APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002491-04.2015.4.04.7118/RS
RELATOR | : | Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | EDI MARIA BRAGA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CANCELAMENTO. RETORNO AO TRABALHO COMPROVADO E NÃO COMUNICADO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. POSSIBILIDADE. MÁ-FÉ. PRESCRIÇÃO. INCIDÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. INTERRUPÇÃO POR EXECUÇÃO FISCAL.
1. Havendo vedação legal ao exercício de atividade laboral para aquele que está em gozo de aposentadoria por invalidez (artigo 46 da Lei de Benefícios), o segurado que voluntariamente retornar ao trabalho terá seu benefício cessado.
2. O exercício de atividade remunerada e a não comunicação dessa situação ao INSS caracteriza a má-fé do beneficiário a autorizar a cobrança dos valores pagos indevidamente pela Autarquia Previdenciária.
3. O ajuizamento da execução fiscal, ainda que posteriormente extinta sem análise do mérito, é fato interruptivo da prescrição da pretensão de reaver as prestações pagas indevidamente. Isso porque a prescrição decorre da inércia do interessado em buscar o seu crédito, circunstância que não se verificou, já que a autarquia efetivamente se movimentou na persecução dos valores e houve a ordem de citação e o ato constitutivo de mora (hipóteses contempladas no CC/02, art. 202).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de maio de 2017.
Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8925608v6 e, se solicitado, do código CRC B82C7788. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002491-04.2015.4.04.7118/RS
RELATOR | : | Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | EDI MARIA BRAGA |
RELATÓRIO
O INSS ajuizou ação ordinária contra Edi Maria Braga objetivando a condenação da requerida ao ressarcimento de valores recebidos indevidamente durante o período de janeiro de 2005 a março de 2008, já que a segurada exerceu atividade laborativa estando em gozo de aposentadoria por invalidez.
A sentenciando, o juízo a quo entendeu que o INSS não havia se desincumbido do ônus de demonstrar a má-fé da segurada. Assim, em nome da presunção da boa-fé e da irrepetibilidade dos alimentos, o feito foi julgado improcedente. Sem condenação em custas e honorários.
Inconformado, o INSS sustenta que se trata de erro inescusável, na medida em que é senso comum, mormente para uma funcionária pública, de que é indevido o pagamento de aposentadoria por invalidez com o exercício concomitante de atividade remunerada. Alega, assim, que inexiste boa-fé da ré e, portanto, é devida a devolução dos valores recebidos concomitantemente.
Considerando que a ré é revel, subiram os autos sem contrarrazões.
É o brevíssimo relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (metas do CNJ/CJF), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Caso concreto
Está consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de que em se tratando de valores percebidos de boa-fé pelo segurado, seja por erro da Administração, seja em razão de antecipação de tutela, não é cabível a repetição das parcelas pagas. Os princípios da razoabilidade, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana conduzem à impossibilidade de repetição das verbas previdenciárias quando se tratar de benefício de caráter alimentar recebido pelo beneficiário de boa-fé.
Por outro lado, cabe "a restituição de valores indevidamente pagos pela Previdência Social, em decorrência de erro administrativo, sempre que a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável". O Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti, em seu artigo 'A restituição de benefícios previdenciários pagos indevidamente e seus requisitos', inserido na Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nº 78, p. 11/122, vai mais longe:
A meu ver, não é desculpável o recebimento de benefícios inacumuláveis (Lei nº 8.213, de 1991, art. 124), porque a lei é bastante clara, sendo de exigir-se o seu conhecimento pelo beneficiário. Também não será escusável o recebimento, em virtude de simples revisão, de valor correspondente a várias vezes o valor do benefício. Do mesmo modo, não cabe alegar boa-fé o pensionista que recebe pensão de valor integral e continua a receber o mesmo valor, ciente de que outro beneficiário se habilitou e houve o desdobramento da pensão. De qualquer modo, serão os indícios e circunstâncias que indicarão, em cada caso concreto, se a ignorância do erro administrativo pelo beneficiário é escusável ou não.
Daí se conclui que se o erro não for desculpável, resta caracterizada a má-fé e será possível à Administração postular o ressarcimento.
No caso concreto, o benefício foi cancelado face a constatação de que a parte ré, aposentada por invalidez, estava exercendo atividade laboral, como empregada, no departamento de assistência social do Município de Rondinha/RS (evento 3 - PROCJUD1, fls. 25/27). Esse fato é incontroverso, tanto porque a segurada é revel quanto porque não o negou em sua defesa administrativa (PROCJUD1, fls. 29/30).
Há vedação legal ao exercício de atividade laboral para aquele que está em gozo de aposentadoria por invalidez (artigo 46 da Lei de Benefícios).
O retorno do segurado ao trabalho é causa, portanto, de imediata cessação do benefício. O segurado que desejar retornar ao trabalho, deverá solicitar a realização de nova avaliação pericial para, constatada a recuperação da capacidade laborativa, ter a prestação previdenciária suspensa, cujas regras estão elencadas no artigo 47 da Lei 8.213/91.
No caso dos autos, não houve por parte da ré tal iniciativa. Ao contrário, ela omitiu o seu retorno ao trabalho. Destarte, a percepção, pela requerente, do benefício de aposentadoria por invalidez em período concomitante ao exercício de atividade remunerada ocorreu de má-fé.
