APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5012665-28.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | FERNANDO QUADROS DA SILVA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMA APARECIDA ZORZATO TOLENTINO |
ADVOGADO | : | FLÁVIO RODRIGUES DOS SANTOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE LABORAL. CARÊNCIA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - DEFINIÇÃO NO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. TUTELA ESPECÍFICA. MULTA DIÁRIA.
1. O segurado portador de enfermidade que o incapacita total e permanentemente tem direito à concessão da aposentadoria por invalidez desde a data em que constatada sua incapacidade.
2. Matéria referente aos critérios de aplicação dos juros de mora e correção monetária sobre os valores devidos que fica diferida para a fase de execução/cumprimento.
3. Mantida a ordem para cumprimento imediato da tutela específica independente de requerimento expresso do segurado ou beneficiário. Seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/73, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/15.
4. A 3ª Seção desta Corte entende que a fixação de multa diária cominatória no montante de R$ 100,00 (cem reais) por dia se afigura suficiente e adequada para garantir o cumprimento da obrigação (v.g AC n. 0021976-70.2012.404.9999/PR, 6ª Turma, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DE 18-09-2013).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar/PR do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa ex officio, dar provimento à apelação da parte autora e confirmar a tutela antecipatória deferida na sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 03 de outubro de 2017.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9142633v5 e, se solicitado, do código CRC 7C1B541B. | |
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RELATÓRIO
Trata-se de ação de concessão de benefício de aposentadoria por invalidez ou restabelecimento de auxílio-doença ou concessão de benefício assistencial à pessoa deficiente proposta por VILMA APARECIDA ZORZATO TOLENTINO em face do INSS.
Aduz que é segurada do INSS e que está sofrendo com moléstia incapacitante, não podendo mais trabalhar para seu sustento. Relata que é portadora de esquizofrenia e depressão, o que a impede de ter relacionamentos sociais e de trabalho. Aduz que recebeu auxílio-doença de 12-07-11 a 02-02-12, quando foi suspenso com fundamento de ausência de incapacidade. Pugnou pela procedência da ação.
Processado o feito, a ação foi julgada procedente para conceder à autora o benefício de auxílio-doença desde 12-01-12 até sua alta ou reabilitação. As parcelas em atraso devem ter atualização monetária a partir de cada vencimento pelo INPC, a partir de 25-03-15 será pelo IPCA-E; os juros de mora serão contados a partir da sentença aplicados uma única vez pelo índice oficial da caderneta de poupança.
Condenado o INSS ao pagamento de custas e despesas processuais, bem como de honorários advocatícios de 10% do valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111 do STJ). Deferida tutela antecipada para implantação do benefício em até 30 dias, sob pena de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais). Sentença enviada para reexame necessário (Evento 49).
Ambas as partes apelaram.
O INSS alega que a perícia constatou que a autora tem incapacidade para trabalhar em atividade rural, mas ainda é capaz para o trabalho de empregada doméstica. Sustenta que as perícias realizadas demonstram que o quadro de saúde da autora está estabilizado. Aduz que a autora não precisaria de uma reabilitação para passar a exercer a profissão de empregada doméstica, eis que não existe diferença educacional significativa entre essa atividade e a rural.
Afirma que, ainda que a incapacidade da autora tenha início em 2011, no ano de 2012 houve melhora em suas condições de saúde, constatada em perícia do INSS, sendo considerada capaz. Entende que essa capacidade perdurou por mais alguns anos, pois a autora não retornou à autarquia para renovar seu pedido por incapacidade. Requer a improcedência da ação.
Mantida a condenação, requer seja fixada a DIB na data da perícia judicial, em 12-12-14. Requer, ainda, a aplicação da TR para a correção monetária a partir de julho de 2009. Subsidiariamente, requer seja aplicada a Lei nº 11.960/09. Ainda, entende que é nula a imposição de multa diária na fase processual, que é presunção de recalcitrância antes de a própria decisão ser descumprida. Julga que o prazo para cumprimento da tutela deve ser estendido para 45 (quarenta e cinco) dias e o valor da multa, caso mantido, deve ser reduzido para R$ 50,00 (cinquenta reais) (Evento 55).
