APELAÇÃO CÍVEL Nº 5035805-28.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LORACI FLORES DE LIMA |
APELANTE | : | MARIA DO CARMO SANTOS |
ADVOGADO | : | JOÃO JOSÉ MENESES BULHÕES FERRO |
: | ROGÉRIO RAIZI BELICE | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL BÓIA FRIA. NECESSIDADE DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL, AINDA QUE MITIGADO.
Para fins de obtenção do benefício de aposentadoria por idade, o trabalhador rural bóia fria deve apresentar um início de prova material, ainda que de forma mitigada, para confortar as alegações das testemunhas.
Hipótese em que o depoimentos dos informantes são manifestamente inconsistentes em face das afirmações prestadas em sede de depoimento pessoal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de junho de 2017.
Loraci Flores de Lima
Relator
| Documento eletrônico assinado por Loraci Flores de Lima, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9014773v5 e, se solicitado, do código CRC 95104416. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5035805-28.2015.4.04.9999/PR
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural, entendendo que a autora não comprovou o exercício da atividade rural durante o período de carência.
Sustenta a recorrente, em síntese, que preenche os requisitos necessários à concessão do benefício.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de demanda previdenciária objetivando a concessão de APOSENTADORIA POR IDADE RURAL, prevista no artigo 48, § 1º e seguintes, da Lei 8.213/91.
Premissas
Quanto ao reconhecimento do tempo de serviço rural, as premissas são as seguintes:
a) a possibilidade de extensão da prova material para período anterior ao documento mais antigo (REsp 1.348.633, Rel. Min. Arnaldo Esteves, j. 28/08/2013);
b) A presunção de continuidade do tempo de serviço rural no período compreendido entre os documentos indicativos do trabalho rural no período abrangido pela carência. Neste sentido, Moacyr Amaral Santos faz referência à teoria de Fitting, segundo a qual presume-se a permanência de um estado preexistente, se não for alegada a sua alteração, ou, se alegada, não tiver sido feita a devida prova desta. Amaral Santos, citando Soares de Faria na síntese dos resultados obtidos por Fitting, pontifica que "só a afirmação de uma mudança de um estado anterior necessita de prova, que não a permanência do mesmo: affirmanti non neganti incumbit probatio" (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983. v. 1, p. 102);
c) A ampliação da abrangência do início de prova material pertinente ao período de carência a períodos anteriores ou posteriores à sua datação, desde que complementado por robusta prova testemunhal, uma vez que "não há exigência de que o início de prova material se refira a todo o período de carência, para fins de aposentadoria por idade do trabalhador rural" (AgRg no AREsp 194.962/MT), bem como que "basta o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória" (AgRg no AREsp 286.515/MG), entendimentos esses citados com destaque no voto condutor do acórdão do REsp nº 1349633 - representativo de controvérsia que consagrou a possibilidade da retroação dos efeitos do documento tomado como início de prova material, desde que embasado em prova testemunhal. Vide recentes julgados da Terceira Seção do STJ: AR 4.507/SP, AR 3.567/SP, EREsp 1171565/SP, AR 3.990/SP e AR 4.094/SP;
d) a inviabilidade de comprovação do labor rural através de prova exclusivamente testemunhal (REsp 1133863/RN, Rel. Ministro CELSO LIMONGI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011);
e) segundo a jurisprudência da 3ª Seção deste Regional, a utilização de maquinário e eventual de diaristas não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente. (TRF4, EINF 5023877-32.2010.404.7000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 18/08/2015);
f) a admissão, como início de prova material e nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, de documentos de terceiros, membros do grupo parental;
g) o fato de que o tamanho da propriedade rural não é, sozinho, elemento que possa descaracterizar o regime de economia familiar desde que preenchidos os demais requisitos (REsp 1403506/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013);
h) segundo a Lei nº 12.873/2013, que alterou, entre outros, o art. 11 da LB, "o grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que trata a alínea g do inciso V do caput, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o período de afastamento em decorrência da percepção de auxílio-doença". Deixou-se de exigir, assim, que a contratação ocorresse apenas em épocas de safra (ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JR., José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. São Paulo: Altas, 2015, p. 63);
i) de acordo com a jurisprudência do STJ, o exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial. No entanto, não se considera segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014);
j) o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (AgRg no AREsp 327.119/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015);
l) no que tange ao trabalho do boia-fria, o STJ, por meio, entre outros, do REsp 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, abrandou as exigências quanto ao início de prova material da atividade rural, desde que complementada através de idônea prova testemunhal;
m) o segurado especial tem de estar trabalhando no campo quando completar a idade mínima para obter a aposentadoria rural por idade, momento em que poderá requerer seu benefício, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, já preencheu de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos - carência e idade. (STJ, REsp 1354908, 1ª Seção, Tema 642/recurso repetitivo).
Exame do caso concreto:
No caso em tela, a parte autora atingiu o requisito etário em 20/09/2009 e formulou o requerimento de aposentadoria por idade rural em 19/07/2011. Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 168 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou 180 meses anteriores à entrada do requerimento administrativo ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Ao examinar a questão, assim decidiu o juízo de Primeiro Grau, verbis:
É necessário analisar se a autora preencheu os demais requisitos, ou seja, o exercício da atividade rural nos últimos 168 (cento o sessenta e oito) meses, mesmo que descontinuamente, contados da data do requerimento administrativo.
