Apelação Cível Nº 5007733-60.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: ELIAS CANO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A parte autora propôs ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pretendendo a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a Data de Entrada do Requerimento - DER, mediante o reconhecimento da especialidade das atividades laborais nos períodos de 01/05/1976 a 06/10/1976; 01/02/1977 a 10/10/1977; 24/10/1977 a 12/04/1982; 02/08/1982 a 30/07/1991 e 19/09/1991 a 15/09/2006, bem como mediante o reconhecimento da atividade rural prestada em regime de economia familiar, na condição de segurado especial, de 09/06/1969 a 30/04/1976.
Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 23/11/2016, cujo dispositivo tem o seguinte teor (ev. 44):
3. Dispositivo
3.1 Ante o exposto, julgo extinto o processo sem resolução do mérito no tocante ao pedido de conversão do período de atividade especial em comum nos períodos 01/05/1976 a 06/10/1976; 24/10/1977 a 12/04/1982; 02/08/1982 a 30/07/1991 e 19/09/1991 a 15/09/2006, já reconhecidos na esfera administrativa, ante a ausência de interesse de agir (art. 485, VI, CPC);
3.2 Quanto aos demais pedidos, julgo improcedente com fulcro no art. 487, I, do CPC.
3.3 Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como ao pagamento dos honorários advocatícios, estes que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos moldes do art. 85, § 2º do CPC, suspendendo a cobrança por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita, conforme art. 98, § 3º do CPC. Cumpram-se as disposições do Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça que forem aplicáveis à espécie.
Com a inclusão da presente sentença no sistema, dou-a por publicada. Registro conforme item 2.20.1.4, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná. Intimem-se.
A parte autora apelou, alegando haver provas do exercício de atividade rural prestada em regime de economia familiar, na condição de segurado especial, de 09/06/1969 a 30/04/1976, bem como postula que tal tempo seja reconhecido como de atividade especial. Pugna também pelo reconhecimento do trabalho urbano, em atividade especial, nos período de 01/02/1977 a 10/10/1977, de 24/10/1977 a 12/04/1982 e de 02/08/1982 a 30/07/1991. Postula tutela provisória antecipada e requer prequestionamento de dispositivos que elenca (ev. 50).
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
A parte autora peticionou, reiterando o pedido de tutela provisória antecipada (ev. 63).
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Prescrição Quinquenal
Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de caráter alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito.
Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação, conforme os termos da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ.
Atividade Rural (Segurado Especial)
O art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, bem como o art. 127, V, do Decreto nº 3.048/99, expressamente autorizam o aproveitamento do tempo de serviço rural trabalhado até 31/10/1991, sem que se faça necessário o recolhimento das contribuições previdenciárias para a averbação de tempo de contribuição, exceto no que se refere à carência.
Ainda, o art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, estendeu a condição de segurado a todos os integrantes do grupo familiar que laboram em regime de economia familiar, sem a necessidade de recolhimento das contribuições quanto ao período exercido antes da Lei nº 8.213/91 (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10-11-2003).
Tratando-se de trabalhador rural e de pescador artesanal, a jurisprudência atenuava a exigência de prova material, flexibilizando a Súmula n° 149 do Superior Tribunal de Justiça, que impedia a concessão do benefício com base apenas em prova oral. Contudo, a 1ª Seção daquele Tribunal, ao julgar o Tema n° 297 de seus Recursos Repetitivos, reafirmou a Súmula, e afastou o abrandamento ao decidir com força vinculante que: "a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário".
Acerca do termo inicial da prova documental, de acordo com a tese elaborada no Tema n° 638 dos Recursos Repetitivos do STJ: "Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório". Teor similar tem a Súmula n° 577 do Superior Tribunal de Justiça: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". Assim, não há necessidade de que o início da prova material abranja integralmente o período postulado, sendo suficiente que seja contemporâneo ao reconhecimento que se pretende, desde que ampliada por prova testemunhal convincente.
O uso de provas documentais em nome de outras pessoas do grupo familiar é permitido, com ressalvas, de acordo com o Tema n° 533 dos Recursos Repetitivos do STJ: "Em exceção à regra geral (...), a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana".
Ademais, sobre o labor urbano de integrante do grupo familiar e a investigação da descaracterização - ou não - do trabalho do segurado especial, o STJ estabeleceu no Tema n° 532 dos Recursos Repetitivos: "O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)".