A parte autora alega que foi constatada em perícia que a incapacidade da autora é permanente e não há cura, o que impõe a condenação do INSS em conceder benefício de aposentadoria por invalidez. Sustenta que a autora poderia até ter forças nos braços e conhecimento mínimo para o trabalho como empregada doméstica, no entanto, não tem qualquer credibilidade perante a sociedade para que alguém lhe dê emprego. Requer seja concedida a aposentadoria desde 2011, data da constatação de sua invalidez, ou, alternativamente, desde o indeferimento administrativo (12-01-12) (Evento 57).
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte. O Ministério Público Federal apresentou parecer, da lavra do Procurador Regional da República Fábio Nesi Venzon, opinando, preliminarmente: a) pela anulação do feito a partir da perícia, a fim de que outra seja realizada por médico psiquiatra; b) subsidiariamente, a conversão do julgamento em diligência com a mesma finalidade; c) o provimento parcial do reexame necessário para corrigir erro material da sentença no tocante à antecipação de tutela. No mérito, pelo conhecimento e parcial provimento da apelação do INSS para reduzir o valor da multa diária, e pelo desprovimento da apelação da autora.
É o relatório.
Peço dia.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9142631v14 e, se solicitado, do código CRC CBFFC7EB. | |
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VOTO
DIREITO INTERTEMPORAL
Inicialmente, cumpre o registro de que a sentença recorrida foi publicada em data anterior a 18-03-2016, quando passou a vigorar o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16-03-2015), consoante decidiu o Plenário do STJ.
REMESSA EX OFFICIO
Nos termos do artigo 475 do CPC/1973, está sujeita à remessa ex officio a sentença prolatada contra as pessoas jurídicas de direito público nele nominadas - à exceção dos casos em que, por simples cálculos aritméticos, seja possível concluir que o montante da condenação ou o proveito econômico obtido na causa é inferior a 60 salários mínimos.
No caso vertente, não sendo possível verificar de plano se o valor da condenação excede ou não o limite legal de 60 salários mínimos (vigente à época da prolação da sentença), aplica-se a regra geral da remessa ex officio, motivo pelo qual a considero feita.
MÉRITO
A concessão de benefícios por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Extraem-se, da leitura dos dispositivos acima transcritos, que são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
Tendo em vista que a aposentadoria por invalidez pressupõe incapacidade total e permanente, cabe ao juízo se cercar de todos os meios de prova acessíveis e necessários para análise das condições de saúde do requerente, mormente com a realização de perícia médica.
Aos casos em que a incapacidade for temporária, ainda que total ou parcial, caberá a concessão de auxílio-doença, que posteriormente será convertido em aposentadoria por invalidez (se sobrevier incapacidade total e permanente),auxílio-acidente (se a incapacidade temporária for extinta e o segurado restar com sequela permanente que reduza sua capacidade laborativa) ou extinto (com a cura do segurado).
Quanto ao período de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício), estabelece o artigo 25 da Lei de Benefícios da Previdência Social:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;
(...)
Na hipótese de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições, prevê o artigo 15 da Lei nº 8.213/91 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Prevê a LBPS que, decorrido o período de graça na forma do § 4º, as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado somente serão computadas para efeitos de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
Cumpre destacar que no caso dos segurados especiais não há obrigatoriedade de preenchimento do requisito carência conforme acima referido, sendo necessária, porém, a comprovação de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mesmo que de forma descontínua.
Assim dispõe o artigo 39 da Lei 8.213/91:
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou
(...)
Nestes casos, o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Entretanto, embora o artigo 106 da LBPS relacione os documentos aptos à comprovação da atividade rurícola, tal rol não é exaustivo, sendo admitidos outros elementos idôneos.
