APELAÇÃO CÍVEL Nº 5025401-78.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ELIZABETH SOUZA |
ADVOGADO | : | MORGANA IGLESIAS COSTA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. BOIA-FRIA. TRABALHO URBANO DE MEMBRO DO GRUPO FAMILIAR. EFEITOS. REQUISITOS NÃO CUMPRIDOS. AVERBAÇÃO.
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. "O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)" - RESP n.º 1.304.479. No caso, o valor da aposentadoria por tempo de contribuição percebida pelo cônjuge indica que os rendimentos decorrentes do labor rurícola são mero complemento à renda familiar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e ao recurso do INSS para negar o pedido de aposentadoria por idade rural, reconhecendo o exercício de labor rural como segurado especial de 25/01/71 a 03/12/77, bem como, de ofício, determinar o imediato cumprimento do julgado no tocante à averbação, para fins de futura concessão de benefício, exceto para efeitos de carência, independentemente de recolhimento das contribuições previdenciárias, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de agosto de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8464002v3 e, se solicitado, do código CRC 24061C7C. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5025401-78.2016.4.04.9999/PR
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença publicada na vigência do CPC/73, em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural à parte autora, em razão do exercício do labor rural como boia-fria, condenando o INSS ao pagamento das parcelas vencidas e dos honorários de 10% sobre o valor da condenação, bem como determinando que, não tendo ocorrido o requerimento administrativo, o cálculo da correção e dos juros se inicie a partir da citação, e caso ocorrido, a partir do referido requerimento.
Em suas razões de apelação a Autarquia Previdenciária sustentou, em síntese (a) a ausência de comprovação do efetivo exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mesmo que de forma descontínua; (b) que a principal fonte de renda da família é o labor urbano do cônjuge, o qual recebe aposentadoria por tempo de contribuição em valor superior a R$ 4.000,00 e (c) pré-questionou os artigos 55, §3º da Lei de Benefícios, art. 3º da Lei 11.718/2008, e o inciso LV do artigo 5º da CF.
Processado, subiram os autos a esta Corte.
É o sucinto relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente a recurso interposto e remessa oficial em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Conforme já referido linhas acima, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73, inaplicável o disposto no art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a aposentadoria por idade rural: a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (artigo 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91); b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício.
Quando implementadas essas condições, aperfeiçoa-se o direito à aposentação, sendo então observado o período equivalente ao da carência na forma do art. 142 da Lei nº 8.213/91 (ou cinco anos, se momento anterior a 31/08/94, data de publicação da MP nº 598, que modificou o artigo 143 da Lei de Benefícios), considerando-se da data da idade mínima, ou, se então não aperfeiçoado o direito, quando isto ocorrer em momento posterior, especialmente na data do requerimento administrativo, tudo em homenagem ao princípio do direito adquirido, resguardado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91.
O benefício de aposentadoria por idade rural será, em todo caso, devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp nº 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. nº 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp nº 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Do trabalho rural como segurado especial
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do enquadramento do trabalhador "boia-fria" no regime da Previdência Social
Inicialmente, destaco que o fato de o trabalhador rural qualificar-se como "boia-fria" (ou volante, ou diarista) não nos induz a concluir que o mesmo esteja inserido em uma específica e determinada relação de trabalho, a apontar para uma determinada forma de vinculação à Previdência Social, e que, portanto, o classifique automaticamente em uma das espécies de segurado elencadas nos incisos do artigo 11 da Lei 8.213/91.
Com efeito, sob a denominação genérica de "boia-fria" - expressão que não foi cunhada no universo jurídico e que tem sido objeto de estudo de diversos ramos das ciências sociais e humanas - encontram-se trabalhadores rurais que exercem sua atividade sob diversas formas, seja como empregados, como trabalhadores eventuais, ou como empreiteiros. (OLIVEIRA, Oris. Criança e Adolescente: O Trabalho da Criança e do Adolescente no Setor Rural. In: BERWANGER, Jane Lúcia Wilhelm. Previdência Rural e Inclusão Social. Curitiba: Juruá, 2007, p. 90).
