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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. ATIVIDADE DE PEDREIRO. CONTATO COM CIMENTO. TRF4. 5006359-72.2018...

Data da publicação: 13/08/2021, 07:01:14

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. ATIVIDADE DE PEDREIRO. CONTATO COM CIMENTO. 1. Até 28 de abril de 1995, as atividades de pedreiro e de servente, exercidas em obra de construção civil, enquadram-se como especiais pela categoria profissional, em conformidade com o código 2.3.3 do Decreto nº 53.831/1964. 2. A relação dos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física definida nos regulamentos não é exaustiva, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (Tema 534 do Superior Tribunal de Justiça). 3. A jurisprudência do Tribunal Regional da 4ª Região reconhece a especialidade do tempo de serviço, mesmo após a Lei nº 9.032, desde que seja comprovada a nocividade do contato com o cimento no desempenho das atividades de pedreiro ou operário da construção civil. (TRF4, AC 5006359-72.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 05/08/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006359-72.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: JOELSO LUIZ DOS SANTOS

ADVOGADO: JANAÍNA BARCELOS MARKOWSKI (OAB RS052240)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

A sentença proferida na ação ajuizada por Joelso Luiz dos Santos contra o INSS julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição e condenou o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados R$ 1.000,00 (um mil reais), ficando suspensa a exigibilidade das verbas de sucumbência.

O autor interpôs apelação. Referiu que a sentença entendeu que o tempo de serviço urbano não havia sido comprovado, porque a cópia da carteira de trabalho não foi juntada aos autos. Alegou que é incontroverso o tempo de contribuição de 21 anos, 6 meses e 1 dia, que foi computado pelo INSS no processo administrativo. Aduziu que as informações obtidas no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), que instruem o pedido de aposentadoria, fazem prova cabal do tempo de serviço, indicando a data de início e do fim de cada contrato de trabalho. Sustentou que exerceu atividade rural desde os doze anos de idade e permaneceu nas lides rurícolas até 21 de abril de 1976, o que perfaz o tempo de 9 anos, 7 meses e 2 dias. Deduziu que trabalhou em atividade especial nos períodos de 22/04/1976 a 21/07/1983, de 27/03/1987 a 07/08/1987, de 01/11/1990 a 28/08/1992, de 01/07/1993 a 30/08/1993 e de 24/07/1996 a 05/02/1998, os quais devem ser convertidos para tempo comum pelo fator 1,4. Afirmou que os formulários DSS-8030 foram anexados, assim como o laudo técnico para o agente físico ruído. Argumentou que, somado o tempo de atividade rural e urbana, conta com 35 anos, 6 meses e 24 dias desde a data do requerimento administrativo (20/11/2008).

O INSS não apresentou contrarrazões.

A sentença foi publicada em 26 de junho de 2017.

VOTO

Tempo de serviço especial e omissão na sentença

A parte autora, na inicial, postulou a condenação do INSS ao pagamento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a contar da data do requerimento administrativo (20/11/2008). Na causa de pedir, afirmou que desempenhou a atividade rural com a sua família desde os doze anos de idade até 21 de abril de 1976, quando passou a exercer atividade urbana. Disse que trabalhou como empregado desde então, destacando em negrito os períodos de 22/04/1976 a 21/07/1983, de 27/03/1987 a 07/08/1987, de 01/11/1990 a 28/08/1992, de 01/07/1993 a 30/08/1993 e de 24/07/1996 a 05/02/1998, que se referiam ao tempo de atividade especial, convertidos para tempo comum.

Na contestação, o INSS, entre outras alegações, o INSS aduziu que a análise técnica efetuada no processo administrativo constatou que não ficou devidamente comprovada a exposição habitual e permanente aos agentes agressivos, salientando que não foram apresentados os laudos técnicos de avaliação do agente físico ruído. Sustentou ainda que a utilização de equipamento de proteção individual eficaz elidiu a ação do agente agressivo e a conversão do tempo especial em comum é possível somente para a atividade exercida até 28 de maio de 1998.

A sentença expendeu a seguinte fundamentação, quanto ao tempo de atividade urbana:

Analisando os autos verifiquei que, na comunicação de decisão do INSS acostada à fl. 118, respondendo ao requerimento de aposentadoria, referiu que não foi reconhecido o direito ao beneficio e até 16/12/1998 tinha reconhecido o tempo de 15 anos, 03 meses e 26 dias, mas não atingiu o tempo mínimo de contribuição.

