| D.E. Publicado em 01/06/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016312-19.2016.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | SALETE JUDITE MATIELLO LEOPOLDO |
ADVOGADO | : | Edmar Viana |
: | Mauro Felippe | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. INCAPACIDADE. COMPROVAÇÃO.
1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade.
2. Hipótese em que restou comprovada a incapacidade laborativa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de maio de 2017.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8943191v3 e, se solicitado, do código CRC D7B8882F. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
| Data e Hora: | 25/05/2017 13:23 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016312-19.2016.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | SALETE JUDITE MATIELLO LEOPOLDO |
ADVOGADO | : | Edmar Viana |
: | Mauro Felippe | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora (fls. 118/120) e pelo INSS (fls. 123/125) em face da sentença (fls. 111/115), publicada em 24/06/2016, que julgou procedente o pleito, concedendo o benefício de auxílio-doença desde 11/01/2016 (data da juntada do laudo pericial - fl. 97/99).
A parte autora insurge-se, em sede de apelo, somente quanto à reforma do termo inicial, pleiteando a fixação do termo inicial em 31/01/2013(DCB).
Em contrapartida o INSS sustenta, em síntese, que a parte autora não preenche os requisitos necessários à prestação previdenciária deferida pelo juízo a quo, especialmente quanto à incapacidade. Pugna, outrossim, pela revogação da tutela antecipada concedida em sentença.
Sem as contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, previsto no art. 59 da Lei 8.213/91, ou APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, regulado pelo artigo 42 da Lei 8.213/91.
São quatro os requisitos para a concessão desses benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Cabe salientar que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do amparo nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita. Por outro lado, tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as particularidades do caso concreto. Isso porque existem circunstâncias que influenciam na constatação do impedimento laboral (v.g.: faixa etária do requerente, grau de escolaridade, tipo de atividade e o próprio contexto sócio-econômico em que inserido o autor da ação).
Exame do caso concreto
No caso sub examine, a controvérsia recursal cinge-se à verificação da incapacidade da parte autora.
Diante disso, a partir da perícia médica (fl. 97/99) realizada por perito de confiança do juízo, Dr. Marcelo Emílio Beirão, CRM 5920, é possível obter os seguintes dados:
a- enfermidade (CID): fibromialgia (M79.7);
b- incapacidade: prejudicado;
c- grau da incapacidade: parcial;
d- prognóstico da incapacidade:temporária;
e- início da doença/incapacidade: refere que teve início em 2001;
f- idade na data do laudo: 49 anos;
g- profissão: costureira;
h- escolaridade: não informado;
i- Que tipo de atividade profissional o(a) autor(a) pode exercer? Neste momento tem dificuldade em função os sintomas de dor articular e muscular difusa que está em tratamento clínico. Mas deveria e poderia ser reabilitada para atividades sem exigência de esforço físico.
j- Atualmente, pode o(a) autor(a) trabalhar e executar tarefas atinentes à sua profissão? Em caso negativo, pode ele(a) realizar outra atividade? Em caso positivo especifique. Neste momento tem limitações, mas deveria tentar uma reabilitação.
Não obstante as considerações esposadas pelo expert, entendo que o juízo não está adstrito às conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC (Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito), podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligidos aos autos, inclusive os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho (AgRg no AREsp 35.668/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 20-02-2015).
Assim, tendo a perícia certificado a existência da patologia alegada pela parte autora, o juízo de incapacidade pode ser determinado, sem sombra de dúvidas, pelas regras da experiência do magistrado, consoante preclara disposição do artigo 375 do NCPC (O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.). Nessa linha, leciona Fabio Luiz dos Passos:
"O objetivo da perícia médica judicial em matéria previdenciária não é (e não deve ser) informar se há (ou houve) incapacidade laborativa no presente ou no passado. A conclusão pela existência ou não de capacidade laborativa, essência da lide previdenciária é encargo atribuído ao juiz, que não deve perder de vista a natureza dinâmica e personalíssima da incapacidade laborativa diante do contexto social de vida do cidadão que busca a tutela judicial." (FOLMANN, Melissa e SERAU Jr., Marco Aurélio. Previdência Social: em busca da Justiça Social. A análise da incapacidade laborativa e o deferimento de benefícios previdenciários. São Paulo: LTr, 2015, p.134-135).