Certo é que os "boias-frias" constituem, em regra, a camada mais pobre dentre os trabalhadores rurais. Diversamente dos segurados especiais, eles não têm acesso a terra, trabalhando para terceiros, vendendo sua força de trabalho para a execução de etapas isoladas do ciclo de produção agrícola. Contudo, diferentemente dos empregados rurais, suas relações de trabalho não se revestem de qualquer formalização, ficando à margem, no mais das vezes, dos institutos protetivos dirigidos ao trabalho assalariado.
Assim, considerando a complexidade e diversidade das relações de trabalho e de formas de organização da produção em que estão imersos, num universo em que a informalidade e a ausência de documentação são a regra (e não por culpa dos trabalhadores, diga-se de passagem), o seu efetivo e seguro enquadramento no rol de segurados da Previdência Social demandaria extensa e profunda dilação probatória, incompatível com a necessidade de efetivação dos direitos sociais mais básicos das parcelas mais pobres da população, e mesmo com as parcas condições econômicas do trabalhador para fazer frente a processo tão complexo.
Esses fatores estão subjacentes ao entendimento dominante nesta Corte, segundo a qual o trabalhador rural volante/diarista/boia-fria é equiparado ao segurado especial quanto aos requisitos necessários para a obtenção dos benefícios previdenciários, focando-se então a questão na prova do exercício da atividade rural no respectivo período de carência. Nesse sentido: REOAC 0000600-28.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/04/2012; AC 0020938-57.2011.404.9999, Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 15/03/2012; APELREEX 0017078-48.2011.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogério Favreto, D.E. 16/02/2012).
Do caso concreto
Tendo a parte autora implementado o requisito etário em 25/01/2014 e requerido o benefício em 24/03/2015, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 meses anteriores aos respectivos marcos indicados.
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:
a) segunda via da certidão de seu casamento contraído em 04/12/77 com Helio Pereira de Souza, este qualificado como funcionário público e a autora como "da lavoura";
b) sua certidão de nascimento, onde consta que seu genitor era lavrador;
c) ficha de atendimento médico onde consta sua ocupação como lavradora;
d) carteira de associado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Guairaçá/PR, em nome de seu pai, admitido em 24/01/84, além de recibo de mensalidade e ficha de inscrição e
e) cadastros em estabelecimentos comerciais.
O INSS, por sua vez, instruiu a contestação com o extrato do benefício de aposentadoria Por Invalidez Previdenciária do cônjuge, com DIB em 04/03/2006, indicando que em 07/2015 recebeu R$ 4.087,96, e, ainda, com o relatório do CNIS, onde consta que trabalhou de 1976 a 2002 na Companhia de Saneamento do Paraná - SANEPAR (evento nº 11).
Em audiência de instrução realizada em 01/12/2015 foi colhido o depoimento de 03 (três) testemunhas, nos seguintes termos:
Sr. Aparecido Dolme relatou: que trabalharam juntos nas fazendas Matão, (...), Espigão, Tabajara; que o marido dela não trabalha na roça; que atualmente ela continua trabalhando; que desde solteira, com 16 anos, ela trabalhava na roça com o depoente; que a diária gira em torno de R$50,00; que há 15 dias a autora trabalhou com o depoente carpindo mandioca.
Sr. Alcides Munhoz Marques relatou: que conhece a autora há uns quarenta anos; que a conheceu trabalhando num sítio vizinho, onde seus pais tocavam café; que ela trabalhava no café, com os pais, e depois que casou, ela trabalhou como diarista; ela trabalhou com o depoente, o qual é encarregado de turma no Guairaçá; que ela trabalhou na fazenda Cubrico, do Grupo Bradesco, fazenda Ouro Verde, onde ela carpia mandioca, na fazenda São João, em plantação de grama; que o marido da autora não trabalhou com o depoente; que na semana atrasada a autora trabalhou com o depoente; que faz uns 25 anos que o depoente trabalha como encarregado e nesse período ela sempre trabalhou na roça; que o marido da autora trabalha na cidade, mas mesmo assim, a autora sempre pedia serviço para o depoente; que a diária, da semana passada pra cá passou a R$ 55,00, mas o depoente vinha pagando R$ 50,00.,
Sr. Benedito José Martiliano declarou: que conhece a autora do Guairaçá, trabalhou com a autora até uns dez anos atrás, pois ambos eram boias-frias; que trabalharam juntos na Figueira, na Fazenda Paranavaí e na Canaã; que a autora carpia café e hoje é mandioca; que o marido da autora é encostado, a autora trabalhava para ajudar o marido; que até o ano passado o depoente via a autora trabalhando; que hoje o depoente trabalha na roça ainda, mas para si, não mais para os outros; que viu a autora trabalhando na fazenda Boa Esperança; que viu ela trabalhando com o Munhoz, com o Cido; que a diária do boia-fria hoje é de R$50,00; que mesmo quando o marido trabalhava na cidade a autora trabalhava como boia-fria para ajudar.
