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Apelação Cível Nº 5002621-63.2020.4.04.7006/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: EDUARDO SELESTRINO DOS SANTOS SOBRINHO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do período rural, de 28/07/1977 e 03/03/1986.
Sentenciando, em 28/10/2021, o MM. Juiz julgou o pedido, nos seguintes termos:
Diante do exposto, julgo procedente o pedido inicial, resolvendo o mérito na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de condenar o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS a:
a) Averbar o(s) intervalo(s) de 28/07/1979 a 03/03/1986 como tempo de serviço rural, exceto para fins de carência.
b) Conceder à parte autora a aposentadoria por tempo de contribuição com proventos integrais. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário(Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015), com efeitos desde a data do requerimento administrativo.
DADOS PARA CUMPRIMENTO: ( ) IMPLANTAÇÃO (X) CONCESSÃO ( ) REVISÃO |
NB: 184.451.713-3 |
ESPÉCIE: APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO |
DIB: 30/10/2017 |
DIP: 20 dias após a intimação posterior ao trânsito em julgado |
DCB: não se aplica |
RMI: a apurar |
c) Pagar a importância resultante da somatória das prestações vencidas entre a data acima fixada e a data da implantação do benefício, incluindo a gratificação natalina, devidamente atualizada até o efetivo pagamento. Durante o período previsto no parágrafo 5º do artigo 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos (súmula vinculante n. 17 e Tema 1037 decidido, em sede de repercussão geral, pelo Supremo Tribunal Federal). A correção monetária incidirá a partir de cada vencimento e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, a saber, IPC-r, de 07/1994 a 06/1995, INPC, de 07/1995 a 04/1996, IGP-DI, de 05/1996 a 03/2006, e INPC, de 04/2006 em diante. Os juros de mora, devidos desde a citação, incidirão à taxa de 1% (um por cento) ao mês, de forma simples, até junho de 2009 e, a partir de julho de 2009, seguirá o índice oficial de juros aplicados à caderneta de poupança, nos seguintes termos: a) 0,5% (meio por cento) ao mês, de forma simples, de julho de 2009 a abril de 2012 e, b) a partir de maio de 2012, conforme variação descrita no inciso II do artigo 12 da Lei 8.177/1991.
Consigno que os consectários legais acima expostos estão em consonância com o Manual de Cálculos da Justiça Federal e o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, de forma vinculante (artigo 927, III e artigo 1.040, III, do Código de Processo Civil) e sem modulação de efeitos, sob o rito da repercussão geral, no RE n. 870.947 [Tema 810], bem como pelo Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos, nos REsp 1492221, REsp 1495144 e REsp 1495146 [Temas 492 e 905].
Sem custas (artigo 4º, I e II, da Lei 9.289/1996).
Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversária, que arbitro em 10% (dez) por cento sobre o valor atualizado da condenação (artigo 85, §3º, I, do Código de Processo Civil). A verba devida pelo INSS deve ser incluída em requisição de pagamento a ser expedida em favor da parte autora, sendo vedada a compensação com o valor pela parte devido (artigo 85, §14, do Código de Processo Civil).
Embora ilíquida a presente sentença, entendo, com fulcro no artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil, que não é caso de remessa necessária. Isso porque, mesmo na hipótese em que a RMI da aposentadoria deferida à parte autora seja fixada no teto do RGPS, o montante das parcelas em atraso desde a DER, acrescida de correção monetária e juros de mora, jamais excederá à quantia de 1.000 salários-mínimos, patamar exigível para a admissibilidade do reexame necessário.
(...)
Apela o autor, requerendo o reconhecimento do período rural anterior aos 12 anos de idade, de 28/07/1977 e 27/07/1979. Afirma que as provas produzidas nos autos indicam que o recorrente exerceu atividades rurais nesse período.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
CONSIDERAÇÕES GERAIS - TEMPO DE SERVIÇO RURAL
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31/10/1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, §2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Outrossim, o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
A comprovação do exercício do trabalho rural pode ser feita mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia).
Importa, ainda, salientar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Devido à alteração legislativa introduzida pela MP 871/2019, convertida na Lei n. 13.846, que modificou os arts. 106 e § 3º e 55 da Lei n. 8.213/91, a comprovação da atividade do segurado especial passa a ser determinada por meio de autodeclaração, corroborada por documentos que se constituam em início de prova material de atividade rural e/ou consulta às entidades públicas credenciadas, nos termos do disposto no art. 13 da Lei n. 12.188/2010, e por outros órgãos públicos, na forma prevista no Regulamento e não mais por declaração de sindicatos (Lei n. 13.846/2019).
