Apelação Cível Nº 5006470-85.2020.4.04.9999/PR
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0003706-92.2018.8.16.0113/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ORLANDO GARBELOTO
ADVOGADO: ARY LÚCIO FONTES (OAB PR012601)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum em que é postulada a averbação de tempo de trabalho rural de 29/08/1962 a 24/07/1997, bem como pleiteia a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Processado o feito, sobreveio sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Diante do exposto, nos termos do art. 487, I, do CPC, julgo procedente a pretensão para reconhecer o tempo de trabalho rural, em regime de economia familiar, de 11anos, 06 meses e 6 dias e, ainda, a conversão do período trabalhado em condições especiais, num total de 4 anos, 3 meses e 17 dias, cujos acréscimos àqueles já contabilizados pelo INSS, importam num total de 35 anos e 24 dias e, destarte, conceder ao autor a aposentadoria por tempo de contribuição e fixação da DER em 16/01/2018.
Conforme interpretação do TRF-4ª. Região, 3ª. Seção, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada com base nos seguintes índices oficiais: - IGP-DI de 05/96 a 03/2006, de acordo com o art. 10 da Lei n. 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n. 8.880/94; INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n. 10.741/03, combinado com a Lei n. 11.430/06, precedida da MP n. 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 8.213/91; IPCA-E a partir de 30/06/2009. A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Relativamente aos juros de mora, incidem da citação; até 29-06-2009, incidem à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87 ( Súmula 75 do TRF-4ª. R. ); a partir de então, incidem juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida.
Condeno o INSS ao pagamento das custas processuais ( Súmula 20 do TRF da 4 . Região ) e honorários a advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, cf. Súmula 111, STJ, ou seja, sobre as parcelas vencidas, “considerando-se como termo final a prolação da sentença monocrática” ( STJ – RESP . 395673 – SC – 5ª T. – Rel. Min. Jorge Scartezzini – DJU 29.04.2002 ).
A parte autora apela, alegando que a sentença afirmou que a prova oral produzida ratificou a atividade campesina desempenhada pela parte autora no período postulado em juízo (29/08/1974 a 31/10/1991), entretanto, o magistrado deixou de reconhecer todo o período de atividade rural sob o argumento de que não há provas materiais do labor rural do autor desde os doze anos até o alistamento militar, 24/04/1980, o que impede que se reconheça período rural anterior a esta data.
Afirma que o posicionamento da sentença destoa da orientação jurisprudencial do TRF4 no que diz respeito ao marco inicial do reconhecimento da atividade rural, a qual compreende como possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, ou posterior ao mais recente, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Pede que seja provido o recurso para ser reconhecido todo o período de atividade rural postulado (29/08/1974 a 31/10/1991), e não somente a partir do documento mais antigo.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
ATIVIDADE RURAL – SEGURADO ESPECIAL
O trabalho rural, na condição de segurado especial, encontra previsão no art. 11, VII, e § 1º da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII- como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em algomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de :
produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividades:
agropecurária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
conjugue ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.
Para fins de comprovação do exercício da atividade rural, não se exige prova robusta, sendo necessário que o segurado especial apresente início de prova material (art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborada por prova testemunhal idônea, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, sendo que se admite inclusive documentos em nome de terceiros do mesmo grupo familiar, a teor da Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região.
Ainda sobre a prova, acrescenta-se que nos termos da Súmula 149 do STJ não se admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência do E. STJ e do TRF4:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. A questão jurídica posta no recurso especial gira em torno da caracterização da condição de segurado especial, para fins de concessão de aposentadoria rural por idade.
2. O Tribunal a quo concluiu pela inexistência de efetiva atividade campesina durante o período pretendido, porquanto ausente o início de prova material exigido por lei. Rever tal entendimento demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, vedado pela Súmula 7/STJ.
Precedentes.
3. Ademais, o reconhecimento de tempo de serviço rurícola, para efeito de aposentadoria por idade, é tema pacificado pela Súmula 149 desta Egrégia Corte, no sentido de que a prova testemunhal deve estar apoiada em um início razoável de prova material.
4. Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp 1042311/AM, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 23/05/2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR E COMO "BÓIA-FRIA". RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ANTECIPADA. CONVERSÃO EM TUTELA ESPECÍFICA. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. Restando comprovado nos autos o requisito etário e o exercício de atividade rural no período de carência, é de ser concedida a aposentadoria por idade rural à parte autora a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei nº 8.213/91. 3. O fato de a parte autora ter recolhido contribuições previdenciárias não constitui óbice à caracterização da sua condição de segurada especial, porquanto, não raras vezes, o segurado especial, com o intuito de garantir o direito à inativação - o qual até a edição da Lei nº 8.213/91 somente era garantido aos trabalhadores rurais com 65 anos de idade e que fossem chefes ou arrimos de família - inscrevia-se na Previdência Social com o fito de assegurar assistência médica, sem, contudo, deixar de exercer, exclusivamente, a atividade rural. Isso sem falar que tais contribuições não acarretam qualquer prejuízo ao INSS, uma vez que foram vertidas aos cofres públicos. 4. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). Contudo, já tendo havido a implantação por força de antecipação de tutela, mantenho a implantação agora sob esse fundamento. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5018877-65.2016.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR MAIORIA, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/06/2017)
Destaca-se, a propósito, que esta Turma já firmou entendimento de que os documentos civis tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento/nascimento, em que consta a qualificação como agricultor constituem início de prova material (STJ, AR 1166/SP, 3ª Seção, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 26/2/2007; TRF4, AC Nº 0002853-52.2013.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, , D.E. 10/11/2016; TRF4: AC 2003.71.08.009120-3/RS, 5ª Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. de 20/5/2008).
Relativamente à idade mínima, a limitação constitucional ao labor do menor de dezesseis anos de idade deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas/previdenciários quando tenha prova de que efetivamente desenvolveu tal atividade (TRF4, AC Nº 5018877-65.2016.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/06/2017; TRF4, AC Nº 5002835-30.2011.404.7213, 5a. Turma, LORACI FLORES DE LIMA, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/03/2017).
Outrossim, há recente precedente deste Tribunal retratado nos autos da ação civil pública sob nº 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, 6ª Turma, Rel. p/ acórdão Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, com o fito de que o INSS:
c.1) se abstenha de fixar idade mínima para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei 8.213/91, admitindo, para comprovação de seu exercício, os mesmos meios probatórios postos à disposição dos demais segurados;
c.2) altere seus regulamentos internos para adequá-los ao comando sentencial;
c.3) comunique às suas Gerências Executivas e Agências da Previdência Social a necessidade de fazer observar a obrigação estabelecida na sentença.
Esta Corte, por ocasião do julgamento da sessão do dia 09/04/2018, julgou integralmente procedente a ação, a fim de reconhecer a possibilidade de ser computado período de trabalho realizado antes dos 12 anos de idade, qual seja, sem a fixação de requisito etário para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei nº 8.213/91.
A decisão foi mantida pelo Supremo Tribunal Federal (RE nº 1.225.475).
Entretanto, a possibilidade da contagem do intervalo de trabalho realizado antes dos 12 (doze) anos de idade, para fins de previdência, não desonera a parte de efetivamente comprovar o efetivo labor, que não pode ser mero auxílio eventual e sem significado em relação à produtividade do grupo familiar.
Para a comprovação da condição de segurado especial, a Lei 8.213/91 exige o desempenho de trabalho rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros da família se mostra indispensável à própria subsistência e seja exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sendo exigido, para o cônjuge, companheiro e filhos, comprovação do efetivo trabalho junto com o grupo.
Deste modo, mesmo que a jurisprudência aceite o reconhecimento do trabalho rural inclusive antes dos doze anos de idade, para tanto deve ficar comprovado que as atividades desenvolvidas pelas crianças e adolescentes dentro do grupo familiar iam além de um mero auxílio nas atividades cotidianas, mas que elas exerciam um trabalho indispensável e de dependência em relação aos demais membros da família, como exige a lei da previdência.
