APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002610-90.2014.4.04.7120/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE ALTAIR MACHADO DE BASTOS |
ADVOGADO | : | ANGELICA CHECHI WALCZAK |
: | GEOVANE DE MOURA CELESTINO |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RETORNO VOLUNTÁRIO AO TRABALHO. RESTABELECIMENTO INDEVIDO. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E TEMPORÁRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. TERMO INICIAL. DATA DO LAUDO PERICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. A concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial.
2. Considerando as conclusões do perito judicial, no sentido de que a parte autora está parcial e temporariamente incapacitada para o exercício de suas atividades laborais, faz jus à concessão de auxílio-doença desde a data do laudo pericial judicial, quando constatada a incapacitação.
3. O retorno voluntário ao trabalho caracteriza a recuperação da capacidade laboral, incompatível com a manutenção de aposentadoria por invalidez anteriormente concedida.
4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e manter a implantação imediata do benefício efetivada no primeiro grau de jurisdição, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 05 de julho de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9044435v37 e, se solicitado, do código CRC 4CE7A146. | |
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| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 06/07/2017 16:50 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002610-90.2014.4.04.7120/RS
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE ALTAIR MACHADO DE BASTOS |
ADVOGADO | : | ANGELICA CHECHI WALCZAK |
: | GEOVANE DE MOURA CELESTINO |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação do INSS contra sentença (15/12/2016) que julgou parcialmente procedente ação para:
1) CONDENAR o INSS a conceder o benefício de auxílio-doença à parte autora desde 19/08/2015, mantendo-o até que haja a recuperação da capacidade laboral (se a parte autora realizar o procedimento cirúrgico indicado pelo perito) ou reabilitação para o exercício de outra atividade ou, ainda, até a conversão em aposentadoria por invalidez, no caso de ser constatada a irreversibilidade da incapacidade, nos termos da fundamentação;
2) CONDENAR o INSS ao pagamento das parcelas vencidas (a partir de 19/08/2015 até a DIP - ora fixada na data da efetiva implantação do benefício pelo INSS), atualizadas e acrescidas de juros moratórios nos termos da fundamentação.
Condeno o INSS a ressarcir os honorários da perícia médica realizada no feito a favor da Justiça Federal de 1ª Instância da Seção Judiciária do RS.
As prestações vincendas deverão ser pagas na via administrativa, reportando-se à data imediatamente posterior à efetiva implantação do benefício.
Defiro a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar que o INSS, no prazo de 12 (doze) dias, contados da intimação desta sentença, implante em favor da parte autora o benefício de auxílio-doença, devendo comprovar o cumprimento da medida em tal lapso.
Considerando a sucumbência, condeno cada uma das partes ao pagamento dos honorários advocatícios da ex adversa, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, em conformidade com o art. 85, § 3°, inciso I, § 4º e § 6º, do Código de Processo Civil, atualizado até o efetivo pagamento pelo IPCA-E, respondendo a parte autora por 60% (sessenta por cento) e o requerido por 40% (quarenta por cento) dessa verba, sendo vedada a sua compensação conforme art. 85, § 14, também do CPC/2015. Ademais, ressalto que tal valor, no que diz respeito ao devido pela parte autora, resta com a exigibilidade suspensa em virtude dos efeitos da gratuidade da justiça deferida.
Não cabe condenação do INSS em custas processuais, porque inexistente adiantamento pela parte autora, bem como à vista da sua isenção legal (artigo 4º, inciso I, da Lei n° 9.289/96).
(...)
Sentença dispensada do reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do CPC.
Alega que o auxílio-doença é indevido, tendo em vista que o autor perdeu a qualidade de segurado, pois não mais exercia atividade laboral, a despeito da anotação de vínculo em CTPS.
Subsidiariamente, requer seja reformada a sentença para:
(1) reconhecer que o autor retornou voluntariamente ao trabalho em 01/07/08, data de sua admissão na empresa Gobba Leather Industria e Comercio LTDA, já que tal vínculo foi utilizado para atribuir ao recorrido status de segurado;
(2) determinar a compensação entre eventual montante devido a título de atrasado em razão da concessão do benefício de auxílio-doença deferido no presente processo com o montante que o autor deve restituir ao INSS em razão do recebimento indevido da aposentadoria por invalidez, atentando-se, nesse ponto, para o reconhecimento, em sentença, da má fé do demandante no recebimento de tais valores,
(3) afastar a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios ou, então, distribuí-los proporcionalmente, conforme art. 86 do CPC ou, se mantida a condenação nesse ponto, fixar como base de cálculo dos honorários advocatícios devidos pelo INSS, o valor da condenação, pois a sentença foi proferida sob as normas do novo CPC e, portanto, deve observar os parâmetros previstos na nova lei processual para a fixação dos honorários, o que significa que, em havendo condenação, os honorários devem incidir sobre o valor a ela correspondente e
(4) determinar a aplicação da Lei 11.960/09.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa oficial
O artigo 496 do Código de Processo Civil/2015 estabelece que a sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal.