Por meio do acréscimo do art. 38-A à Lei nº 8.213/91, foi prevista a criação do sistema de cadastro dos segurados especiais no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS). Nos termos do art. 38-B, o INSS utilizará as informações constantes do “CNIS Segurado Especial” para fins de comprovação do exercício da atividade e da condição do segurado especial e do respectivo grupo familiar.
Na redação conferida pela Lei 13.846/19, o “CNIS Segurado Especial” se tornaria, a partir de 1 de janeiro de 2023, a exclusiva fonte de informações para comprovação da condição de segurado especial do indivíduo. Tendo em vista a virtual impossibilidade de adesão completa ao cadastro até a referida data, a EC nº 103/19 (Reforma da Previdência), estabeleceu que esse prazo será prorrogado até a data em que o “CNIS Segurado Especial” atingir a cobertura mínima de 50% (cinquenta por cento) dos segurados especiais, a ser apurado conforme quantitativo da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD).
Enquanto não atingido tal objetivo, o Art. 38-B, da Lei nº 8.213/91, estabelece que “o segurado especial comprovará o tempo de exercício da atividade rural por meio de autodeclaração ratificada por entidades públicas credenciadas, nos termos do art. 13 da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, e por outros órgãos públicos, na forma prevista no regulamento".
Essas alterações foram adotadas pela administração previdenciária nos arts. 47 e 54 da IN 77 PRES/INSS, de 21 de janeiro de 2015, passando a ser aplicadas para os benefícios a partir de 18/01/2019, sendo, deste modo, dispensada a realização de justificação administrativa e as declarações de testemunhas para corroborar o início de prova material.
No entanto, entendo que se trata de norma de natureza processual, que deve ser aplicada de forma imediata aos processos em curso, independentemente da data do requerimento administrativo.
Segundo o Ofício Circular nº 46/DIRBEN/INSS, de 13/09/2019, a ratificação da autodeclaração do segurado especial será admitida para os requerimentos administrativos de aposentadoria por idade híbrida, certidão de tempo de contribuição (CTC) ou aposentadoria por tempo de contribuição, devendo ser corroborado, no mínimo, por um instrumento ratificador (base governamental ou documento) contemporâneo para cada período a ser analisado, observado o limite de eficácia temporal fixado em metade da carência para cada documento apresentado.
Dessa forma, na aposentadoria por idade ou por tempo de contribuição, cada documento autoriza o reconhecimento de até 7 anos e 6 meses de carência, de modo que para o tempo total de carência é exigido, ao menos, 2 documentos contemporâneos - um para cada metade, sendo que na hipótese de períodos intercalados de exercício de atividade rural e urbana superior a 120 (cento e vinte) dias no ano civil, deverá ser apresentado instrumento ratificador (base governamental ou documento) a cada retorno à atividade rural.
Quanto à contemporaneidade da prova documental, é verificada considerando a data de emissão/registro/homologação do cadastro ou documento.
O instrumento ratificador anterior ao período de carência será considerado se for contemporâneo ao fato nele declarado, devendo ser complementado por instrumento ratificador contemporâneo ao período de carência/controvertido, caso não haja elemento posterior que descaracterize a continuidade da atividade rural.
Quando o instrumento ratificador for insuficiente para reconhecer todo o período autodeclarado, deverá ser computado o período mais antigo em relação ao instrumento de ratificação, dentro do limite temporal de 7 anos e meio por documento. Se houver ratificação parcial do período que consta da autodeclaração, a comprovação deverá ser complementada mediante prova documental contemporânea ao período alegado do exercício de atividade rural.
Assim, as diretrizes administrativas lançadas pelo INSS autorizam o reconhecimento do tempo de serviço rural com base em declaração do segurado ratificada por prova material, dispensando-se a produção de prova oral em justificação administrativa.
Portanto, se é dispensada a realização de justificação administrativa, em regra não há razão para a produção de prova testemunhal em juízo, mas somente após o esgotamento da produção de prova documental e/ou em bancos de dados disponíveis é que se justifica a oitiva de testemunhas, caso necessário em razão de fundada dúvida a respeito do efetivo exercício de atividade rural.
Em conclusão, a comprovação do tempo rural em juízo não dependerá mais, na maioria dos casos, de prova oral, seja por meio de determinação de justificação administrativa, seja por meio de audiências. Se, em Juízo, não houver início de prova material, trata-se de hipótese de aplicação da tese fixada no Tema 629, do STJ, ou seja, a extinção do feito sem exame do mérito. Isso porque, como cediço, não há possibilidade de reconhecimento de tempo rural sem início de prova material (Súmula 149, STJ).