O rol de documentos descrito no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é exemplificativo, admitindo-se a inclusão de documentos em nome de terceiros, integrantes do grupo familiar, conforme a Súmula nº 73 desta Corte: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
No que se refere à idade mínima para o reconhecimento do trabalho rural, a Súmula nº 05 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais uniformizou o seguinte entendimento: "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários".
No caso dos autos, o tempo de serviço rural em controvérsia refere-se ao período de 09/06/1969 a 30/04/1976. Como prova, a parte autora trouxe ao autos certidão, emitida pelo Registro de Imóveis da Comarca da Mandaguari, relativa à aquisição por Jesus Cano (pai do segurado - ev. 1, OUT3), qualificado naquele documento como "lavrador", mediate escritura pública lavrada em 20.6.1952, do seguinte imóvel rural (ev. 1, OUT7, p. 1):
uma área de terras medindo 5,00 - (cinco) - alqueires, ou seja 12,10 hectares, da 2a. Seção, da Colônia Paranavaí, sita no distrito de Paranaval, deste município e comarca de Mandaguari, com as seguintes divisas e confrontações: "pela cabeceira com o Patrimônio Maracanã, por um lado com Manoel Cano Cano, pelo outro lado, com Leonidio Palon e finalmente pelos fundos com Luiz Gargalho (...)
Além disso, juntou certidão, emitida pelo Registro de Imóveis de Nova Londrina, relativa à transmissão de imóvel rural, feita pelo pai do segurado - igualmente qualificado como "lavrador" -, por escritura pública de compra e venda, com data de 21.02.1975, referente ao seguinte imóvel rural (ev. 1, OUT7, pp. 3-4):
uma área de terras medidndo 5,0 (cinco) alqueires paulistas, ou sejam 12,10 hectares, da 2ª Seção da Colônia Paranavaí, localizado no Município de Diamante do Norte, comarca de Nova Londrina, Estado do Paraná, com as seguintes divisas e confrontações: pela cabeceira com o Patrimônio Maracanã, por um lado com Manoel Cano Cano ou seus sucessores; pelo outro lado, com Leonidio Polon ou seus sucessores, e finalmente pelos fundos com Luiz Gargalho ou seus sucessores (...)
Também trouxe certidão, emitida pelo Registro de Imóveis de Nova Londrina, relativa à aquisição, por David Canno Garcia, mediane escritura pública lavrada em 23.01.1975, de imóvel rural assim descrito (ev. 1, OUT7, pp. 5-6):
uma área de terras medindo 9,50 (nove e meio) alqueires paulistas, mais ou menos, iguais a 22,9 hectares, destacadas das partes dos lotes nºs 64 e 27 (sessenta e quatro e vinte e sete), da subdivisão particular dos lotes nºs 21 a 30 (vinte e um a trinta e oito), da Gleba 1-B, 4ª Parte, 2ª Seção da Colônia Paranavaí, situada no Município de Itaúna do Sul, Comarca de Nova Londrina, Estado do Paraná, cuja área está dentro do seguinte roteiro: "Começa no marco nº 1, cravado à beira da estrada que demanda ao Rio Quatí, na divisa do Lote 65, segue rumo NE (...)
Ademais, destaque-se que o segurado nasceu em 09.6.1957, na cidade de Nova Londrina (ev. 1, OUT3), interior do Estado do Paraná, localidade de matiz sabidamente rural até a atualidade.
O primeiro registro do vínculo de trabalho do autor data de 01.5.1976 (ev. 1, OUT6, p. 2, folha 10 da CTPS).
Como prova oral, foram ouvidos o Sr. Júlio César Bassan, como testemunha advertida, compromissada e não contraditada (ev. 35, TERMOAUD1, p. 3; ev. 61, VÍDEO1), e o Sr. Moacir Lelis Sgarboza (ev. 35, TERMOAUD1, p. 4; ev. 61, VÍDEO2), além do depoimento pessoal do autor (ev. 35, TERMOAUD1, p. 2; ev. 61, VÍDEO3).