Exclui-se a obrigatoriedade do referido duplo grau de jurisdição sempre que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União, respectivas autarquias e fundações de direito público (art. 496, §3º, I).
No ano de 2017, o salário mínimo representa R$ 937,00, correspondendo o limite de mil salários-mínimos a R$ 937.000,00.
O teto para os benefícios da Previdência Social atualmente está fixado em R$ 5.531,31 e a sentença condenatória alcança, geralmente, cinco anos de efeitos financeiros, os quais, somados ao tempo de tramitação do processo até a sentença (atualmente com o tempo desejável de quatro anos, conforme a meta nº 2 do Conselho Nacional de Justiça), poderiam perfazer quase dez anos. Desse modo, considerados dez anos de efeitos financeiros, o ano com 13 prestações mensais, o teto dos benefícios previdenciários e o salário mínimo de R$ 937,00, chega-se a um valor máximo da condenação de 767,41 salários mínimos ou R$ 719.070,30, bastante inferior ao limite legal.
De outro giro, segundo informação da Divisão de Cálculos do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em simulação tomando por base a DIB 01/04/2006, ajuizamento em 01/05/2006, citação em 05/2006, renda mensal inicial de R$ 2.801,56 (teto da Previdência Social em abril de 2006), sentença condenatória em 06/2016, chegou-se a um valor da condenação, nessa data, de R$ 879.317,03, aí incluídos juros e correção monetária, equivalente a 999,22 salários mínimos vigente em junho de 2016 (R$ 880,00).
Portanto, é possível concluir que, em sentenças proferidas na vigência do Código de Processo Civil de 2015, as condenações ao pagamento de benefício previdenciário - seja benefício de valor mínimo, seja benefício de valor máximo - por prazo inferior a dez anos não admitem a remessa necessária. Tal prazo deve ser aferido entre a data de entrada de requerimento ou a data de início do benefício e a data em que proferida a sentença, excluídas as parcelas prescritas e os valores já percebidos a título de antecipação de tutela ou tutela provisória.
De acordo com julgado do Superior Tribunal de Justiça, reafirmado em decisão monocrática no Recurso Especial nº 1.577.902, proferida pelo Ministro Humberto Martins, em 2/2/2016, "É líquida a sentença que contém em si todos os elementos que permitem definir a quantidade de bens a serem prestados, dependendo apenas de cálculos aritméticos apurados mediante critérios constantes do próprio título ou de fontes oficiais públicas e objetivamente conhecidas." (REsp 937.082/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 13/10/2008 ). Outras decisões monocráticas no mesmo sentido foram proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, em datas mais recentes, como o Recurso Especial nº 1.513.537/MG, Ministro Og Fernandes, em 24/11/2016, e o Recurso Especial nº 1.656.578/RS, Ministro Gurgel de Faria, em 6/3/2017.
Na espécie, são devidos valores a contar de 19/08/2015, data do laudo judicial, até 15/12/2016, data em que foi prolatada a sentença, perfazendo um lapso temporal inferior a dez anos.
Assim, correta a sentença ao não submeter o feito a reexame necessário.
Incapacidade
O autor teve sua aposentadoria por invalidez, concedida em 26/10/2004, com efeito retroativo a 01/02/2009, tendo em vista a constatação de irregularidade na manutenção do benefício, pois o autor teria retornado voluntariamente ao trabalho, demonstrando ter recuperado a capacidade laboral.
Os fatos foram minuciosamente narrados na sentença, razão pela qual a transcrevo, embora longa, para melhor elucidação da controvérsia:
Do restabelecimento da aposentadoria por invalidez
Inicialmente, para apreciação e julgamento da lide forçoso estabelecer os requisitos para concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez.
A concessão do auxílio-doença está regulada no art. 59, da Lei nº 8.213/91, nos seguintes termos:
Art. 59. O auxílio- doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for ocaso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Parágrafo único. Não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
O benefício da aposentadoria por invalidez, de outra banda, está previsto nos arts. 42 e seguintes da mesma lei:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio- doença , for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico pericial a cargo da Previdência social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez , salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
Art. 43. A aposentadoria por invalidez será devida a partir do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, ressalvado o disposto nos parágrafos 1o, 2o e 3o deste artigo.
Qualquer dos benefícios pleiteados depende, para sua concessão, da comprovação da incapacidade laboral provisória, no caso de auxílio-doença, ou permanente, na aposentadoria por invalidez, bem como, do cumprimento da carência de 12 (doze) contribuições mensais (art. 25, inc. I, da Lei 8.213/91), salvo as exceções legais (art. 26, II, da referida lei).