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/ SERVIÇO
Até 16 de dezembro de 1998, quando do advento da EC n.º 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço disciplinada pelos arts. 52 e 53 da Lei n.º 8.213/91, pressupunha o preenchimento, pelo segurado, do prazo de carência (previsto no art. 142 da referida Lei para os inscritos até 24 de julho de 1991 e previsto no art. 25, II, da referida Lei, para os inscritos posteriormente à referida data) e a comprovação de 25 anos de tempo de serviço para a mulher e de 30 anos para o homem, a fim de ser garantido o direito à aposentadoria proporcional no valor de 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano adicional de tempo de serviço, até o limite de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de serviço para as mulheres e aos 35 para os homens.
Com as alterações introduzidas pela EC nº 20/98, o benefício passou a denominar-se aposentadoria por tempo de contribuição, disciplinado pelo art. 201, § 7º, I, da Constituição Federal. A nova regra, entretanto, muito embora tenha extinto a aposentadoria proporcional, manteve os mesmos requisitos anteriormente exigidos à aposentadoria integral, quais sejam, o cumprimento do prazo de carência, naquelas mesmas condições, e a comprovação do tempo de contribuição de 30 anos para mulher e de 35 anos para homem.
Em caráter excepcional, para os segurados filiados até a data da publicação da Emenda, foi estabelecida regra de transição no art. 9º, §1º, possibilitando a concessão de aposentadoria proporcional quando, o segurado I) contando com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos, se mulher e, atendido o requisito da carência, II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e 25, se mulher; e b) um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a 40% do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional. O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens a e b supra, até o limite de 100%).
De qualquer modo, o disposto no art. 56 do Decreto n.º 3.048/99 (§§3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.
CÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL (RMI)
A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.
CASO CONCRETO
Conforme sentença, decidiu-se:
No intuito de demonstrar a atividade rural, no período de 28/07/1977 e 03/03/1986, a parte autora apresentou documentos (eventos 1 e 19), dentre os quais entendo serem relevantes os seguintes:
- 1966: Certidão de casamento dos genitores, em que consta que o noivo era lavrador e residente em Nova Cantu (evento 7, PROCADM1, p. 18).
- 1967: Certidão de nascimento do autor, em que consta que os pais residiam em Nova Cantu - PR (evento 6, PROCADM1, p. 59).
- 1970: Matrícula de imóvel rural, em que consta que os genitores do autor, José Selestrino dos Santos e Leonarda Kuc dos Santos, qualificados como lavradores, adquiriram um imóvel rural com área de 98.800m2, gleba 9, Colônia Cantu, em Ubiratã - PR. Consta averbação de venda do referido imóvel, em 14/12/1987 (evento 19, ESCRITURA3).
- 1975 a 1978 e 1979 a 1984: Histórico escolar do autor, em que consta que ele frequentou o ensino fundamental no grupo escolar Rui Barbosa e na Escola João F. da Costa, em Nova Cantu - PR. Consta da anotação de que o aluno reside fora do perímetro urbano e trabalha na agricultura (evento 8, PROCAM2, pp. 1-2).
- 1980 a 1992: Histórico escolar das irmãs Eva, Josefa, Cecília e Lúcia, em que consta que frequentaram o ensino fundamental no grupo escolar Rui Barbosa e na Escola João F. da Costa, em Nova Cantu - PR (evento 8, PROCAM2, pp. 3-8).
-1986: Carteira de trabalho e seguridade social emitida em 03/03/1986, com anotação do primeiro vínculo de emprego em 04/03/1986 a 02/09/1987 (evento 8, PROCAM2, pp.20-21).
- 1988: extrato do CNIS do genitor, com registro de vínculos urbanos a partir de 09/05/1988 e registro de período como segurado especial (evento 24, CNIS1)
Além disso, o autora apresentou autodeclaração na esfera administrativa (evento 8, PROCADM3, p. 2-38), segundo a qual ele laborou, entre os anos 18/07/1979 a 04/03/1986 no regime de economia familiar titularizado por seu pai, em terreno próprio, com área de 6,8ha, em Nova Cantu, no plantio de milho e algodão para venda e subsistência, sem a contratação de empregados tampouco fonte de renda estranha às lidas campesinas.
Os documentos estão em consonância com a autodeclaração apresentada pelo autor. Isso porque, a propriedade rural da família somente foi vendida em 14/12/1987. Além disso, no período de prova não há vínculo urbano no CNIS do autor e de seu genitor.