Diversa não é a interpretação do eminente Juiz Federal e professor de Direito Previdenciário José Antonio Savaris (Direito Processual Previdenciário: Curitiba, Alteridade Editora, 2014, p. 275-276), sustentando que não atende ao dever de fundamentação a decisão judicial que consubstancia simples referência à resposta pericial a um dos quesitos que lhe foram formulados (se há ou não incapacidade para o trabalho). Por conseguinte, vaticina o ilustre magistrado, quando a sentença denegatória de proteção social não especifica a função habitual do segurado, o seu contexto social (idade, escolaridade, local de residência, etc), a patologia identificada pela prova técnica e pelos demais achados médicos, e tampouco arrisca pensar o segurado para além da sala em que é realizada a perícia judicial, culmina, a referida sentença, por carecer da necessária fundamentação. Por conta disso, existindo documentação médica relevante, as conclusões do julgador podem afastar-se, por exemplo, quanto à existência de incapacidade, quando à data do seu início, ou quanto à existência de incapacidade que justifique a concessão de benefício.
Os critérios de exame das provas no processo previdenciário já não se restringem aos instrumentos e às formas tradicionais. Ainda que o caderno processual não contenha elementos probatórios categóricos com relação à incapacidade do segurado, caso não se possa chegar a uma prova absolutamente conclusiva, consistente, robusta, é adequado que se busque socorro na prova indiciária e nas evidências.
Nesse aspecto, não é preciso romper com os paradigmas da dogmática, porque tal meio probatório é legal e, no contexto, pode e deve ser valorada, sobretudo para essa espécie de prestação social, intrinsecamente permeada pela subjetividade, haja vista o moderno conceito de incapacidade dado pela Organização Mundial da Saúde:
"Incapacidade, genericamente falando, é a resultante da interação entre a disfunção apresentada pelo indivíduo (orgânica e/ou da estrutura do corpo), a limitação de suas atividades e a restrição na participação social e dos fatores ambientais que podem atuar como facilitadores ou barreiras para o desempenho dessas atividades ou da participação (CIF/OMS, 2004).
A incapacidade pode ser operacionalmente definida como debilidades não compensadas do indivíduo frente às exigências do trabalho, sempre tendo em mente que debilidade e incapacidade não são apenas uma conseqüência das condições de saúde/doença, mas são determinadas, também, pelo contexto do meio ambiente físico e social, pelas diferentes percepções culturais e atitudes em relação à deficiência, pela disponibilidade de serviços e legislação (CIF/OMS, 2004)." (TREZUB, Cláudio José. Fundamentos para a perícia médica judicial previdenciária. Curso de Perícia Judicial Previdenciária/coordenação de José Antonio Savaris. Curitiba: Alteridade Editora, 2014. p. 168).
A tendência, pois, é de uma maior valorização da prova indiciária, o que, aliás, já vem sendo feito pela jurisprudência em relação a outros benefícios previdenciários, como nos casos da aposentadoria rural por idade (v.g. AgRg no AREsp 163.261/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, DJe 17-12-2012).
Ademais, não se pode olvidar que o artigo 472 do NCPC prevê que o juiz poderá, inclusive, dispensar prova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem, sobre as questões de fato, pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes, o que, aliado ao dever de fundamentação das decisões judiciais previsto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, demonstra a possibilidade de emprego de tais meios.
Muitas vezes, se instala a dúvida científica em relação à verdade sobre um fato relevante à solução do conflito. Um caso emblemático na área do direito da seguridade social é a questão da incapacidade para fins previdenciários. Não é diferente quando se está diante dos pedidos de tratamentos e medicamentos especiais. Uma dose de recursividade ao pragmatismo pode ajudar o juiz na tarefa de compelir o Estado a cumprir o seu papel constitucional de proteção social.