Assinalo, ainda, que nenhum benefício será devido quando a incapacidade for diagnosticada após a perda da qualidade de segurado, sendo necessário analisar, neste ponto, a data da incapacidade em consonância com o art. 15 ("período de graça") ou art. 24, parágrafo único, (restabelecimento da qualidade de segurado) da lei 8.213/91, conforme o caso.
No caso dos autos, segundo consta no processo administrativo juntado aos autos (evento 09), o autor teve seu benefício de aposentadoria por invalidez, que titulava desde 26/10/2004 (NB 506.370.061-2), cancelado em 10/2013, com efeito retroativo a 01/02/2009 (DCB), sob a alegação de constatação de irregularidade, em virtude da existência de prova de ter retornado voluntariamente à atividade laborativa após a concessão do benefício, sugerindo a recuperação da capacidade laboral.
Inicialmente, insta esclarecer que o retorno voluntário à atividade após a concessão do benefício por incapacidade autoriza o seu cancelamento automático, nos termos do artigo 46 da Lei nº 8.213/91, in verbis: "O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno."
Da análise das cópias do processo administrativo juntadas no evento 09, é possível inferir a existência de diversas provas materiais conduzindo à conclusão de que o autor, efetivamente, voltou a exercer atividade laborativa como caminhoneiro, dentre as quais:
- registro no CNIS de vínculo celetista extemporâneo com a empresa Gobba Leather Industria e Comercio LTDA, desde 01/07/2008;
- registro no CNIS de recolhimentos como contribuinte individual no período de 01/02/2009 a 30/04/2009, em vínculo com empresa de obras rodoviárias (CNPJ 17.216.052/0001-00 - TORC TERRAPLENAGEM OBRAS RODOVIÁRIAS E CONSTRUÇÕES LTDA);
- registro como transportador no Registro Nacional dos Transportadores Rodoviários de Cargas (ANTT), na categoria autônomo, desde 23/04/2008;
- consulta da CNH em que consta informação de que o autor está habilitado na categoria C desde 15/11/2007 e renovação do exame médico em 06/11/2012.
Tais informações corroboram os dados colhidos pelo INSS em pesquisa externa, realizada em 24/10/2013, quando a agente da autarquia previdenciária entrevistou vizinhos do autor, sendo informado que ele trabalha com um caminhão, também o utilizando para vender lenha e "cocho para gado", como segue:
(...) Realizada pesquisa junto aos vizinhos do beneficiário. Uma Sra. residente na Rua Antonio João (rua transversal), informou que é vizinha há 4 anos. Que o beneficiário vende lenha e trabalha com caminhão. Outra vizinha residente na Rua Pericles de Albuquerque informou que faz 6 anos que mora no local, que quando foi morar nesse endereço o beneficiário já residia com a esposa e os dois filhos, que desde que o conhece ele sempre trabalhou, não sabendo dizer se o mesmo é aposentado pois está sempre trabalhando. Que logo no início quando conheceu o beneficiário ele possuía um caminhão vermelho, depois trocou por um branco e hoje é proprietário de um caminhão azul, que o mesmo também vende lenha. Perguntada sobre a profissão do beneficiário informou camioneiro. Que vê o mesmo saindo pra trabalhar diariamente entre 7 e 8 da manhã, retorna ao meio e depois sai novamente à tarde. Que de uns dias pra cá está parado pois o caminhão estragou. Que os dois filhos do beneficiário trabalham fora, um é militar e o outro trabalha em uma oficina mecânica quase ao lado da residência da família. Que os filhos não dirigem o caminhão profissionalmente. Afirmou que o beneficiário trabalha vendendo cocho para gado, que de um tempo pra cá o emsmo está trabalhando para uma empresa, acredita que o nome é "DAMIOSSO". Conversei com outra vizinha da Rua Osvaldo Cruz, a qual informou que faz una 10 anos que o beneficiário mora no local. Que o mesmo está trabalhando na empresa Minosso Carrocerias, não sabe dizer há quanto tempo, que é motorista, que carrega cocho para gado, que antes disso fazia algumas mudanças e vendia lenha. (...)
Em seu depoimento pessoal (evento 64), o autor confirma a propriedade sobre um caminhão, recebido por herança, mas afirma que nunca trabalhou com ele, sendo os fretes realizados por seu enteado. A prova testemunhal produzida em juízo, por sua vez, também afirma que apenas o enteado do autor realizava fretes. Por outro lado, a referida prova testemunhal também apresenta contradições, a exemplo da informação de que ele alugava o veículo para outras pessoas, o que não condiz com o depoimento pessoal prestado.
De todo modo, entendo que as provas materiais produzidas são bastante elucidativas e indicam claramente o exercício de atividades laborativas pelo autor, pelo menos desde 01/02/2009 (DCB), na função de caminhoneiro.
