| D.E. Publicado em 14/09/2016 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0016799-62.2011.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | CARLOS FERNANDO GASPAR PEREIRA |
ADVOGADO | : | Osmar Araujo Soares |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE TERRA RICA/PR |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. BOIA FRIA. SEGURADO ESPECIAL.
. É possível o aproveitamento do tempo de serviço rural até 31-10-1991 independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência.
. O Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que o trabalhador rural boia-fria está abarcado no Regime Geral de Previdência Social como segurado especial.
. A partir de novembro de 1991, pretendendo o segurado especial computar tempo rural para obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá comprovar o recolhimento das contribuições facultativas (Súmula 272 do STJ).
. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
. As anotações constantes da CTPS gozam de presunção juris tantum do vínculo empregatício, salvo alegada fraude, do que não se cuida na espécie.
. Não cumprindo com todos os requisitos para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, ou seja, tempo mínimo de contribuição e carência, remanesce o direito da parte autora à averbação do período ora reconhecido, para fins de obtenção de futura aposentadoria
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de setembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8502198v4 e, se solicitado, do código CRC 332C97E3. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 06/09/2016 18:18 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0016799-62.2011.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | CARLOS FERNANDO GASPAR PEREIRA |
ADVOGADO | : | Osmar Araujo Soares |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE TERRA RICA/PR |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação e de remessa oficial de sentença em que foi julgado procedente o pedido, para conceder à parte autora aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo, mediante o reconhecimento de exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, e como boia-fria, na condição de contribuinte individual, nos períodos de 02/06/1970 a 01/08/1982; de 01/09/1992 a 30/04/1994, e de 08/12/2001 a 04/06/2003. O INSS foi condenado a pagar as parcelas vencidas desde a DER, 28/11/2006, corrigidas pelos índices de atualização dos benefícios previdenciários, e acrescidas de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação. Os honorários advocatícios foram fixados em 15% do valor da condenação.
Alega a entidade previdenciária que a parte autora não logrou comprovar o exercício de atividade rural mediante apresentação de prova material, sendo vedado o reconhecimento de tal atividade somente com base em depoimentos testemunhais.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do tempo de serviço rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 - independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência - está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99. Quando exercido em regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Pode o exercício do labor rural ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo; ademais, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas um documento que, juntamente com a prova oral, criando um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilite um juízo de valor seguro.
Também não é necessário que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213. Tal exigência implicaria introdução indevida em limites não estabelecidos pelo legislador, e que devem ser de pronto afastados.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016) que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Observa-se que as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
De outro lado, nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Em relação aos boias-frias, cujo trabalho rural é caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal. Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte.
No regime de economia familiar (§1º do art. 11 da Lei de Benefícios) em que os membros da família trabalham "em condições de mútua dependência e colaboração", os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
No tocante ao trabalho do segurado especial em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade de seu cômputo, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo a questão maiores digressões.
Da condição do boia-fria como segurado especial
Boia-fria, volante e diarista são designações ainda correntes de uma mesma categoria de trabalhadores rurais caracterizada pelo trabalho autônomo e temporário, e pela suas precárias condições socioeconômicas.
No plano jurisdicional, o que se afigura como o principal empecilho para a efetivação do direito fundamental à Previdência Social, no caso dos trabalhadores rurais boias-frias, volantes ou diaristas, é a dificuldade de enquadrar tal grupo de trabalhadores em uma das categorias de segurado do Regime Geral de Previdência Social, contidos nas Leis 8.212 e 8.213 de 1991. A legislação previdenciária brasileira não trata de forma explícita a categoria composta pelos trabalhadores rurais diaristas (também chamados de boias-frias ou volantes).
O Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que o trabalhador rural boia-fria está abarcado no Regime Geral de Previdência Social como segurado especial. Demonstra-se isto a partir de trechos de julgados recentes:
Restou consignado na decisão agravada, ainda, que o Tribunal de origem estabeleceu, com base na prova dos autos, que o período vindicado pelo ora recorrente como segurado empregado é, na verdade, período no qual o segurado exercia atividade de bóia-fria trabalhador rural, na qualidade de segurado especial da previdência e não segurado empregado, como quer fazer crer o ora agravante. (AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.172.644 - PR (2009/0243453-6)
Discute-se nestes autos o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, na condição de boía-fria. (AgRg no AREsp 390.932/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/10/2013, DJe 28/10/2013)
Entendo que a analogia se faz necessária, da constatação de que o enquadramento do boia-fria como contribuinte individual corresponderia à negativa de proteção jurídica justamente àquele trabalhador que está mais desamparado. Ademais, a categoria de segurado especial tem justamente a função de abranger situações especiais que se encontram no meio rural, não sendo em nada absurda a perspectiva de abrangência entre suas hipóteses dos trabalhadores volantes.
