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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHO URBANO DO CÔNJUGE. TEMPO RURAL. DESCONTINUIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCI...

Data da publicação: 07/07/2020, 05:35:03

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHO URBANO DO CÔNJUGE. TEMPO RURAL. DESCONTINUIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADO. 1. A comprovação do exercício de atividade rural deve-se realizar na forma do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal idônea. 2. O exercício de atividade urbana pelo cônjuge da demandante não impede o reconhecimento do labor rurícola desta, especialmente se não restou comprovado que os ganhos do cônjuge com o trabalho urbano pudessem colocar em segundo plano os rendimentos auferidos na atividade rural da requerente para a subsistência da família. 3. A descontinuidade do labor rurícola permite afastamentos do campo sem que haja a desqualificação como segurado especial, desde que o conjunto probatório demonstre haver um retorno efetivo às lides campesinas. 4. Cumprido o requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e comprovado o exercício de atividade rural durante o período exigido em lei, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo. (TRF4, AC 5003821-84.2019.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, juntado aos autos em 08/08/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003821-84.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: CARMEM BIANCHIN

ADVOGADO: RAFAEL PLENTZ GONÇALVES (OAB RS062492)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSS contra sentença publicada na vigência do novo CPC, cujo dispositivo tem o seguinte teor:

Diante do exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do CPC, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por CARMEM BIANCHIN FOIATTO em face de INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para o fim de RECONHECER o período de 01/01/1979 a 31/12/1980, 01/01/1986 a 31/12/1986, 01/01/1991 a 31/12/1991, 01/01/1993 a 17/11/1995, 01/01/2003 a 14/04/2016 como laborado pelo autor em regime de economia familiar e, como consequência, determinar que o réu proceda na averbação do período reconhecido. Condeno a parte autora ao pagamento de 50% das custas e a honorários ao INSS em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§2º e 3º, do CPC; suspensa, todavia, a exigibilidade, pois litiga sob o pálio da gratuidade da justiça. Quanto ao restante das custas (50%), considerando que a presente ação foi ajuizada em 20/03/2017 aplicável a Lei Estadual nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais e isentou a União, os Estados, os Municípios, os Territórios Federais, o Distrito Federal e as respectivas autarquias e fundações do pagamento da taxa nos processos ajuizados a partir de 20/03/2017. Orientação do Ofício-Circular nº 060/2015-CGJ. Embora não pague taxa única, deverá suportar as despesas dos processos. Sentença não sujeita ao reexame necessário. Registre-se. Publique-se. Intimem-se.

Em suas razões recursais, a parte autora alega que preenche os requisitos necessários à concessão da aposentadoria por idade rural, pois comprova tempo de atividade rural suficiente para completar a carência do benefício, com a consideração de períodos descontínuos.

Por sua vez, o INSS recorre, sustentando que a parte autora não comprova a qualidade de segurada especial, tendo em vista que seu esposo possui vínculos urbanos contínuos no CNIS, desde 1995.

Com as contrarrazões da parte autora, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

As apelações preenchem os requisitos legais de admissibilidade.

Aposentadoria por Idade Rural

O exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ. Trata-se de exigência que vale tanto para o trabalho exercido em regime de economia familiar quanto para o trabalho exercido individualmente.

O rol de documentos do art. 106 da LBPS não é exaustivo, de forma que documentos outros, além dos ali relacionados, podem constituir início de prova material, que não deve ser compreendido como prova plena, senão como um sinal deixado no tempo acerca de fatos acontecidos no passado e que agora se pretendem demonstrar, com a necessária complementação por prova oral.

Não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).

Saliento que, em recente decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos, firmou-se entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.

2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).

3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.

4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.

5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a

alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.

6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.

7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.

(REsp 1.348.633/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Primeira Seção, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014).

Caso Concreto

No caso em tela, a parte autora atingiu o requisito etário em 29-03-2015 e formulou o requerimento de aposentadoria por idade rural em 14-04-2016. Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou à entrada do requerimento administrativo ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.