Nesse sentido, o recente julgado desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. IDADE MÍNIMA PARA O TRABALHO RURAL. REQUISITOS LEGAIS. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Relativamente à idade mínima, a limitação constitucional ao labor do menor de dezesseis anos de idade deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas/previdenciários quando tenha prova de que efetivamente desenvolveu tal atividade. Entretanto, essa atividade deve ir além de um mero auxílio, ou seja, o menor deve exercer um trabalho indispensável e de dependência em relação aos demais membros da família, como exige a lei da previdência.
2. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905). (AC nº 5060204-92.2018.4.04.7000, Relator Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, un., juntado aos autos em 16/03/2022).
Finalmente, no que diz respeito aos denominados boias-frias (trabalhadores informais), diante da dificuldade de obtenção de documentos, o STJ firmou entendimento no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do período pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por robusta prova testemunhal.
A partir do exposto, conclui-se, em síntese, que para o reconhecimento do labor rural permite-se:
a) o reconhecimento do tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que corroborado por prova testemunhal idônea e robusta (AgInt no REsp 1570030/PR, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 29/05/2017);
b) o reconhecimento de documentos em nome de terceiros (parentes que compõem o grupo familiar) como início de prova material;
c) a averbação do tempo de serviço rural em regime de economia familiar sem a fixação de requisito etário;
d) que os documentos tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento/nascimento, em que consta a qualificação como agricultor, valham como início de prova material.
Registro ainda que o aproveitamento do tempo de atividade rural desenvolvida até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, V, do Decreto n.º 3.048/99.
CASO CONCRETO – LABOR RURAL
A parte autora pretende seja reconhecido o exercício de labor rural, em regime de economia familiar, no período de 29/08/1962 a 24/07/1997. Para tanto, acostou aos autos os seguintes documentos:
a) Certidão de Casamento do autor, no qual este consta como agricultor, de 1991;
b) Atestado do Instituto de Identificação, que informa que o autor declarou ser lavrador na 1ª via do RG, de 1982;
c) Certidão da Justiça Eleitoral que informe que o autor declarou ser agricultor quando fez seu cadastro eleitoral;
d) Declaração do Serviço Militar que informa que o autor declarou residir em zona rural na época do alistamento, em 1980;
e) Matrícula dos Imóveis Rurais nos quais o autor residiu e trabalhou;
f) Notas fiscais de produtor em seu nome da COAMO, de 1993 a 1994;
Os documentos apresentados (itens a/f) servem como início de prova material da atividade rural do requerente após 1974, não sendo demais frisar que a jurisprudência não exige "a comprovação da atividade rural ano a ano, de forma contínua" pois início de prova material não significa prova cabal, mas algum "registro por escrito que possa estabelecer liame entre o universo fático e aquilo que expresso pela testemunhal." (TRF 4ª Região - AC n° 2000.04.01.128896-6/RS, Relator Juiz João Surreaux Chagas, DJU de 25-7-2001, p. 215).
Com efeito, a Declaração do Serviço Militar que informa que o autor declarou residir em zona rural na época do alistamento, em 1980, bem como a Certidão de casamento do autor, no qual este consta como agricultor, de 1991, e o Atestado do Instituto de Identificação, que informa que o autor declarou ser lavrador na 1ª via do RG, de 1982, servem como início razoável de prova material de que o autor exerceu o labor rural no período controverso.
Na Audiência Judicial (evento 39), foram ouvidas três testemunhas.
A primeira, Sr. Damilton João Pavesi, disse que seus pais possuíam uma propriedade de 29 alqueires, em Porto Real. Que moravam e Itambé, mas ele e o pai trabalhavam na lavoura. Que tinham funcionários. Que conheceu o autor porque ele morava na propriedade vizinha, do Sr. Florindo. Que o pai do autor era porcenteiro de café e que a família do autor era em 08 irmãos e não tinham empregados. Que o autor se mudou para uma propriedade ali da mesma região e continuou mantendo contato. Que tem conhecimento que o autor sempre trabalhou na roça, até trabalhar na Cocari. Que se lembra quando o autor morou na Fazenda Santa Bárbara, que também é vizinha do seu sítio.
