APELAÇÃO CÍVEL Nº 5043175-58.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA APARECIDA DONDA DE LIMA |
ADVOGADO | : | JESUINO RUYS CASTRO |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO.
1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Comprovado o exercício de atividades rurais, logrando alcançar o tempo exigido para aposentadoria por tempo de contribuição integral, tem o segurado direito à concessão do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, tida por interposta, julgar prejudicado o apelo do INSS e, de ofício, determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de agosto de 2016.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8437077v3 e, se solicitado, do código CRC 1A70878C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
| Data e Hora: | 10/08/2016 15:45 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5043175-58.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA APARECIDA DONDA DE LIMA |
ADVOGADO | : | JESUINO RUYS CASTRO |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido para reconhecer o trabalho rural da autora no período de 14/10/1981 a 30/06/1990, bem como conceder aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER em 21/08/2012.
Em suas razões recursais, o INSS postula a aplicação do critério previsto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, para a atualização dos valores em atraso.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Reexame necessário
Considero interposta a remessa necessária, visto que sua dispensa apenas tem lugar quando a sentença líquida veicular condenação não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (STJ, Súmula 490, EREsp 600.596, Corte Especial, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 23/11/2009).
Saliente-se, por oportuno, que não incide o limite de 1.000 (mil) salários mínimos previsto no art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC, porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Destaco que a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- a aplicação da Lei 9.494/97.
Não obstante, passo a analisar as demais questões controvertidas nos autos, por força do reexame necessário.
Atividade rural
Quanto ao reconhecimento do tempo de serviço rural, as premissas de que se parte são as seguintes:
a) a possibilidade de extensão da prova material para período anterior ao documento mais antigo (RESP 1.348.633, Rel. Min. Arnaldo Esteves, j. 28/08/2013);
b) A presunção de continuidade do tempo de serviço rural no período compreendido entre os documentos indicativos do trabalho rural. Neste sentido, Moacyr Amaral Santos faz referência à teoria de Fitting, segundo a qual "presume-se a permanência de um estado preexistente, se não for alegada a sua alteração, ou, se alegada, não tiver sido feita a devida prova desta". Amaral Santos, citando Soares de Faria na síntese dos resultados obtidos por Fitting, pontifica que "só a afirmação de uma mudança de um estado anterior necessita de prova, que não a permanência do mesmo: affirmanti non neganti incumbit probatio" (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983. v. 1, p. 102);
c) a suficiência de apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido (REsp 1321493/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012).
Exame da atividade rural no caso concreto
Os documentos juntados pela autora na inicial (Evento1) permitem concluir que houve de fato o exercício de atividade rural em regime de economia familiar:
1. Certidão de casamento dos pais da autora, lavrada em 1967, onde consta como profissão do pai "lavrador" Ev.1.2;
2. Certidão de Nascimento de seus irmãos, nascido nos anos de 1972,1973 e 1983, todas qualificando o genitor da Requerente como lavrador Ev.1.2.3;
3. Título de Eleitor de se pai, também constando a profissão de lavrador e que votou nos anos de 1969 a 1982 - Ev.1.2;
4. Ficha de matrícula de sua irmã, do ano de 1980, também sendo o pai da Requerente qualificado como lavrador Ev.1.3.
5. Instrumento de Procuração do ano de 1985, onde seu genitor consta como procurador e sua profissão a de lavrador Ev.1.2;
6. Carteira de Identificação de seu pai no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alto Piquiri em 1982 Ev.1.2;
7. Certidão de Casamento da Autora - realizado em 1987; onde consta a profissão do cônjuge da autora como agricultor - Ev.1.2;
8. Requerimento de matrícula de seu irmão no ano de 1991, onde consta profissão do pai como lavrador Ev.1.3;
9. Certidão de óbito de seu pai Antônio - lavrada em 2008, onde consta como profissão a de lavrador Ev.1.2;
Os documentos elencados, constituem, a meu sentir, razoável início de prova material, a qual foi corroborada pela prova testemunhal produzida em audiência (áudio e vídeo no Evento 81).
Do depoimento das testemunhas, percebe-se que a autora trabalhou desde criança com seus pais e irmãos como diarista bóia-fria.