Conclusão
Quanto ao período em que a autora laborou no meio rural juntamente com seus pais, os documentos juntados correspondem ao início de prova material exigido, o qual foi devidamente corroborado pela prova testemunhal colhida em audiência de instrução, de sorte que deve ser reconhecida a sua qualidade de segurada especial no período (25/01/71 a 03/12/77).
Outrossim, em relação ao período de carência, com início em 1999 até a data da implementação do requisito etário (2014), não se tem pelos documentos juntados aos autos uma convicção plena no sentido de que, de fato, pode ser considerada segurada especial já que os proventos recebidos pelo cônjuge, enquanto funcionário público, seriam suficientes para o sustento da família.
É assente nesta Corte que o exercício de atividade urbana por integrante do núcleo familiar não tem o condão de descaracterizar, por si só, a condição de segurado especial em regime de economia familiar da parte autora, sempre que o trabalho agrícola for indispensável à sobrevivência dos membros do grupo familiar com um mínimo de dignidade.
No caso concreto, observa-se que os proventos de aposentadoria percebidos pelo marido da demandante - R$ 4.087,96 em 07/2015 (evento nº 11) podem ser considerados suficientes para a manutenção do grupo familiar, o que descaracteriza sua condição de segurada especial, já que ausente o caráter de essencialidade dos rendimentos auferidos como boia-fria, tornando tais rendimentos mero complemento à renda familiar.
Assim, é de ser reformada a sentença que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, devendo ser parcialmente provido o recurso de apelação do INSS, cabendo-lhe, contudo, averbar o período em que a autora exerceu labor rural em regime de economia familiar anteriormente ao casamento - de 25/01/71 a 03/12/77.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do NCPC, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Assim, considerando que ambas as partes foram parcialmente vencidas, ficam compensados os honorários sucumbenciais.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo Código de Processo Civil, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à averbação do período de labor rural ora reconhecido. Prazo: 45 dias.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Pré-questionamento
Dou por pré-questionados os artigos 55, §3º da Lei de Benefícios, art. 3º da Lei 11.718/2008, e o inciso LV do artigo 5º da CF, referidos pelo INSS em seu recurso de apelação.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à remessa oficial e ao recurso do INSS para negar o pedido de aposentadoria por idade rural, reconhecendo o exercício de labor rural como segurado especial de 25/01/71 a 03/12/77, bem como, de ofício, determinar o imediato cumprimento do julgado no tocante à averbação, para fins de futura concessão de benefício, exceto para efeitos de carência, independentemente de recolhimento das contribuições previdenciárias.
É o voto.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8464001v4 e, se solicitado, do código CRC 1318D0A8. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5025401-78.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00014493420158160167
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ELIZABETH SOUZA |
ADVOGADO | : | MORGANA IGLESIAS COSTA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 10/08/2016, na seqüência 832, disponibilizada no DE de 26/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E AO RECURSO DO INSS PARA NEGAR O PEDIDO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL, RECONHECENDO O EXERCÍCIO DE LABOR RURAL COMO SEGURADO ESPECIAL DE 25/01/71 A 03/12/77, BEM COMO, DE OFÍCIO, DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO JULGADO NO TOCANTE À AVERBAÇÃO, PARA FINS DE FUTURA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO, EXCETO PARA EFEITOS DE CARÊNCIA, INDEPENDENTEMENTE DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8520156v1 e, se solicitado, do código CRC A31E5EE4. | |
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