Para comprovar o exercício de atividade rural nos períodos de 01/01/1979 a 31/12/1980, 01/01/1986 a 31/12/1986, 01/01/1991 a 31/12/1991, 01/01/1993 a 17/11/1995, 01/01/2003 a 14/04/2016 , a parte autora trouxe aos autos os seguintes documentos (Evento 3 - ANEXOS_PET4):

a) certidão de casamento, em que a profissão do cônjuge é agricultor datado em 1995 (fl. 31);

b) escritura de imóvel rural em nome do genitor da autora (fl. 33/34);

c) certidão de casamento dos pais, em que consta profissão agricultor datado em 1959 (fl. 35);

d) certidão de casamento de irmãos, em que consta a profissão de agricultores datado em 1959 (fl. 36/37);

e) certidão de óbito da genitora da autora, em que consta profissão agricultora e endereço rural em 2013 (fl. 38);

f) histórico escolar rural em nome próprio e de irmãos datado em 1969, 1971, 1972, 1973, 1983, 1984 (fl.39/42);

g) contrato de comodato em nome da autora de 2002 em diante (fl. 43/45);

h) escritura de imóvel rural do arrendante (fl.49/50);

i) notas de produtor rural em nome do genitor da autora datado em 1972, 1973, 1974, 1975, 1976, 1977, 1978, 1981, 1982, 1983, 1984, 1985, 1986, 1987, 1988, 1989, 1990, 1992 (fl. 51/83);

j) notas de produtor rural em nome próprio datada em 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016 (fl. 85/112);

k) CNIS do INSS em nome próprio, que atesta ausência de vínculos urbanos (fl.113).

Em Audência, realizada em 08-02-2018, foram ouvidas três testemunhas (evento 3, AUDIÊNCI11), cujos depoimentos confirmaram o exercício de atividade rural, por parte do demandante, desde quando ainda era criança, conforme se verifica do resumo extraído da sentença.

Segundo a testemunha Gertrudes Tosatti Menegussi, conheceu a autora na Comunidade São Miguel, no interior de Marau. Afirmou que a autora morava com os pais e os irmãos, que os pais tinham terras e que todos trabalham na agricultura. Referiu que a família não tinha outros ganhos além da agricultura. Afirmou que a autora sempre trabalhou com pais, começou a trabalhar desde criança e continuou até o casamento. Afirmou também que plantavam milho, soja, feijão mantimentos e que era para consumo e que o excedente era vendido. Afirmou que não tiveram empregados e nem arredavam terras.
No mesmo sentido, foi o depoimento da testemunha Edite Maria Grando Gaevski :
(…) A justificante nunca teve terra própria, ela sempre trabalhou em terras(um pedaço somente de terra meio grande, plana, sem mato, sem potreiro) arredada do Celso Piano até a presente data. A gente via ela plantar, limpar, colher, o que era para vender da sobra, ela vendia e o resto ela segurava para as 2 duas ou 3 três vacas, terneiro, sempre tinha 1 ou 2 porcos só para o gasto da casa, galinha. Sempre enxergou ela ir plantar e após vendia soja, trigo, e milho para o silo dos Trentini que era o forte, era o mais próximo a 1km e ela vende lá até agora sendo que o silo vinha buscar em casa. Ela sempre plantou milho, soha, trigo desde o primeiro ano de casada em todos os anos até hoje. Esse pedaço de terra de milho, soja, trigo é bem grande, não sabe como dizer o tamanho, nunca perguntou quando ela colhia de milho, soja, trigo. Viu ela colhendo a mão o milho, soja, trigo desde casada até a presente data. O celso não ajudava ela a colher manual. Nesse 24 a 25 anos, ela pagava por hora para o dono da terra lavrar a terra com máquina de trator. Após o dono preparar a terra, ela plantava a mão com máquina de colono, ela sempre foi capinar bastante, colhia a mão e ajuda do marido quando podia. Não sabe quando que a justificante tinha que pagar de arrendamento e tem certeza que ela era arrendatária de terra. Sem ajuda de vizinhos. Não sabe quantos sacos de milho, soja, trigo, ela colhe, acha que ela colhe uma média produção. As vezes, ela vendia uns quilos de amendoim, pipoca, batata doce para algum vizinho. A maioria dos animais era para o gasto. O esposo era empregado na empresa. As móveis cidade de Santo Antônio do Palma por 22 a 23 anos atrás e quando era feriado e nos sábado , ele sempre ia ajudar a Carmem na roça. A Justificante não era empregada somente exercia atividade rural. Ela teve uma menina Carla que se formou agora. Ela teve bloco de notas de produtor rural casada. Não sabe se a justificante vendia milho, soja, trigo, em outro lugar que não fosse o silo dos Trentinis nesse 24 a 25 anos. Não sabe se vendeu soja, milho, ou trigo para vizinhos. Vizinhos eram Jair Perin e Lauro Gatto nesse 24 a 25 anos. O advogado pediu para perguntar se a Cramen tinha empregados e a depoente disse que não. O advogado perguntou a distância da casa de Carmen e da terra e a depoente disse que era 1 Km, ela sempre ia a pé. O advogado perguntou a distância em se ela parasse de trabalhar na roça ela ira conseguir sobreviver? E depoente disse que não. A Carnem é conhecida na sociedade como agricultora? A depoente disse que sim. O advogado pediu para perguntar ela alguma vez pagou para alguém para ajudar (...)” - grifei