A segunda, Sr. Vitorino Rigamonti, disse que tinha uns vinte e poucos anos quando conheceu o autor, porque o autor foi porcenteiro do seu pai, em uma propriedade em Fenix. Que era uma propriedade de 05 alqueires e que o autor não tinha empregados. Que o autor morava com a esposa, nessa época. Que ficou uns 07 anos na propriedade, que só produzia café e que lembra que eram duas partes e, uma delas, era tocada pelo autor, a outra não sabe dizer se era o irmão do autor que tocava. Que depois que eles mudaram perdeu o contato.
A terceira, Sr. José Carlos da Silva, disse que nasceu em 1960. Que é natural de Itambé, que nasceu na zona rural. Que o pai trabalhava com café, que são em 08 irmãos, que com 10 anos já ia para roça. Que não tinham empregados e que o pai explorava uns 02 alqueires, mais ou menos. Que estudou até o meio do 5º ano. Que conheceu o autor mais ou menos em 1977, quando morava na propriedade do Pavesi, em Porto Real. Que a família do autor se mudou para um sítio vizinho, na propriedade do Sr. Florindo. Que, nessa época, tinha 15 anos e o autor devia ter uns 13 anos. Que conheceu os pais do autor, que o autor tinha uns 07 irmãos. Que a propriedade do Florindo tinha 10 alqueires, que também era cultivo de café. Que o autor fazia o mesmo serviço e que a família do autor também não tinha empregados. Que a família do autor mudou para outro local, mas, algum tempo depois, trabalhou com o autor na Fazenda Santa Bárbara de propriedade de José Roberto de Souza Flaquer. Que trabalhava com pecuária. Que trabalhou de 1987 até 2006 nessa fazenda. Que o autor ficou uns 09 anos nessa fazenda, que mesmo quando o autor se mudou para Fenix, manteve contato, pois se encontravam todos os domingos.
A parte autora, em depoimento judicial, disse que nasceu na zona rural de Itambé, na propriedade do avô. Que quando tinha mais ou menos uns 10 anos, a propriedade foi vendida. Que a família mudou para uma propriedade em Porto Real, para trabalhar com café. Que trabalhavam como porcenteiros, que são em 08 irmãos. Que permaneceram nessa propriedade de 1976 a 1981. Que estudou até a 3ª série na cidade de Itambé. Que, nessa época, ajudava levando água, limpando tronco de café, rastelando o café, carregando o que fosse preciso. Que o pai plantava arroz, feijão e milho no meio do cafezal. Que o plantio era manual. Que tinha uma pequena área para cultura branca, mas depois o dono limpou para fazer um pasto. Que, nessa época, um dos irmãos já havia casado. Que a única renda da família era essa. Que havia uma plantação de café de 10 alqueires, na colheita os vizinhos ajudavam, trocando dia de serviço. Que depois se mudaram para o Bairro Catarinense, na propriedade de Emilio Otto, onde também cultivavam café. Que não se lembra o tamanho da propriedade. Que eram várias famílias que se dividiam e tocavam uma parte. Que depois voltaram para Porto Real, mas em outra propriedade. Que plantavam milho, arroz, feijão. Que se mudaram para Fenix, onde se casou, em 1991. Que foi para Fenix com os pais. Que lá em Fenix também cultivavam café; que ficou responsável por uma parte e o irmão por outra. Que a propriedade era de Elias Rigamonti e tinha 05 alqueires, que ficou ali de 1989 a 1997. Que o trabalho era manual, que plantavam no meio do café algodão, milho, arroz e feijão. Que uma de suas filhas nasceu nessa propriedade, que entregava a produção na Coamo. Que, em 1997, voltou para Porto Real, na propriedade de José Roberto Souza Flaquer, onde foi registrado como campeiro e lá permaneceu durante 09 anos. Que a propriedade tinha 65 alqueires, que tinha outra família que morava lá. Que era pecuária. Que depois trabalhou na Employer e na Cocari, que trabalha até hoje na Cocari.
A parte autora apela, alegando que a sentença afirmou que a prova oral produzida ratificou a atividade campesina desempenhada pela parte autora no período postulado em juízo (29/08/1974 a 31/10/1991), entretanto, o magistrado deixou de reconhecer todo o período de atividade rural sob o argumento de que não há provas materiais do labor rural do autor desde os doze anos até o alistamento militar, 24/04/1980, o que impede que se reconheça período rural anterior a esta data.
