Apelação Cível Nº 5006568-87.2018.4.04.7009/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: JOAO CARLOS RIBEIRO (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante a averbação dos períodos de aluno aprendiz, de 01/03/1977 a 31/03/1980, e de tempo de serviço urbano, de 20/02/1976 a 08/12/1976 e de 02/09/1988 a 10/01/1990.
Em sentença, o pedido foi julgado nos seguintes termos:
Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos, resolvendo o mérito, na forma do art. 487, I, do NCPC, para reconhecer o tempo de serviço do autor, na condição de Aluno Aprendiz, referente ao período de 01/03/1977 a 31/03/1980, condenando o INSS a promover a devida averbação em favor do autor para fins de aposentadoria.
Em decorrência, condeno o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, bem como a pagar os valores atrasados devidos desde a data de entrada do requerimento administrativo (21/03/2017 - NB 42/179.932.886-1), atualizados pelos índices e acrescidos de juros na forma estipulada no Manual de Cálculos da Justiça Federal para os benefícios previdenciários.
Julgo improcedente, por outro lado, o pedido de reconhecimento do tempo de serviço urbano referente aos períodos de 20/02/1976 a 08/12/1976 e de 02/09/1988 a 10/01/1990.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência em favor do advogado da parte autora em montante correspondente a 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observadas as parcelas vencidas até a presente data, na forma da Súmula nº 111 do STJ.
Ainda, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência em favor do INSS, o que arbitro em 1/4 (um quarto) do valor a que fizer jus o patrono da parte autora, a ser apurado por ocasião da liquidação, cuja execução fica suspensa pelo prazo máximo de 5 (cinco) anos a contar do trânsito em julgado, enquanto persistirem as condições que ensejaram a concessão da gratuidade da justiça.
O INSS está isento de custas quando demandado na Justiça Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96), bem como a parte autora, enquanto persistirem as condições que ensejaram a concessão da gratuidade da justiça, observado o prazo máximo de 5 anos.
Sentença não sujeita a reexame necessário (art. 496, § 3º, I, do CPC).
Irresignado, o INSS apela. Argumenta, em síntese, que o período de aluno-aprendiz não deve ser computado como tempo de serviço, uma vez que não se caracterizava o trabalho remunerado ínsito ao vínculo empregatício. Pugna pela reforma da sentença, "determinando-se a exclusão do período 01/03/1977 a 31/03/1980, como tempo de contribuição, bem como a julgar improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria, com a inversão do ônus da sucumbência."
Apela também a parte autora. Pretende ainda a averbação dos períodos de 20/02/1976 a 08/12/1976 e de 02/09/1988 a 10/01/1990, para que sejam considerados no cálculo do benefício concedido.
Com contrarrazões da parte autora, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
Adoto no ponto os próprios fundamentos da sentença como razões de decidir, in verbis:
1. Da atividade como aluno aprendiz
Em regra, o ensino técnico não tem por finalidade o desenvolvimento de atividade remunerada. Por vezes, a contraprestação pelas tarefas realizadas pelos alunos ocorre, mas o objetivo da permanência do aluno em escola técnica é o aprendizado. Assim, o aluno aprendiz, na condição de educando, é beneficiário do serviço estatal e não prestador de serviços ao Estado.
Contudo, com a configuração da situação inversa ou, no mínimo, equivalente (beneficiário e prestador de serviços), reconhece-lhes a jurisprudência, em interpretação ampliativa deste conceito para fins estritamente previdenciários, a condição de servidores públicos, cabendo a respectiva contagem do tempo de serviço, nos termos das Leis n.º 6.225/79 e 6.864/80.
No entanto, para esse efeito tem-se como necessário que o aluno-aprendiz receba, à conta do erário, certa remuneração, ainda que indireta mediante o fornecimento de moradia, alimentação, fardamento e a eventual repartição de receitas.
Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União admitiu em julgamento de 1976 a contagem de tempo de serviço de aluno-aprendiz, entendimento consubstanciado na Súmula nº 96/76, reeditada em 1995, que prescreve, literalmente:
"Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz em Escola Pública Profissional, desde que haja vínculo empregatício e retribuição pecuniária à conta do Orçamento".
