APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006713-72.2015.4.04.7002/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | LENIR VARGAS |
ADVOGADO | : | OSCAR GOMES FIGUEIREDO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA.
1. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão.
2. Hipótese em que se anula a sentença para a realização de nova prova pericial por médico especialista.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso da parte autora, para anular a sentença e deteminar a reabertura da instrução, a fim de que seja realizada nova perícia judicial com médico especialista em ortopedia/traumatologia., nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de maio de 2017.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8929253v4 e, se solicitado, do código CRC 5A9B481E. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006713-72.2015.4.04.7002/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | LENIR VARGAS |
ADVOGADO | : | OSCAR GOMES FIGUEIREDO |
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pelo INSS (evento 55) em face da sentença (evento 49), publicada em 31/10/2016, que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício por incapacidade.
Sustenta a parte autora, preliminarmente, que a) foi nomeado para a realização da perícia médico que não é especialista em ortopedia. Realizada perícia judicial, o expert apresentou o laudo que não condiz com as reais patologias apresentadas pela apelante; e b) pugna, então, pela anulação da sentença, determinando a reabertura da instrução processual, sendo-lhe propiciado o direito a uma nova perícia judicial a ser realizada por médico especialista em ortopedia.
No mérito, defende, em suma, que a) a parte Apelante, de fato, apresenta incapacidade definitiva para suas ocupações habituais, o que dificulta o reingresso no mercado competitivo de trabalho; b) a insistência do perito em se estribar em laudos periciais realizados pela Autarquia Previdenciária, cujos teores sabidamente encontram-se eivados de parcialidade, desprezando exames por imagem que comprovam a presença das mesmas patologias incapacitantes em momento pretérito, causa enorme prejuízo ao reconhecimento do direito da Autora; e c) a conclusão do expert definitivamente não se coaduna com as provas colacionadas aos autos, pois o acervo probatório comprova a existência de patologias que impedem o desenvolvimento de atividades que tem na higidez física sua forma de execução.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, previsto no art. 59 da Lei 8.213/91, ou APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, regulado pelo artigo 42 da Lei 8.213/91.
São quatro os requisitos para a concessão desses benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Cabe salientar que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do amparo nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita. Por outro lado, tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as particularidades do caso concreto. Isso porque existem circunstâncias que influenciam na constatação do impedimento laboral (v.g.: faixa etária do requerente, grau de escolaridade, tipo de atividade e o próprio contexto sócio-econômico em que inserido o autor da ação).
Exame do caso concreto
No caso sub examine, a controvérsia recursal cinge-se à verificação da incapacidade da parte autora, bem como aos marcos temporais a partir dos quais a autora ostentava carência mínima/qualidade de segurada.
Diante disso, a partir da perícia médica realizada por perito de confiança do juízo (Dr. Edson Keity Otta, CRM 14743 - evento 26, especialista em cirurgia geral e cirurgia pediátrica), referendada na sentença, é possível obter os seguintes dados:
O perito concluiu ser a parte autora "Incapaz para o exercício de qualquer trabalho ou atividade que lhe garanta subsistência".
Por fim, quanto ao início da incapacidade, afirmou "Data de início da doença afixada em 2000 conforme relato da periciada. Data de início da incapacidade afixada na data da perícia. A descrição do exame físico dos laudos do INSS de 2004 e 2013 mostram que não havia incapacidade nestas épocas."
Como referida perícia foi realizada em 19/10/2015, esta é a data de início da incapacidade.
Em complementação, o perito esclareceu, detalhadamente, o questionamento que havia sido apresentado pela parte autora. (evento 41)
"(...) para conclusão de incapacidade é necessário que haja correlação entre queixa clinica, achados de exame físico e achados dos exames complementares. Apenas os achados de alteração discal associados a queixa de dor não são suficientes para permitir a conclusão de incapacidade. São necessários achados de exame físico que demonstrem o acometimento radicular, pois diversos estudos da literatura médica mostram estas alterações nos exames complementares em pessoas sem nenhum tipo de queixa. (...) No momento da pericia, observou-se teste de Lasègue positivo, indicando presença de radiculopatia e gerando incapacidade. Devido a inexistência de documentos médicos com data posterior ao laudo do INSS de 2013, a data de inicio da incapacidade foi afixada no momento da perícia. Ou seja, após um período sem radiculopatia, houve a recidiva do quadro e da incapacidade. Confome explicado no corpo do laudo, "A radiculopatia é uma condição transitória com grande possibilidade de resolução através de medicamentos e fisioterapia". Esta transitoriedade associada aos esclarecimentos acima permitem concluir que, apesar de se tratar da mesma condição, não é possível afirmar que a autora estava incapacitada desde 2004."
Em suma, segundo o experto, a radiculopatia é uma condição transitória e não há elementos para se concluir que a parte autora estivesse incapaz desde 2004.
Saliente-se que o exame intitulado Tomografia Computadorizada Helicoidal, de 23/09/2003, referido pelo perito e que segundo a Defesa não se estaria juntado neste feito, encontra-se anexado no evento 13 - LAUDO2, p. 60, tendo sido denominado em letras maiores como "RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DA COLUNA LOMBAR". Verifica-se, no aludido exame, que abaixo do nome da clínica UNITOM encontra-se a denominação Tomografia Computadorizada Helicoidal.