De fato, não há outra explicação plausível para, após a concessão da aposentadoria por invalidez em 2004, o autor realizar habilitação para condução de veículos de transporte de carga (categoria C) em 15/11/2007, bem como efetuar registro como transportador na ANTT, desde 23/04/2008. Soma-se a isso o registro no CNIS do recolhimento de contribuições, como contribuinte individual, entre 01/02/2009 a 30/04/2009, feito por empresa de obras rodoviárias, se, nesse período, ele supostamente estava impossibilitado de trabalhar. Outrossim, enfatizo o registro de vínculo no CNIS, como empregado, desde 01/07/2008, pela empresa Gobba Leather Indústria e Comércio LTDA.
Cumpre ressaltar, ainda, conforme consta no Termo de Audiência (evento 64), que o autor apresentou sua CNH (nº 04113789092), expedida em 2012, onde consta a informação de que ele exerce atividade remunerada, registro feito após a concessão da aposentadoria por invalidez, sendo mais um elemento que evidencia a fragilidade das suas alegações.
Por derradeiro, foi realizada perícia médica judicial nos autos, na qual o perito constatou a ausência de incapacidade laborativa permanente (evento 27).
Sendo assim, resta evidente o retorno voluntário à atividade laborativa pelo autor, ao menos desde 01/02/2009, razão pela qual correto o procedimento administrativo que cancelou o benefício de aposentadoria por invalidez que ele titulava.
Desse modo, deve ser julgado improcedente o pedido de restabelecimento da aposentadoria por invalidez.
Do pedido de auxílio-doença
De outro lado, conforme perícia judicial, o perito constatou que a parte autora está parcial (incapacidade multiprofissional) e temporariamente incapacitada para sua atividade laborativa, sugerindo seu afastamento do trabalho para a realização do tratamento adequado, que compreende procedimento cirúrgico, e estimou o início da incapacidade em 19/08/2015, quando da realização da perícia médica (evento 27).
Assinalo que o perito nomeado no presente processo, e que examinou a parte autora com imparcialidade, tem todo o conhecimento técnico necessário e exigível para diagnosticar eventual incapacidade decorrente da(s) doença(s) alegada(s) e para identificar o momento a partir do qual o periciando tornou-se incapaz para o trabalho. Sendo assim, resta prescindível a vinculação a pareceres de outros médicos, de forma que considero que as conclusões do laudo pericial são suficientemente elucidativas e fidedignas para o julgamento da lide.
Pelos mesmos motivos, não se justificam quaisquer inconformidades ou impugnações ao trabalho pericial, que ora resta acolhido.
Quanto à qualidade de segurado e à carência, segundo os dados constantes no CNIS, o último vínculo da parte autora como empregado teve início em 01/07/2008 (Evento 9, PROCADM1, Página 4), embora nesse período (e até 01/02/2009) ele estivesse recebendo o benefício de aposentadoria por invalidez (NB 506.370.061-2).
Outrossim, o INSS sustenta que, na data de início da incapacidade (19/08/2015), a parte autora não mais possuía a qualidade de segurada.
Todavia, analisando os dados constantes no sistema CNIS, verifica-se que o vínculo da parte autora com o empregador Gobba Leather Industria e Comercio LTDA (admissão em 01/07/2008) continua ativo, não havendo registro de rescisão do contrato de trabalho. Nesse sentido, permanecendo o vínculo ativo, ainda que a parte autora não tenha exercido atividades laborativas, não há falar em perda da qualidade de segurado.
De outro norte, o atraso ou a ausência de recolhimento das contribuições previdenciárias não pode vir em prejuízo do reconhecimento da qualidade de segurado da Previdência, uma vez que a obrigação de assinar a carteira e de recolher as contribuições previdenciárias é do empregador, nos termos do art. 30, I, "a", da Lei 8.212./91.
Ora, é cediço que o segurado, como contribuinte de fato, não é o responsável direto pelo pagamento do tributo e, por essa razão, mesmo nos casos de atraso do recolhimento, ou, até mesmo, de falta de repasse, o tempo de serviço pode ser averbado nos registros do INSS.
É oportuna a ilustração:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PRETENSÃO RESISTIDA. AUSÊNCIA DE PEDIDO ADMINISTRATIVO DE RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. ANOTAÇÕES NA CTPS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CONTRIBUIÇÕES EXTEMPORÂNEAS. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. 1. (...). 2. Se as anotações da CTPS não apresentam rasuras, cotas marginais ou qualquer outra irregularidade, o obreiro não pode sofrer o ônus decorrente da ausência das demais anotações (férias, aumentos salariais, entre outros), de modo que a CTPS forma início de prova material do vínculo anotado, independente da ausência de registro no CNIS, pois compete ao empregador recolher as respectivas contribuições à Previdência Social. 3. Comprovado o recolhimento de contribuições previdenciárias, mesmo que a destempo, faz jus o segurado ao computo do respectivo tempo de serviço. 4. Constando dos autos a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 5. Demonstrado o tempo de contribuição necessário, bem como a carência mínima, é devido à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. 6. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, APELREEX 5003345-03.2011.404.7000, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Ezio Teixeira, juntado aos autos em 11/06/2013). (grifei)
Logo, o tempo de serviço deve ser reconhecido, independentemente da comprovação, pelo segurado, do efetivo recolhimento das contribuições, que era encargo do empregador. Eventuais divergências a respeito devem ser discutidas entre a autarquia e o empregador.