Na mesma linha é a Súmula nº 18 da Turma Nacional de Uniformização: "Provado que o aluno aprendiz de Escola Técnica Federal recebia remuneração, mesmo que indireta, à conta do orçamento da União, o respectivo tempo de serviço pode ser computado para fins de aposentadoria".
Doutra banda, a autarquia ré têm emitido reiterados pareceres que orientam pela restrição da contagem de tempo de serviço do aluno-aprendiz ao período de vigência Lei Orgância do Ensino Industrial (30 de janeiro de 1942 e 16 de fevereiro de 1959), argumentando que o advento da Lei n.º 3.552/59, que reestruturou a aprendizagem em escolas técnicas, teria cessado os efeitos daquela com relação à contagem desse tempo.
Entretanto, razão não lhe assiste, já que nem a Lei n.º 3.552/59, nem aquelas afetas à contagem recíproca do tempo de serviço público federal e atividade privada (Leis n.º 6.225/79 e 6.868/80) contêm dispositivo vedando o reconhecimento do tempo despendido em escolas técnicas, observados os demais requisitos.
Tampouco foram alterados o conceito e a natureza do aluno-aprendiz, seja pela Lei 3552/59, seja pelo decreto n.º 47.038/59 que, ao contrário, os ratifica. Assim, tentar imprimir revogação pela omissão da lei nova quanto à possibilidade de contagem de tempo não se afigura a melhor interpretação jurídica.
Contudo, a definição legal do aluno-aprendiz traz em seu âmago a prestação de serviços, ou seja, a existência de relação empregatícia entre entidade e aluno e a consequente contraprestação pecuniária à conta dos cofres públicos.
Desta maneira, é imprescindível que se faça prova da contraprestação para aproveitar ao aluno o tempo em que permaneceu aprendendo e trabalhando em escola técnica pública, sendo aceita para tanto certidão da escola a que esteve vinculado atestando, por exemplo, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar ou parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros. Nesse sentido, colaciono o seguinte precedente jurisprudencial:
"Previdenciário. Aluno-aprendiz. Escola agrícola. Súmula 96 do TCU. Concessão da aposentadoria por tempo de serviço. Custas processuais. Remessa oficial.1. O Tribunal de Contas da União, através da Súmula 96, manifestou-se da seguinte forma: ´Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros´. 2. No caso concreto, face à percepção de parte dos produtos agrícolas pelo labor junto à escola agrícola, possível o reconhecimento de tempo de serviço.3. Apelação do Autor provida".(TRF da Quarta Região - AC 277772 Processo: 199904010445786 UF: RS - Sexta Turma - Relator Juiz Marcos Roberto Araújo dos Santos - Unanimidade - Data da decisão: 17/10/2000 -DJU: 29/11/2000, p. 579)
Ressalte-se que a prova da retribuição pecuniária, ônus que incumbe ao autor, é requisito condicionante do reconhecimento do tempo de serviço prestado nas entidades escolares de que trata o Decreto-Lei n.º 4.073/42.
No caso dos autos, os documentos apresentados com a inicial (PROCADM9, p. 15), demonstram que o autor frequentou a Escola Estadual Florestal de Educação Profissional Presidente Costa e Silva, onde concluiu o curso de Técnico Florestal Regular.
Consta da referida certidão que no período letivo de 01/03/1977 a 31/03/1980 o autor foi remunerado à conta da dotação global da União, de forma indireta, uma vez que a alimentação, calçados, vestuário, atendimento médico/odontológico e pousada foram adquiridos com verbas provenientes do orçamento da União, como compensação das atividades extracurriculares exercidas pelo aluno nos campos de culturas e criações da referida escola.
Desta forma, de acordo com fundamentação acima exposta e considerando que havia contraprestação indireta pelos trabalhos realizados pelo autor, custeada por recursos públicos, deve ser reconhecido o tempo de serviço por ele prestado na condição de aluno-aprendiz, no período de 01/03/1977 a 31/03/1980.
2. Do tempo de serviço perante Valdomiro Ribeiro
Nos termos do art. 55, § 3°, da Lei de Benefícios, a comprovação de tempo de serviço deve estar baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. A exigência de provas materiais constitui medida salutar prevista pelo legislador ordinário, já que, condicionando o reconhecimento de tempo de serviço à apresentação de documentos idôneos e contemporâneos aos fatos, previne-se a possibilidade de fraudes ao sistema previdenciário.
