| D.E. Publicado em 12/12/2016 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0010336-02.2014.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NAIRA SONIA SERAFIM DE SOUZA |
ADVOGADO | : | Luis Roger Vieira Azzolin |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA CIVEL DA COMARCA DE SAO LUIZ GONZAGA/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INTERESSE DE AGIR. CONTESTAÇÃO DE MÉRITO. DECADÊNCIA. DIREITO MATERIAL AO BENEFÍCIO. INAPLICABILIDADE. REQUISITOS. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. PERSISTÊNCIA DA INCAPACIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CITAÇÃO VÁLIDA. CUSTAS PROCESSUAIS NO RS. ISENÇÃO.
1. Não se aplica o prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário.
2. A contestação de mérito por parte do INSS caracteriza oposição ao pleito e gera interesse processual.
3. Não ocorre a perda da qualidade do segurado que permanece incapacitado para o trabalho, ainda que não esteja em gozo de benefício, seja por ato administrativo indevido, seja por não tê-lo requerido.
4. Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida (Súmula 576 do STJ).
5. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao ressarcimento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471/2010.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e dar parcial provimento ao reexame necessário, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de novembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8664242v2 e, se solicitado, do código CRC 6D379308. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0010336-02.2014.4.04.9999/RS
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação e reexame necessário contra sentença que deferiu a antecipação de tutela e julgou procedente o pedido para conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por invalidez desde 27/10/2009 (data do ajuizamento da ação). Restou o INSS condenado a pagar as parcelas devidas a partir do vencimento de cada uma, corrigidas pelo IGP-DI e acrescidas de juros de mora de 12% ao ano, a partir da citação, até 06/2009 e, a contar da vigência da Lei nº 11.960, em 1º-7-2009, com a aplicação dos índices oficiais de remuneração básica e juros da caderneta de poupança. Arcará a autarquia, também, com o pagamento de metade das custas processuais e honorários advocatícios de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença.
Em suas razões recursais, o INSS sustenta que se consumou a decadência do direito de revisão do ato concessório do benefício anteriormente recebido pela segurada, na medida em que este foi cessado em 31/01/1995. Argumenta, também, que a ação deve ser extinta por falta de interesse de agir já que a parte autora não formulou requerimento administrativo antes de ajuizar a presente ação.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o breve relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do Novo CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
O caso presente encontra-se dentre aqueles considerados urgentes no julgamento, vez que se refere a benefício por incapacidade, estando a parte autora, hipossuficiente, hipoteticamente impossibilitada de laborar e obter o sustento seu e de familiares.
Preliminar de carência de ação
Em 27/08/2014, o Supremo Tribunal Federal pacificou a questão da necessidade de prévio requerimento administrativo antes de o segurado recorrer à Justiça para a concessão de benefício previdenciário. No Recurso Extraordinário 631.240, com repercussão geral reconhecida, foi definido que não há interesse de agir do segurado que não tenha inicialmente protocolado seu requerimento junto ao INSS.
Muito embora, no caso dos autos, a segurada não tenha formulado pedido administrativo, o INSS apresentou contestação abordando o mérito da causa, refutando o direito material perseguido pela autora (fls. 13/16), o que configura resistência à pretensão e caracterizando o interesse de agir.
Decadência - inaplicabilidade ao direito ao benefício
A decadência, instituto do direito substantivo, é a extinção do próprio direito por não haver oportuno exercício no período fixado na legislação pertinente; ou seja, é a perda do direito em decorrência da inércia de seu titular no prazo previsto legalmente.
Estabelece o art. 103 da Lei 8.213/1991 que é de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.
Com efeito, a hermenêutica do texto legal leva à conclusão de que o instituto da decadência não atinge a concessão dos benefícios previdenciários, mas apenas a possibilidade de sua revisão. O Supremo Tribunal Federal reconhece tal circunstância em vários de seus julgados:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS). REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA.
1. O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário.
2. É legítima, todavia, a instituição de prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefício já concedido, com fundamento no princípio da segurança jurídica, no interesse de evitar a eternização dos litígios e na busca de equilíbrio financeiro e atuarial para o sistema previdenciário.
3. O prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória 1.523, de 28.06.1997, tem como termo inicial o dia 1º de agosto de 1997, por força de disposição nela expressamente prevista. Tal regra incide, inclusive, sobre benefícios concedidos anteriormente, sem que isso importe em retroatividade vedada pela Constituição.