Contudo, necessário fazer uma análise da prova que de fato o autor trabalhou o tempo que diz ter trabalhado conforme a relação que segue:

a) 24/04/1976 a 21/07/1983 - 10 anos 01 mês e 24 dias;

b) 30/01/1984 a 26/01/1985 - 11 meses e 27 dias;

c) 15/07/1985 a 17/12/1985 - 05 meses e 03 dias;

d) 15/04/1986 a 11/03/1987 - 10 meses e 27 dias;

e) 27/03/1987 a 07/08/1987 - 06 meses e 03 dias;

f) 10/03/1998 a 17/01/1990 - 01 ano 10 meses e 01 dia;

g) 01/11/1990 a 28/08/1992 - 02 anos 06 meses e 21 dias;

h) 01/07/1993 a 30/08/1993 - 02 meses e 24 dias;

i) 24/07/1996 a 05/02/1998 - 02 anos 01 mês e 20 dias;

j) 16/02/2002 a 20/11/2008 - 06 anos 02 meses e 04 dias.

Assim verifiquei que os documentos acostados pelo autor se referem ao pedido feito ao INSS para reconhecimento dos tempos de serviço, cujos documentos foram preenchidos pelo autor e por empregadores, muitos deles em formulários próprios do INSS que são informações unilaterais prestadas pelo autor para análise na esfera adminitrativa. Porém, para que seja reconhecido o tempo de serviço em juízo, o autor deveria ter juntado cópia da CTPS ou contrato de trabalho aonde constasse data de início e fim do vínculo, o que não veio aos autos, não sendo possível com base na prova dos autos reconhecer que o autor trabalhou os 25 anos, 11 meses e 22 dias que diz ter trabalhado na atividade urbana.

A sentença não atentou à alegação da parte autora no sentido de que o tempo de 25 anos, 11 meses e 22 dias de trabalho urbano resultava da conversão dos períodos de atividade especial, destacados em negrito na inicial, em tempo comum. Com isso, não analisou a pretensão de reconhecimento do exercício de atividade em condições especiais.

Ainda que haja certa obscuridade na postulação, a defesa do INSS delineou perfeitamente a controvérsia.

Portanto, a sentença incorreu em omissão no exame de um dos pedidos, situação em que o tribunal deve decidir o mérito, nos termos do art. 1.013, §3º, inciso III, do Código de Processo Civil, já que o processo está em condições de imediato julgamento.

Tempo de serviço rural e dispositivo da sentença

A respeito da questão atinente ao reconhecimento do tempo de serviço rural, a fundamentação da sentença apresenta o seguinte teor:

Por sua vez, com relação ao tempo de serviço desenvolvido em atividade rural, os documentos acostados comprovam que o autor trabalhou em atividade rural desde a infância. As testemunhas ouvidas em juízo todas conhecem o autor desde criança e foram unânimes em afirmar que o autor é filho de agricultores que trabalhou desde cedo na agricultura familiar na localidade de Aldeia Velha, interior do Município de Santo Antônio da Patrulha. Afirmaram as testemunhas que a família do autor plantava feijão, milho, aipim, tinha carreta de boi e um pequeno engenho de açúcar mascavo, criava porcos e galinhas e que quando sobravam mantimentos vendiam, sobrevivendo disso.

Também afirmaram que o autor morou na localidade até os 20 e poucos anos, o que coincide com a informação do primeiro trabalho urbano, iniciado em 22/04/1976. Considerando que nasceu em 20/09/1954, conforme certidão de casamento acostada à fl. 11, morou no interior até os 22 anos.

Além disso, consta no Certificado de Dispensa de Incorporação do Exército que o autor aos 18 anos era agricultor (f. 52), bem como consta nos autos os documentos de seu pai, que era agricultor proprietário das terras em que trabalhavam (fls. 54/71).

Assim, tenho como comprovado que o autor desde a infância trabalhava na atividade rural, fazendo jus ao reconhecimento do tempo como trabalhador rural em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade.

Percebe-se que a sentença julgou comprovado o exercício de atividade rural no período de 20/09/1966 (quando o autor completou doze anos de idade) a 21/04/1976, porém nada dispôs acerca do acolhimento do pedido.

Em que pese a petição inicial não tenha desdobrado a pretensão de acordo com as causas de pedir, a interpretação do pedido deve considerar o conjunto da postulação e observar o princípio da boa-fé, conforme estabelece o art. 322 do CPC.

Mostra-se evidente que haviam sido deduzidos vários pedidos na inicial: reconhecimento do tempo de serviço rural e especial; conversão do tempo especial em comum; concessão de aposentadoria e, por consequência, pagamento das prestações do benefício.

Assim, o alcance da parte dispositiva da sentença, em consonância com os motivos expendidos pelo juízo, abrangeu o reconhecimento do tempo de serviço rural no período de 20/09/1966 a 21/04/1976.