O Sr. Júlio César referiu que conhece o segurado desde a década de 1950, e que o segurado, durante a década de 1960 e de 1970, teria residido no meio rural, em localidade próxima de onde o pai do depoente possuía sítio. Afirmou que o segurado, àquela época, morava noutro sítio com a família, ajudando-a na plantação de café, desde quando iniciou sua força de trabalho ("no meio rural é assim, sabe? começou a conseguir fazer alguma coisa, os pais levam pra roça" - ev. 61, VÍDEO1, 01'46"-01'54"), e até mudar-se do meio rural para a cidade. Acresceu que, junto à plantação de café, havia "cultura intermediária", relativa à plantação de demais gêneros alimentícios para a subsistência familiar, como milho, feijão, arroz. Assegurou ter visto o autor trabalhando nas plantações, e que o cultivo era realizado sem o auxílio de empregados.
O Sr. Moacir Lelis mencionou que possuía chácara a 1km de distância, mais ou menos, da propriedade rural dos pais do segurado e que, desde quando os conheceu, em 1966, o autor, mesmo criança, já trabalhava "na roça" com a família. Confirmou que o segurado e sua família trabalharam no campo até o momento em que venderam o sítio, no qual plantavam, principalmente, café, porém "no meio do café plantavam um milho, um feijão..." (ev. 61, VÍDEO2, 01'38"-01'42").
Por sua vez, o autor, Sr. Elias Cano, afirmou que "nasceu no sítio" e nele morou até os dezoito anos, aproximadamente, quando foi para a cidade. Confirmou que um dos confinantes do imóvel era a família Polon. Referiu que no sítio trabalhavam seu pai, ele e seus três irmãos homens; suas irmãs, no entanto, não trabalhavam na área rural. Reiterou que não tinham empregados.
Quanto a este tópico da demanda, a sentença fundamentou o seguinte:
No caso dos autos, o único documento acostado à inicial foi a matrícula da propriedade rural em nome dos pais (seq. 1.11), concluindo-se, pois, pela inexistência de prova material a permitir o cômputo da atividade rural alegada na inicial.
Ademais, a prova testemunhal foi fraca, limitando-se as testemunhas a dizerem que conheceram o autor desde criança e viam trabalhar junto com seu pai e irmãos, contudo não souberam precisar o período que o autor supostamente trabalhou no campo.
Assim, reconheço demonstrado, mediante início de prova material confirmada pela prova oral, o período rural de 09/06/1969 (início presumido de sua força de trabalho no campo, referente à data em que o segurado completou 12 anos - ev. 1, OUT3) a 21/02/1975 (data em que o pai do autor, Sr. Jesus Cano, vendeu a propriedade rural, conforme escritura já mencionada).
Logo, dou parcial provimento à apelação, a fim de reconhecer o labor rural de 09/06/1969 a 21/02/1975.
Atividade Urbana
O apelante requer a averbação do período urbano, registrado em CTPS, relativo ao intervalo de 01/02/1977 a 10/10/1977, como empregado na "Cano e Cano Ltda", conforme anotação em CTPS (ev. 1, OUT6, p. 2, fl. 11 da CTPS).
De acordo com a jurisprudência deste Tribunal, os registros em CTPS possuem presunção de veracidade, razão pela qual, desde que hígidos, devem ser computados para todos os efeitos previdenciários, independentemente de registro no CNIS:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. CTPS. PROVA PLENA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. ATIVIDADE ESPECIAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELA RMI MAIS VANTAJOSA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados, devendo a prova em contrário ser inequívoca. 2. a 6. (...) (TRF4, AC 5051359-32.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 24/05/2019)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. CTPS. PROVA PLENA. PERÍODO DE GRAÇA. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. (...) 2. O tempo de serviço urbano pode ser comprovado por documentação idônea, gozando as anotações em CTPS de presunção juris tantum de veracidade. É ônus do empregador os recolhimentos das contribuições devidas que, se não efetuadas, não pode implicar em ônus ao empregado. 3. a 5. (...) (art. 85, §11, CPC). (TRF4, AC 5000104-12.2016.4.04.7108, QUINTA TURMA, Relator ADRIANE BATTISTI, juntado aos autos em 16/05/2019)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. TEMPO DE SERVIÇO. REQUISITOS LEGAIS. CARÊNCIA. ATIVIDADE URBANA. CTPS. DUAS APOSENTADORIAS. REGIMES DISTINTOS. CONVERSÃO EM PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. a 2. (...) 3. A anotação na CTPS comprova, para todos os efeitos, o tempo de contribuição, a filiação à Previdência Social e o vínculo empregatício alegados, porquanto goza de presunção juris tantum de veracidade, nos termos da Súmula 12/TST. 4. a 5. (...) (TRF4 5024173-05.2015.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 15/04/2019)
Logo, dou parcial provimento à apelação do autor, neste item.