4. Inexiste direito adquirido a regime jurídico não sujeito a decadência." (RE nº 626.489/SE. Tribunal Pleno. Relator Ministro Roberto Barroso. Julgado em 16.10.2013)
Importante destacar, nas palavras do Juiz Federal João Batista Lazzari, em artigo escrito para a Revista de Doutrina desta Corte, que a concessão do benefício não prescreve ou decai, podendo ser postulada a qualquer tempo. Entendimento semelhante foi sustentado nas turmas do E. Superior Tribunal de Justiça, em reiterados julgados, nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA RURAL. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DO DIREITO. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 103 DA LEI N. 8.213/91.
1. Na hipótese de concessão de benefício previdenciário, é sabido que a prescrição não atinge o direito ao benefício, mas somente as prestações não pagas, conforme se infere da leitura das redações, a antiga e a atual, do art. 103 da Lei n. 8.213/91.
2. "Em matéria de previdência social, a prescrição só alcança as prestações, não o direito, que pode ser perseguido a qualquer tempo." (REsp 1.319.280/SE, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, PRIMEIRA TURMA, julgado em 6/8/2013, DJe 15/8/2013.) Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1384787/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 10/12/2013)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO. INAPLICABILIDADE NAS DEMANDAS PREVIDENCIÁRIAS QUE ENVOLVEM RELAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO E ATENDEM NECESSIDADES DE CARÁTER ALIMENTAR, RAZÃO PELA QUAL A PRETENSÃO À OBTENÇÃO DE UM BENEFÍCIO É IMPRESCRITÍVEL. AGRAVO REGIMENTAL DO INSS DESPROVIDO. 1. As normas previdenciárias primam pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais.2. Os benefícios previdenciários envolvem relações de trato sucessivo e atendem necessidades de caráter alimentar, razão pela qual a pretensão à obtenção de um benefício é imprescritível. 3. É firme o entendimento desta Corte de que, cumpridas as formalidades legais, o direito ao benefício previdenciário incorpora-se ao patrimônio jurídico do beneficiário, não podendo ser objeto, dest'arte, de modificação ou extinção. 4. Agravo Regimental do INSS desprovido. (AgRg no AREsp 311.396/SE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 03/04/2014)
Destarte, no caso, não se há falar em decadência porquanto o objeto da lide é o próprio direito ao benefício e às prestações correspondentes, estas, sim, sujeitas à prescrição quinquenal.
Dos requisitos para a concessão do benefício
A concessão de benefícios por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Extrai-se, da leitura dos dispositivos acima transcritos, que são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
Da qualidade de segurado e do período de carência
Quanto ao período de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício), estabelece o art. 25 da Lei de Benefícios da Previdência Social:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;
Na hipótese de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Prevê a LBPS que, decorrido o período de graça na forma do § 4º, as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado somente serão computadas para efeitos de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
Da comprovação da incapacidade laboral
A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação, através de exame médico-pericial, da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto essa condição persistir. Ainda, não obstante a importância da prova técnica, o caráter da limitação deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar de que fatores relevantes - como a faixa etária do requerente, seu grau de escolaridade e sua qualificação profissional, assim como outros - são essenciais para a constatação do impedimento laboral e efetivação da proteção previdenciária.
Dispõe, outrossim, a Lei 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.
Do caso concreto
A presente ação foi distribuída em 27/10/2009 no Juízo Estadual de São Luiz Gonzaga/RS com pedidos atinentes a benefícios por incapacidade.
A qualidade de segurado e o cumprimento do requisito da carência não foram contestados de forma contundente pelo INSS, não sendo, a priori, pontos controvertidos na presente ação. Assim, a matéria central a ser enfrentada, e motivo da decisão administrativa, diz respeito ao requisito da incapacidade.
Nesse passo, foi realizada perícia judicial (fls. 62/65 e 74) pelo Dr. Carlos Kuzli Kuzmik, especialista em neurologia, chegando às seguintes conclusões:
- Autora com 62 anos de idade;
- Profissão habitual auxiliar de enfermagem (desempregada);
- Apresenta sequelas de isquemia cerebral (CID I64), que lhe causam paresia esquerda e portanto incapacidade total e permanente;
- Teve três acidentes vasculares cerebrais: em 1984, 1987 e 2009;
- Episódios comprovados por tomografias cerebrais computadorizadas e ecografia de carótidas;
- Em relação ao início da incapacidade, não é possível precisá-la porquanto o perito não teve acesso aos prontuários médicos e arquivos periciais do INSS, porém a paresia esquerda remonta a 1984 - época do primeiro AVC.
Diante das conclusões periciais, observo que o INSS concedeu à autora o benefício de auxílio-doença nos períodos de 10/04/1984 a 30/06/1992 (NB 31/078.067.952-0) e de 15/10/1992 a 31/01/1995 (NB 31/041.111.935-4) justamente em razão dos AVCs sofridos àquela época.