Dessa forma, com base na fundamentação da sentença, deve ser julgado procedente o pedido de reconhecimento do tempo de serviço rural no período de 20/09/1966 a 21/04/1976.

Tempo de atividade especial

O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente na época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, havendo a prestação laboral sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem do tempo de serviço especial na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Nesse sentido, a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24-09-2008) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18-11-2009).

A evolução legislativa da matéria apresenta os seguintes marcos temporais:

a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei nº 3.807 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213 (Lei de Benefícios da Previdência Social), em sua redação original (artigos 57 e 58), a especialidade do tempo de serviço decorria do exercício de atividade profissional prevista como especial nos Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979 e/ou na legislação especial. As normas regulamentares classificavam as atividades de duas formas: segundo os grupos profissionais, presumindo-se a sujeição do trabalhador a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física; e segundo os agentes nocivos, caso em que deve ser demonstrada a exposição ao agente por qualquer meio de prova. Para os agentes nocivos ruído e calor, é necessário mensurar os seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar o grau de nocividade dos agentes envolvidos;

b) entre 29 de abril de 1995 a 5 de março de 1997, período em que estavam vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima. Foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei nº 5.527, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13 de outubro de 1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523/1996, que a revogou expressamente;

c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória nº 1.523/1996 (convertida na Lei nº 9.528), passou a ser exigida, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, ou por meio de perícia técnica.

Para que se caracterize a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, §3º, da Lei n° 8.213), a exposição ao agente nocivo deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011). Em suma, somente se a exposição ao agente nocivo for eventual ou ocasional, está afastada a especialidade do tempo de serviço.

Além disso, conforme o tipo de atividade, a exposição ao agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade. Não é razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).

Uma vez que se incorpora ao patrimônio jurídico do trabalhador a prestação de trabalho em condições especiais, regida pela legislação em vigor na época do exercício da atividade, é possível a conversão do tempo especial para comum, independente da data da prestação do trabalho ou do requerimento de benefício. A respeito, cabe registrar que, embora o art. 28 da MP nº 1.663-10 tenha revogado o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213, a lei de conversão (Lei nº 9.711) não manteve o dispositivo, permanecendo a possibilidade de soma do tempo de serviço especial, após a respectiva conversão, ao tempo de atividade comum, para a concessão de qualquer benefício. O Superior Tribunal de Justiça firmou a seguinte tese sobre a matéria:

Tema 422 - Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991. (REsp 1151363/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)

A atual redação do artigo 70 do Decreto nº 3.048/1999, em conformidade com o precedente do STJ, estabelece que as regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Contudo, o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é o previsto na legislação vigente na data da concessão do benefício, e não aquele em vigor quando o serviço foi prestado. De acordo com o art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, o fator de conversão a ser observado é de 1,4 para o homem e de 1,2 para a mulher (considerando, em ambos os casos, o exercício de atividade que ensejaria a aposentadoria especial em 25 anos).

Utilização de equipamento de proteção individual

A respeito da utilização de equipamento de proteção individual (EPI), a Medida Provisória nº 1.729, convertida na Lei nº 9.732, modificou a redação do art. 58, § 2º, da Lei nº 8.213, estabelecendo que a existência de tecnologia de proteção individual eficaz, que comprovadamente neutralize os agentes nocivos ou diminua a sua intensidade a limites de tolerância, afasta o efetivo prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador, razão pela qual a atividade não pode ser qualificada como especial. Note-se que a questão atinente ao uso do EPI só passou a ter relevância, para fins de reconhecimento das atividades exercidas em condições especiais, a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729.

O Supremo Tribunal Federal, em julgado com repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não há direito à aposentadoria especial. Contudo, havendo demonstração de que o uso do EPI, no caso concreto, não é suficiente para afastar a nocividade, deve ser reconhecida a especialidade do trabalho. Em relação ao ruído, o STF considerou que a exposição a níveis superiores aos limites de tolerância causa prejuízos ao organismo humano que vão além dos relacionados à perda das funções auditivas. Assim, a utilização do EPI não garante a eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído, pois existem fatores de difícil ou impossível controle que influenciam a sua efetividade. Esta é a redação da tese firmada no Tema 555:

I - O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; II - Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015)

No período posterior à MP nº 1.729, o uso de EPI se revela, de per si, ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano pelo ruído. Com efeito, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.

Por essa razão, a declaração do empregador sobre a eficácia do EPI não tem o condão de afastar o reconhecimento da especialidade com base no agente nocivo ruído, conforme a tese firmada no Tema 555 do STF.

