
Apelação Cível Nº 5003821-10.2017.4.04.7104/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: PAULO MARTINS DAS CHAGAS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença proferida em 09/01/2019 (evento 105 - SENT1) e posteriormente corrigida, em resposta a embargos de declaração, em 15/02/2019, cuja parte dispositiva tem o seguinte teor (evento 116 - SENT1):
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos veiculados na petição inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito (NCPC, art. 487, inciso I) para os fins de:
a) reconhecer (no mínimo, dada a inexistência de ação de cobrança) prescritas as parcelas não reclamadas há mais de 5 anos da data desta sentença;
b) declarar indevida a cobrança dos valores recebidos pelo autor a título de aposentadoria por invalidez NB 32/135.900.102-3 no período de 13/07/2008 a 11/03/16, uma vez que não restou comprovada a atividade concomitante, nem demonstrada de forma consistente a inexistência de incapacidade neste período;
De outro lado, julgo improcedente o pedido de restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez.
Considerando a sucumbência recíproca, condeno cada parte ao pagamento de metade do valor dos honorários advocatícios calculados sobre o valor atualizado da causa, sopesados os critérios do artigo 85 do CPC/2015, observando-se, quando da liquidação do julgado, os percentuais mínimos previstos nos incisos do parágrafo terceiro do citado artigo por se tratar de causa em que a Fazenda Pública é parte.
Condeno, ainda, o autor a metade do valor das custas. O INSS é isento do pagamento das custas processuais (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96).
Os ônus de sucumbência restam com a exigibilidade suspensa em face do autor em razão da gratuidade da justiça deferida.
Em sua apelação, o autor requer o restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez, face a sua incapacidade laborativa, argumentando ser portador de patologia de CID 10 D69.6, denominada púrpura refratária (púrpura trombocitopênica idiopática), e possuir outros sintomas decorrentes do uso excessivo do medicamento Eltrombopag (Revolade), alternativamente ao primeiro pedido, requer que seja observado o inciso II do art. 47 da Lei 8.213/91, alíneas a, b e c, pagando-se os valores devidos a título de mensalidade de recuperação, pelo período de gozo do benefício ter sido superior aos 5 anos previsto no inciso I do referido artigo, e subsidiariamente ao segundo pedido, caso não seja esse o entendimento, requer a anulação da sentença, alegando contradição do laudo pericial no qual se funda a decisão de primeira instância com as demais provas produzidas e requerendo a designação de médico especialista para nova perícia médica judicial (evento 122 - APELAÇÃO1).
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
VOTO
AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ
O art. 59 da Lei n.º 8.213/91 estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido na referida lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213/91 estabelece que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
A Lei nº 8.213/91 estabelece que, para a concessão dos benefícios em questão, deve ser cumprida a carência correspondente a 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), a qual é dispensada nos casos legalmente previstos (art. 26, II, da Lei nº 8.213/91).
O fato de a incapacidade temporária ser total ou parcial para fins de concessão do auxílio-doença não interfere na concessão desse benefício, uma vez que, por incapacidade parcial, deve-se entender aquela que prejudica o desenvolvimento de alguma das atividades laborativas habituais do segurado. No mesmo sentido, assim já decidiu o e. STJ:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO HABITUAL.
1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício de outras atividades laborais.
2. Recurso improvido. (STJ, REsp 501267 / SP, rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, T6 - SEXTA TURMA, DJ 28/06/2004 p. 427)
Por fim, a diferença entre os dois benefícios restou esclarecida consoante excerto doutrinário abaixo colacionado:
"A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017.)
O direito à aposentadoria por invalidez e ao auxílio-doença pressupõe a presença de três requisitos: (1) qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, que dispensam o prazo de carência, e (3) requisito específico, relacionado à existência de incapacidade impeditiva para o labor habitual em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após o ingresso no RGPS, nos termos do art. 42, § 2º, e art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/91.
CASO CONCRETO
a) Incapacidade:
A controvérsia recursal envolve a comprovação da incapacidade laborativa do autor para fins de restabelecimento do benefício nº 32/135.900.102-3, de aposentadoria por invalidez, desde a data da cessação em 11/03/2016.
