Apelação Cível Nº 5000446-21.2019.4.04.7107/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JORGE MOACIR SCHIOCHET (AUTOR)
RELATÓRIO
JORGE MOACIR SCHIOCHET propôs ação de procedimento comum contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em 14/01/2019, postulando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da data de entrada do requerimento administrativo (27/08/2018), mediante: "b) o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar de 11/05/1976 a 28/02/1978 e 01/01/1985 a 31/01/1986; c) a contabilização do recolhimento efetuado na competência de 02/1986 como autônomo; d) o cômputo do intervalo compreendido entre 28/01/1987 a 16/03/1990 como aluno aprendiz; e) o reconhecimento dos períodos de 01/11/1990 a 05/02/2003 e 01/06/2003 a 31/01/2012 como tempo especial, com a posterior conversão em tempo comum".
Sobreveio sentença que julgou o pedido formulado na inicial nos seguintes termos (
):Considerando o contido no corpo desta decisão, julgo parcialmente procedentes os pedidos, nos termos do artigo 487, I, do CPC, o que faço para condenar o INSS a:
a) reconhecer e averbar o período de 11/05/1976 a 28/02/1978 como tempo rural em regime de economia familiar;
b) reconhecer e averbar o intervalo de 01/02/1986 a 28/02/1986 como tempo de contribuição e carência, nos termos da fundamentação;
c) reconhecer e averbar o período de 28/01/1987 a 31/12/1989, excluídos os períodos de faltas, devendo ser computado o total de 2 anos, 10 meses e 23 dias, nos moldes da fundamentação; e
d) reconhecer e averbar o período de 01/11/1990 a 05/03/1997 como tempo especial, com direito à sua conversão para tempo de serviço comum mediante o acréscimo de 40%.
Considerando o estabelecido no art. 85, §§ 2º; 3º, I e § 4º do NCPC, bem como que o proveito econômico desta demanda será inferior a 200 (duzentos) salários-mínimos, montante que se depreende da análise ao valor da causa, bem como a sucumbência de ambos os litigantes, condeno a parte autora e o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa.
Suspendo, contudo, a exigibilidade dos honorários advocatícios devidos pelo demandante, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, face ao benefício da gratuidade de justiça concedido a ele.
Os litigantes são isentos do pagamento das custas processuais em razão do disposto no art. 4º, I e II, da Lei nº 9.289/96.
Publique-se. Intimem-se.
Interposto recurso de apelação, intime-se a parte adversa para contra-arrazoar em 15 dias. Vencido este prazo, remetam-se os autos ao E.TRF4 (artigo 1.010, parágrafo terceiro, NCPC).
Não há falar em remessa necessária, uma vez que eventual condenação é inferior a 1000 (mil) salários-mínimos, de acordo com a regra do art. 496, § 3º, I, do NCPC (Lei nº 13.105/15).
Inconformada, a parte ré interpôs recurso de apelação.
Em suas razões, sustenta ser indevido o reconhecimento do tempo de serviço em que o autor era aluno-aprendiz, sob o argumento de que inexistia dotação orçamentária ou remuneração específica, ainda que indireta, às custas do orçamento público. Subsidiariamente, alegou que não podem ser computadas as ausências e períodos de férias, por exemplo, havendo necessidade de cômputo apenas do tempo líquido, conforme a jurisprudência majoritária em relação à matéria (
).Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O(s) apelo(s) preenche(m) os requisitos legais de admissibilidade.
Aluno-Aprendiz
No que diz respeito à averbação de tempo de serviço como aluno-aprendiz, verifica-se que a questão encontra-se sumulada no âmbito da própria Advocacia-Geral da União nos seguintes termos:
Enunciado nº 24: É permitida a contagem, como tempo de contribuição, do tempo exercido na condição de aluno-aprendiz referente ao período de aprendizado profissional realizado em escolas técnicas, desde que comprovada a remuneração, mesmo que indireta, à conta do orçamento público e o vínculo empregatício.
Na mesma linha, os seguintes precedentes desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO COMO ALUNO-APRENDIZ. RETRIBUIÇÃO ESTATAL. TEMPO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. AGENTES QUÍMICOS. RECONHECIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO OU APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. 1. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a comprovação dos seguintes requisitos: (1) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (2) retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de (a) alimentação, (b) fardamento, (c) material escolar e (d) parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros. 2 a 6 Omissis. (TRF4, AC 5009402-61.2012.4.04.7110, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 11/05/2018)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO - CONCESSÃO. LABOR RURAL - COMPROVAÇÃO - REQUISITOS. ALUNO-APRENDIZ. ATIVIDADE ESPECIAL. COMPROVAÇÃO - REQUISITOS LEGAIS. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF (TEMA 810) E STJ (TEMA 905). CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1 e 2 Omissis. 3. Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a comprovação da prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e de retribuição pecuniária à conta do orçamento público (admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros). Precedentes. 4 a 7 Omissis. (TRF4, AC 5005325-57.2017.4.04.7005, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 28/10/2020)
Alinhados com o posicionamento do STJ:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO COMO ASPIRANTE À VIDA RELIGIOSA. ANALOGIA ALUNO-APRENDIZ. RELAÇÃO DE EMPREGO NÃO CARACTERIZADA. REVISÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO.