Deu lenitivo a essa situação o art. 143 da Lei de Benefícios de 1991, que concedeu ao prestador de serviços rurais, em caráter eventual, sem relação de emprego, se requerido até 2006, direito à aposentadoria por idade sem a exigência de contribuição; prazo que foi estendido pela Medida Provisória 410/07 até dezembro de 2010.
Do caso concreto
Superada a questão do enquadramento do boia-fria como segurado especial, cumpre analisar as provas juntadas para comprovar o exercício de atividade rural nos períodos de 02/06/1970 a 01/08/1982; de 01/09/1992 a 30/04/1994, e de 08/12/2001 a 04/06/2003. Foram apresentados os seguintes documentos pelo autor, nascido em 02/06/1958 (RG, fls. 09):
- certidão de casamento, realizado em 08/04/1978, em que o autor está qualificado como agricultor (fls. 10);
- ficha de associado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Terra Rica, com data de inscrição ilegível, e registros de pagamento de mensalidades de fevereiro/1980 a abril/1985 (fls. 15).
- CTPS, emitida em 1981, em que se vê que o primeiro vínculo de trabalho celetista do autor iniciou em 08/08/1982, em uma fazenda, como trabalhador rural, função esta que exerceu em que todos os empregos subsequentes, até o último, iniciado em 05/06/2003 (fls. 12/13);
- título eleitoral do autor, emitido em 30-08-1982, registrando a profissão de agricultor (fls. 14);
- certidão de nascimento do filho Fabiano, nascido em 22/09/1985, onde consta a profissão de campeiro do requerente (fls. 11).
A prova testemunhal, colhida na audiência realizada em 15/04/2011 corrobora a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em confirmar que a parte autora trabalhava nas lides rurais, em depoimentos assim reduzidas a termo (fls. 50/52):
CICERO JOSÉ DE OLIVEIRA, brasileiro, residente e domiciliado na Av. Liberdade, n° 984, no Jardim Bela Vista, nesta cidade de Terra Rica/PR Aos costumes disse nada. Testemunha que presta o compromisso legal, e sendo inquirido pelo MM. Juiz disse:
Que eu conheço O Carlos a mais de 40 anos. Que quando eu o conheci trabalhando na roça, junto com o padrasto dele. Que eu trabalhei na Fazenda Bragantina desde 1976, e o Carlos começou a trabalhar na mesma fazenda desde 1979. Que antes de 1979 o Carlos trabalhou na Fazenda Real e na Fazenda São José. Que nessas fazendas ele trabalhava junto com seu padrasto e sua mãe. Que o Carlos sempre trabalhou em fazenda e trabalha como lavrador até hoje. Que ele trabalha na profissão de lavrador desde criança,/quando trabalhava junto com seus pais. Sem Reperguntas. Nada mais.
LAURINDO AGOSTINHO, brasileiro, residente domiciliado na Chácara Primavera, s/n°, nesta cidade de Terra Rica/PR Aos costumes disse nada. Testemunha que presta o compromisso legal, e sendo inquirido pelo MM.Juiz disse:
Que eu conheço O Carlos Lourdes a mais de 38 anos. Que quando eu a conheci trabalhando na roça, junto com o padrasto dele. Que eu inclusive chegue i a trabalhar junto com ela no plantio de café, carpindo, colhendo. Que nós trabalhamos juntos para o José da Silva Braga. Que até hoje ele ainda é lavrador. Que antes ele morava na Fazenda São José, Fazenda Real. Que desde quando era criança ele já trabalhava na roça. Que nós trabalhávamos na diária, e os pagamentos eram feitos nos finais de semana desde que eu a conheço ele sempre trabalhou na roça, nunca teve outro emprego, ele sempre trabalhou em fazenda. Sem Reperguntas. Nada mais.
