fim, na qualidade de informante, José Pinto narrou que "a autora trabalhou na roça de 2000 a 2010, no sítio de João Pinto, conhecido como Sargento João. Que nesse período ela plantava um pedacinho de roça. Que a produção era dela. Que não sabe o que ela fazia com a produção. Que antes disso desconhece o que a autora fazia. Que sabe que a autora atualmente reside na cidade".
Conclusão
No caso dos autos, entendo que o conjunto probatório é suficiente a demonstrar o labor rural da autora, seja como segurada especial ou como diarista, em período suficiente a satisfazer a carência exigida para a concessão do benefício.
Não há dúvidas que a autora exerceu a agricultura em regime de economia familiar com seu falecido marido, o que é aferido pela farta documentação acostada, ratificada pelo fato de a autora ser titular de pensão por morte deferida pelo reconhecimento da qualidade de segurado especial daquele.
No ponto, o fato de a autora perceber pensão por morte desde 28/01/1995 não afasta o seu direito à aposentação, porquanto se tratam de benefícios de pressupostos fáticos diferentes e fatos geradores de naturezas distintas, consoante resta claro do precedente abaixo colacionado:
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE E PENSÃO POR MORTE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.1. Não há como abrigar agravo regimental que não logra desconstituir os fundamentos da decisão atacada.2. Conforme entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, a lei previdenciária não impede a cumulação dos proventos de aposentadoria com a pensão por morte, tendo em vista serem benefícios com pressupostos fáticos e fatos geradores diversos.3. Agravo regimental a que se nega provimento."
(AgRg no REsp 1180036/RS, 6ª Turma, Rel. Min. Haroldo Rodrigues, DJe 28-06-2010)."
Já no que tange ao período posterior ao óbito, de igual forma, denota-se que a requerente manteve seu labor rural em terras cedidas por terceira pessoa (João Pinto dos Santos), exercendo ali sua atividade até ver-se impedida em razão de problemas de saúde.
Assim, presente início de prova material, complementada por prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial no período equivalente ao da carência, motivo pelo qual é de ser mantida a sentença de procedência, com a concessão da aposentadoria por idade rural desde o requerimento administrativo (29/04/2010).
Consectários
Juros Moratórios e Correção Monetária.
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014 - grifei).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, não prevalecendo os índices eventualmente fixados na fase de conhecimento, ocasião em que provavelmente já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos juros e da correção monetária, restando prejudicado o recurso e a remessa necessária no ponto.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do CPC/2015, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado, conforme definidos nas Súmulas nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p.único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado. Prazo: 45 dias.
Observo já ter havido a comprovação da implantação do benefício pelo INSS diante da antecipação da tutela deferida pelo juízo a quo (E1 - OUT33 - p.15).
Prequestionamento
Consideram-se prequestionados os artigos 1º-F da Lei 9.494/97, artigos 100, §12, e 102, I, 'l' e §2º da Constituição Federal.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, mantendo a decisão do juízo monocrático no sentido de conceder o benefício de aposentadoria rural por idade, a contar da data do requerimento administrativo (29/04/2010), bem como, de ofício, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, julgando prejudicada a remessa oficial, no ponto.
É o voto.
Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/09/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5034739-76.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00013877220118160057
RELATOR | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Juarez Mercante |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | TEREZINHA BERTASSOLI CONTREIRAS |
ADVOGADO | : | EDSON DAL POZ JUNIOR |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/09/2016, na seqüência 418, disponibilizada no DE de 30/08/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, MANTENDO A DECISÃO DO JUÍZO MONOCRÁTICO NO SENTIDO DE CONCEDER O BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE, A CONTAR DA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO (29/04/2010), BEM COMO, DE OFÍCIO, DIFERIR PARA A FASE DE EXECUÇÃO A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS, JULGANDO PREJUDICADA A REMESSA OFICIAL, NO PONTO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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