A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação, por meio de exame médico-pericial, da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto essa condição persistir. Ainda, não obstante a importância da prova técnica, o caráter da limitação deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar de que fatores relevantes - como a faixa etária do requerente, seu grau de escolaridade e sua qualificação profissional, assim como outros - são essenciais para a constatação do impedimento laboral e efetivação da proteção previdenciária.
Dispõe, outrossim, a Lei nº 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.
CASO CONCRETO
1) qualidade de segurada da autora e 2) o cumprimento da carência: não havendo controvérsia a respeito, passo à análise da incapacidade laborativa.
3) a incapacidade para o trabalho: no caso concreto, foi realizada perícia médica na segurada em 12-12-14 pelo perito judicial médico especialista em ortopedia e traumatologia, com laudo técnico acostado aos autos (Evento 41), conforme descrito a seguir:
a) enfermidades: distúrbio mental não especificado (transtorno psicótico) (CID F23.1);
b) incapacidade: existente;
c) grau da incapacidade: parcial;
d) prognóstico da incapacidade: permanente;
e) início da incapacidade: 2011;
f) outras informações pertinentes: a autora está em tratamento, mas não há como precisar data do início da melhora. A doença da autora é incurável. A autora necessita de permanente cuidado médico e utilização de medicamentos. Seu último trabalho foi de empregada doméstica, mas não pode mais exercê-lo pela limitação do convívio social. O perito entende que a autora pode trabalhar na zona rural.
Do exame dos autos colhem-se, ainda, as seguintes informações a respeito da parte autora, na data da perícia:
a) idade: 37 anos;
b) profissão: agricultora e empregada doméstica;
c) comprovantes médicos acostados aos autos: guia de referência para alta hospitalar psiquiátrico após internamento de 11-05 a 07-06-11 (Evento 1, OUT9, fl. 6); atestado médico de período de internamento psiquiátrico (Evento 1, OUT10).
d) extrato de consulta ao CNIS: informação de recebimento de benefício previdenciário e contribuições individuais (Evento 55, OUT2).
As conclusões periciais dão conta de que a autora apresenta quadro de grave doença psiquiátrica incurável (transtorno psicótico), o que a impossibilita de trabalhar como doméstica, mas ainda permite que trabalhe na agricultura.
APELAÇÕES E REMESSA EX OFFICIO
O INSS apela por julgar que a parte autora pode ainda trabalhar como empregada doméstica. Esse entendimento é contrário ao do perito que afirmou que:
"A autora possui uma limitação para algumas atividades, mas não completa. Está apta para cuidar de sua casa, mas não creio que esteja apta para trabalhar em casa de outra família (empregada doméstica). (...).
R: O último trabalho foi como empregada doméstica. Não pode continuar a exercê-lo, pela limitação do convívio social. (...)
(...) Não tem condições de trabalhar como empregada doméstica."
A alegação de que a autora teve melhora no ano de 2012 e que seu quadro de saúde está estabilizado deve ser afastada, pois entendo que a incapacidade deve ser analisada sob aspectos do caso concreto, tendo o laudo médico como amparo para a convicção, via de regra, mas não como documento único. Pois bem.
A doença da autora tem a seguinte descrição na Classificação Internacional de Doenças 10 (CID):
F 23.1 - Transtorno psicótico agudo polimorfo, com sintomas esquizofrênicos Classificação Internacional de Doenças
Nota: Transtorno psicótico agudo caracterizado pela presença do quadro clínico polimorfo e instável descrito em F23.0, mas comportando além disso, e apesar da instabilidade do quadro clínico, alguns sintomas tipicamente esquizofrênicos, presentes durante a maior parte do tempo.
Quando os sintomas esquizofrênicos persistem, o diagnóstico deve ser modificado pelo de esquizofrenia (F20.-).