Entendo que a documentação relacionada acima constitui início de prova material para o período de 28/07/1979 [data em que o autor completou 12 anos] a 03/03/1986 [data anterior ao primeiro vínculo empregatício dele], na forma fundamentada alhures.
Por oportuno, entendo ser dispensável a prova testemunhal no presente caso. Explico-me.
A Lei de Benefícios não mais exige tal modalidade probatória e prescreve, no artigo 38-B, §2º [redação dada pela MP 871/2019, convertida na Lei 13.846/2019], ser suficiente a apresentação de autodeclaração pelo próprio segurado, o que foi feito pela parte autora.
A esse respeito e a título ilustrativo, transcrevo trecho da Nota Técnica Conjunta nº 01/2020 – CLIPR/CLISC/CLIRS (Centros de Inteligência das Seções Judiciárias do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), no qual se reproduziu esclarecimentos da Procuradoria Federal (SEI 0001675-95.2020.4.04.8003):
(...) A partir de 19.03.2019, a comprovação do tempo de exercício da atividade rural do segurado especial passou a ocorrer mediante autodeclaração ratificada por entidades públicas credenciadas ou órgãos públicos, na forma do § 2º do art. 38-B da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.
Assim, repisa-se, após 18.01.2019, o novo parâmetro legislativo concretizado a partir das diretrizes do Ofício-Circular n. 46/DIRBEN/INSS, permite o reconhecimento da atividade de SE com base em autodeclaração ratificada por prova material, dispensando-se a produção de prova oral.
(...)
Com o advento do novo marco regulatório, se em âmbito administrativo não se realiza Justificação Administrativa, razão não subsiste para o exigir na esfera judicial, sendo cabível apenas quando esgotada a produção de prova documental aceita ou a pesquisa nos bancos de dados disponíveis. A dispensa da produção de prova oral no âmbito administrativo não prejudica o segurado, pelo contrário, vai ao encontro dos princípios da economia processual e razoável duração do processo, eis que a análise ocorrerá com base na documentação juntada pelo próprio interessado. Ressalta-se que, em caso de não concordância, há possibilidade de recurso.
Com esse mesmo raciocínio, também a oitiva de testemunhas em Juízo torna-se uma prova dispensável.
Ainda, cito as conclusões da referida Nota Técnica:
(...)
Demonstrados os critérios com base nos quais o INSS passou a analisar a atividade do segurado especial, importa refletir, por ausência de regra material ou processual expressa, sobre a própria necessidade da prova oral em juízo para essa finalidade e sobre a utilidade de se utilizar a autodeclaração homologada ou corroborada por documentos também na via judicial.
A regra geral em processo civil é o livre convencimento motivado, em que apenas provas úteis para o julgamento são produzidas e o juiz menciona na sentença as que foram de fato relevantes para o convencimento (CPC, art. 370 e 371).
Não existe, tampouco na lei previdenciária, uma exigência de prova oral para a comprovação de tempo de contribuição em geral ou de atividade rural.
(...)
Pelo mesmo motivo - qual seja, não estar o magistrado adstrito ao limite temporal definido pelo administrador - não se entende recomendável a reabertura da via administrativa nesses casos, para a produção de JA ou de outras diligências. Se o INSS entendeu por bem indeferir o pedido conforme o regramento de então e se o juízo pode aplicar, com simplicidade, o novo sistema de provas, basta determinar ao segurado, logo ao deliberar sobre a inicial, que apresente a autodeclaração e todos os demais elementos de prova que puder obter. Essa medida uniformizaria o tratamento de todos os pedidos que chegarem ao Judiciário a partir de agora, com ganhos de celeridade e de isonomia.
Conclui-se, pois, do exposto, que o novo parâmetro legislativo concretizado de acordo com as diretrizes administrativas autoriza o reconhecimento do tempo de serviço rural exclusivamente com base em declaração do segurado ratificada por prova material, dispensando-se a produção de prova oral.
Neste diapasão, o conjunto probatório convergiu no sentido da comprovação do tempo de serviço rural do autor, de 28/07/1979 a 03/03/1986, o qual deve ser averbado pelo INSS independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência.
Não se desconhece a decisão proferida na AC 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, no TRF da 4ª Região, possibilitando, em tese, a contagem do intervalo de trabalho realizado antes dos 12 (doze) anos de idade, para fins de previdência.
De fato, a limitação constitucional ao labor do menor de dezesseis anos de idade deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas/previdenciários quando tenha prova de que efetivamente desenvolveu tal atividade.