A matéria devolvida diz respeito à existência ou não de quadro incapacitante a comprometer a capacidade laboral do autor. Foi realizada perícia médica no autor, em 03 de agosto de 2018, a fim de que fosse esclarecido o seu estado de saúde e a sua capacidade laborativa (evento 88 - LAUDOPERI1).
A sentença foi no sentido da improcedência do pedido, pois o laudo médico atestou a aptidão para o exercício de atividade laboral, afirmando inexistir incapacidade para o trabalho, ainda que reconhecendo que o autor seja portador de púrpura trombocitopênica idiopática (D69.3), conforme excerto (evento 88 - LAUDOPERI1):
"(...)
Histórico da doença atual: Periciado, 53 anos de idade, refere diagnóstico de púrpura refratária em 2015 após realização de um hemograma que evidenciou um número baixo de plaquetas (segundo informações relatadas). Refere ainda diabetes em tratamento e acompanhamento no posto de saúde. Está em uso de eltrombopag, alopurinol, anlodipino, metformina, sinvastatina, complexo B, enalapril, omeprazol e insulina. Apresenta CNH categoria B renovada em 15/12/2014. Mora com a esposa.
Exames físicos e complementares: Exame Físico:
Ao exame físico apresenta bom estado geral. Lúcido, orientado e coerente. Marcha sem alterações. Mucosas úmidas e coradas. Cuidados pessoais preservados. Membros superiores e inferiores sem alterações de força, sensibilidade e amplitude de movimentos. Joelhos sem alterações aparentes. Coluna cervical, dorsal e lombossacra, sem alterações evidentes. Teste de Lasègue negativo bilateralmente. Corpo sem evidências de hemorragias clinicamente evidenciáveis. Ausculta cardíaca sem alterações. Presença de tosse produtiva. Ausculta pulmonar com presença de estertores basais.
Exames Complementares:
- Atestado médico datado do dia 17/07/2015 referindo púrpura refratária prescrevendo eltrombopag; sem solicitação de afastamento.
- Atestados médicos datados de 01/06/2017 e 06/07/2018 sem solicitação de afastamento.
- Exames de laboratório datados de 27/07/2018.
Diagnóstico/CID:
- Púrpura trombocitopênica idiopática (D693)
Justificativa/conclusão: Com base na anamnese, no exame físico, nos exames complementares e nos laudos apresentados o periciado não apresenta incapacidade para a sua função. A púrpura trombocitopênica é uma doença crônica que ocasiona a diminuição do número de plaquetas no sangue e pode ocasionar o aparecimento de petéquias, equimoses e outras manifestações hemorrágicas. No entanto, também existem muitos casos em que a púrpura não causa qualquer tipo de sintomas, sendo que a pessoa é diagnosticada com a doença apenas porque apresenta uma quantidade de plaquetas no sangue inferior a 10.000/mm³. O periciado não comprova internações hospitalares motivadas pela púrpura trombocitopênica. Não há qualquer impedimento para o desempenho de suas funções. Diante do exposto, o periciado não comprova incapacidade laboral.
O periciado nunca foi meu paciente.
Não existem indícios de que as doenças apresentadas decorram de suas atividades laborais (acidente de trabalho ou doença ocupacional).
Data de Início da Doença: 2015
Data de Início da Incapacidade: sem incapacidade
Data de Cancelamento do Benefício: sem incapacidade
- Sem incapacidade (...)"
Conforme se observa do laudo judicial, o perito foi taxativo ao afirmar que o autor, diante do exame físico, dos exames complementares e dos laudos apresentados, não se encontra incapaz para o exercício de suas atividades habituais.
Assim, havendo o parecer médico oficial concluído pela inexistência de incapacidade para o exercício de atividades laborais habituais, e inexistindo prova substancial em contrário, não há direito à manutenção do benefício por incapacidade.
Em que pesem os documentos apresentados pela parte autora darem conta da moléstia que poderia gerar a incapacidade arguida, conclui-se, a partir de um exame do conjunto probatório dos autos, que deve subsistir a presunção legal de veracidade do exame pericial judicial. Vale dizer que, embora essa presunção não seja absoluta, a parte autora não logrou demonstrar que a sua doença é incapacitante.