Atividade Especial
Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Tal entendimento foi manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado, que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998 (REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 05.04.2011).
Tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28.4.1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II);
b) de 29.4.1995 e até 5.3.1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 5.3.1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo I);
c) a partir de 6.3.1997, quando vigente o Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos nº 2.172/97 (Anexo IV) e nº 3.048/99.
d) a partir de 1.1.2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10-12-2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Intermitência
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24.10.2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 7.11.2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18.5.2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8.1.2010).
Equipamentos de Proteção Individual - EPI
A Medida Provisória n° 1.729/98 (posteriormente convertida na Lei 9.732/1998) alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha i) informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância, e ii) recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Por esse motivo, em relação à atividade exercida no período anterior a 03.12.1998 (data da publicação da referida Medida Provisória), a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador. O próprio INSS já adotou esse entendimento na Instrução Normativa n° 45/2010 (artigo 238, § 6º).
Em período posterior a 03.12.1998, foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal a existência de repercussão geral quanto ao tema (Tema 555). No julgamento do ARE 664.335 (Tribunal Pleno, Rel Min. Luiz Fux, DJe 12.2.2015), a Corte Suprema fixou duas teses: 1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; 2) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. Ou seja: nos casos de exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI, ou de menção em laudo pericial à neutralização de seus efeitos nocivos, uma vez que os equipamentos eventualmente utilizados não detêm a progressão das lesões auditivas decorrentes; em relação aos demais agentes, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência da utilização de EPI's é admissível, desde que estejam demonstradas no caso concreto a existência de controle e peridiocidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade e, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador.
A matéria foi objeto de exame por esta Corte no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (IRDR Tema 15), tratando da eficácia dos EPI's na neutralização dos agentes nocivos. O acórdão foi assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s. (TRF4, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) 5054341-77.2016.404.0000, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Jorge Antonio Maurique,11.12.2017)
Como se vê, foi confirmado o entendimento acerca da necessidade de prova da neutralização da nocividade dos agentes agressivos, sendo relacionados ainda outras hipóteses em que a utilização de EPI não descaracteriza o labor especial (além do ruído, já afastado pela decisão do STF), consoante o seguinte trecho do voto condutor:
Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas seguintes hipóteses:
a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:
Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º:
'§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)'
b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:
b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)
b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)
b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:
Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017)
Em suma, de acordo com a tese fixada por esta Corte, a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor: i) em períodos anteriores a 3.12.1998; ii) quando há enquadramento legal pela categoria profissional; iii) em relação aos agentes nocivos: ruído, biológicos, cancerígenos (asbestos e benzeno) e periculosos.
Outrossim, nos demais casos, mesmo que o PPP consigne a eficácia do EPI, restou garantida ao segurado a possibilidade de discutir a matéria e produzir provas no sentido de demonstrar a ineficácia do EPI e a permanência da especialidade do labor.