Se vamos assumir que a verdade real precisa ser perseguida, e nem sempre nos deparamos com a prova cabal, seja sobre a própria incapacidade ou sobre a data do início desta, um raciocínio filosófico pragmático autoriza, a partir de uma boa "inquirição", a recursividade às "evidências". As circunstâncias do caso precisam ser levadas em conta.
A perícia judicial previdenciária deveria ser uma avaliação holística, o que permitiria distinguir as circunstâncias do caso concreto, inclusive a perspectiva das consequências do reconhecimento para a manutenção da vida e da subsistência digna, objetivo primaz do Estado.
Na prática, convivemos com o raciocínio fingido, expressão cunhada por Susan Haack, uma forma rematada de cinismo. Nem o juiz, nem seus auxiliares, como o perito judicial, buscam descobrir as coisas como verdadeiramente são. Não importa onde a busca os levará, mas buscam suporte para uma proposição com a qual eles já estão comprometidos e que não é negociável. Não se interessam por desconstituir seus preconceitos, seus prejuízos, seus comprometimentos anteriores e inamovíveis com a proposição que tentam defender. Não se interessam pela coisa como ela é.
Cumpre salientar que quando a ciência médica não consegue subsidiar a instrução com elementos mínimos sobre o estado global de saúde do segurado, a proteção social há de ser conferida pelo Estado-Juiz, aplicando-se, no campo previdenciário, o princípio constitucional da proteção do hipossuficiente, pois, consoante abalizada lição de João Batista Lazzari (Manual de Direito Previdenciário. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 89), não há razão para gerar proteção ao sujeito passivo - como, certas vezes, acontece em matéria de discussões jurídicas sobre o direito dos beneficiários do sistema a determinado reajuste ou revisão de renda mensal, por dubiedade da norma, visto que incide, a regra de interpretação in dubio pro misero, ou pro operário, pois este é o principal destinatário da norma previdenciária.
Por conseguinte, delineado conflito aparente entre as avaliações médicas elaboradas pelos profissionais da Autarquia Previdenciária, pelo médico-assistente do segurado e pelo próprio expert do juízo, impõe-se, com fundamento no princípio in dubio pro misero, acolher a conclusão da asserção mais protetiva ao bem jurídico tutelado pelos benefícios de incapacidade, isto é, a vida, a saúde, e, mais remotamente, a própria dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil insculpido no artigo 3º, inciso III, da Constituição da República, sob pena de o próprio Poder Judiciário afrontar o princípio da proibição de proteção insuficiente (Untermassverbot).
Ademais, não se pode olvidar que a atividade de costureira demanda longos períodos na posição "sentado", expondo a trabalhadora aos riscos posturais da profissão ao longo dos anos, muitos desses submetida a esforços repetitivos atrás de uma máquina de costura, sem a possibilidade de fazer intervalos adequados, muito menos de investir em fortalecimento muscular da área afetada, o que potencialmente minimizaria os problemas, não estivesse a segurada vivendo, ao que narra, constantemente em crise dolorosa.