Afirma que o posicionamento da sentença destoa da orientação jurisprudencial do TRF4 no que diz respeito ao marco inicial do reconhecimento da atividade rural, a qual compreende como possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, ou posterior ao mais recente, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Pede que seja provido o recurso para ser reconhecido todo o período de atividade rural postulado (29/08/1974 a 31/10/1991), e não somente a partir do documento mais antigo.
Possui razão a parte autora.
Ora, para fins de comprovação do exercício da atividade rural, não se exige prova robusta, sendo necessário que o segurado especial apresente início de prova material (art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborada por prova testemunhal idônea, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91.
Ainda que a sentença tenha considerado que não foram apresentadas provas anteriores a 1980, o que impediria o reconhecimento do labor rural a partir de 1974 exclusivamente com base em provas testemunhais, ressalta-se a previsão da Súmula 577 do STJ, a qual preconiza que “é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”.
Nesse sentido, não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).
Desse modo, a testemunha Sr. Damilton João Pavesi, bem como a testemunha Sr. José Carlos da Silva, disseram ter presenciado o labor rural do autor desde quando este era "moleque", com cerca de 13 anos aproximadamente. Bem como a parte autora explicou que trabalhava na lavoura desde a adolescência. Nesse sentido, somado os depoimentos às provas documentais, é possível reconhecer que a atividade rural do autor iniciou-se bastante cedo, em 1974, com 12 anos.
Assim, dou provimento ao recurso e julgo comprovado o exercício da atividade rural pelo autor no período de 29/08/1974 a 31/10/1991.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
A partir da jurisprudência do STJ (em especial do AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 09/08/2017, DJe 19/10/2017), para que haja a majoração dos honorários em decorrência da sucumbência recursal, é preciso o preenchimento dos seguintes requisitos simultaneamente: (a) sentença publicada a partir de 18/03/2016 (após a vigência do CPC/2015); (b) recurso não conhecido integralmente ou improvido; (c) existência de condenação da parte recorrente no primeiro grau; e (d) não ter ocorrido a prévia fixação dos honorários advocatícios nos limites máximos previstos nos §§2º e 3º do artigo 85 do CPC (impossibilidade de extrapolação). Acrescente-se a isso que a majoração independe da apresentação de contrarrazões.
Na espécie, diante do provimento do recurso da parte autora, mantenho a condenação do INSS ao pagamento dos honorários advocatícios nos termos fixados na sentença.
TUTELA ESPECÍFICA
Com base no artigo 497 do CPC e na jurisprudência consolidada da Terceira Seção desta Corte (QO-AC 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias, a contar da publicação do presente julgado, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício concedido ou revisado judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelo da PARTE AUTORA: provido para que seja reconhecido o exercício da atividade rural pelo autor no período de 29/08/1974 a 31/10/1991.
Determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, nos termos da fundamentação. Determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003205719v19 e do código CRC 89b2fc28.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 1/6/2022, às 15:29:47
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Apelação Cível Nº 5006470-85.2020.4.04.9999/PR
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0003706-92.2018.8.16.0113/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ORLANDO GARBELOTO
ADVOGADO: ARY LÚCIO FONTES (OAB PR012601)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LABOR RURAL. RECONHECIMENTO ANTERIOR AO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. REFORMA DA SENTENÇA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Para fins de comprovação do exercício da atividade rural, não se exige prova robusta, sendo necessário que o segurado especial apresente início de prova material (art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborada por prova testemunhal idônea, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91.
2. A Súmula 577 do STJ preconiza que “é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”.
3. Não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).
4. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos da fundamentação. Determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 31 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003205720v4 e do código CRC 04f0e4e1.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 1/6/2022, às 15:29:48
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:39:19.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 24/05/2022 A 31/05/2022
Apelação Cível Nº 5006470-85.2020.4.04.9999/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ORLANDO GARBELOTO
ADVOGADO: ARY LÚCIO FONTES (OAB PR012601)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 24/05/2022, às 00:00, a 31/05/2022, às 16:00, na sequência 442, disponibilizada no DE de 13/05/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO. DETERMINO O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO OU REVISADO, A SER EFETIVADA EM 45 DIAS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:39:19.