Nesse norte, importa atentar ao fato de que o direito ao benefício surge para o segurado no momento em que são preenchidos os requisitos estabelecidos em lei para que dele possa gozar; assim, não há de se falar em perda da qualidade de segurado quando a única razão a justificar a ausência de contribuições ao RGPS é o fato de o segurado continuar incapacitado para o trabalho. Esse entendimento, aliás, é comungado pela própria Advocacia Geral da União que, orientando a atuação dos procuradores federais, reconhece, em sua Súmula nº 26, que "para a concessão de benefício por incapacidade, não será considerada a perda da qualidade de segurado decorrente da própria moléstia incapacitante".
A propósito do que foi exposto, transcrevo a bem lançada sentença de primeiro grau (fls. 81v/82), no ponto em que faz alusão à continuidade da incapacidade desde os episódios isquêmicos de 1984 e 1987, o que torna inquestionável a condição de segurada da parte autora, ainda que não haja registro de contribuições no período posterior a 1995:
Cumpre referir que o perito nomeado para a realização do trabalho é de confiança deste Juízo, não tendo sido deduzido nos autos qualquer argumento robusto capaz de desqualificar as conclusões declinadas no laudo médico das fls. 65/67.
Ainda, quanto à alegação do demandado de que não restou comprovado que quando do início da incapacidade a autora possuía qualidade de segurada, tenho que diante do caso entelado, no qual a incapacidade decorreu dos eventos de isquemia cerebral sofridos pela demandante, bem como considerando que no ano de 1992 o próprio réu reconheceu a incapacidade da requerente, forçoso concluir que desde a cessação administrativa, que ocorreu em 1995, a autora permanece incapacitada para suas atividades laborais.
O art. 15, I, da Lei nº 8.213/91, preceitua que mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições, sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício. Nesse ínterim, leciona Marina Vasques Duarte, em sua obra Direito Previdenciário, 6ª edição:
Se não requereu o auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez ou a administração cancelou-o indevidamente, mas faz prova de que fazia jus, também não perde esta qualidade. É o exemplo de alguém que esteve doente, incapacitado para o trabalho, mas não requereu auxílio-doença, ou perícia administrativa conclui pela capacidade e, em juízo, ele prova que não estava apto para o trabalho desde antes da perda da qualidade de segurado. (Editora Verbo Jurídico, Porto Alegre, 2008, p. 65-6) (grifei)
Portanto, a requerente manteve sua qualidade de segurada desde o ano de 1995, quando houve a cessação administrativa de seu benefício de auxílio-doença, visto que permanecia incapacitada em decorrência do segundo AVC que sofreu na época. Assim, não há falar em falta de qualidade de segurada da autora.
A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que se tornar incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, como ocorre no caso em tela. O art. 42 da Lei 8.213/1991 prevê que a aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Diante desse cenário, a sentença proferida pelo Juízo a quo é apropriada no ponto em que reconhece o direito da parte autora ao benefício de aposentadoria por invalidez, razão pela qual deve ser mantida.
O único reparo a ser feito deve-se à Súmula 576 do Superior Tribunal de Justiça, a qual dispõe que ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida.
Assim, considerando que não houve requerimento administrativo, dou parcial provimento ao reexame necessário para fixar o marco inicial da aposentadoria por invalidez em 12/11/2009 - data da citação do INSS (fl. 12v).
Da compensação de prestações inacumuláveis
Explicito que devem ser abatidos das prestações devidas na presente demanda os valores eventualmente já adimplidos pelo INSS a título de benefício inacumulável no mesmo período, seja administrativamente ou em razão de antecipação de tutela.
Custas processuais na Justiça Estadual do RS
O art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010, estabelece a isenção do pagamento de custas, mas obriga ao pagamento de eventuais despesas processuais no âmbito da Justiça Estadual de Primeiro e Segundo Graus do Rio Grande do Sul para as Pessoas Jurídicas de Direito Público.
Uma vez verificado que a sentença onerou a Autarquia com o pagamento de metade das custas, impõe-se o afastamento de tal ônus com o parcial provimento do reexame necessário.
Conclusão
A apelação do INSS foi desprovida. O reexame necessário foi parcialmente provido para fixar o marco inicial da aposentadoria por invalidez em 12/11/2009 - data da citação do INSS (fl. 12v) - e isentar a autarquia do pagamento de custas processuais na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e dar parcial provimento ao reexame necessário.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/11/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0010336-02.2014.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00537616720098210034
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NAIRA SONIA SERAFIM DE SOUZA |
ADVOGADO | : | Luis Roger Vieira Azzolin |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA CIVEL DA COMARCA DE SAO LUIZ GONZAGA/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/11/2016, na seqüência 1424, disponibilizada no DE de 16/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO REEXAME NECESSÁRIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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