1. Com efeito, a jurisprudência do STJ orienta-se no sentido de que é possível o cômputo do tempo de estudante como aluno-aprendiz de escola pública profissional para complementação de tempo de serviço, que objetiva fins previdenciários, desde que preenchidos os requisitos da comprovação do vínculo empregatício e da remuneração à conta do orçamento da União. 2 a 4 - omissis (AgInt no AREsp 1906844, 2ª Turma, Relator Ministra Herman Benjamin, DJU 25/03/2022).
Ainda quanto à matéria, o Superior Tribunal de Justiça, reiteradamente, tem aplicado a Súmula 96 do Tribunal de Contas da União:
Conta-se, para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado, na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomenda para terceiros.
Em resumo, é necessária, portanto, a comprovação dos seguintes requisitos: (1) prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e (2) retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de (a) alimentação, (b) fardamento, (c) material escolar ou (d) parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros.
No caso concreto, consta da Declaração fornecida pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul - Campus Bento Gonçalves (
, p. 26) que, no período de 28/01/1987 a 10/03/1990, o autor frequentou aulas teóricas e atividades práticas, recebendo alimentação e moradia do Instituto.Consta dos autos, ainda, uma Declaração assinada pelo Coordenador de Orçamento e Finanças do IFRS - Campus Bento Gonçalves (
, p. 27), na qual consta que o referido Instituto é mantido através de recursos da União desde sua criação, em outubro de 1959.Deste modo, é possível o reconhecimento deste período.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. ALUNO-APRENDIZ. ESCOLA TÉCNICA ESTADUAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. EXISTÊNCIA DE RETRIBUIÇÃO ESTATAL. AVERBAÇÃO. 1. Legitimidade passiva do INSS para reconhecimento de período como aluno-aprendiz em escola técnica federal para fins de aposentação no RGPS. Precedentes deste Tribunal. 2. Nos termos da Súmula 96 do Tribunal de Contas da União, conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado na qualidade de aluno-aprendiz em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros. 3. Demonstrado o preenchimento dos requisitos legais, o segurado faz jus à averbação dos períodos em que foi aluno-aprendiz, nos termos em que decidido na origem. (TRF4, AC 5000253-36.2020.4.04.7118, QUINTA TURMA, Relator HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, juntado aos autos em 21/06/2023)
Em relação ao pedido sucessivo da Autarquia ré de que o tempo a ser considerado deve ser o líquido, observo que a sentença já reconheceu que devem ser excluídos os períodos de faltas e férias, de modo a ser computado apenas o total de 2 anos, 10 meses e 23 dias, não havendo, portanto, interesse recursal do INSS no ponto.
Honorários advocatícios
Mantida a procedência do pedido, uma vez que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC), aplica-se ao INSS a majoração prevista no artigo 85, § 11, desse diploma, observando-se os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. Assim, majoro a verba honorária devida pelo INSS em 50% sobre o percentual mínimo da primeira faixa (art. 85, § 3º, inciso I, do CPC).
Caso o valor da condenação/atualizado da causa apurado em liquidação do julgado venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no §3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual mínimo da faixa subsequente, assim sucessivamente, na forma do §§4º, inciso III e 5º do referido dispositivo legal.
Tutela específica
Deixo de determinar a imediata implantação do benefício, considerando que já há aposentadoria por tempo de contribuição deferida e implantada na esfera administrativa e que a parte autora poderá optar, no cumprimento de sentença, pela percepção do benefício mais vantajoso.
Conclusão
Mantida a sentença de parcial procedência, com a majoração da verba honorária.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte ré.
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Apelação Cível Nº 5000446-21.2019.4.04.7107/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JORGE MOACIR SCHIOCHET (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ALUNO-APRENDIZ. comprovação.
Para fins de reconhecimento do tempo de serviço prestado na condição de aluno-aprendiz, é necessária a comprovação da prestação de trabalho na qualidade de aluno-aprendiz e de retribuição pecuniária à conta do orçamento público (admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas por terceiros). Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte ré, com ressalva do entendimento da Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 28 de junho de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 21/06/2024 A 28/06/2024
Apelação Cível Nº 5000446-21.2019.4.04.7107/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JORGE MOACIR SCHIOCHET (AUTOR)
ADVOGADO(A): EVERSON SARTORI CASAROTTO (OAB RS059053)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 21/06/2024, às 00:00, a 28/06/2024, às 16:00, na sequência 438, disponibilizada no DE de 12/06/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE RÉ, COM RESSALVA DO ENTENDIMENTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL ELIANA PAGGIARIN MARINHO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Ressalva - GAB. 112 (Des. Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO) - Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO.
Embora entenda necessária a demonstração de que a contrapartida auferida pelas atividades práticas desenvolvidas pelo aluno-aprendiz decorra do atendimento de encomendas de terceiros, comercialização do excedente de produção ou prestação de serviço público, no caso em tela o INSS, no apelo, alega apenas que inexistia dotação orçamentária ou remuneração específica, ainda que indireta, às custas do orçamento público, o que, conforme decidiu o Supremo (Mandado de Segurança 31.518/DF) não é condição ao reconhecimento do tempo de serviço. Ademais refere no recurso que a comprovação de recebimento de alimentação, fardamento ou material escolar representariam remuneração por eventual trabalho realizado, prova que, conforme indicado pela Relatora, está presente nos autos. Com estas notas, acompanho a Relatora no resultado.
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