Com efeito, os atestados médicos acostados pela parte autora se mostram isolados nos autos, constituindo prova unilateral, produzidos a partir da conclusão de médico particular. Desse modo, a prova produzida pelo autor se mostra insuficiente para infirmar o laudo médico judicial apresentado, conforme excerto da sentença do juízo de origem (evento 105 - SENT1):
"Neste contexto, tenho que no momento atual os documentos juntados aos autos pelo autor não corroboram a versão de incapacidade para o trabalho em razão de ser portador de púrpura refratária. No E1, OUT4, consta um atestado de que possui púrpura refratária e necessita do medicamento Revolade de forma contínua, bem como pedido do medicamento na Secretaria Estadual de Saúde e orçamentos. No E81, OUT2 consta uma internação por prostatite em 2016, solicitações de exames médicos, receituários, realização de um procedimento ambulatorial de retirada de cálculo salivar do assoalho anterior da boca em maio de 2018.
Portanto, acolho como provada a ausência de incapacidade laborativa atual do autor, respaldada no laudo pericial produzido em Juízo, restando improcedente o pedido de restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez."
Excerto da sentença em embargos de declaração, proferida pelo juízo de origem, vai no mesmo sentido (evento 116 - SENT1):
"Analisando os argumentos expendidos nos embargos de declaração do E105, entendo que não há qualquer omissão no tocante ao indeferimento do restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez, isso porque, há um tópico inteiro tratando do assunto (2. Do restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez, 2.1 Dos benefícios por incapacidade: considerações gerais e 2.2. Caso Concreto).
Contrariamente ao afirmado pelo autor, esse Juízo não ignorou o conjunto probatório dos autos, especificamente as provas documentais e testemunhais. Todavia, analisando todos os elementos constantes do processo, entendi que, apesar do autor ser portador de doença crônica (púrpura refratária) e fazer uso contínuo de medicação, a incapacidade não é constante e linear. Ao que parece, em alguns momentos o autor está incapaz para o trabalho, em outros não.
Como destacado na sentença do E105, os documentos juntados aos autos pelo autor não corroboram a versão de incapacidade para o trabalho em razão de ser portador de púrpura refratária. No E1, OUT4, consta um atestado de que possui púrpura refratária e necessita do medicamento Revolade de forma contínua, bem como pedido do medicamento na Secretaria Estadual de Saúde e orçamentos. No E81, OUT2 consta uma internação por prostatite em 2016, solicitações de exames médicos, receituários, realização de um procedimento ambulatorial de retirada de cálculo salivar do assoalho anterior da boca em maio de 2018. Não vislumbro nesses documentos qualquer relação de incapacidade laboral decorrente da púrpura refratária. Ademais, o laudo pericial produzido em juízo (E.88) apontou de forma clara a ausência de incapacidade laborativa atual do autor."
Destaque-se que o perito judicial detém o conhecimento científico necessário ao exame do segurado, ficando ao seu cargo a análise dos exames laboratoriais ou físicos para exarar o seu diagnóstico. A desconsideração do laudo pericial somente se justificaria com base em robusto contexto probatório, constituído por exames que sejam seguramente indicativos da incapacidade para o exercício de atividade laborativa e que coloquem, efetivamente, em dúvida a conclusão do expert do juízo.
Embora o julgador não esteja adstrito à perícia judicial, é inquestionável que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo se houver motivo relevante, uma vez que o perito judicial se encontra em posição equidistante das partes, mostrando-se imparcial e com mais credibilidade. Dessa forma, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente caso.
Conforme reiteradamente afirmado por esta Corte, "a concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial" (TRF4, APELREEX 0013571-06.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 11/07/2017). Apenas em situações excepcionais é que o magistrado pode, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo perito.
Além disso, a existência de patologia ou lesão nem sempre significa incapacidade para o trabalho. Doença e incapacidade podem coincidir ou não, dependendo da gravidade da moléstia, das atividades inerentes ao exercício laboral e da sujeição e resposta ao tratamento indicado. Portanto, nem toda enfermidade gera a incapacidade necessária ao deferimento, à manutenção ou ao restabelecimento dos benefícios previdenciários postulados.