Nesse ponto, é importante destacar que a parte autora pretende não apenas o reconhecimento do exercício de atividade laborativa, mas que seja declarada a existência de uma relação de emprego, o que traz implicações das mais diversas, como por exemplo a desnecessidade de indenizar, por sua conta, as respectivas contribuições previdenciárias, que na modalidade do segurado empregado são de responsabilidade do empregador.
Quanto aos pressupostos para configuração da relação empregatícia, são extraídos da análise combinada dos arts. 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, que são: a) a prestação de trabalho por pessoa física, b) pessoalidade em relação ao trabalhador, c) não-eventualidade das atividades, d) subordinação do tomador de serviços, e, por fim, e) onerosidade.
São esses mesmos elementos que constam do art. 11, I, alínea a, da Lei de Benefícios: "aquele que presta serviços de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado".
No caso dos autos, visando comprovar o trabalho alegado a parte autora trouxe aos autos laudo de exame grafotécnico em cuja conclusão foi consignado que as notas fiscais apresentadas para exame, emitidas nos períodos de 02/1976 a 12/1976 e 09/1988 a 01/1990, foram preenchidas de próprio punho pelo autor (evento 1 - LAUDO8).
Não foram apresentados outros elementos materiais de prova, sendo que o conjunto probatório foi complementado pela prova oral produzida em audiência, com o seguinte teor:
Depoimento Pessoal: que em 1976 contava com 15 anos de idade, trabalhava no bar, com gêneros alimentícios; que estudava pela manhã e pela tarde trabalhava no comércio do pai, Valdomiro; que estudou o segundo grau, concluído aos 18 anos; que ao concluir o estudo passou a trabalhar como empregado na função de técnico florestal; que o estabelecimento do pai era bar e armazém juntos; que não tinha hora para parar o trabalho; que trabalhava o autor, seu pai e eventualmente uma de suas 3 irmãs; que as irmãs auxiliavam eventualmente, mas o autor trabalhava diariamente, vendia, servia bebidas; que sua mãe não trabalhava no bar; que não havia outros empregados; que considerava o pai como seu patrão; que trabalhou dos 15 anos de idade até quando foi para o colégio florestal, onde permaneceu por 3 anos; em 1988 ficou desempregado e ficou até 1990 com o pai no bar, até que conseguiu novo emprego; que trabalhou o ano de 1976 todo no bar; que de 1977 a 1980 ficou no colégio agrícola, onde estudava e prestava serviço em aulas práticas, em viveiros florestais, trabalhava com motosserra, na criação de animais, pois tinha uma granja de porcos, que tratava e dava água; que atuava mais nas plantas do que com os animais; que era apenas reflorestamento; que tinha produção de milho e feijão, mas não era o forte; que era em regime de internato; que enquanto esteve no regime de internato não prestou serviços em outros estabelecimentos; que sobre a Sociedade Agrícola Cerro Azul afirma que foi um estágio exigido pelo Colégio; que ficou um mês nessa empresa aprendendo atividades relacionadas ao ensino do colégio; que ficou o mês de férias nesse estágio, na cidade de Rio Negrinho; que esse mês ficou por conta da empresa, em alojamentos próprios; que recebeu a remuneração de um salário mínimo, diretamente da empresa; que era um estágio obrigatório; que em 1988, 1989 e 1990 trabalhou no bar do pai novamente, em Teixeira Soares; que em fevereiro de 1990 ingressou na Fiat Lux, com registro em carteira; que nesse segundo período não havia outros funcionários, nem suas irmãs trabalhavam no bar, pois já eram professoras; que seu pai trabalhava sozinho nessa época; que nesse segundo período o autor trabalhava o dia todo no bar de seu pai; que seu pai nunca teve empregado, sendo o autor a única pessoa que trabalhou ajudando ele no estabelecimento; que nesse período voltou a morar com seus pais; que praticamente não recebia salário, mas se precisasse ele dava dinheiro; que trabalhava pela responsabilidade de auxiliar nas atividades em contraprestação
Primeira Testemunha – Rosa de Souza Déa: que conhece o autor de Teixeira Soares, onde morava; que o pai do autor tinha um bar, um comércio tipo mercearia; que quando a depoente foi morar em Teixeira Soares o bar já existia; que esse bar funcionou por muito tempo, não sabe precisar; que o pai dele era Valdomiro Ribeiro; que não tinha empregados no bar, sendo ajudado pela esposa e pelos filhos; que o autor tinha na base de 12 anos quando ajudou no bar; que ele estudava de manhã e ajudava no bar de tarde; que a família viva desse bar, que era a única fonte de renda; que o autor estudou em Teixeira Soares e depois no Colégio Florestal, mas não sabe o ano que foi isso; que não sabe quanto tempo ele ficou no Colégio Florestal; que depois do Colégio Florestal ele voltou a trabalhar no bar do pai, tendo voltado para casa; que além do bar não sabe dizer se ele teve outro emprego em Teixeira Soares; que Valdomiro nunca teve empregados; que seu pai era freguês do bar; que o autor atendeu a autora no bar; que o autor respondia às ordens do pai no trabalho.