No mesmo sentido, foi o depoimento da testemunha Delcino Gabriel Andretta e Moacir Ebone (fls. 182 e 170-CD).

Denota-se, dos documentos juntados aos autos pelo INSS, que o marido da requerente exerceu labor urbano, a partir de 1995, em empresas moveleiras. Entretanto, tal fato, por si só, não é suficiente para descaracterizar a condição de segurada especial da demandante. Observa-se, do conjunto probatório, que a requerente exerceu atividade agrícola, juntamente com seus pais, entre 1972 e 1995 e, após, trouxe aos autos início material em nome próprio que, aliado à prova testemunhal, dá conta do labor rural no interregno de 2003 a 2016. Ademais, não restou demonstrado que a renda proveniente do trabalho urbano do marido era suficiente para tornar desnecessária a atividade rural desempenhada pela autora.

Assim, a sentença deve ser confirmada para reconhecer o exercício de labor rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 01/01/1979 a 31/12/1980, 01/01/1986 a 31/12/1986, 01/01/1991 a 31/12/1991, 01/01/1993 a 17/11/1995, 01/01/2003 a 14/04/2016.

No tocante à descontinuidade do labor rurícola, somente um longo período de afastamento da atividade, com sinais de saída definitiva do meio rural, poderia anular todo histórico de trabalho rural da recorrente. Apenas quando se identifica que não se trata de propriamente um regresso ao meio campesino, mas uma mudança do trabalhador, da cidade para o campo, estrategicamente provocada para fins de obtenção de benefício previdenciário, é que se torna inviável o manejo da cláusula de descontinuidade prevista no art. 143 da Lei de Benefícios.

Dessa forma, havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, é que poderá ser admitida a descontinuidade nos termos acima propostos.

Nessa esteira, os seguintes precedentes desta Corte:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. DESCONTINUIDADE. 1. É devido o benefício de aposentadoria rural por idade, nos termos dos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/1991, independentemente do recolhimento de contribuições quando comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e cinquenta e cinco anos para a mulher) e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, mediante início de prova material complementada por prova testemunhal idônea. 2. O artigo 145 da IN 45/2010, do INSS, estabelece tão somente dois pressupostos para a concessão de aposentadoria por idade rural no caso de comprovação de desempenho de atividade urbana entre períodos de atividade rural, com ou sem perda da qualidade de segurado: (a) completar o número de meses igual ao período de carência exigido para a concessão do benefício e (b) esteja em efetivo exercício da atividade rural à época do requerimento administrativo. 3. Hipótese em que a parte autora preencheu os requisitos necessários à concessão do benefício. (APELRE Nº 0014262-20.2016.404.9999, 5ª Turma, Relator Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 08/03/2017)