JAIME CARDOSO FARIAS, brasileiro, residente e domiciliado na Rua Itaipu, n° 73, Vila Castelo Branco, nesta cidade de Terra Rica/PR Aos costumes disse nada. Testemunha que presta o compromisso legal, c sendo inquirido pelo MM. Juiz disse:
Que eu conheço O Carlos a mais de 40 anos. Que quando eu o conheci trabalhando na roça, junto com o padrasto dele. Que ele trabalhou na Fazenda Bragantina desde 1979. Que antes de 1979 o Carlos trabalhou na Fazenda Real e na Fazenda São José. Que eu o Carlos trabalhava junto com meu irmão na Fazenda São José. Que nessas fazendas ele trabalhava junta com seu padrasto e sua mãe. Que o Carlos sempre trabalhou em fazenda e trabalha como lavrador até hoje. Que ele trabalha na profissão de lavrador desdei criança, quando trabalhava junto com seus pais. Sem Reperguntas. Nada mais.
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material, para o que, reitere-se, consideradas as peculiaridades do trabalho na agricultura, não se pode exigir que sejam apenas por si mesmos conclusivos ou suficientes para a formação de juízo de convicção. É aceitável que a prova contenha ao menos uma indicação segura de que o fato alegado efetivamente ocorreu, vindo daí a necessidade de sua complementação pela prova oral, a qual, como se viu, confirmou de modo coerente e preciso o trabalho rural da parte autora.
Conclusão: Fica mantida a sentença quanto ao reconhecimento dos seguintes lapsos de tempo de serviço rural: de 02/06/1970 a 01/08/1982; de 01/09/1992 a 30/04/1994, e de 08/12/2001 a 04/06/2003.
Entretanto, uma vez admitida a condição de segurado especial do autor (nos termos já expendidos no item que antecedeu o presente), e não a de contribuinte individual, somente poderá ser averbado e contabilizado de imediato para fins de concessão de benefício o labor exercido até 31/10/1991.
A partir da competência novembro de 1991, em observância ao princípio constitucional da anterioridade previsto no art. 195, §6º, da Constituição Federal (90 dias para a instituição de contribuições para a seguridade social), pretendendo o segurado especial computar tempo de serviço rural para obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá comprovar o recolhimento de contribuições facultativas, conforme dispõe o art. 39, II, da Lei nº 8.213/91. Significa dizer que a contribuição obrigatória sobre percentual retirado da receita bruta da comercialização da produção rural, prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91, não garante ao segurado especial a aposentadoria por tempo de serviço, pois tal benefício, conforme se depreende do exame dos arts. 11, inciso VII, e 39, I e II, da Lei nº 8.213/91, tem sua concessão condicionada ao recolhimento facultativo de contribuições.
Referido entendimento restou assim sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, em 11/09/2002:
Súmula 272 - "O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas."
Na hipótese em exame, não é possível computar-se o tempo de serviço rural exercido após 31 de outubro de 1991. Necessário o recolhimento das correspondentes contribuições previdenciárias, o que não restou comprovado nestes autos. Assim reforma-se a sentença, no ponto, reservando-se à autora o direito à contabilização dos períodos restantes à indenização respectiva.
Conclusão: Do período reconhecido, somente o decorrido entre 02/06/1970 a 01/08/1982 deverá ser averbado de imediato, o que perfaz 12 anos e 02 dias.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
A aposentadoria por tempo de serviço, extinta pela Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.1998 e transformada em aposentadoria por tempo de contribuição, foi garantida (art. 3º) aos segurados da previdência social que, até a data da publicação da Emenda, em 16.12.98, tivessem cumprido os requisitos para sua obtenção, com base nos critérios da legislação então vigente (arts. 29, caput, e 52 a 56 da Lei nº 8.213/91, na sua redação original), quais sejam: a) 25 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 30 anos, se homem e b) carência (conforme a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91, inscritos até 24-7-1991, ou conforme o art. 25, II, da Lei, para os inscritos posteriormente). O valor da aposentadoria corresponde a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano para cada ano completo de atividade até o máximo de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de tempo de serviço para as mulheres, e 35 para os homens.
Oportuno enfatizar que o direito adquirido a tal modalidade de benefício exige a satisfação de todos os requisitos até a data da EC nº 20/98, já que, a partir de então, passa a viger a aposentadoria por tempo de contribuição, consoante previsão do art. 201, §7º, da Constituição Federal, para a qual exigem-se 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, se mulher, e carência de 180 contribuições mensais.