Segunda Testemunha – Rosy Neves Gubert: que conhece o autor desde a infância, pois estudou junto com seu filho; que ele ajudava o pai, que era açougueiro, a carnear animais na fazenda da depoente; que o pai do autor era açougueiro e tinham, ao lado, um armazém; que no armazém vendiam de tudo um pouco de gêneros alimentícios; que o pai dele se chamava Valdomiro Ribeiro; que não se recorda se havia empregados no estabelecimento; que na idade escolar o autor ajudava o pai no comércio, por volta dos 15 anos de idade; que não sabe dizer se ele recebia salário pelo serviço; acredita que era como funcionário; que ele ficou pouco tempo trabalhando no comércio, pois logo foi para Irati estudar em Colégio Florestal; que naquela época não havia empregados, ao que se recorda; que acredita que depois do Colégio Florestal ele não voltou a trabalhar com o pai no estabelecimento; que desconhece detalhes das atividades profissionais do autor depois de formado; que era cliente do açougue e da lojinha; que provavelmente foi atendida pelo autor.
Terceira Testemunha – Sônia Maria Preuss Nardi: que conhece o autor da cidade de Teixeira Soares, onde mora; que o conhece desde que foi morar lá, ele ainda criança; que o pai do autor tinha um bar; que o pai do autor teve o bar até falecer, mas não sabe quando isso aconteceu; que se recorda que a família continuou com o bar mesmo depois do falecimento do pai do autor; que no bar havia comercialização de gêneros alimentícios também; que ao lado tinha um açougue, dele também; que o pai do autor se chamava Valdomiro Ribeiro; que não tinha empregados, sendo que o autor que ajudava; que as irmãs e a mãe dele ajudavam de vez em quando; que o autor começou a ajudar no comércio por volta dos 12 aos 15 anos de idade; que ele ia para a escola de manhã e ajudava no comércio pela tarde; que não sabe dizer se havia pagamento de salário; que o autor estudou no Colégio Florestal em Irati; que depois que ele saiu do Colégio ele retornou para ajudar o pai por volta dos anos 1980 ou 1988; que depois do colégio florestal ele voltou a trabalhar com o pai e então foi trabalhar de carteira assinada; que ele morava com os pais nesses períodos que trabalhava no bar, não tinha família; que nesse segundo período ele trabalhava o dia todo; que comprava carnes no açougue e doces no bar; que era atendida pelo autor; que quando ele voltou pro bar acredita que tinha de 25 a 28 anos de idade; que se recorda de velo ajudando sempre no estabelecimento desde pequeno; que na fase adulta ele trabalhava mesmo, não sabendo dizer se ele recebia remuneração; que depois ele foi trabalhar na Faber Castel, uma fábrica de lápis.
Verifica-se que a prova oral não é conclusiva para amparar as alegações do autor.
No depoimento pessoal do autor, tal qual no depoimento prestado pela primeira testemunha, não foi referida a existência de açougue, mas apenas de bar e mercearia, sendo lacônicas também as afirmações sobre o retorno do autor ao estabelecimento de propriedade de seu pai e sobre a forma da execução do trabalho.
Certo é, no entanto, que se tratava de empresa familiar.
Segundo iterativa jurisprudência do Tribunal Regional da 4ª Região, as atividades desenvolvidas pelos parentes em estabelecimento empresarial geralmente se inserem em contexto de mútuo auxílio, caracterizando, à semelhança do que ocorre com os trabalhadores rurais, um regime de economia familiar.