Vê-se, assim, que a doença da autora pode ser considerada grave e imprevisível (quadro clínico polimorfo e instável). Assim como à autora não é recomendável trabalhar em uma casa de família por causa do convívio social, também fica prejudicado o exercício de trabalho na lavoura, onde a mesma terá que cumprir ordens de alguém, ou terá que conviver com os demais que lá estiverem, ou a outras pessoas terá que supervisionar. Ou seja, não se pode determinar, com certeza, que a falta de habilidade social que impede a autora de trabalhar na zona urbana não a impeça de também trabalhar na zona rural, mormente quando não se pode ter a certeza do que, onde e com quem ela trabalhará.
Assim, julgo que as mesmas razões psiquiátricas que impedem a autora de prosseguir com seu trabalho de empregada também obstam seu retorno à agricultura.
Ademais, a autora já tem mais de 40 anos (nasceu em 1977), nunca estudou, é rurícola, trabalhou apenas 3 (três) anos na zona urbana, apresenta doença psiquiátrica, mora na cidade e não mais na zona rural da cidade. Ainda que tenha controle sobre a moléstia com medicamentos, o próprio perito afirma que inexiste cura para a doença, e não há como precisar data de início de melhora. Ou seja, como estava a autora no momento da perícia, mais capacitada não ficará.
Para o perito, a autora está parcial e permanentemente incapacitada, podendo ainda exercer suas atividades laborais na agricultura, como fazia antes de ser empregada doméstica. Julgo, no entanto, que essa constatação deve ser considerada em favor do direito da autora, pois a mesma é portadora de doença psiquiátrica, incurável, bem como vem buscando tratamento desde sempre.
Entendo que a apelação da parte autora deve ser acolhida em seus argumentos, de que a autora não tem mais possibilidade de reabilitação ou recuperação. Ressalto o apontado em apelação: a autora não tem mais credibilidade perante a sociedade para conseguir um emprego nas condições de saúde em que se encontra.
Por essa razão, entendo que deva ser concedido à parte autora o benefício de aposentadoria por invalidez a partir da suspensão do benefício anterior de auxílio-doença (02-02-12). Esta Turma firmou entendimento no sentido de que, evidenciado que a incapacidade laboral já estava presente quando da suspensão ilegal de benefício previdenciário, mostra-se correto o estabelecimento do termo inicial do benefício em tal data. No caso dos autos, ficou demonstrado que a autora tinha sua incapacidade instalada já naquela data.
Devem, também, ser pagas as parcelas atrasadas, corrigidas, compensando-se os valores já recebidos a esse título.
CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA
Vinha entendendo, em razão de tratar-se de norma de natureza instrumental e com fulcro no entendimento das Cortes Superiores, pela imediata aplicabilidade da Lei nº 11.960/09, mesmo naquelas ações ajuizadas anteriormente ao seu advento.
Entretanto, recentemente o STF julgou parcialmente procedente a ADI nº 4.357, a qual, dentre outras questões, tratou das regras de atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública (incidência dos índices oficiais de remuneração básica e juros da caderneta de poupança), oportunidade em que a Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do artigo 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97.
Com efeito, o STF decidiu pela inconstitucionalidade da expressão índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, visto que a taxa básica da poupança não mede a inflação acumulada no período, não servindo, portanto, de parâmetro para correção monetária dos débitos da Fazenda Nacional.
Posteriormente, em 25-03-2015, o STF concluiu o julgamento da ADI em questão, tratando da modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade da Emenda nº 62/2009. No referido julgamento, entretanto, o STF limitou-se a conferir eficácia prospectiva da decisão aos precatórios expedidos ou pagos até a data da mencionada manifestação judicial (25-03-2015).
Persistindo controvérsia acerca da questão referente à modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade em comento, notadamente no que se refere às regras de correção monetária aplicáveis às dívidas da Fazenda Pública decorrentes de condenações judiciais na fase anterior à atualização dos precatórios, foi reconhecida pelo STF a existência de repercussão geral no julgamento do RE nº 870.947.