Agente físico ruído

Em se tratando do agente nocivo ruído, o reconhecimento da especialidade do labor exige, em qualquer período, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Ou seja, não basta, aqui, mesmo no período anterior a 28 de abril de 1995, o enquadramento por categoria profissional, sendo exigida prova da exposição ao agente nocivo.

Em relação ao agente nocivo ruído, consideram-se os níveis de pressão sonora estabelecidos na legislação em vigor na data da prestação do trabalho, conforme o quadro a seguir:

Período trabalhadoEnquadramentoLimites de tolerância
até 05/03/19971. Decreto nº 53.831/1964; 2. Decreto nº 83.080/19791. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB
de 06/03/1997 a 06/05/1999Decreto nº 2.172/1997Superior a 90 dB
de 07/05/1999 a 18/11/2003Decreto nº 3.048/1999, na redação originalSuperior a 90 dB
a partir de 19/11/2003Decreto nº 3.048/1999 com alteração introduzida pelo Decreto nº 4.882/2003Superior a 85 dB

Cabe esclarecer que os Decretos nº 53.831/1964 e 83.080/1979 tiveram vigência concomitante até a edição do Decreto nº 2.172/1997, que revogou de forma expressa o fundamento de validade da legislação então vigente. Dessa forma, até 5 de março de 1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n° 53.831/64.

O Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o limite de tolerância ao agente físico ruído para 85 decibéis, não pode ser aplicado retroativamente. Dessa forma, entre 6 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003, o limite de tolerância ao ruído corresponde a 90 decibéis, consoante o código 2.0.1 do Anexo IV dos Decretos n° 2.172/1997 e 3.048/1999. O Superior Tribunal de Justiça examinou a matéria em recurso especial repetitivo e fixou a seguinte tese:

Tema 694 - O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). (REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)

Caso concreto

A controvérsia diz respeito ao exercício de atividade especial nos períodos a seguir:

Período

22/04/1976 a 21/07/1983

Empresa

Construtora e Incorporadora Guerino Ltda.

Cargo/setor

Servente/canteiro de obras (22/04/1976 a 24/01/1978)
Pedreiro/canteiro de obras(25/01/1978 a 10/04/1981)
Encarregado de turma/canteiro de obras (11/04/1981 a 21/07/1983)

Atividades

Servente: limpeza da obra e tarefa de apoio aos pedreiros, como tranportar materiais de construção, descarregar materiais de construção.
Pedreiro: concretagem de lajes, reboco, levantamento de paredes de alvenaria e limpeza da obra.
Encarregado de turma: supervisionar a obra, distribuir, orientar, fiscalizar e executar as atividades dos trabalhadores.

Agentes nocivos

Poeira, cimento e argamassa

Provas

Formulários DSS-8030 (evento 3, anexospet4, p. 4, 7 e 10)

Período

27/03/1987 a 07/08/1987

Empresa

Agomar Martins Rohrig e outro

Cargo/setor

Pedreiro/obras

Atividades

Construção de prédios

Agentes nocivos

Poeira, calor

Provas

Formulário DSS-8030 (evento 3, anexospet4, p. 13/14)

Período

01/11/1990 a 28/08/1992

Empresa

José Saturnino ME

Cargo/setor

Carpinteiro

Atividades

Conserto em esquadrias de madeira

Agentes nocivos

Poeira de madeira e ruído de equipamentos como furadeira e lixadeira

Provas

Formulário DSS-8030 (evento 3, anexospet4, p. 15/1

Período

01/07/1993 a 30/08/1993

Empresa

Degraus Construções Ltda.

Cargo/setor

Pedreiro/obras

Atividades

Construção de prédios

Agentes nocivos

Poeira, calor

Provas

Formulário DSS-8030 (evento 3, anexopet4, p. 17/18)

Período

24/07/1996 a 05/02/1998

Empresa

Construtora Ernesto Woebcke S/A

Cargo/setor

Pedreiro/canteiro de obra

Atividades

Organizar e preparar o local de trabalho na obra, construir fundações e estruturas de alvenaria, aplicar revestimentos, fazer contrapisos, nivelar pisos, paredes e peças pré-moldadas.

Agentes nocivos

Ruído

Provas

Formulário DSS-8030 (evento 3, anexospet4, p. 19)

PCMAT do ano de 1996 (evento 3, anexospet4, p. 22/42)

Embora os formulários fornecidos pelas empresas Construtora e Incorporadora Guerino, Agomar Martins Rohrig e outro e Degraus Construções não especifiquem a exposição aos agentes nocivos calor e poeiras minerais de acordo com os Anexos 3 e 12 da NR 15, nem possuam laudo técnico pericial, a prova é dispensável, em razão do enquadramento da atividade profissional com base na legislação aplicável até 28 de abril de 1995. O Anexo do Decreto nº 53.831, de 1964, contempla, nas ocupações em perfuração, construção civil e assemelhados, no código 2.3.3, os trabalhadores em edifícios, barragens, pontes e torres.

