APELAÇÃO CÍVEL Nº 5029830-25.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | ANTONIO MARTINELLI |
ADVOGADO | : | DORISVALDO NOVAES CORREIA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. AGRICULTOR. VISÃO MONOCULAR. IMPEDIMENTO LABORAL NÃO COMPROVADO.
1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
2. A jurisprudência do TRF-4 tem se posicionado no sentido de que a visão monocular, por si só, não impede o exercício da atividade de agricultor em regime de economia familiar.
3. Não comprovadas outras especificidades no caso concreto, e sendo o autor capaz para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, não tem lugar a concessão dos benefícios por incapacidade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de abril de 2017.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8881168v4 e, se solicitado, do código CRC 650B4AFA. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5029830-25.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | ANTONIO MARTINELLI |
ADVOGADO | : | DORISVALDO NOVAES CORREIA |
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, restando a parte autora condenada ao pagamento das custas e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 500,00, suspensa a respectiva exigibilidade em face da gratuidade de justiça.
Em suas razões recursais, a autora sustenta que o motivo do indeferimento administrativo foi a perda da qualidade de segurado, e não a ausência de incapacidade laboral. Aduz, ainda, que a realização da perícia judicial por médico clínico geral caracteriza cerceamento de defesa. Postula, também, a oitiva de testemunhas para comprovar o tempo de serviço rural exercido.
Sem contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do Novo CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
O caso presente encontra-se dentre aqueles considerados urgentes no julgamento, vez que se refere a benefício por incapacidade, estando a parte autora, hipossuficiente, hipoteticamente impossibilitada de laborar e obter o sustento seu e de familiares.
Dos requisitos para a concessão do benefício
A concessão de benefícios por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Extrai-se, da leitura dos dispositivos acima transcritos, que são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
Da qualidade de segurado e do período de carência
Quanto ao período de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício), estabelece o art. 25 da Lei de Benefícios da Previdência Social:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;
Na hipótese de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Prevê a LBPS que, decorrido o período de graça na forma do § 4º, as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado somente serão computadas para efeitos de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
Cumpre destacar que no caso dos segurados especiais não há obrigatoriedade de preenchimento do requisito carência conforme acima referido, sendo necessária, porém, a comprovação de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mesmo que de forma descontínua. Eis a disciplina do art. 39, da Lei 8.213/91:
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão: I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido (...)
Nestes casos, o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Entretanto, embora o art. 106 da LBPS relacione os documentos aptos à comprovação da atividade rurícola, tal rol não é exaustivo, sendo admitidos outros elementos idôneos.
Da comprovação da incapacidade laboral
A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação, através de exame médico-pericial, da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto essa condição persistir. Ainda, não obstante a importância da prova técnica, o caráter da limitação deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar de que fatores relevantes - como a faixa etária do requerente, seu grau de escolaridade e sua qualificação profissional, assim como outros - são essenciais para a constatação do impedimento laboral e efetivação da proteção previdenciária.
Dispõe, outrossim, a Lei 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.
Do caso concreto
A presente ação foi distribuída em 19/09/2013 no Juízo Estadual de PEROLA/PR com pedidos atinentes a benefícios por incapacidade.
Compulsando os autos, verifica-se que o Juízo sentenciante fundou a decisão de improcedência no laudo pericial que reconheceu a existência de cegueira total no olho esquerdo (CID H54.4), mas negou que esta doença causasse incapacidade para o trabalho rural. Assim, em que pese a alegação no sentido de que o indeferimento administrativo deu-se em decorrência da perda da qualidade de segurado, primeiro passo a examinar se realmente há, ou não, incapacidade laboral.
A perícia médica foi realizada nestes autos pelo Dr. Valter Botan Júnior, especialista em clínica geral, chegando às seguintes conclusões:
- quadro mórbido: cegueira no olho esquerdo (CID H54.4);
- incapacidade: não há para as atividades habituais;
- idade no momento da perícia: 54 anos (nascimento em 25/08/1962);
- atividades laborais: agricultura - de natureza braçal.
Acrescentou, ainda, o expert:
"Exame clínico: Bom estado geral, lúcido, corado. Deambulando normalmente. Pressão arterial 120/80 mmHg. Peso 64 kg. Altura 1,73 m. Apresenta calosidades em ambas as mãos.
Exame físico dirigido: Olho esquerdo amaurose (cegueira). Olho direito normal (20/20).
(...)
O paciente é portador de cegueira em olho esquerdo que determina uma incapacidade total e permanente para as atividades que exijam visão binocular, porém não gera incapacidade para sua atividade laborativa habitual."
A respeito dessa limitação na visão correlacionada com o trabalho na agricultura, esta Corte consolidou jurisprudência no sentido de que, em regra, não é devido o benefício:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AGRICULTOR. VISÃO MONOCULAR. Em relação à visão monocular de agricultor, este Tribunal vem firmando posicionamento no sentido de que é, de regra, indevido benefício por incapacidade. (TRF4, AC 0006751-05.2015.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 20/07/2015)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA OU AUXÍLIO-ACIDENTE. VISÃO MONOCULAR. AGRICULTOR. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO MANTIDA. Não demonstrada pela perícia oficial ou pelo conjunto probatório a incapacidade para o trabalho da parte autora, que é agricultor e possui visão monocular, nem que tal enfermidade decorreu de acidente e que houve redução da capacidade, é de ser mantida a sentença que julgou improcedente a ação. (TRF4, AC 0017843-77.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, D.E. 03/08/2016)
Observo, nesse norte, que a existência de moléstia nem sempre significa que está a parte segurada incapacitada para o trabalho, uma vez que doença e incapacidade podem coincidir ou não, dependendo do grau da doença, de como ela afeta a pessoa, bem como das condições particulares de cada indivíduo. Portanto, nem toda enfermidade, em qualquer grau, gera incapacidade.
Sendo, portanto, a parte autora capaz de garantir sua subsistência através de seu trabalho, não tem lugar a concessão dos benefícios por incapacidade, em razão do que mantenho a sentença na íntegra.
Conclusão
A apelação da parte autora foi improvida, mantendo a sentença em seus exatos termos.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/04/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5029830-25.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00011919720138160133
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | ANTONIO MARTINELLI |
ADVOGADO | : | DORISVALDO NOVAES CORREIA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/04/2017, na seqüência 476, disponibilizada no DE de 04/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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