Atividade de Mecânico
A atividade de mecânico é considerada especial mediante enquadramento profissional até 28/4/1995, por equiparação aos trabalhadores de indústrias metalúrgicas e mecânicas, com base no Anexo do Decreto n° 53.831/64 (item 2.5.3) e Anexo do Decreto n° 83.080/79 (item 2.5.1), de acordo com a jurisprudência desta Turma Suplementar (destaquei):
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ANTERIOR AO CPC DE 2015. CABIMENTO. APOSENTADORIA ESPECIAL - CONCESSÃO. AGRAVO RETIDO. CONHECIDO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. ATIVIDADE DE MECÂNICO E TRATORISTA. AGENTE NOCIVO QUÍMICO. COMPROVAÇÃO - REQUISITOS LEGAIS. EPI EFICAZ. RETORNO DOS AUTOS. IRDR 15. PROVA PERICIAL IMPRESCINDÍVEL. 1. a 6. (...) 7. A atividade de mecânico desempenhada antes de 28-4-1995 admite a aceitação de qualquer meio de prova, sendo possível, ainda, o enquadramento por categoria profissional por equiparação com os trabalhadores de indústrias metalúrgicas e mecânicas. 8. a 10. (...) (TRF4 5013052-55.2012.4.04.7001, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 27/02/2019)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ANTERIOR AO CPC DE 2015. CABIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE DE MECÂNICO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. COMPROVAÇÃO - REQUISITOS LEGAIS. REPETITIVO DO STJ. TEMA 546. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. RE Nº 870.947/SE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. INDEFINIÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE DE CUMPRIMENTO. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO. 1. a 3. (...) 4. A atividade de mecânico desempenhada antes de 28-4-1995 admite a aceitação de qualquer meio de prova, sendo possível, ainda, o enquadramento por categoria profissional por equiparação com os trabalhadores de indústrias metalúrgicas e mecânicas (anexo II, subitem 2.5.1, do Decreto nº 83.080/1979). 5.a 12. (...)(TRF4 5055719-25.2013.4.04.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ ANTONIO BONAT, juntado aos autos em 06/02/2019)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. MECÂNICO. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. ANÁLISE QUALITATIVA DA EXPOSIÇÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. 1. (...) 2. A atividade de mecânico desempenhada antes de 28-4-1995 admite a aceitação de qualquer meio de prova, sendo possível, ainda, o enquadramento por categoria profissional por equiparação com os trabalhadores de indústrias metalúrgicas e mecânicas (anexo II, subitem 2.5.1, do Decreto nº 83.080/1979). 3. a 7. (...) (TRF4 5011891-47.2011.4.04.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 10/07/2018)
Caso Concreto
No caso dos autos, a controvérsia diz respeito à especialidade - ou não - dos períodos de 01/02/1977 a 10/10/1977, de 24/10/1977 a 12/04/1982 e de 02/08/1982 a 30/07/1991.
A sentença examinou as provas e decidiu a questão nos seguintes termos:
2.1 O autor quer a conversão dos períodos trabalhados em condições especiais (mecânico) em comum.
De plano, observo, de acordo com planilha de contagem de tempo de serviço/contribuição juntadas ao processo administrativo (evento 1.11), que o INSS já considerou em favor do segurado, como tempo de serviço comum o período de 01/05/1976 a 06/10/1976; 24/10/1977 a 12/04/1982; 02/08/1982 a 30/07/1991 e 19/09/1991 a 15/09/2006.
Acerca destes períodos, portanto, carece o autor de interesse de agir, porque a tutela jurisdicional não revela útil e necessária na espécie, sendo forçoso, pois, a extinção do processo sem resolução do mérito, a teor do art. 485, VI, CPC.
Em verdade, ao contrário do que fundamenta a sentença, há interesse de agir da parte autora, pois o INSS não reconheceu os períodos em questão como especiais, tampouco posteriormente os converteu em comum pelo fator 1,4, como requer o autor. Destaco também que, no ev. 1.11, citado na sentença, há apenas o comunicado de decisão indeferitória do INSS, com cômputo total do tempo de contribuição, sendo a única planilha de contagem, período por período, apresentada no ev. 1, OUT10, com dados inseridos pelo próprio segurado no simulador oferecido pelo INSS.
Como se nota, a parte autora postula o reconhecimento do caráter especial de atividades nos seguinte períodos: 01/02/1977 a 10/10/1977, como balconista na "Cano e Cano Ltda.", conforme anotação em CTPS (ev. 1, OUT6, p. 2, fl. 11 da CTPS); 24/10/1977 a 12/4/1982, na condição de mecânico de produção na "Ford Motor Company Brasil Ltda.", vínculo esse anotado em CTPS (ev. 1, OUT6, p. 3, fl. 12 da CTPS), descrito em PPP (ev. 1, OUT8, pp. 1-2) e registrado no CNIS (ev. 1, OUT9, p. 1, item 3); e 02/8/1982 a 30/7/1991, na qualidade de mecânico e lubrificador na "Enso Cano", também registrado em CTPS (ev. 1, OUT6, p. 3, fl. 13 da CTPS), consignado em formulário-padrão (ev. 1, OUT8, p. 4) e parcialmente declinado no CNIS (ev. 1, OUT9, p. 1, item 4).