O grupo familiar que desenvolve uma atividade empresarial se auxilia mutuamente, sendo certo que os rendimentos revertem em favor de todos, não havendo que se falar, nesses casos, de uma típica relação de emprego, mas sim de uma sociedade de fato.
Na relação de emprego existente em atividades empresariais é acentuada a alteridade, característica que denota a assunção dos riscos da atividade exclusivamente pelo empregador, obstando que este distribua aos seus empregados os prejuízos e perdas do âmbito do empreendimento. Não é o que ocorre em uma empresa familiar, em que todos compartilham da mesma sorte, assumindo os riscos em conjunto.
Nesses casos, nem mesmo a formalização de um contrato de emprego não é capaz de afastar o reconhecimento de uma sociedade de fato, eis que o contrato de emprego é um contrato realidade.
Nessas hipóteses, portanto, a configuração de relação empregatícia é uma exceção, e demanda robusta prova dos requisitos que são inerentes a essa condição, devendo ficar evidenciado pelo conjunto probatório que a relação familiar era distinta dos negócios desenvolvidos na empresa. É dizer, "embora não haja vedação ao reconhecimento do vínculo de emprego em tal situação, há a necessidade de melhor comprovação, apta a afastar o ânimo meramente de colaboração familiar" (TRF 3ª Região, Turma Suplementar da 3ª Seção, AC2007703990135218, Rel. Alexandre Sormani, DJU de 23/01/2008, p. 738).
No presente caso, entendo que as provas produzidas não comprovam uma relação de emprego, pois, aliado à fragilidade dos documentos apresentados, os depoimentos não são robustos em confirmar os elementos característicos de uma relação empregatícia.
Portanto, não há prova da não eventualidade das atividades desenvolvidas pelo autor na empresa de sua família, nada obstando que nessas situações o auxílio prestado fosse esporádico e eventual.
Tampouco há no CNIS recolhimento de contribuições previdenciárias, aliás, nem sequer há menção do suposto vínculo empregatício naquele cadastro. Essa circunstância torna pouco provável o preenchimento do requisito da onerosidade, sendo mais provável que se tratasse, realmente, de uma sociedade de fato, na forma da fundamentação.
Portanto, entendo que não há prova nos autos do exercício de atividade pela parte autora na condição de empregado, carecendo de elementos indicativos de onerosidade, não eventualidade e subordinação no trabalho.
Ao que tudo indica, o trabalho do autor era desenvolvido em contexto de mútuo auxílio entre os membros da família, e não no contexto de uma relação formal e de subordinação, como exige um vínculo de emprego.
Destarte, não havendo prova da reunião dos requisitos de uma relação de emprego, os pedidos formulados na inicial devem ser julgados improcedentes.
É pacífico na jurisprudência o direito à averbação do tempo de aluno aprendiz nas condições observadas nos autos. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ESCOLA TÉCNICA ESTADUAL. AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO. ALUNO-APRENDIZ. EXISTÊNCIA DE RETRIBUIÇÃO ESTATAL. 1. A pacífica jurisprudência do STJ entende que o período de trabalho prestado na qualidade de aluno aprendiz em escola técnica estadual (não apenas federal), com remuneração, ainda que indireta, desde que às contas do Poder Público, deve ser considerado para efeitos de concessão da aposentadoria (RECURSO ESPECIAL Nº 1.318.990 - SC (2012/0075263-0, Relator Ministro Humberto Martins). 2. Havendo prova da contraprestação estatal pelos serviços prestados na condição de aluno-aprendiz, deve ser considerado o respectivo período de labor. (TRF4, AC 5006723-72.2018.4.04.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JOÃO BATISTA LAZZARI, juntado aos autos em 13/12/2019)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ACRÉSCIMO DE TEMPO COMO ALUNO-APRENDIZ. REQUISITOS LEGAIS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. 1. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a demonstração da presença dos seguintes requisitos: prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e retribuição pecuniária à conta do orçamento público, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar ou parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. Comprovada a prestação do labor como aluno-aprendiz, às expensas do Poder Público, é devido o cômputo do período respectivo. 2. Preenchidos os requisitos legais, tem a parte autora direito à revisar a renda mensal inicial do benefício, com o pagamento das diferenças daí decorrentes. 3. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905). (TRF4, AC 5004991-91.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 02/07/2020)