Em caráter excepcional, para os segurados filiados até a data da publicação da Emenda, foi estabelecida regra de transição no art. 9º, §1º, possibilitando aposentadoria proporcional quando, o segurado I) contando com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos, se mulher e, atendido o requisito da carência, II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e 25, se mulher; e b) um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a 40% do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional. O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens a e b supra, até o limite de 100%).
De qualquer modo, o disposto no art. 56 do Decreto n.º 3.048/99 (§3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.
Forma de cálculo da renda mensal inicial (RMI)
A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.
Assim, o segurado que completar os requisitos necessários à aposentadoria antes de 29/11/1999 (início da vigência da Lei n.º 9.876/99), terá direito a uma RMI calculada com base na média dos 36 últimos salários-de-contribuição apurados em período não superior a 48 meses (redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91), não se cogitando da aplicação do fator previdenciário, conforme expressamente garantido pelo art. 6º da respectiva lei.
Completando o segurado os requisitos da aposentadoria já na vigência da Lei nº 9.876/99 (em vigor desde 29.11.1999), o período básico do cálculo (PBC) estender-se-á por todo o período contributivo, extraindo-se a média aritmética dos 80% maiores salários-de-contribuição, a qual será multiplicada pelo "fator previdenciário" (Lei n.º 8.213/91, art. 29, I, e §7º).
Do direito à aposentadoria no caso concreto
Considerando-se o presente provimento judicial, e o tempo de contribuição contabilizado pelo INSS no CNIS atualizado, parte autora contabiliza o seguinte tempo de contribuição, nos três marcos legislativos:
RECONHECIDO NA FASE ADMINISTRATIVA
Anos
Meses
Dias
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98:
16/12/1998
11
7
15
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário:
28/11/1999
12
7
27
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento:
08/06/2010
21
8
10
RECONHECIDO NA FASE JUDICIAL
Obs.
Data Inicial
Data Final
Mult.
Anos
Meses
Dias
T. Rural
02/06/1970
01/08/1982
1,0
12
2
0
Subtotal
12
2
0
SOMATÓRIO (FASE ADM. + FASE JUDICIAL)
Modalidade:
Coef.:
Anos
Meses
Dias
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98:
16/12/1998
Tempo Insuficiente
-
23
9
15
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário:
28/11/1999
Tempo insuficiente
-
24
9
27
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento:
08/06/2010
Sem idade mínima
-
33
10
10
Pedágio a ser cumprido (Art. 9º EC 20/98):
2
5
24
Data de Nascimento:
02/06/1958
Idade na DPL:
41 anos
Idade na DER:
52 anos
a) em 16-12-98 (advento da EC nº 20/98), a parte autora somava 23 anos, 09 meses e 15 dias de tempo de contribuição, não fazendo jus, portanto, à concessão de aposentadoria por tempo de serviço;
b) em 28-11-1999 (advento da Lei nº 9.876/99), a parte autora contava com 41 anos de idade e somava 24 anos, 09 meses e 27 dias de tempo de contribuição, não atingindo o tempo mínimo necessário, nem idade, razão por que não faz jus à aposentadoria;
c) na DER (08/06/2010), a parte autora somava 33 anos, 10 meses e 10 dias de tempo de contribuição, atingindo o tempo mínimo necessário (já incluído o pedágio) porém não fazendo jus à concessão da aposentadoria, porque não atingida a idade mínima, o que veio a ocorrer somente em 02/06/2011, após o ajuizamento da ação.
Nesse passo, não cumprindo com todos os requisitos para a concessão do benefício, a parte autora tem direito à averbação dos períodos ora reconhecidos, nos termos da fundamentação, para fins de obtenção de futura aposentadoria.
Da sucumbência
Tendo em vista a reforma da sentença, e que a parte decaiu de maior parte do pedido, condeno-a ao pagamento das custas e de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, suspendendo a execução de tal verba em face da justiça gratuita que lhe foi concedida a fls. 32.
Conclusão
A sentença resta parcialmente reformada para o fim de excluir da condenação o comando de averbação dos períodos de 01/09/1992 a 30/04/1994, e de 08/12/2001 a 04/06/2003, condicionada ao recolhimento respectivo, e para julgar improcedente a concessão do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06/09/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0016799-62.2011.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00019489120108160167
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | CARLOS FERNANDO GASPAR PEREIRA |
ADVOGADO | : | Osmar Araujo Soares |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE TERRA RICA/PR |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06/09/2016, na seqüência 41, disponibilizada no DE de 17/08/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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