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AVERBAÇÃO. DESCONTINUIDADE. CONCESSÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 11.960/2009. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE PRÓPRIA (EXECUÇÃO). 1. O período rural é reconhecido através de início de prova material corroborada pelas testemunhas arroladas. 2. Preenchidos os requisitos legais, a parte autora faz jus à aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo. 3. A descontinuidade do labor rurícola permite afastamentos do campo sem que haja a desqualificação como segurado especial, desde que o conjunto probatório demonstre haver um retorno efetivo às lides campesinas. 4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei nº 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. (AC Nº 0003655-45.2016.404.9999, 6ª Turma, Rel. Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR, D.E. 09/03/2017)

Assim, o desempenho de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo (de 01/01/2003 a 14/04/2016) demonstra que a parte autora inequivocamente retornou às lides rurícolas, readquirindo a sua qualidade de segurada especial, razão pela qual deve ser admitido o direito à contagem dos períodos descontínuos anteriores (de 01/01/1979 a 31/12/1980, 01/01/1986 a 31/12/1986, 01/01/1991 a 31/12/1991, 01/01/1993 a 17/11/1995).

Portanto, somando-se os períodos em que a parte autora desempenhou atividades rurais, restou preenchida a carência necessária (180 meses) para a concessão do benefício.

Preenchidos os requisitos - idade exigida (completou 55 anos em 29-03-2015) e exercício de atividades rurícolas por tempo superior à carência, deve ser reformada a sentença, concedendo-se à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo (14-04-2016).

Correção monetária

A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e serácalculada pelos seguintes índices oficiais:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;

- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.

A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.

Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização,deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja,o INPC.

Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.

A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.

Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos dedeclaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".

Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável - INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios. Se esta fase tiver início antes da decisão, deverá ser utilizada, provisoriamente, a TR, sem prejuízo de eventual complementação.

Juros de mora

Os juros de mora devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).

Honorários Advocatícios

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Considerando o provimento do recurso da parte autora, estabeleço a verba honorária, a cargo unicamente do INSS, em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.

Custas e despesas processuais

O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).

Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Prequestionamento

O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.

Conclusão

- provido o recurso da parte autora para conceder-lhe o benefício de aposentadoria por idade rural, a contar do requerimento administrativo.

- apelo do INSS desprovido;

- ônus da sucumbência a cargo do INSS;

- determinada a imediata implantação do benefício.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora, negar provimento ao recurso do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão.



Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001195204v13 e do código CRC 52dda3c2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Data e Hora: 8/8/2019, às 21:50:43


5003821-84.2019.4.04.9999
40001195204.V13


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:35:02.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003821-84.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: CARMEM BIANCHIN

ADVOGADO: RAFAEL PLENTZ GONÇALVES (OAB RS062492)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. trabalho urbano do cônjuge. TEMPO RURAL. DESCONTINUIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADO.

1. A comprovação do exercício de atividade rural deve-se realizar na forma do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal idônea.

2. O exercício de atividade urbana pelo cônjuge da demandante não impede o reconhecimento do labor rurícola desta, especialmente se não restou comprovado que os ganhos do cônjuge com o trabalho urbano pudessem colocar em segundo plano os rendimentos auferidos na atividade rural da requerente para a subsistência da família.

3. A descontinuidade do labor rurícola permite afastamentos do campo sem que haja a desqualificação como segurado especial, desde que o conjunto probatório demonstre haver um retorno efetivo às lides campesinas.

4. Cumprido o requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e comprovado o exercício de atividade rural durante o período exigido em lei, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a contar da data do requerimento administrativo.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, negar provimento ao recurso do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 07 de agosto de 2019.



Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001195205v2 e do código CRC 49f51fc2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Data e Hora: 8/8/2019, às 21:50:43

5003821-84.2019.4.04.9999
40001195205 .V2


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:35:02.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual ENCERRADA EM 07/08/2019

Apelação Cível Nº 5003821-84.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

APELANTE: CARMEM BIANCHIN

ADVOGADO: MAURICIO FERRON

ADVOGADO: RAFAEL PLENTZ GONÇALVES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual encerrada em 07/08/2019, na sequência 761, disponibilizada no DE de 19/07/2019.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:35:02.

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