A questão constitui o Tema nº 810 em sede de Repercussão Geral no STF, contando com a seguinte descrição: Validade da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, conforme previstos no art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009.
Decorrentemente, considerando ainda não estar plenamente resolvida a modulação dos efeitos da referida decisão do STF, que deverá nortear os julgamentos nesta instância, filio-me ao entendimento já adotado pelas Turmas integrantes da 3ª Seção desta Corte, no sentido de que o exame da referida matéria deva ser diferido para a fase de execução da sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo de conhecimento.
Nessa linha de entendimento, vale o registro de precedente do Superior Tribunal de Justiça:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. ANISTIA POLÍTICA. PAGAMENTO RETROATIVO DOS EFEITOS FINANCEIROS. CONCESSÃO DA ORDEM. REVISÃO DA PORTARIA DE ANISTIA. NÃO-COMUNICAÇÃO ANTES DO JULGAMENTO DO WRIT. SUSPENSÃO DO FEITO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA PARA O ADIMPLEMENTO IMEDIATO. NECESSIDADE DE EXECUÇÃO (ARTIGO 730 DO CPC). JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. QUESTÃO QUE EXTRAPOLA O OBJETO DO MANDAMUS. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 5º DA LEI N. 11.960/09. MODULAÇÃO DE EFEITOS NÃO CONCLUÍDA PELO STF. DIFERIMENTO PARA A FASE EXECUTIVA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1 e 2, omissis. 3. Diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no MS nº 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, 3ª Seção, DJe 15-10-2014)
Portanto, reconhecido o direito à incidência de juros de mora e correção monetária sobre os valores devidos, por ser questão de ordem pública e a fim de dar efetividade à prestação jurisdicional, fica diferida para a fase de execução/cumprimento a definição quanto à forma da sua aplicação.
CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula 111 do STJ e Súmula 76 deste Tribunal:
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
TUTELA ESPECÍFICA
Quanto a antecipação dos efeitos da tutela, a 3ª Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QOAC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper, DE 01-10-2007).
Assim sendo, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Quanto à multa imposta, esclareço que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido do cabimento da fixação de multa por descumprimento de obrigação de fazer, não fazendo distinção entre fixação prévia ou posterior a eventual resistência à ordem judicial (AgRg no REsp 1409194/PB, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/12/2013, DJe 16/12/2013, AgRg no AREsp 296.471/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 03/04/2014).
Já quanto ao valor da astreinte, é razoável sua redução para R$ 100,00 (cem reais) por dia, pois a Terceira Seção desta Corte passou a entender que a fixação de multa diária cominatória neste montante se afigura suficiente e adequada para garantir o cumprimento da obrigação (v.g AC n. 0021976-70.2012.404.9999/PR, 6ª Turma, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-09-2013).
Neste aspecto, portanto, merece reparo o decisum para majorar o prazo de cumprimento da obrigação para 45 dias e reduzir o valor da multa diária para R$ 100,00 (cem reais).
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelação do INSS e remessa ex officio: provida em parte para diferir para a execução/cumprimento a matéria referente aos critérios de atualização monetária e juros de mora contemplados na Lei nº 11.960/09, para majorar o prazo de cumprimento da tutela antecipada e reduzir a multa diária.
Apelação da parte autora: provida.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação do INSS e remessa ex officio, dar provimento à apelação da parte autora e confirmar a tutela antecipatória deferida na sentença.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 03/10/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5012665-28.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00015823920138160105
RELATOR | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Eduardo Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMA APARECIDA ZORZATO TOLENTINO |
ADVOGADO | : | FLÁVIO RODRIGUES DOS SANTOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 03/10/2017, na seqüência 505, disponibilizada no DE de 18/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E REMESSA EX OFFICIO, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E CONFIRMAR A TUTELA ANTECIPATÓRIA DEFERIDA NA SENTENÇA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO | |
: | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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