A dor associada à profissão que exige a posição predominantemente sentada já foi objeto de diversos estudos, e, no caso das costureiras, também já foi objeto de estudo específico na área da fisioterapia, tal a repetição dos casos. Transcrevo, a propósito, excerto do artigo "Perfil epidemiológico e fatores relacionados à lombalgia em um grupo de costureiras da empresa textil Marka da Paz" (http://www.efdeportes.com/efd162/ lombalgia-em-um-grupo-de-costureiras.htm), foram feitas observações que merecem ser destacadas neste voto:
As lesões por esforços repetitivos (LER) também conhecidos, no Brasil, como distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT), aparecem significativamente relacionadas a aspectos da organização laboral como o trabalho repetitivo, longas jornadas sem pausas e/ou insuficientes, alta velocidade, pressão constante, intensificação e uniformização da forma de produção, vibração, tensão mecânica, aspectos ambientais, equipamentos e mobiliários que não respeitam as diferenças antropométricas dos trabalhadores, levando a movimentos e posturas inadequadas. Com isso há o surgimento de dores e uma grande dificuldade no desempenho de seu trabalho ao trabalhador. Consequentemente tem-se às empresas, problemas onerosos, como despesas médicas, ações trabalhistas, gastos com recrutamento e seleção de pessoal, pagamentos de seguros, significando em redução dos níveis de produtividade e diminuição dos lucros (FALCHI; SILA; SOLZA, 2004; CARDOSO; POPOLIN, 2006; NEVES, 2006; MACIEL; FERNANDES; MEDEIROS, 2006; SERRANO; SANDOVAL, 2010).
Estes fatores, atualmente, são um dos principais problemas de saúde pública e os responsáveis por quase 90% dos afastamentos do trabalho, sendo que, sua prevalência vem atingindo proporções epidêmicas, tornando-se um grave problema de saúde de difícil abordagem, reabilitação e prevenção (MACIEL; FERNANDES; MEDEIROS, 2006; FORMIGONI; VALENTE; BARBOSA, 2008).
A categoria têxtil-confecção, principalmente no setor de costura, está entre as profissões que tem em sua essência uma organização de trabalho que oferece riscos à saúde dos trabalhadores. A operação de máquinas de costura requer o uso repetitivo e coordenado do tronco, extremidades superiores e inferiores das operárias que trabalham em postura sentada prolongada, levando a elevada sobrecarga física, expondo os trabalhadores a sintomatologias dolorosas, fadiga muscular, e até lesões, principalmente na região lombar e nos membros inferiores (MORAES; ALEXANDRE; GUIRARDELLO, 2002; AMBRIOSE; QUEIROZ, 2004; OLIVEIRA; BERTO; MACEDO, 2004; CARDOSO; POPOLIM, 2006; MACIEL; FERNANDES; MEDEIROS, 2006; PERREIRA; LÓPEZ; LIMA, 2009).
No simples fato de passar da postura em pé para a sentada há o aumento da pressão no disco intervertebral, gerado pela transmissão do peso do tronco para a coluna lombar, sobretudo quando se associa a flexão anterior de tronco, levando a desgastes dos discos intervertebrais. Além disso, a postura sentada, adotada pelas costureiras, favorece o estiramento das estruturas da parte posterior da coluna, como ligamentos, nervos e pequenas articulações (MORAES; ALEXANDRE; GUIRARDELLO, 2002; OLIVEIRA; BERTO; MACEDO, 2004; JORGUE JUNIOR; VIEIRA; SANDOVAL, 2010; MARCHAND, 2010).
Assim sendo, o corpo não consegue adaptar-se ao estresse cumulativo da força aplicada repetidamente, e o trauma repetitivo é maior do que a capacidade do tecido regenerar-se. Isso somado às disfunções anatômicas e ao estresse emocional, ocasiona o aumento da tensão muscular, acarretando em excessiva contração ou postura inadequada, tornando-se um ciclo vicioso que leva ao desenvolvimento de distúrbios musculoesqueléticos, dentre eles a lombalgia (OLIVEIRA; BERTO; MACEDO; 2004).
Lombalgia é definida como todas as condições de dor, com ou sem rigidez do tronco, localizadas na região inferior do dorso, em uma área situada entre o último arco costal e a prega glútea, podendo ser acompanhada ou não de irradiação para os membros inferiores. A dor lombar acomete ambos os sexos, tendo predileção por adultos jovens em fase economicamente ativa, sendo considerada a principal causa de incapacidade nas faixas etárias abaixo de 45 anos, além de se tornar a primeira causa de afastamento do trabalho entre os segurados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).
(...)