Por outro lado, para a averbação de tempo exercido em empresa familiar, exige-se a plena caracterização da relação de emprego, com pagamento regular de remuneração, o que não se observa no caso. Neste sentido, é o posicionamento do Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. AVERBAÇÃO. EMPREGADO. EMPRESA FAMILIAR. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ENCARGO DO EMPREGADOR. EMPRESÁRIO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. OPTANTE DO SIMPLES. 1. É possível o reconhecimento do período urbano exercido pelo segurado em empresa familiar, desde que demonstrada, além da efetiva prestação do labor, a existência de vínculo não eventual, dotado de subordinação do empregado em relação ao empregador, e objeto de contraprestação através do pagamento de salário (art. 3º da CLT). 2. A responsabilidade pelo pagamento das contribuições previdenciárias, no caso do contribuinte individual ou do trabalhador autônomo, sempre foi do segurado que deverá fazê-lo por iniciativa própria (art. 79, IV, da Lei n. 3.807/60; art. 139, II, do Decreto n. 89.312/1984 e art. 30, II, da Lei n. 8.212/91). 3. A LC 123/06 estabeleceu forma única de recolhimentos de tributos devidos pela empresa optante do Simples Nacional, excluídos os débitos da previdência de seus sócios ou empregados. Assim, a qualidade de segurado do empresário nesta situação deve ser verificada com o recolhimento de contribuições vertidas por ele próprio e não pela empresa. 4. É devida a averbação da exação vertida ao RGPS na condição de contribuinte individual ou de trabalhador autônomo, para contagem como carência, desde que o segurado comprove, além do exercício da atividade, o efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias. (TRF4, AC 5019596-76.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 24/11/2020)
Rejeito, portanto, ambos os apelos.
TUTELA ESPECÍFICA
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a 3ª Seção deste Tribunal, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que, confirmada a sentença de procedência ou reformada para julgar procedente, o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, portanto sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte (TRF4, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7, 3ª Seção, Des. Federal Celso Kipper, por maioria, D.E. 01/10/2007, publicação em 02/10/2007). Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente ao cumprimento de obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo dispôs de forma similar à prevista no Código/1973, razão pela qual o entendimento firmado pela 3ª Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Nesses termos, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora a ser efetivada em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, bem como por se tratar de prazo razoável para que a autarquia previdenciária adote as providências necessárias tendentes a efetivar a medida. Saliento, contudo, que o referido prazo inicia-se a contar da intimação desta decisão, independentemente de interposição de embargos de declaração, face à ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações e determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002524286v3 e do código CRC be18643f.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5006568-87.2018.4.04.7009/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: JOAO CARLOS RIBEIRO (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ACRÉSCIMO DE TEMPO COMO ALUNO-APRENDIZ. REQUISITOS LEGAIS. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. AVERBAÇÃO. EMPREGADO. EMPRESA FAMILIAR. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a demonstração da presença dos seguintes requisitos: prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e retribuição pecuniária à conta do orçamento público, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar ou parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. Comprovada a prestação do labor como aluno-aprendiz, às expensas do Poder Público, é devido o cômputo do período respectivo.
2. É possível o reconhecimento do período urbano exercido pelo segurado em empresa familiar, desde que demonstrada, além da efetiva prestação do labor, a existência de vínculo não eventual, dotado de subordinação do empregado em relação ao empregador, e objeto de contraprestação através do pagamento de salário (art. 3º da CLT).
3. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento às apelações e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 25 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002524287v4 e do código CRC 9064e358.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Data e Hora: 1/6/2021, às 16:22:41
Conferência de autenticidade emitida em 09/06/2021 04:01:19.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 18/05/2021 A 25/05/2021
Apelação Cível Nº 5006568-87.2018.4.04.7009/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: JOAO CARLOS RIBEIRO (AUTOR)
ADVOGADO: RICELLY MOLETA BUSATTO (OAB PR088505)
ADVOGADO: INGRID HESSEL (OAB PR043209)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 18/05/2021, às 00:00, a 25/05/2021, às 16:00, na sequência 349, disponibilizada no DE de 07/05/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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