Interpretando a definição de "trabalhadores em edifícios", a jurisprudência desta Corte tem entendido que não se trata de conceito limitado apenas aos trabalhadores que laboram em construções com mais de um pavimento. O dispositivo busca alcançar a obra de construção civil, a qual possui uma periculosidade inerente, não relacionada com o número de pavimentos da edificação. Afinal, subsistem, mesmo na obra de pavimento único, o risco de desabamento de uma parede, de queda de teto, ou até mesmo do trabalhador cair da cobertura do pavimento único. Daí por que os típicos trabalhadores da construção civil, como o pedreiro e o servente de pedreiro, são alcançados pela norma infralegal, mesmo que trabalhem em obra de um só pavimento.

Sobre o tema, confiram-se os seguintes julgados deste Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. PEDREIRO. CIMENTO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. CONSTRUÇÃO CIVIL. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO DA ATIVIDADE ESPECIAL. ART. 57, § 8.º DA LEI 8.213/1991. INCONSTITUCIONALIDADE. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço especial deve ser reconhecido. 2. Até o advento da Lei 9.032/95, é possível o reconhecimento da especialidade das atividades de servente e de pedreiro com base no código 2.3.3 do Decreto 53.831/64, pois o conceito de edifício na construção civil não está restrito às construções que envolvam mais de um pavimento. 3. Tratando-se de reconhecimento da atividade especial com base no enquadramento por categoria profissional, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de Equipamentos de Proteção Individual. Ademais, a informação de fornecimento de equipamentos de proteção individual pelo empregador, por si só, não é suficiente para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo, no caso concreto, ser demonstrada a efetiva, correta e habitual utilização desses dispositivos pelo trabalhador. (...) (TRF4 5001508-43.2017.4.04.7115, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 04/06/2020)

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. ATIVIDADE ESPECIAL. SERVENTE E PEDREIRO. CATEGORIA PROFISSIONAL E EXPOSIÇÃO A CIMENTO COMO AGENTE NOCIVO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. AÇÃO MALICIOSA. TUTELA ESPECIFICA (AVERBAÇÃO). 1. Tendo sido cancelado o amparo previdenciário, em decorrência de fraude no seu deferimento, pela inclusão de períodos indevidos, o reconhecimento de novos lapsos contratuais não constantes no pedido administrativo ou a contagem dos desconstituídos, necessita de prova idônea e fidedigna, que demonstre ser irretocável o seu reconhecimento, o que não se apresentou no caso presente. 2. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em tempo de serviço comum no âmbito do Regime Geral de Previdência Social 3. Destaco a possibilidade de enquadramento por categoria profissional de tais atividades pelo código 2.3.3 (Edifícios, barragens, pontes) do Decreto nº 53.831/64, pois o autor as exerceu em obras da construção civil. 4. Embora o manuseio do elemento cimento não esteja especificamente citado como agente nocivo nos Decretos 53.381/64 e 83.080/79, que regem quanto ao período, a exposição do segurado para fins de reconhecimento da atividade especial, mas somente a atividade de fabricação de cimento (código 1.2.12 do Anexo I do Decreto 83.080/79), pode ser reconhecida sua nocividade em face da composição altamente prejudicial à saúde desse material. 5. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos não requerem a análise quantitativa de concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa, considerada a potencialidade da agressão à saúde do trabalhador. Assim, inaplicável, à espécie, a regra contida na NR-15, Anexo 12, do INSS. 8. (...) (TRF4, AC 5001596-44.2013.4.04.7108, SEXTA TURMA, Relator EZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 11/07/2017)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES QUÍMICOS NOCIVOS. CIMENTO E CAL. RECONHECIMENTO. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido. Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. No que se refere às atividades de pedreiro e servente na construção civil, esta Turma tem admitido o reconhecimento da especialidade quando comprovada a exposição nociva a álcalis cáusticos (cimento) em razão do manuseio deste agente químico, Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a conversão dos períodos de atividade especial, a partir da data do requerimento administrativo, respeitada eventual prescrição quinquenal. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário. (TRF4, AC 5014520-18.2016.4.04.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 08/05/2020)

No entanto, em relação ao período de 01/11/1990 a 28/08/1992, o documento apresentado não é suficiente para a comprovação do exercício de atividade especial. A poeira de madeira não é enquadrada como agente agressivo pela legislação previdenciária. Conforme o código 1.2.10 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964, as poeiras minerais nocivas são a sílica, carvão, cimento, asbesto e talco. Já o agente nocivo ruído exige a quantificação por meio de laudo técnico.