Por outro lado, essa possibilidade não desonera a parte de efetivamente comprovar o efetivo labor, que não pode ser mero auxílio eventual e sem significado em relação à produtividade do grupo familiar.
Para comprovação da condição de segurado especial, a Lei 8.213/91 exige o desempenho de trabalho rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros da família se mostra indispensável à própria subsistência e seja exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sendo exigido, para o cônjuge, companheiro e filhos, comprovação do efetivo trabalho junto com o grupo.
Deste modo, mesmo que a jurisprudência aceite o reconhecimento do trabalho rural nesse tempo, para tanto deve ficar comprovado que as atividades desenvolvidas pelas crianças dentro do grupo familiar iam além de um mero auxílio nas atividades cotidianas, mas que elas exerciam um trabalho indispensável e de dependência em relação aos demais membros da família, como exige a lei da previdência, o que não ocorreu no caso.
Destaque-se o estudo primário do autor, desde os 8 anos de idade (evento 1 - HIST_ESC15), o que somado à atividade normal infantil, afastam a ideia de auxílio relevante ao ponto de determinar a condição de segurado especial.
Assim, a sentença deve ser mantida.
HONORÁRIOS RECURSAIS
Mantidos os honorários fixados na origem.
TUTELA ESPECÍFICA
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a 3ª Seção deste Tribunal, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que, confirmada a sentença de procedência ou reformada para julgar procedente, o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, portanto sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte (TRF4, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7, 3ª Seção, Des. Federal Celso Kipper, por maioria, D.E. 01/10/2007, publicação em 02/10/2007). Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente ao cumprimento de obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo dispôs de forma similar à prevista no Código/1973, razão pela qual o entendimento firmado pela 3ª Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Nesses termos, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora a ser efetivada em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, bem como por se tratar de prazo razoável para que a autarquia previdenciária adote as providências necessárias tendentes a efetivar a medida. Saliento, contudo, que o referido prazo inicia-se a contar da intimação desta decisão, independentemente de interposição de embargos de declaração, face à ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).
CONCLUSÃO
Apelação do autor improvida, nos termos da fundamentação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, e determinar a imediata implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003193397v20 e do código CRC e71f1fd9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Data e Hora: 13/5/2022, às 16:46:4
Conferência de autenticidade emitida em 20/05/2022 04:00:58.
Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal Penteado - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90019-395 - Fone: (51)3213-3282 - www.trf4.jus.br - Email: gpenteado@trf4.jus.br
Apelação Cível Nº 5002621-63.2020.4.04.7006/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: EDUARDO SELESTRINO DOS SANTOS SOBRINHO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. NOVAS REGRAS PARA A COMPROVAÇÃO. MP 871/2019, CONVERTIDA NA LEI 13.846/2019. idade mínima. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Devido à alteração legislativa introduzida pela MP 871/2019, convertida na Lei n. 13.846, que modificou os arts. 106 e § 3º e 55 da Lei n. 8.213/91, a comprovação da atividade do segurado especial passa a ser determinada por meio de autodeclaração, corroborada por documentos que se constituam em início de prova material de atividade rural e/ou consulta às entidades públicas credenciadas, nos termos do disposto no art. 13 da Lei n. 12.188/2010, e por outros órgãos públicos, na forma prevista no Regulamento e não mais por declaração de sindicatos (Lei n. 13.846/2019).
2. Relativamente à idade mínima, a limitação constitucional ao labor do menor de dezesseis anos de idade deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas/previdenciários quando tenha prova de que efetivamente desenvolveu tal atividade.
3. A possibilidade da contagem do intervalo de trabalho realizado antes dos 12 (doze) anos de idade, para fins de previdência, não desonera a parte de efetivamente comprovar o efetivo labor, que não pode ser mero auxílio eventual e sem significado em relação à produtividade do grupo familiar.
4. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 10 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003193398v7 e do código CRC a24986cb.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Data e Hora: 13/5/2022, às 16:46:4
Conferência de autenticidade emitida em 20/05/2022 04:00:58.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/05/2022 A 10/05/2022
Apelação Cível Nº 5002621-63.2020.4.04.7006/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: EDUARDO SELESTRINO DOS SANTOS SOBRINHO (AUTOR)
ADVOGADO: PLÍNIO MARCOS MILLÉO (OAB PR037282)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/05/2022, às 00:00, a 10/05/2022, às 16:00, na sequência 141, disponibilizada no DE de 22/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Conferência de autenticidade emitida em 20/05/2022 04:00:58.