Tal conclusão emerge do próprio conhecimento popular acerca da impossibilidade de percepção de aposentadoria por invalidez quando se está trabalhando - matéria objeto de inúmeras reportagens jornalísticas e orientação por parte dos servidores do INSS. Isso decorre do benefício recebido ter como pressuposto a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado (artigo 42 da Lei 8.213/91); assim, ao retornar à atividade remunerada, assim o faz conscientemente, contrariando os fundamentos expendidos para o requerimento da aposentadoria por invalidez.
Em situações análogas, esta Corte assim se pronunciou:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RETORNO AO TRABALHO. CARGO DE CONFIANÇA COMO SUPERVISOR. CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO. VALORES RECEBIDOS DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO. I. O retorno ao trabalho implica o cancelamento do benefício de aposentadoria por invalidez. II. O exercício de atividade remunerada e a não comunicação dessa situação ao INSS caracteriza a má-fé do beneficiário a autorizar a cobrança dos valores pagos indevidamente pela Autarquia Previdenciária. (TRF4, AC 0008098-39.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, D.E. 09/03/2017)
PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. OCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CANCELAMENTO. DENÚNCIA DE RETORNO AO TRABALHO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. POSSIBILIDADE. MÁ-FÉ. 1. Encontram-se prescritas as parcelas não reclamadas há mais de cinco anos do ajuizamento da ação, ainda que se trate de pedido de devolução de valores recebidos indevidamente pelo segurado. 2. Havendo vedação legal ao exercício de atividade laboral para aquele que está em gozo de aposentadoria por invalidez (artigo 46 da Lei de Benefícios), o segurado que voluntariamente retornar ao trabalho terá seu benefício cessado. 3. No caso dos autos, mostra-se legítima a devolução dos valores recebidos indevidamente, de modo a evitar o enriquecimento sem causa da ré, como previsto no art. 115, II, da Lei n° 8.213/91 e art. 884 do Código Civil, porque afastada a boa-fé, na medida em que a segurada afirmou que se mantinha trabalhando para complementar os valores recebidos a título de benefício por incapacidade laborativa. (TRF4, AC 5022265-87.2014.404.7107, QUINTA TURMA, Relator TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 19/02/2016)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RETORNO AO TRABALHO. CANCELAMENTO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS DE MÁ-FÉ. O retorno ao trabalho implica o cancelamento do benefício de aposentadoria por invalidez a contar da data em que caracterizado o exercício de atividade laboral. Assim, o exercício de atividade remunerada, devidamente comprovada nos autos, e a não comunicação dessa situação ao INSS, para cancelamento do benefício, implica a ocorrência e má-fé da beneficiária a autorizar a cobrança dos valores pagos indevidamente pela Autarquia Previdenciária. (TRF4, AC 5004779-45.2012.404.7112, SEXTA TURMA, Relator PAULO PAIM DA SILVA, juntado aos autos em 26/07/2013)
Assim, caracterizada a má-fé, a segurada deve devolver aos cofres do INSS os valores percebidos a título de aposentadoria por invalidez desde o seu ingresso na Prefeitura de Rondinha. Fica, portanto, provido o apelo autárquico.
No entanto, considerando que não há notícia de que os fatos analisados sejam objeto de ação penal ou de improbidade administrativa, faz-se necessário tecer algumas considerações acerca da prescrição. Nesse particular, sendo o processo administrativo causa de suspensão da prescrição, não corre o prazo prescricional no período em que se desenvolve regularmente o processo administrativo de cancelamento de benefício ou de apuração de responsabilidade com vistas ao ressarcimento. Mais especificamente, fica suspenso o prazo compreendido entre a intimação do ex-beneficiário para apresentação de defesa e o encerramento do prazo para interposição de recurso na esfera administrativa.
De mais a mais, o INSS ajuizou, em 20/05/2011, a Execução Fiscal nº 5000606-91.2011.4047118 contra a parte ré, para a cobrança da mesma dívida objeto desta ação, com sentença de extinção em 18/07/2013, a qual foi confirmada pelo TRF da 4ª Região. O trânsito em julgado ocorreu em 21/02/2014. Nessa hipótese, o ajuizamento do processo executivo atrai a incidência do preconizado no caput e incisos I e V do art. 202 do Código Civil de 2002 ("a interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á: por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual; por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor").
Destarte, o ajuizamento da execução fiscal, ainda que posteriormente extinta sem análise do mérito, é fato interruptivo da prescrição da pretensão de reaver as prestações pagas indevidamente. Isso porque a prescrição decorre da inércia do interessado em buscar o seu crédito, circunstância que não se verificou, já que a autarquia efetivamente se movimentou na persecução dos valores e houve a ordem de citação e o ato constitutivo de mora (hipóteses contempladas no CC/02, art. 202).
Assim, ainda que a presente ação esteja sujeita à prescrição, no caso concreto ela não se consumou.
Consectários e sucumbência
Considerando que não se trata de dívida tributaria, mas sim decorrente de ato ilícito civil, as prestações a serem restituídas devem ser corrigidas pelo INPC e acrescidas de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde cada pagamento indevido.
Com a inversão da sucumbência e revelia da parte ré, condeno-a ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do patrono do INSS, no percentual de 10% sobre o valor da condenação.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo do INSS.
Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002491-04.2015.4.04.7118/RS
ORIGEM: RS 50024910420154047118
RELATOR | : | Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Claudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | EDI MARIA BRAGA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/05/2017, na seqüência 714, disponibilizada no DE de 12/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9020805v1 e, se solicitado, do código CRC 12C5B7A9. | |
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