Conforme o programa de condições e meio ambiente de trabalho na indústria da construção (PCMAT) da Construtora Ernesto Woebcke, os trabalhadores que exercem a função de pedreiro desenvolvem suas atividades na etapa de concretagem da obra, realizando as tarefas de espalhar o concreto nas formas com o auxílio de pás, enxadas, réguas, colher e vibrador (evento 3, anexospet4, p. 34). Os fatores de risco são o ruído proveniente da utilização de vibrador de concreto e da betoneira, medidos, respectivamente, em 92 a 102 dB(A) e 90 a 102 dB(A), e o manuseio de cimento (álcalis cáusticos).

O INSS não enquadrou a atividade como especial, visto que, no demonstrativo ambiental, haveria referência à exposição intermitente ao ruído. Verifica-se, no entanto, que as informações constantes no PCMAT não corroboram a conclusão da autarquia. Não existe qualquer ressalva no documento que permita afastar a permanência da sujeição ao agente nocivo, inclusive porque o laudo não apurou a dose diária, considerando a jornada padrão de 8 horas diárias. De qualquer modo, uma vez que a preparação de concreto era realizada de forma cotidiana, depreende-se que demandava período significativo da rotina de trabalho. Assim, leva-se em conta o nível de ruído constante no PCMAT, superior ao limite de tolerância de 80 dB até 5 de março de 1997 e de 90 dB entre 6 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003.

No mais, o demonstrativo ambiental informou o contato com produtos alcalinos e cáusticos (cimento). Em relação aos agentes químicos, o Decreto nº 53.831/1964, no código 1.2.10 do Quadro Anexo, e o Decreto nº 83.080/1979, no código 1.2.12 do Anexo I, preveem o cimento como agente passível de enquadramento, por conter óxido de cálcio, classificado como álcali cáustico. No entanto, mesmo que os atos normativos infralegais posteriores não considerem esse agente como nocivo, se for constatado o efetivo prejuízo à saúde do trabalhador, é possível o reconhecimento da especialidade do labor desempenhado. Isso porque, consoante entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso representativo de controvérsia, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991) (REsp 1.306.113/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013).

Desse modo, constatando-se, concretamente, a insalubridade de determinada atividade, é imperioso o reconhecimento da sua especialidade, ainda que o agente nocivo não esteja elencado no respectivo ato regulamentar. Nesse sentido, aliás, já dispunha a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos: Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento.

A Norma Regulamentadora 15 (NR-15), aprovada pela Portaria nº 3.214/1978, do Ministério do Trabalho, no Anexo 13. relaciona a fabricação e o transporte de cal e cimento nas fases de grande exposição a poeiras como atividades insalubres. Além dos efeitos da poeira sobre o sistema respiratório, o cimento pode causar outros danos à saúde, como dermatoses e problemas oculares. No julgamento dos Embargos Infringentes nº 2001.71.14.000772-3/RS (TRF4, Relator Juiz Federal João Batista Lazzari, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009), foi transcrito trecho do laudo pericial que arrolou os efeitos à saúde que podem decorrer do manuseio do cimento:

O cimento é um ligante hidráulico usado nas edificações e na Engenharia Civil. É um pó fino da moagem do clínquer (calcário + argila + gesso), cozido a altas temperaturas (1400ºC). Pode-se misturá-lo ao cal, areia e pedras de várias granulometrias para obter-se argamassa e concreto. O cimento tipo Portland é composto por silicatos e aluminatos de cálcio, óxidos de ferro e magnésio, álcalis e sulfatos. Aditivos ao cimento poderão ser: aceleradores e anticongelantes, antioxidantes, corantes, fungicidas, impermeabilizantes e plastificantes.

Dermatites de contato irritativas pelo cimento e poeiras do cimento sobre tegumento e conjuntivas:

- Dermatite de contato por irritação

- Dermatite de contato por irritação forte (queimadura pelo cimento)

- Dermatite de contato alérgica

- Hiperceratose-Hardening

- Hiperceratose Subungueal

- Paroníqueas

- Onicólises

- Sarnas dos Pedreiros

- Conjuntivites.