Desse modo, em que pese não constem recolhimentos no CNIS no período posterior a 01/07/2008 pelo empregador Gobba Leather Indústria e Comércio LTDA, forçoso reconhecer que o vínculo empregatício da parte autora continua ativo para fins previdenciários.
Assim, considerando que a incapacidade remonta ao dia 19/08/2015 (DII), tenho que o demandante detinha a qualidade de segurado da previdência social à época, de forma que está preenchido tal requisito, bem como preenchia a carência necessária para concessão do benefício.
Quanto ao benefício a ser concedido, a parte autora tem direito ao auxílio-doença, uma vez que considerada temporariamente incapaz para o trabalho.
Nessa senda, há que se observar, ainda, a disposição do art.101 da Lei de benefícios:
Art. 101. O segurado em gozo de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e o pensionista inválido estão obrigados, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a exame médico a cargo da Previdência Social, processo de reabilitação profissional por ela prescrito e custeado, e tratamento dispensado gratuitamente, exceto o cirúrgico e a transfusão de sangue, que são facultativos. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
Dessa forma, como é impossível impingir à parte autora a realização da cirurgia, o auxílio-doença deverá ser mantido até que haja a recuperação da capacidade laboral (se a parte autora realizar o procedimento cirúrgico indicado pelo perito) ou reabilitação para o exercício de outra atividade ou, ainda, até a conversão em aposentadoria por invalidez, no caso de ser constatada a irreversibilidade da incapacidade.
Destarte, não é fixada data para a cessação do benefício.
Da data de início do benefício
Sobre a questão, o Juiz Daniel Machado da Rocha em sede de recurso nº 2004.71.95.004653-8/RS, em julgado da Turma Recursal do RS, entendeu que:
Com efeito, o termo inicial dos benefícios por incapacidade corresponderá à data da perícia médica judicial somente naqueles casos em que não for possível especificar a data de início da incapacidade laboral. Do contrário, quando o perito possui condições de especificar a data em que a incapacidade laboral teve início, o segurado faz jus ao benefício a partir da data indicada pelo perito, a partir da data do requerimento administrativo, ou a partir do cancelamento administrativo do benefício, dependendo do caso concreto. (grifei)
Sob tal contexto, entendo que o auxílio-doença deve ser concedido a partir da data de início da incapacidade, ou seja, 19/08/2015.
Da inexigibilidade da obrigação de restituir os valores recebidos
Requer a parte autora, por via oblíqua, como decorrência do pedido de restabelecimento da sua aposentadoria por invalidez, a desconstituição de débito que lhe está sendo cobrado na importância de R$ 33.811,37 (trinta e três mil, oitocentos e onze reais e trinta e sete centavos), referente aos valores recebidos no período de 01/02/2009 a 31/10/2013, no âmbito do benefício NB 506.370.061-2.
A parte autora defende, em suma, a irregularidade do cancelamento da sua aposentadoria por invalidez, sustentando que jamais voltou a exercer qualquer atividade laborativa após a concessão, postulando assim o restabelecimento do benefício.
Por sua vez, o INSS aduz que os valores foram pagos indevidamente a partir de 01/02/2009, tendo em vista o exercício de atividade laborativa concomitantemente à percepção do benefício de aposentadoria de invalidez.
Nessa senda, cumpre esclarecer que verbas de caráter alimentar recebidas de boa-fé são irrepetíveis. Além disso, a boa-fé é presumida, devendo a má-fé ser provada pelo requerido.
No caso dos autos, tenho que restou claramente caracterizada a má-fé do autor.
Como referido anteriormente, foi comprovado por meio das provas materiais que o autor passou a exercer atividades laborativas ao menos desde 01/02/2009, situação que motivou o juízo de improcedência do pedido de restabelecimento da aposentadoria por invalidez.
Com efeito, restou demonstrado que, após a concessão da aposentadoria por invalidez em 26/10/2004, o autor realizou habilitação para condução de veículos de transporte de carga (categoria C) em 15/11/2007, bem como registro como transportador na ANTT, desde 23/04/2008; após isso, no seu CNIS houve registro de vínculo empregatício extemporâneo na data de 01/07/2008, assim como constou recolhimento de contribuições, como contribuinte individual, entre 01/02/2009 a 30/04/2009, feito por empresa de obras rodoviárias; somado a isso tudo, na CNH do autor (nº 04113789092), expedida em 2012, consta a informação de que ele exerce atividade remunerada.