Como referido em tópico precedente da fundamentação deste voto, a atividade de mecânico é considerada especial mediante enquadramento profissional até 28/4/1995. Os períodos requeridos pela parte autora nesta apelação referem-se a intervalos anteriores a essa época (ev. 50, p. 20, item "d"). Todavia, o período de 01/02/1977 a 10/10/1977, como balconista na "Cano e Cano Ltda.", não encontra enquadramento por categoria profissional. Os demais períodos, porém, merecem ser reconhecidos como especiais.
Logo, dou parcial provimento à apelação, a fim de reconhecer como especiais os períodos de 24/10/1977 a 12/04/1982 e de 02/08/1982 a 30/07/1991.
Aposentadoria Especial
Os requisitos exigidos para a concessão de aposentadoria especial são os seguintes: (a) comprovação de tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, durante o período mínimo de quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme a atividade laborativa; (b) comprovação de efetiva exposição aos agentes nocivos (químicos, físicos ou biológicos) pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício; (c) para fins de carência, comprovação de um mínimo de 15 anos de contribuição (180 contribuições mensais), nos termos do art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, ou período menor se a filiação ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS) foi anterior a 24/07/91, conforme tabela do art. 142 Lei nº 8.213/91.
Contagem do tempo de serviço/contribuição e carência
Especial | 24/10/1977 | 12/04/1982 | 1,0 | 4 | 5 | 19 |
Especial | 02/08/1982 | 30/07/1991 | 1,0 | 8 | 11 | 29 |
Conclusão
Não existe direito ao benefício em questão, pois a parte autora não conta com tempo de contribuição suficiente para o preenchimento do primeiro requisito necessário à concessão do benefício de aposentadoria especial, pois comprova 13 anos, 5 meses e 18 dias de atividade especial. Além disso, não preencheu a carência exigida pelo art. 142 da Lei 8.213/91, correspondente a 180 meses de contribuição.
O pedido de aposentadoria especial deve ser julgado improcedente, restando assegurado à parte autora o reconhecimento dos períodos de atividade especial acima explicitados, para fins de conversão e/ou cômputo futuro em outros benefícios que venha a requerer.
Quanto ao fator de conversão, considerada a DER (quando já se encontrava em vigor o artigo 57, § 5º, da Lei n° 8.213/91 com a redação dada pela Lei n° 9.032/95), devem ser aplicados a todo o período laboral os fatores de conversão previstos no artigo 64 do Decreto n.º 357/91, e atualmente no art. 70 do Decreto 3.048/99, que regulamenta o referido diploma legal:
Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
TEMPO A CONVERTER | MULTIPLICADORES | |
MULHER (PARA 30) | HOMEM (PARA 35) | |
DE 15 ANOS | 2,00 | 2,33 |
DE 20 ANOS | 1,50 | 1,75 |
DE 25 ANOS | 1,20 | 1,40 |
Aposentadoria por tempo de contribuição
No caso, não foi juntado aos autos o processo administrativo, havendo apenas o comunicado de decisão indeferitória do INSS, informando que, para o requerimento administrativo formulado em 18/4/2015, foi reconhecido, até 16/12/1998, 18 anos, 3 meses e 6 dias de contribuição. Assim, quanto aos períodos contributivos seguintes, colho os dados diretamente do CNIS, juntado aos autos (ev. 1, OUT9, p. 3).