A jurisprudência deste Tribunal Regional, em vários julgados, já reconheceu a especialidade do tempo de serviço, mesmo após a Lei nº 9.032/1995, nos casos em que houve a comprovação da nocividade do contato com o cimento no desempenho das atividades de pedreiro ou operário da construção civil. A título de exemplo, os seguintes acórdãos:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. RECONHECIMENTO DE LABOR EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. PEDREIRO. CIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. (...) 7. Havendo nos autos perícia técnica apontando a nocividade do contato com o cimento (ou com as substâncias presentes na sua composição, como, p. ex., álcalis cáusticos) no desempenho das atividades de operário da construção civil, não há por onde restringir-se a especialidade apenas às atividades ligadas à produção do cimento ou que envolvam inalação excessiva de sua poeira. Reconhecida a especialidade das atividades de pedreiro e servente de pedreiro, exercidas pela parte autora nos períodos indicados. 8. Implementados os requisitos de tempo de contribuição e carência, é devida a aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4, AC 0013365-65.2011.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 29/08/2016)

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL: OPERÁRIO DA CONSTRUÇÃO CIVIL. AGENTES NOCIVOS: ÁLCALIS CÁUSTICOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PROPORCIONAL. CONCESSÃO. (...) 4. O trabalhador que rotineiramente, em razão de suas atividades profissionais, expõe-se ao contato com cimento, cujo composto é usualmente misturado a diversos materiais classificados como insalubres ao manuseio, faz jus ao reconhecimento da natureza especial do labor. 5. Implementados os requisitos de pedágio e idade, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional. (TRF4 5022997-31.2010.404.7100, QUINTA TURMA, Relator (AUXÍLIO FAVRETO) TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 06/05/2016)

No caso presente, é induvidoso o fato de que havia a exposição do autor a ruído e ao cimento de modo habitual e permanente. Note-se que o conceito de habitualidade e permanência não significa que o segurado deva permanecer sujeito a condições nocivas diariamente, durante toda a jornada de trabalho, mas sim que, no desenvolvimento das atividades usuais e inerentes à sua função, haja o contato com o agente agressivo. Resta evidente que o contato com os referidos agentes nocivos era indissociável das tarefas habituais e diárias realizadas pelo trabalhador, visto que as suas atribuições principais envolviam a concretagem dos pavimentos da construção.

A respeito da utilização do equipamento de proteção individual, a legislação anterior à Medida Provisória nº 1.729 não estabelecia expressamente a possibilidade de elisão do prejuízo à saúde ou à integridade física do trabalhador em razão da existência de tecnologia de proteção individual eficaz. Logo, mesmo que o autor tenha efetivamente usado EPI, não se descaracteriza o exercício de atividade especial.

Portanto, está comprovada a especialidade do tempo de serviço nos períodos de 22/04/1976 a 21/07/1983, de 27/03/1987 a 07/08/1987, de 01/07/1993 a 30/08/1993 e de 24/07/1996 a 05/02/1998.

Requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição

Na data do requerimento administrativo (20/11/2008), o INSS contou o seguinte tempo de contribuição e carência (evento 3, anexospet4, p. 94/97 e 105/106):

Marco temporal

Anos

Meses

Dias

Carência

Até 16/12/1998

14

2

29

178

Até 28/11/1999

14

2

29

178

Até a DER

21

6

1

266

O tempo de atividade rural (20/09/1966 a 21/04/1976) corresponde a 9 anos, 7 meses e 2 dias.

A conversão do tempo especial pelo fator 1,4 acresce o tempo de contribuição a seguir:

a) 22/04/1976 a 21/07/1983: 2 anos, 10 meses e 24 dias;

b) 27/03/1987 a 07/08/1987: 1 mês e 22 dias;

c) 01/07/1993 a 30/08/1993: 24 dias;

d) 24/07/1996 a 05/02/1998: 7 meses e 10 dias.

A soma dos períodos acima ao tempo de serviço contabilizado na data do requerimento administrativo resulta no seguinte quadro:

Marco temporal

Anos

Meses

Dias

Carência

Até 16/12/1998

27

6

21

178

Até 28/11/1999

27

6

21

178

Até a DER

34

9

23

266

Pedágio

11 meses e 21 dias

Nessas condições, em 16 de dezembro de 1998, a parte autora não tinha direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional, de acordo com as regras anteriores à Emenda Constitucional nº 20, porque não cumpria o tempo mínimo de serviço de 30 anos.

Em 28 de novembro de 1999, o autor não tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional, conforme as regras de transição do art. 9º, §1º, da Emenda Constitucional nº 20, porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição de 30 anos, o pedágio e nem a idade mínima de 53 anos.

Por fim, em 20 de novembro de 2008 (DER), o autor preencheu os requisitos para a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, de acordo com as regras de transição do art. 9º, §1º, da Emenda Constitucional nº 20, com o coeficiente de 85% do salário de benefício e a incidência do fator previdenciário.