A autora, com idade atual de 53 anos, possui ensino fundamental incompleto (6ª série) e afirmou desempenhar o ofício de costureira.
A recorrente trouxe aos autos diversos exames e atestados médicos (evento 01), muitos dos quais retratando a incapacidade laboral, em razão de padecer de doença ortopédica crônica.
O posicionamento do perito judicial colide frontalmente com o substancial aporte probatório da autora, o qual revela a existência de um quadro de saúde com sérias complicações vivenciadas pela segurada.
Entrementes, o perito judicial (ainda que detenha especialidade em cirurgia) limitou-se a apresentar ao juízo um laudo absolutamente lacônico, eximindo-se de analisar, sobretudo no que tange à superficialidade das respostas aos quesitos, a alegada incapacidade laboral de natureza ortopédica da segurada, que anexou farta documentação clínica a indicar que o quadro seria incapacitante.
De fato, inexiste liberdade absoluta na elaboração da prova pericial por parte do expert, que deve se empenhar em elucidar ao juízo e às partes todos os elementos necessários à verificação do real estado de saúde do segurado que objetiva a concessão de benefício por incapacidade. A propósito do tema, leciona o eminente Juiz Federal José Antonio Savaris (Curso sobre perícia judicial previdenciária. Curitiba: Alteridade Editora, 2014, p. 32-33):
Com efeito, o médico perito nomeado pelo Juízo, nada obstante - formalmente - atue como perito de confiança em processo judicial, tem o dever inderrogável de prestar todos os esclarecimentos de forma racional, de molde a permitir real debate sobre a prova que é crucial para os processos previdenciários por incapacidade.
O perito não é um senhor absoluto erigido acima de todos os postulados processo-constitucionais. Não pode ser tido tampouco como um ser mítico que acessa o impenetrável e revela a verdade oculta e que somente por ele pode ser obtida. A prova técnica, como qualquer outra etapa processual, não pode ser arbitrária e assim será toda vez que não se mostrar devidamente justificada ou, tanto quanto possível, fundamentada em dados técnicos objetivos ou que possam ser obtidos por sua experiência profissional (não se pretende excluir aqui, evidentemente, o elemento subjetivo do exame pericial).
Não se exigirá do perito, qualquer que seja sua especialidade, que realize diagnóstico para prescrição do tratamento, faça prognóstico da evolução clínica, oriente ou acompanhe o periciando (o que seria ideal numa perspectiva de atendimento não fracionado à pessoa), mas é atribuição do perito determinar, com a necessária fundamentação, a aptidão laboral para fins do benefício por incapacidade.
O laudo técnico pericial, reconhecidamente a mais relevante prova nas ações previdenciárias por incapacidade, deve conter, pelo menos: as queixas do periciando; a história ocupacional do trabalhador; a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos examinados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados); os principais resultados e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados); o provável diagnóstico (com referência à natureza e localização da lesão); o significado dos exames complementares em que apoiou suas convicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando.
Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão, porque respostas periciais categóricas, porém sem qualquer fundamentação, revestem um elemento autoritário que contribui para o que se chama decisionismo processual. Em face da ausência de referências fáticas determinadas, a solução judicial se traduziria em uma subjetividade desvinculada aos fatos, resultando mais de valorações e suspeitas subjetivas do que de circunstâncias de fato (FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: RT, 2002. p. 36).
Nessa direção, também se manifesta a jurisprudência deste Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA PARA PRODUÇÃO DE NOVO LAUDO MÉDICO PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. Insuficiente a perícia médica, elemento essencial para a verificação da incapacidade da postulante ao benefício de prestação continuada, determinada a anulação da sentença, com a reabertura da instrução para que seja produzido novo laudo médico pericial, com levantamento detalhado da moléstia, a ser elaborado por médico especialista, bem como as demais provas que as partes entenderem pertinentes. (AC nº 0019515-91.2013.404.9999, 5ª TURMA, Rel. Des. Federal ROGERIO FAVRETO, unânime, D.E. 28-01-2014).
Por conseguinte, deve ser, excepcionalmente, anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia judicial por ortopedista, para avaliar, exaustivamente, a alegada incapacidade da parte autora, para que se desvende adequadamente o histórico clínico da segurada, e, sendo o caso, para que sejam definidos os marcos temporais da incapacidade temporária/absoluta.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso da parte autora, para anular a sentença e deteminar a reabertura da instrução, a fim de que seja realizada nova perícia judicial com médico especialista em ortopedia/traumatologia.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006713-72.2015.4.04.7002/PR
ORIGEM: PR 50067137220154047002
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr.Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | LENIR VARGAS |
ADVOGADO | : | OSCAR GOMES FIGUEIREDO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/05/2017, na seqüência 248, disponibilizada no DE de 04/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA, PARA ANULAR A SENTENÇA E DETEMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO, A FIM DE QUE SEJA REALIZADA NOVA PERÍCIA JUDICIAL COM MÉDICO ESPECIALISTA EM ORTOPEDIA/TRAUMATOLOGIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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