Logo, considerando o tempo de contribuição reconhecido pelo INSS em sede administrativa até 16/12/1998 (ev. 1, OUT11) e, para os períodos seguintes, os dados do CNIS (ev. 1, OUT9, p. 3), bem como levando em conta o tempo de atividade rural e especial reconhecidas neste voto, convertida essa última para tempo comum pelo fator correspondente, tem-se o seguinte cenário:
RECONHECIDO NA FASE ADMINISTRATIVA | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | 18 | 3 | 6 | ||
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | 18 | 8 | 22 | ||
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 18/04/2015 | 23 | 4 | 24 | ||
RECONHECIDO NA FASE JUDICIAL | ||||||
Obs. | Data Inicial | Data Final | Mult. | Anos | Meses | Dias |
T. Rural | 09/06/1969 | 21/02/1975 | 1,0 | 5 | 8 | 13 |
T. Comum | 01/02/1977 | 10/10/1977 | 1,0 | 0 | 8 | 10 |
T. Especial | 24/10/1977 | 12/04/1982 | 0,4 | 1 | 9 | 14 |
T. Especial | 02/08/1982 | 30/07/1991 | 0,4 | 3 | 7 | 6 |
Subtotal | 11 | 9 | 13 | |||
SOMATÓRIO (FASE ADM. + FASE JUDICIAL) | Modalidade: | Coef.: | Anos | Meses | Dias | |
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | Proporcional | 70% | 30 | 0 | 19 |
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | Sem idade mínima | - | 30 | 6 | 5 |
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 18/04/2015 | Integral | 100% | 35 | 2 | 7 |
Pedágio a ser cumprido (Art. 9º EC 20/98): | 0 | 0 | 0 | |||
Data de Nascimento: | 09/06/1957 | |||||
Idade na DPL: | 42 anos | |||||
Idade na DER: | 57 anos |
Logo, como se nota da tabela acima, a parte autora tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a DER, em 18/4/2015, com direito ao recebimento de quantias atrasadas desde tal data.
Consectários da Condenação
Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de abril de 2006 (Lei 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei 8.213/91), conforme decisão do STF no RE 870.947 (Tema 810), Pleno, Rel. Min. Luis Fux, DJE de 20.11.2017, item "2" (EDs rejeitados na íntegra sem modulação dos efeitos; julgamento concluído em 03.10.2019) e do STJ no REsp 1.492.221/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 20.03.2018 (Tema 905), item "3.2" da decisão e da tese firmada.
Juros Moratórios
a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29.06.2009;
b) a partir de 30.06.2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97, consoante decisão do STF no RE 870.947, DJE de 20.11.2017.
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios de sucumbência são devidos pelo INSS, em regra, no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).
Reformada a sentença e invertida a sucumbência, fixo a verba honorária em 10% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face do benefício da gratuidade da justiça.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Tutela Antecipada
Quanto à antecipação dos efeitos da tutela, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (TRF4, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7, Rel. para Acórdão, Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 9.8.2007).
Assim sendo, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação a artigos do Código de Processo Civil e da Constituição Federal, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação: provida parcialmente, a fim de reconhecer o labor rural de 09/06/1969 a 21/02/1975, averbar o período urbano de 01/02/1977 a 10/10/1977, declarar especiais os períodos de 24/10/1977 a 12/4/1982 e de 02/8/1982 a 30/7/1991 e conceder à parte autora aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde 18/4/2015 (DER), com direito ao recebimento de quantias atrasadas desde tal data;
- é determinada a implantação do benefício no prazo de 45 dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000820066v39 e do código CRC dcb67cfc.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 24/12/2019, às 6:48:54
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:39:07.
Apelação Cível Nº 5007733-60.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: ELIAS CANO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria por tempo de contribuIção. Atividade especial. mecânico. reconhecimento. atividade rural.
A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido.
Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
A atividade de mecânico é considerada especial mediante enquadramento profissional até 28/4/1995, por equiparação aos trabalhadores de indústrias metalúrgicas e mecânicas, com base no Anexo do Decreto n° 53.831/64 (item 2.5.3) e Anexo do Decreto n° 83.080/79 (item 2.5.1).
Nos termos do artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o cômputo de tempo de serviço de segurado trabalhador rural, anterior à data de início de sua vigência, é admitido para concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Para o período ulterior à Lei de Benefícios (competência de novembro de 1991, conforme disposto no artigo 192 do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 357/91), o aproveitamento condiciona-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, de acordo com o artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91 e Súmula 272 do Superior Tribunal de Justiça.
Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal.
Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a conversão dos períodos de atividade especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 17 de dezembro de 2019.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000820067v4 e do código CRC efdd7fd9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 24/12/2019, às 6:48:54
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:39:07.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual ENCERRADA EM 17/12/2019
Apelação Cível Nº 5007733-60.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: ELIAS CANO
ADVOGADO: ANTÔNIO CARLOS SÃO JOÃO (OAB PR029825)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, aberta em 10/12/2019, às 00:00, e encerrada em 17/12/2019, às 16:00, na sequência 822, disponibilizada no DE de 29/11/2019.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juiz Federal MARCOS JOSEGREI DA SILVA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:39:07.