Correção monetária e juros de mora

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 810, declarou a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pela Lei nº 11.960, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança. Em relação aos juros de mora, reputou constitucional a aplicação do índice de remuneração da caderneta de poupança (RE 870.947, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017).

Os embargos de declaração opostos no RE 870.947 foram rejeitados pelo STF, não sendo acolhido o pedido de modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

Dessa forma, devem ser observados os critérios de correção monetária e juros de mora fixados no Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG, REsp 1.492.221/PR, REsp 1.495.144/RS, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22/02/2018):

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

Assim, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada parcela, conforme a variação do INPC, a partir de abril de 2006 (art. 41-A da Lei nº 8.213).

Os juros moratórios incidem a contar da citação, conforme a taxa de juros da caderneta de poupança, de forma simples (não capitalizada).

Honorários advocatícios

Caracteriza-se a sucumbência mínima da parte autora, razão pela qual o INSS deve arcar com a verba honorária.

Os honorários devidos pelo INSS incidem sobre o valor das prestações vencidas até a data do julgamento da apelação, segundo o entendimento da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça e da Súmula 76 deste Tribunal Regional Federal, no percentual mínimo de cada uma das faixas previstas no art. 85, §3º.

Custas judiciais

O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, inciso I, da Lei Estadual nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado).

Essa regra deve ser observada mesmo no período anterior à Lei Estadual nº 14.634/2014, tendo em vista a redação conferida pela Lei Estadual nº 13.471/2010 ao art. 11 da Lei Estadual nº 8.121/1985.

Cabe frisar que, embora a norma estadual tenha dispensado as pessoas jurídicas de direito público também do pagamento das despesas processuais, a inconstitucionalidade formal do dispositivo nesse particular foi declarada (ADIN estadual nº 70038755864).

Desse modo, subsiste a isenção apenas em relação às custas, não se aplicando às despesas processuais.

Implantação imediata do benefício

Desnecessário conceder a tutela específica no caso presente, pois o autor já recebe o benefício de aposentadoria por invalidez previdenciária desde 4 de setembro de 2018.

Conclusão

Dou parcial provimento à apelação da parte autora, para condenar o INSS a: a) reconhecer o tempo de serviço rural no período de 20/09/1966 a 21/04/1976; b) reconhecer o tempo de atividade especial nos períodos de 22/04/1976 a 21/07/1983, de 27/03/1987 a 07/08/1987, de 01/07/1993 a 30/08/1993 e de 24/07/1996 a 05/02/1998 e proceder à conversão para tempo comum pelo fator 1,4; c) conceder o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, com coeficiente de cálculo de 85%, desde a data do requerimento administrativo (20/11/2008); d) pagar as prestações vencidas com atualização monetária e juros de mora nos termos da fundamentação.

Em face do que foi dito, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002670524v39 e do código CRC 0eb7f409.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 5/8/2021, às 15:26:14


5006359-72.2018.4.04.9999
40002670524.V39


Conferência de autenticidade emitida em 13/08/2021 04:01:14.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006359-72.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: JOELSO LUIZ DOS SANTOS

ADVOGADO: JANAÍNA BARCELOS MARKOWSKI (OAB RS052240)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

previdenciário. aposentadoria por tempo de contribuição. exercício de atividade especial. atividade de pedreiro. contato com cimento.

1. Até 28 de abril de 1995, as atividades de pedreiro e de servente, exercidas em obra de construção civil, enquadram-se como especiais pela categoria profissional, em conformidade com o código 2.3.3 do Decreto nº 53.831/1964.

2. A relação dos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física definida nos regulamentos não é exaustiva, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (Tema 534 do Superior Tribunal de Justiça).

3. A jurisprudência do Tribunal Regional da 4ª Região reconhece a especialidade do tempo de serviço, mesmo após a Lei nº 9.032, desde que seja comprovada a nocividade do contato com o cimento no desempenho das atividades de pedreiro ou operário da construção civil.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 20 de julho de 2021.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002670525v4 e do código CRC ed11f1e3.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 5/8/2021, às 15:26:14


5006359-72.2018.4.04.9999
40002670525 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 13/08/2021 04:01:14.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/07/2021 A 20/07/2021

Apelação Cível Nº 5006359-72.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI

APELANTE: JOELSO LUIZ DOS SANTOS

ADVOGADO: JANAÍNA BARCELOS MARKOWSKI (OAB RS052240)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/07/2021, às 00:00, a 20/07/2021, às 14:00, na sequência 26, disponibilizada no DE de 02/07/2021.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 13/08/2021 04:01:14.

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