A testemunha Sr. Carlos Batista dos Santos, narrou que "conheceu a Requerente quando trabalhava na Fazenda Maria de Lurdes que pertencia a Valentim na época de 1979; que ajudava na fazenda carpindo soja como bóia-fria; que o nome do pai da Requerente é Antônio Donda; que naquela época a Requerente trabalhava na roça com seu pai e seus irmãos; que a Requerente possui irmãos com os nomes de Silvio e José e também possui uma irmã; que na fazenda aquela época se tinha soja e milho e depois plantação também de algodão; que as meninas na roça de algodão raleavam, carpiam, olhavam e na época da colheita, colhiam; que o que a Requerente ganhava a época ia para família; que a Requerente estudava e quando chegava da escola ia para a roça; que trabalhou muito tempo como bóia fria; que depois de um tempo a família da Requerente mudou-se para o patrimônio de Mirante, continuando a trabalhar como bóia fria; que na região os proprietários da época eram o Sr. Valentim, Manoel Cordeiro e outros; que na região se plantava algodão e também trigo; que nessa época a Requerente era solteira; que após a família da Requerente se mudar para Mirante ele continuou morando na fazenda do seu Valentim; que na fazenda moravam poucas famílias, só os bóias-frias; que mesmo depois de ter se mudado da fazenda a Requerente ainda trabalhava na fazenda do Sr. Valentim como bóia-fria; que a Requerente não trabalhou em outra atividade naquele tempo, somente na roça; que atualmente a Requerente trabalha na prefeitura."
No mesmo sentido foram os depoimentos das testemunhas Luis Rodrigues e Osvaldo Rodrigues da Silva.
O fato de alguns documentos não estarem em nome da autora, não invalida a prova. A produção em regime de economia familiar/trabalho de diarista (bóia-fria) caracteriza-se, em regra, pelo trabalho com base em uma única unidade produtiva, em nome da qual a documentação é expedida. Contudo, o pressuposto, no plano fático, é o trabalho conjunto e cooperado de todos os membros da família.
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Acresce-se que o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Desta forma, entendo comprovado o exercício de atividade agrícola em regime de economia familiar no período postulado nos autos, conforme dispõe o art. 11, VII, e § 1o, da Lei nº 8.213/91.
Conclusão quanto ao tempo rural
Deve ser mantida a sentença relativamente ao reconhecimento do tempo rural de 14/10/1981 a 30/06/1990.
Do direito do autor no caso concreto
No caso dos autos, somando-se o tempo reconhecido administrativamente pelo INSS (22 anos, 01 meses e 21 dias - Ev.1-OUT3), com o tempo rural (08 anos, 08 meses e 16 dias), tem-se que o autor, por ocasião do requerimento administrativo (DER 21/08/2012), contava com 30 anos, 10 meses e 07 dias de tempo de contribuição, suficientes à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção Monetária e Juros
Não obstante a determinação do artigo 491 do NCPC no sentido de que "na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso", tal deliberação resta inviabilizada, neste momento, em razão da pendência do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 pelo STF e dos recursos representativos de controvérsia (Resp 1495146/MG, 1495144/RS e 1492221/PR) pelo STJ (Tema 905).
Por conseguinte, ainda que o percentual de juros e o índice de correção monetária devam ser aqueles constantes da legislação em vigor em cada período em que ocorreu a mora da Fazenda Pública (INSS), difere-se, excepcionalmente, para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária, no ponto, nos termos da deliberação proferida pelo STJ (EDcl no MS 14.741/DF , Rel. Ministro JORGE MUSSI, Terceira Seção, DJe 15/10/2014).
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Saliente-se, por oportuno, que não incide a sistemática dos honorários prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais).
Conclusão
Mantém-se a sentença que determinou a averbação do período de trabalho rural da autora de 14/10/1981 a 30/06/1990, totalizando 30 anos, 10 meses e 07 dias de tempo de contribuição, e concedeu aposentadoria por tempo de contribuição integral, a contar da DER em 21/08/2012. Determina-se a implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa oficial, tida por interposta, julgar prejudicado o apelo do INSS e, de ofício, determinar a implantação do benefício.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8437075v5 e, se solicitado, do código CRC B7A0A7F7. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
| Data e Hora: | 10/08/2016 15:45 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5043175-58.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00012596320128160042
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Mercante |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA APARECIDA DONDA DE LIMA |
ADVOGADO | : | JESUINO RUYS CASTRO |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/08/2016, na seqüência 398, disponibilizada no DE de 18/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA, JULGAR PREJUDICADO O APELO DO INSS E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR | |
: | Juiz Federal MARCELO CARDOZO DA SILVA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8514951v1 e, se solicitado, do código CRC 6B78F74D. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 09/08/2016 18:35 |