Ao analisar a faixa etária das funcionárias com sintomatologia lombar percebeu-se uma predominância entre as idades de 37 a 41 anos, o que corresponde a 80% destas. Resultados que confrontaram com os encontrados por Oliveira; Berto; Macedo (2004), que em estudo da prevalência de lombalgia em 26 costureiras, a média de idade encontrada nas que apresentavam lombalgia foi de 25,21 anos em comparação com a média deste estudo que foi de 33,14. Já Jesus; Marinho (2006); Kleinpaul et al. (2008) afirmam que os picos de dores lombares ocorrem entre os 35 e 55 anos de idade, como foi encontrado neste estudo. Ambos correlacionam às médias encontradas ao fato de ocorrer associado ao envelhecimento, à diminuição da flexibilidade, da potência muscular e perda de massa óssea, reduzindo a função de sustentação.
(Grifei)
Com efeito, a experiência no Direito Previdenciário tem demonstrado que é frequente o afastamento dos segurados de suas atividades laborativas, muitas vezes transformando-se em casos crônicos, resultantes das atividades repetitivas em posturas inadequadas, sem as indispensáveis pausas e em condições ergonômicas precárias.
Em razão disso, encontram-se nesta Corte inúmeros precedentes jurisprudenciais inclinando-se pela concessão do benefício, mesmo em casos em que a perícia não se mostra sensível ao caso concreto, seja por não verificar incapacidade suficiente, seja por denominá-la de limitação, muitos deles em situações similares à encontrada nos presentes autos (AC Nº 0001375-43.2012.4.04.9999/SC e AC Nº 0010242-20.2015.4.04.9999/SC- Rel. Des. Federal ROGER RAUPP RIOS; AC Nº 0008988-12.2015.4.04.9999/PR - Rel. Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE; AC Nº 0019284-93.2015.4.04.9999/SC - Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA).
Portanto, ainda que o laudo pericial realizado tenha concluído pela aptidão laboral da parte autora, é forçoso reconhecer que a confirmação da existência da moléstia incapacitante referida na exordial (fibromialgia), corroborada pela documentação clínica das fls. 10-19 associada às suas condições pessoais - habilitação profissional (costureira) e idade atual (51 anos de idade) - demonstram a efetiva incapacidade temporária para o exercício da atividade profissional, o que enseja, indubitavelmente, a concessão de auxílio-doença, desde 31/01/2013.
No tocante ao termo inicial do benefício, tendo a sentença do juízo a quo fixado o inicio da incapacidade na juntada do laudo aos autos, ocorrido em (11/01/2016), refere-se dos atestados juntados às fls. 11/17 que a moléstia já se manifestava em período anterior, portanto, devido o benefício desde a data do cancelamento na esfera administrativa, ocorrido em 31/01/2013 (fl. 33).
Por conseguinte, inexiste prescrição quinquenal, porquanto a presente ação foi ajuizada em 24/09/2013.
Conclusão quanto ao direito da parte autora no caso concreto
Dessarte, o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui incapacidade, devendo ser reconhecido o direito ao auxílio-doença, desde 31/01/2013 (DCB), impondo-se a reforma da sentença.
Dos consectários
Correção Monetária e Juros
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Da antecipação de tutela
Pelos fundamentos anteriormente elencados, é de ser mantida a antecipação da tutela deferida, uma vez presentes os requisitos da verossimilhança do direito e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, bem como o caráter alimentar do benefício, porquanto relacionado diretamente com a subsistência, propósito maior dos proventos pagos pela Previdência Social.
Conclusão
Reforma-se a sentença no tocante ao mérito, concedendo à parte autora benefício de auxílio-doença desde 31/01/2013 (DCB - fl. 33).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação do INSS.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016312-19.2016.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 00036485120138240078
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr.Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | SALETE JUDITE MATIELLO LEOPOLDO |
ADVOGADO | : | Edmar Viana |
: | Mauro Felippe | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/05/2017, na seqüência 39, disponibilizada no DE de 04/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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