Apelação Cível Nº 5010815-65.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARTA DALCIN
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pelo INSS em face da sentença, publicada em 21-07-2017 (e. 2. 43) que julgou procedente o pedido de concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, desde a data da intimação da Autarquia da decisão.
Sustenta, em síntese, que a parte autora não preenche os requisitos necessários à prestação previdenciária deferida pelo juízo a quo. Alega, outrossim, que não mantinha qualidade de segurada na data de concessão do benefício (e. 2. 48).
Embora intimada, a parte autora não apresentou contrarrazões.
Vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, previsto no art. 59 da Lei 8.213/91, ou APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, regulado pelo artigo 42 da Lei 8.213/91.
São quatro os requisitos para a concessão desses benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Cabe salientar que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do amparo nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita. Por outro lado, tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as particularidades do caso concreto. Isso porque existem circunstâncias que influenciam na constatação do impedimento laboral (v.g.: faixa etária do requerente, grau de escolaridade, tipo de atividade e o próprio contexto sócio-econômico em que inserido o autor da ação).
Exame do caso concreto
No caso sub examine, a controvérsia recursal cinge-se à verificação da qualidade de segurado e do índice de correção monetária adotado.
Em relação à qualidade de segurado, observa-se que essa questão não foi suscitada por ocasião da contestação (e. 2. 12), quando a Autarquia se insurgiu apenas quanto à capacidade laboral do autor.
Ora, o sistema processual brasileiro prevê etapa de preclusão para o réu da possibilidade de deduzir fatos que impugnem o direito alegado pelo autor. O momento da preclusão se dá em caráter geral, ao se extinguir o prazo de contestação, o que se extrai do texto dos arts. 336 e 342 do CPC:
Art. 336. Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.
Art. 342. Depois da contestação, só é lícito ao réu deduzir novas alegações quando:
I - relativas a direito ou a fato superveniente;
II - competir ao juiz conhecer delas de ofício;
III - por expressa autorização legal, puderem ser formuladas em qualquer tempo e grau de jurisdição.
O tópico em discussão não se refere a questão de direito ou fundamento jurídico de solução da demanda, mas sim a fato que afeta o direito do autor não alegado pelo réu em contestação. A jurisprudência desta Corte não admite a inovação processual quando deduzida em recurso de apelação:
[...] Descabe o conhecimento da parte do apelo que inova na via recursal, sob pena de se suprimir um grau de jurisdição. (TRF4, Sexta Turma, APELREEX 0025074-92.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 16nov.2016)
[...] Não se conhece de parte das razões recursais que inovam no processo. [...] (TRF4, Quinta Turma, AC 0012200-41.2015.404.9999, rel. Roger Raupp Rios, D.E. 10nov.2016)
[...] Não conhecida parte do apelo do INSS, por tratar-se de inovação recursal, vedada pelo art. 517 do CPC/1973 e art. 1.014 do CPC/2015, sob pena de supressão de instância. [...] (TRF4, Quinta Turma, AC 0006429-53.2013.404.9999, rel. Roger Raupp Rios, D.E. 13set.2016).
De acrescer-se que o juiz de primeiro grau, de maneira previdente e adequada, para evitar nulidades, proferiu despacho saneador em que definiu os pontos controvertidos determinando a realização da prova necessária ao deslinde da questão. Disse expressamente, ao sanear o processo, que a questão da condição de segurado era incontroversa. Com efeito, embora a matéria não fique preclusa, o processo caminha para a frente, de modo que o INSS não pode vir agora em sede recursal suscitar questão de fato que não alegou na contestação e em qualquer outro momento antes da sentença.
Assim, o argumento do INSS sequer pode ser conhecido nesta quadra do processo, por tratar-se de inovação recursal.
Diante disso, não diviso reparos à solução encontrada pelo juízo de origem, razão pela qual adoto a sentença como razões de decidir (e. 2. 43):
"(...) Em relação à condição de segurada e ao período de carência, verifica-se que restaram evidenciados pelos documentos acostados aos autos – mormente aqueles juntados pelo INSS onde denotam a atividade rural exercida pela parte autora -. Ademais, percebe-se que não houve impugnação específica pelo INSS, razão pela qual incontroversas tais exigências.
Passo, dessa forma, ao exame da existência de incapacidadeda parte autora para o exercício das suas atividades laborais.
Cediço é que, em se tratando de auxílio-doença ouaposentadoria por invalidez, via de regra, o magistrado firma seu convencimentopara o deferimento das benesses consubstanciado no laudo pericial, cotejando-ocom as demais provas coligidas aos autos.