Destarte, tenho que a prova dos autos demonstra a intenção da parte autora de fraudar a autarquia previdenciária, a fim de continuar recebendo indevidamente o benefício previdenciário por invalidez concomitantemente com o exercício de atividades laborativas.
Neste contexto, não se trata de presumir a má-fé, mas, sim, de considerar, a partir do contexto probatório existente nos autos, que a parte autora dolosamente omitiu sua situação pertinente à capacidade laborativa à Autarquia Previdenciária.
Assim, reconhecida a má-fé da parte autora, os valores indevidamente pagos e apurados devem por ela ser ressarcidos. Isto porque, embora os benefícios previdenciários e assistenciais tenham caráter alimentar, demonstrada a má-fé, é inafastável a necessidade de devolução, sob pena de se incentivar a prática de tais condutas.
De fato, nessa situação há que se fazer uma ponderação entre os valores da conduta contrária à boa-fé e o caráter alimentar do benefício, prevalecendo a necessidade de comportamento probo, honesto, consonante com o princípio da eticidade nas relações sociais, não podendo ser obtido benefício de caráter alimentar imbuído de ação fraudulenta. Caso contrário, estar-se-ia incentivando conduta aviltante, inclusive, à solidariedade social, que norteia o sistema da Seguridade Social. Ademais, não pode o direito servir a favor daquele que se utiliza da fraude para a obtenção de algum bem jurídico.
Portanto, não há como se aplicar o princípio já consagrado pela jurisprudência da não repetição de valores previdenciários recebidos de boa-fé. Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CANCELADO. FRAUDE CONSTATADA EM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DO BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE. MÁ-FÉ COMPROVADA. RESTITUIÇÃO DEVIDA. 1. Os valores pagos a título de benefício cancelado, diante da constatação de fraude na sua concessão, devem ser restituídos pelo segurado. 2. Embora o benefício previdenciário tenha caráter alimentar, nos casos em que demonstrada a má-fé do segurado para sua concessão fraudulenta é permitida a sua devolução. 3. Nos termos do art. 115 da Lei n° 8.213/91, o INSS é competente para proceder ao desconto dos valores pagos indevidamente ao segurado, pois comprovada a má-fé do segurado com provas que superam a dúvida razoável. (TRF4, AC 5000504-90.2011.404.7208, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Ezio Teixeira, D.E. 09/05/2013 - grifei)
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL. PREVIDENCIÁRIO. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. DESCONTO NO BENEFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDENTE PROVIDO. 1. "É irrepetível o valor recebido a maior pelo segurado, salvo quando comprovada a má-fé de sua parte ou quando houver comprovação de que o mesmo contribuiu, de qualquer forma, para o erro de cálculo da RMI por parte do INSS. 2. Incidente de uniformização conhecido e não provido" (IUJEF 0000145-63.2006.404.7060, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator Rodrigo Koehler Ribeiro, D.E. 08/02/2011) 2. Reafirmação de entendimento anterior desta TRU. 3. É irrelevante que os valores já tenham sido descontados pelo INSS, devendo ser restituídos ao segurado em razão de sua irrepetibilidade. 4. Incidente provido. (5001681-76.2012.404.7007, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, juntado aos autos em 20/06/2014 - grifei)
Desse modo, demonstrada no caso dos autos a má-fé, é permitido ao INSS proceder à cobrança dos valores percebidos indevidamente pela parte autora, nos moldes em que vinha fazendo.
Da atualização monetária das parcelas vencidas
Deverá a autarquia previdenciária, além de conceder o benefício previdenciário, pagar as diferenças vencidas, a partir de 19/08/2015, e vincendas.
Recentemente o STF, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade da expressão "na data de expedição do precatório", do § 2º; dos §§ 9º e 10º; e das expressões "índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança" e "independente de sua natureza", do § 12, todos do art. 100 da Constituição Federal de 1988, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 62/2009. Por arrastamento, também declarou inconstitucional o art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960, de 29.07.2009 (atualização monetária pelo índice de remuneração da poupança).
Passo, pois, a observar o que foi decidido com efeitos erga omnes e eficácia vinculante pelo STF, restabelecendo, em relação à correção monetária, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/09.
Logo, todas as parcelas deverão ser corrigidas monetariamente desde o dia em que deveriam ter sido pagas (Súmula 43 e 148 do STJ) em conformidade com a variação do INPC.