Dessa forma, não reconhecida a incapacidade atual do autor para o trabalho, não é devido o restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez.
Quanto ao pedido alternativo trazido pelo autor, na apelação, considerando o gozo, pela parte autora, do benefício de aposentadoria por invalidez por período superior a 5 (cinco) anos, de 01/10/2004 a 11/03/2016, verifica-se que é caso de aplicação da hipótese prevista no inciso II e alíneas do art. 47 da Lei 8.213/91:
Art. 47. Verificada a recuperação da capacidade de trabalho do aposentado por invalidez, será observado o seguinte procedimento:
I - quando a recuperação ocorrer dentro de 5 (cinco) anos, contados da data do início da aposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença que a antecedeu sem interrupção, o benefício cessará:
a) de imediato, para o segurado empregado que tiver direito a retornar à função que desempenhava na empresa quando se aposentou, na forma da legislação trabalhista, valendo como documento, para tal fim, o certificado de capacidade fornecido pela Previdência Social; ou
b) após tantos meses quantos forem os anos de duração do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, para os demais segurados;
II - quando a recuperação for parcial, ou ocorrer após o período do inciso I, ou ainda quando o segurado for declarado apto para o exercício de trabalho diverso do qual habitualmente exercia, a aposentadoria será mantida, sem prejuízo da volta à atividade:
a) no seu valor integral, durante 6 (seis) meses contados da data em que for verificada a recuperação da capacidade;
b) com redução de 50% (cinqüenta por cento), no período seguinte de 6 (seis) meses;
c) com redução de 75% (setenta e cinco por cento), também por igual período de 6 (seis) meses, ao término do qual cessará definitivamente.
Tendo sido o autor submetido, em 11/03/2016, a perícia médica na esfera administrativa que o considerou apto para o trabalho, conforme informado pela autarquia previdenciária no Ofício MOB nº 170/2016, juntado aos autos no evento 1 - PROCADM3, gerando a cessação do benefício de aposentadoria por invalidez, deveria o INSS ter mantido o pagamento da mensalidade de recuperação legalmente prevista, tendo em vista a percepção do benefício de aposentadoria por invalidez por mais de 05 anos ininterruptos, devendo então ser dado parcial provimento à apelação do autor.
b) Conclusão:
Está, portanto, configurada a hipótese prevista no inciso II do art. 47 da Lei 8213/91, fazendo jus o autor ao recebimento, com juros e correção monetária, dos valores referentes às mensalidades de recuperação não implementadas, conforme previsão do inciso II e alíneas do art. 47 da Lei 8.213/91, a contar do mês subsequente ao da data da cessação administrativa do benefício de aposentadoria por invalidez (11/03/2016), no seu valor integral, durante 6 (seis) meses contados da data em que foi verificada a recuperação da capacidade do autor pela perícia administrativa do INSS (do mês de abril/2016 a setembro/2016), com redução de 50% (cinquenta por cento), no período seguinte de 6 (seis) meses (do mês de outubro/2016 a março/2017) e com redução de 75% (setenta e cinco por cento), também por igual período de 6 (seis) meses (do mês de abril/2017 a setembro/2017).
CONSECTÁRIOS LEGAIS: correção monetária e juros
Correção monetária
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O art. 491 do Código de Processo Civil, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E, no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE 870.947, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017), fixando as seguintes teses sobre a questão da correção monetária e dos juros moratórios nas condenações impostas à Fazenda Pública:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º,caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.
Não se extrai da tese firmada pelo STF no Tema nº 810 qualquer sinalização no sentido de que foi acolhida a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009. A leitura do inteiro teor do acórdão demonstra que o Plenário não discutiu a fixação dos efeitos do julgado a partir de 25 de março de 2015, nos mesmos moldes do que foi decidido na questão de ordem das ADI nº 4.357 e 4.425.