Nesse particular, a autora trouxe como início de prova material os seguintes documentos:
a) Certidão de óbito de João Padovan no ano de 2003 a qual a qualifica como agricultora (ato seq. 1.7, fl. 09).
b) Declaração assinada por João Pavan afirmando que vivia com a autora desde 1993 (ato seq. 1.9, fl. 03).
c) Notas fiscais em nome de João Pavan nos anos de 1997 (ato seq. 1.9, fls. 05/07 e 13).
d) Notas fiscais em nome da autora em 2004 (ato seq. 1.9, fl. 15), 2005 (ato seq. 1.10, fls. 01 e 03).
Por sua vez, o documento juntado no ato seq. 1.10, fls. 05/11, ficha cadastral do departamento de saúde da prefeitura local, não pode servir como início de prova material, por ter sido produzido unilateralmente pelas alegações da própria autora.
A corroborar a documentação encartada aos autos, no depoimento pessoal prestado, relatou que começou a trabalhar com 12 (doze) anos com seus pais, em uma terra que era deles, onde carpia soja e milho. Contou que com 17 anos se casou de foi morar na cidade passando a trabalhar de boia-fria, alegou que mesmo depois que seu esposo faleceu, continuou trabalhando até 05 (cinco) anos atrás.
Por sua vez, Osnil Lulu, que foi ouvido como informante, relatou que a autora morou em uma chácara perto da cidade por uns 20 (vinte) anos, e mesmo após seu esposo falecer, ela ficou lá mais uns 05 anos. Contou que a autora e seu esposo plantavam milho, soja e trigo nessa chácara de 01 (um) alqueire).
A sra. Maria de Lourdes, também ouvida como informante, disse que a autora trabalhava no meio rural. Afirmou que a autora tinha uma chácara onde trabalhava junto com seu esposo. Assegurou ainda, que a autora trabalhava apenas na chácara.
Sendo assim, é notável que os depoimentos foram controversos, tendo em vista que a autora alega ter trabalhado como boia-fria e as testemunhas afirmam que a autora trabalhava em uma chácara com seu esposo. Verifica-se também que as provas materiais são fracas.
Sobre o tema o Egrégio Tribunal Federal da 4ª Região, já decidiu:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. BENEFÍCIO INDEFERIDO. Não estando comprovado o labor rural, em regime de economia familiar, no período de carência exigido em lei, indevida a concessão de aposentadoria por idade rural. (TRF4, APELREEX 0021252-95.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator Paulo Paim da Silva, D.E. 17/04/2015).
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. IDADE MÍNIMA ATINGIDA PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TRABALHO RURAL COMPROVADO. 1. Atingida a idade mínima exigida e comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, pelo período exigido em lei, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus à aposentadoria rural por idade. 2. A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é exemplificativa. Admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar. 3. Início de prova material em nome de membros do grupo familiar, que exerce atividade urbana não impede que reste configurada a condição de trabalhador rural em regime de economia familiar do requerente, nem precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental. (TRF4, APELREEX 0023861-85.2013.404.9999, Quinta Turma, Relatora Taís Schilling Ferraz, D.E. 16/05/2014) (grifos nossos).
Desta forma, o conjunto probatório constante nos autos revela extrema fragilidade das informações relativas ao exercício da atividade rural da autora mesmo que de modo descontínuo, razão pela qual a improcedência do pedido é a medida que se impõe.
Não obstante os argumentos lançados pela autora, em sede de recurso, tenho que a sentença deve ser confirmada. Explico.
Em seu depoimento pessoal a autora foi muito clara ao afirmar que após o seu casamento foi residir na cidade e que a partir daí trabalhou apenas como bóia fria, para diversos proprietários da região.
Tal afirmação, contudo, revela-se totalmente contraditória aos termos das declarações prestadas pelos informantes, que aduziram que após o casamento a demandante foi residir numa chácara de propriedade do casal, aonde teria trabalhado apenas com o marido, em regime de economia familiar.
Note-se que a demandante, que desde o ano de 1993 recebe benefício de pensão por conta do óbito do primeiro companheiro, evento 1, OUT8, apresentou documentos que podem servir como início de prova material somente até o ano de 2005, inexistindo qualquer outra confirmação de que tenha mantido a qualidade de segurado após essa data.
Assim é que, embora não se negue a origem rurícola da demandante, que parece ter exercido a atividade rural por boa parte de sua vida, não há como admitir que a autora tenha mantido a qualidade de segurada especial até a época em que completou o requisito etário e, muito menos, quando do requerimento do benefício.
Mantenho, sobre esse fundamento, a improcedência da demanda.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.
Loraci Flores de Lima
Relator
| Documento eletrônico assinado por Loraci Flores de Lima, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9014772v17 e, se solicitado, do código CRC 29347180. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/06/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5035805-28.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00024993520138160048
RELATOR | : | Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Marcus Vinícius Aguiar Macedo |
APELANTE | : | MARIA DO CARMO SANTOS |
ADVOGADO | : | JOÃO JOSÉ MENESES BULHÕES FERRO |
: | ROGÉRIO RAIZI BELICE | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/06/2017, na seqüência 902, disponibilizada no DE de 02/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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