Contudo, observo que as referidas decisões não interferiram na taxa de juros aplicável às condenações da Fazenda Pública, consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp 1.270.439 e que vem sendo adotado pela Sexta Turma do TRF da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97, COM A REDAÇÃO DA LEI Nº 11.960/09. RETORNO DO CÔMPUTO DO INPC. 1. Na atualização monetária do crédito judicial previdenciário, a partir de 1º de julho de 2009, de acordo com o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, aplicam-se separadamente a variação da TR e os juros de 0,5% ao mês, como forma de evitar a capitalização dos juros. 2. Em face da decretação, pelo STF, da inconstitucionalidade parcial do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, a correção monetária do débito judicial previdenciário volta a ser contada pela variação do INPC (art. 31 da Lei nº 10.741/03, combinado com a Lei nº 11.430/06, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei nº 8.213/91, e REsp nº 1.103.122/PR). O juros de mora, contudo, permanecem no patamar de 0,5% ao mês, porque tal critério não foi declarado inconstitucional pelo STF. (TRF4, AC 0016252-51.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 16/10/2013)
Nesse julgamento, o eminente Desembargador Relator mencionou, in verbis:
(...). Com efeito, como consignado pela Ministra Eliana Calmon no julgamento do MS 18.217, "No julgamento do Resp 1.270.439/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, esta Corte, diante da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 1º-F da Lei 9.494/99 no que concerne à correção monetária, ratificou o entendimento de que nas condenações impostas à Fazenda Pública após 29.06.2009, de natureza não tributária, os juros moratórios devem ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança".
Sendo assim, os juros de mora devem incidir à razão de 1% ao mês (Súmula 75 do TRF4) a partir da citação válida (a teor da Súmula nº 204 do STJ e da Súmula 3 do TRF da 4ª Região) até 30/06/2009 (Súmula 75 do TRF4), a partir de quando devem incidir em 0,5% ao mês.
Por fim, caso a contadoria deste Juízo apure a existência de algum benefício previdenciário percebido pela parte autora entre a DIB e a DIP, os valores recebidos em virtude dele deverão ser deduzidos daqueles devidos em razão do benefício ora deferido.
Outrossim, elucido que os cálculos são feitos com base nas informações constantes no sistema PLENUS na data em que são efetuados.
Da Tutela Provisória
A autora pleiteou a concessão da antecipação dos efeitos da tutela.
Consoante a novel redação do CPC/2015, a tutela provisória pode ser baseada na urgência ou na evidência.
Em relação àquela, deve ser verificada a presença da probabilidade do direito e, para o caso de tutela antecipada, o perigo de dano ou, na hipótese de tutela cautelar, o risco ao resultado útil do processo.
Relevante, no ponto, reproduzir o tratamento da matéria no Diploma Processual:
Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.
Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.
(...)
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
No caso em apreço, mais do que a probabilidade do direito, está configurada a prova inequívoca dos fatos subjacentes à pretensão da demandante. Há, na verdade, considerando a prova carreada aos autos, juízo de certeza do direito vindicado.
Ademais, está caracterizado o perigo de dano em relação à imediata implantação do benefício, na medida em que a prestação pleiteada - que tem natureza alimentar - é indispensável para a manutenção da parte autora.
Não obstante a natureza da verba faça transparecer sua irrepetibilidade, deve-se ter em conta que é igualmente irreversível o sofrimento e desconforto imposto à parte demandante, que necessita do benefício pleiteado para prover seu sustento. Assim, entendo que se deve dar privilégio, ao cotejar os interesses em conflito, ao princípio da dignidade da pessoa humana, no sentido de garantir-se, provisoriamente, à parte requerente, meios mínimos de sobrevivência, em detrimento do interesse patrimonial da autarquia.
Tal urgência, porém, não se vê em relação às prestações pretéritas do benefício, razão pela qual o deferimento deste, em sede antecipatória, não pode retroagir à data fixada para seu início.
Dessa forma, preenchidos os requisitos do art. 300 do CPC, defiro a tutela provisória, para determinar ao INSS a imediata implantação do benefício de auxílio-doença à parte demandante.
A sentença examinou muito bem a questão do retorno ao trabalho, demonstrando, pela análise da prova documental, testemunhal e diligências administrativas feitas pela autarquia, que o autor realmente retornou às atividades laborais, de forma voluntária, razão pela qual deixou de fazer jus à aposentadoria por invalidez, pois recuperada a capacidade para o trabalho.
Nesse sentido, correta a decisão de acolher a data de 01/02/2009 como termo final da aposentadoria. Esclareço que não é possível retroagir o termo final a 01/07/2008, como requer o INSS em apelação, pois, a despeito de entender comprovado o retorno ao trabalho nessa data, que marca o início do vínculo laboral com a empresa Gobba Leather Industria e Comercio LTDA, ainda ativo quando prolatada a sentença, na via administrativa a autarquia considerou 01/02/2009 como termo final da aposentadoria, não podendo o processo judicial voltar-se contra o autor e dele retirar aquilo que nem o INSS o fez quando revisou a concessão.