No que diz respeito ao índice de correção monetária a ser utilizado na atualização dos débitos decorrentes de condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, cabe observar que o texto da tese consolidada, constante na ata de julgamento do RE nº 870.947, não incorporou a parte do voto do Ministro Luiz Fux que define o IPCA-E como indexador. Depreende-se, assim, que a decisão do Plenário, no ponto em que determinou a atualização do débito judicial segundo o IPCA-E, refere-se ao julgamento do caso concreto e não da tese da repercussão geral. Portanto, não possui efeito vinculante em relação às instâncias ordinárias.
Recentemente, todavia, o Ministro Luiz Fux proferiu decisão no RE 870.947, deferindo excepcionalmente efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pelos entes federativos estaduais, a fim de obstar a imediata aplicação do acórdão.
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, discutiu a aplicabilidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, em relação às condenações impostas à Fazenda Pública, em julgamento submetido à sistemática de recursos repetitivos (REsp 1.495.146/MG, REsp 1.492.221/PR, REsp 1.495.144/RS - Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, j. em 22/02/2018). Quanto aos índices de correção monetária e juros de mora aplicáveis às ações previdenciárias, a tese firmada no Tema nº 905 foi redigida nos seguintes termos:
3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Porém, no juízo de admissibilidade do recurso extraordinário interposto contra o acórdão proferido no REsp n.º 1.492.221/PR (Tema 905 do STJ), a Ministra Maria Thereza de Assis Moura igualmente atribuiu efeito suspensivo à decisão que é objeto do recurso.
Portanto, não há ainda definição do índice de atualização monetária aplicável aos débitos de natureza previdenciária.
Em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os artigos 4º, 6º e 8º, todos do CPC, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelos tribunais superiores, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelas Cortes Superiores a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a definição do índice de atualização monetária aplicável, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
Juros moratórios
Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Honorários advocatícios
Não obstante o provimento parcial da apelação, fica mantida a sucumbência recípoca, razão pela qual mantenho os honorários advocatícios nos termos em que fixados na sentença.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação e, de ofício, diferir para a fase de cumprimento de sentença a definição do índice de atualização monetária aplicável.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001003502v61 e do código CRC b77f4f41.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ADRIANE BATTISTI
Data e Hora: 16/5/2019, às 17:8:17
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:36:24.

Apelação Cível Nº 5003821-10.2017.4.04.7104/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: PAULO MARTINS DAS CHAGAS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria por invalidez. mensalidade de recuperação. laudo médico. CONSECTÁRIOS LEGAIS. CUSTAS.
1. O acesso aos benefícios previdenciários de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença pressupõe a presença de 3 requisitos: (1) qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) carência de 12 contribuições mensais, salvo as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, que dispensam o prazo de carência, e (3) requisito específico, relacionado à existência de incapacidade impeditiva para o labor habitual em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após o ingresso no RGPS, nos termos do art. 42, § 2º, e art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/91.
2. A desconsideração do laudo somente se justifica por significativo contexto probatório contraposto à conclusão do perito judicial, constituído por exames que sejam seguramente indicativos da incapacidade para o exercício de atividade laborativa.
3. Se houve a conclusão administrativa de capacidade laboral, não há motivo para que não sejam aplicadas as regras estabelecidas no inc. II do art. 47 da Lei 8.213/91.
4. Difere-se para a fase de cumprimento de sentença a definição do índice de atualização monetária aplicável, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
5. Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e, de ofício, diferir para a fase de cumprimento de sentença a definição do índice de atualização monetária aplicável, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de maio de 2019.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001003503v11 e do código CRC 41f83c6e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ADRIANE BATTISTI
Data e Hora: 16/5/2019, às 17:8:17
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/05/2019
Apelação Cível Nº 5003821-10.2017.4.04.7104/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: PAULO MARTINS DAS CHAGAS (AUTOR)
ADVOGADO: TALITA ROSÁLIA BATTOCCHIO (OAB RS086828)
ADVOGADO: GIOVANA DAMETO MERTZ (OAB RS099548)
ADVOGADO: TAISE LECI SMANIOTTO (OAB RS066199)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/05/2019, na sequência 104, disponibilizada no DE de 26/04/2019.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, DIFERIR PARA A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA A DEFINIÇÃO DO ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEL.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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