No que tange à primeira perícia, realizada por médicoortopedista (fls. 78/79), tem-se que não foi constatada a presença de doençaincapacitante desta natureza. Entretanto, este expert indicou a necessidade derealização de perícia por médico psiquiatra.
O perito especialista em psiquiatria informou às fls. 84/90 quea demandante é portadora de Transtorno depressivo recorrente (CID 10 F33), razãopela qual encontra-se incapacitada para o labor, temporariamente. Informou,ademais, não ser possível precisar a data do início da doença e da incapacidade, ressaltando que "[...] no momento da perícia a autora encontrava-seincapacitada e estima-se que a incapacidade teve início meses antes" (fl. 87).
Pois bem. Num primeiro momento, percebe-se que não é casode invalidez da segurada, uma vez se trata de comorbidade que afetatemporariamente a capacidade funcional da parte autora. Assim, em razão daausência de um dos pressupostos necessários à concessão da aposentadoria,inviável o deferimento do pleito.
De outra ponta, tem-se que o benefício auxílio-doença serádevido à segurada que for considerada incapaz total/parcial e temporariamente parao trabalho e suscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garantaa subsistência dignamente, e ser-lhe-á pago enquanto perdure essa condição,conforme dispõe o artigo 59 e seguintes da Lei n. 8.213/91.
A incapacidade laboral que autoriza a concessão do benefícioauxílio-doença também pode ser aquela que, embora parcial e permanente, inabilita a segurada do RGPS para o trabalho habitualmente desenvolvido, sendo, porém,passível de readaptação profissional para que se integre de forma plena em outraatividade, segundo se infere do artigo 62 da Lei de Benefícios.
Conclui-se, desse modo, que assiste à parte requerente o direito de ter deferido o benefício auxílio-doença, uma vez que tal benefício independe do grau de incapacidade do segurado (STJ, Resp. n. 699.920).
No que se refere ao termo inicial do auxílio-doença, verifico que embora o perito tenha apontado como data da incapacidade "meses antes da realização da perícia", tenho que, o benefício em questão deverá iniciar a partir da intimação da presente sentença (...)"
Como se pode observar, o laudo pericial é seguro sobre a efetiva incapacidade temporária para o exercício da atividade profissional para qual possui habilitação, o que justifica a concessão de auxílio-doença à parte autora, desde a desde a intimação da Autarquia da sentença.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96) e responde por metade do valor no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97).
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Conclusão
Confirma-se a sentença que julgou procedente o pedido de concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, desde a data de intimação da Autarquia acerca da sentença, em 21-07-2017 (e. 2. 45).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por, de ofício, fixar os critérios de correção monetária e juros, conforme o Teman 810/STF e 905/STJ, conhecer em parte o apelo do INSS para negar-lhe provimento e determinar a imediata implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001344756v20 e do código CRC 6edba2fd.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5010815-65.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARTA DALCIN
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria por invalidez. condição de segurado incontroversa. PROCESSUAL CIVIL. despacho saneador. INOVAÇÃO RECURSAL. INADMISSIBILIDADE.
Se o réu não impugna os fatos alegados na contestação, permitindo, sem oposição, que o processo seja saneado, fixados os pontos controvertidos e assim siga para a instrução, constitui inovação recursal, alegar, genericamente, apenas na apelação, a falta da condição de segurado, em momento algum discutida nos autos e dada por incontroversa no momento do saneamento do processo. O processo é ordenado por preclusões e deve caminhar para frente.
Se o laudo pericial é seguro sobre a efetiva incapacidade temporária para o exercício da atividade profissional para qual possui habilitação a segurada, impõe-se-lhe a concessão de auxílio-doença.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, fixar os critérios de correção monetária e juros, conforme o Teman 810/STF e 905/STJ, conhecer em parte o apelo do INSS para negar-lhe provimento e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 16 de outubro de 2019.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001344757v10 e do código CRC d79e87b5.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 16/10/2019
Apelação Cível Nº 5010815-65.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARTA DALCIN
ADVOGADO: JOAO PAULO SOETHE ASCARI (OAB sc039628)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 16/10/2019, na sequência 297, disponibilizada no DE de 27/09/2019.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, FIXAR OS CRITÉRIOS DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS, CONFORME O TEMAN 810/STF E 905/STJ, CONHECER EM PARTE O APELO DO INSS PARA NEGAR-LHE PROVIMENTO E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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