Ademais, a perícia judicial feita em 19/08/2015 (evento 27) assegurou que a incapacidade constatada ao examinar o autor é parcial e temporária, além de não ser possível determinar quando se iniciou. Para o expert, a data de início da incapacidade deve ser considerada como a da realização do laudo. Por tais razões, forçoso concluir que inexistente incapacidade definitiva a ensejar a manutenção da aposentadoria por invalidez, estando correto, também por este ângulo, o cancelamento feito na via administrativa.
Quanto à concessão do auxílio-doença, entendo que também aqui andou bem o julgador a quo. O perito judicial afirmou que o autor "apresenta dor e deformidade no joelho direito, refere dor aos pequenos esforços, caminha com o apoio de muletas", concluindo que a severa patologia degenerativa de que é portador (atrose pós traumática) lhe deixa sem condições de realizar suas atividades laborais habituais, havendo possibilidade de recuperação através de cirurgia. Assegurou, ainda, que a incapacidade é parcial e temporária. Quanto ao termo inicial, deixou claro que "não é possível avaliar a capacidade laborativa do paciente antes da perícia", razão por que adequada a fixação da data de 19/08/2015 como de início do benefício.
No que diz respeito à condição de segurado, que o INSS alega ter sido perdida, por considerar que o vínculo laboral com a empresa Gobba Leather Industria e Comercio LTDA era meramente fictício, tenho que sem razão a autarquia. Não é possível considerar a existência do referido vínculo para considerar que o autor retornou ao trabalho e, assim, cassar a aposentadoria, como fez administrativamente, e, na via judicial, defender que a relação de emprego é inválida, com vistas a reconhecer a perda da qualidade de segurado. Ou bem uma coisa ou outra. No caso, conforme demonstrado à exaustão pelo julgador singular, todos os elementos de prova convergem para apontar o retorno às atividades laborais e a existência, de fato, do vínculo empregatício com a referida empresa, não tendo o INSS apontado qualquer elemento consistente em sentido contrário.
Abstenho-me de examinar a determinação de devolução das parcelas de aposentadoria por invalidez indevidamente recebidas, por força da má-fé do autor, reconhecida na sentença, tendo em vista que este não recorreu da decisão.
No tocante à compensação dos valores recebidos a título de aposentadoria com os valores que o autor tem a receber por força da concessão do auxílio-doença, sem razão a autarquia previdenciária, pois são rubricas independentes e que não se comunicam, sendo descabida a utilização da ação judicial de que o autor é titular para cobrar-lhe diferenças que não fazem parte do objeto do pedido. Na verdade, com a presente ação o autor buscou, entre outros, somente declarar a inexibilidade de execução extra-judicial dos valores indevidamente recebidos, no que não teve sucesso. Caberá ao INSS, agora, buscar as vias próprias para cobrança do débito, se assim o entender.
Já no que diz respeito aos honorários advocatícios, deve prosperar o recurso da autarquia. Considerando os valores que o autor não logrou fosse reconhecida a inexigibilidade, bem como não ter tido êxito no restabelecimento da aposentadoria por invalidez, a concessão de auxílio-doença a partir de 19/08/2015 constitui diminuto sucesso em relação à maior parte do pedido, na qual foi majoritariamente sucumbente. Sendo assim, entendo deva arcar por inteiro com os honorários advocatícios, que devem seguir a sistemática prevista no artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015. Considerando o trabalho adicional em grau de recurso, aplica-se o comando do § 11º do referido artigo.
Assim, estabeleço a majoração da honorária para 15% sobre o valor atualizado da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC/2015. A exigibilidade de tais verbas permanecerá sobrestada até modificação favorável da situação econômica da parte autora (artigo 98, § 3º, do CPC/2015).
Caso o valor atualizado da causa venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no § 3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual médio da faixa subsequente, e assim sucessivamente, na forma do §§ 4º, inciso III, e 5º do referido dispositivo legal.
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida para a fase de cumprimento do julgado em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016, e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, prejudicada a apelação do INSS no ponto.
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09 de agosto de 2007), faz jus a parte autora ao cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício.
Desnecessária a medida, contudo, tendo em vista já ter sido efetivada no primeiro grau por força do provimento antecipatório (evento 102).
Conclusão
Dá-se parcial provimento à apelação do INSS para condenar a parte autora ao pagamento integral dos honorários advocatícios, majorados para 15% do valor da causa, em face do trabalho adicional em grau de recurso.
Difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, prejudicada a apelação do INSS no ponto.
Mantida a implantação imediata do benefício, já efetivada no primeiro grau de jurisdição por força do provimento antecipatório.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e manter a implantação imediata do benefício efetivada no primeiro grau de jurisdição.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002610-90.2014.4.04.7120/RS
ORIGEM: RS 50026109020144047120
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE ALTAIR MACHADO DE BASTOS |
ADVOGADO | : | ANGELICA CHECHI WALCZAK |
: | GEOVANE DE MOURA CELESTINO |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/07/2017, na seqüência 736, disponibilizada no DE de 19/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E MANTER A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO EFETIVADA NO PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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