| D.E. Publicado em 12/12/2016 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0022463-06.2013.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | CLARICE MARIA ZIMMER |
ADVOGADO | : | Reciâni Ereno Sansonowicz |
APELADO | : | (Os mesmos) |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 3A VARA DA COMARCA DE FARROUPILHA/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. DIFERIMENTO. TUTELA ESPECÍFICA.
. É possível o aproveitamento do tempo de serviço rural até 31-10-1991 independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência.
. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
. As anotações constantes da CTPS gozam de presunção juris tantum do vínculo empregatício, salvo alegada fraude, do que não se cuida na espécie.
. A definição dos índices de correção monetária e juros de mora deve ser diferida para a fase de cumprimento do julgado.
. Implementados os requisitos de tempo de contribuição e carência, é devida a aposentadoria por tempo de contribuição.
. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015.
. A determinação de implantação imediata do benefício, com fundamento nos artigos supracitados, não configura violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973 e 37 da CF/1988.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da autora, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, determinando a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de novembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8619491v4 e, se solicitado, do código CRC 6608B1C1. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 29/11/2016 15:35 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0022463-06.2013.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | CLARICE MARIA ZIMMER |
ADVOGADO | : | Reciâni Ereno Sansonowicz |
APELADO | : | (Os mesmos) |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 3A VARA DA COMARCA DE FARROUPILHA/RS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelações e de remessa oficial de sentença em que foi julgado parcialmente procedente o pedido, para determinar a averbação de tempo de serviço rural, exercido em regime de economia familiar pela parte autora, no período de 29/09/1968 a 03/02/1977, e de período urbano laborado de 05/2008 a 07/2008, e de 01/2009 a 04/2009, num total de sete meses.
Em face da sucumbência recíproca, a parte autora foi condenada ao pagamento de 20% das custas processuais, suspensas pela AJG, e ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 300,00 (trezentos reais). O INSS ficou condenado ao pagamento de honorários no valor de R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), com fulcro no art. 20, § 3º, do CPC, a ser corrigido pelo IGP-M, permitida a compensação, conforme autoriza a súmula 306 do STJ.
A parte autora sustenta que deve ser reconhecido o tempo de serviço rural de 01/06/1979 a 31/01/1981, porque comprovou devidamente fazer jus a tal direito e, por conseqüência, à concessão do benefício postulado.
A entidade previdenciária, por sua vez, alega falta de interesse processual, e que a parte autora não logrou comprovar o exercício de atividade rural mediante apresentação de prova material, sendo vedado o reconhecimento de tal atividade somente com base em depoimentos testemunhais. Aduz que o período trabalhado como doméstica não foi administrativamente analisado pela autarquia, razão porque a parte autora é carecedora da ação. Acrescenta ser inviável contabilizar para a carência os recolhimentos extemporâneos realizados a título de vínculo urbano. Finaliza postulando a redução da verba honorária.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas, a saber, metas do CNJ, justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Do tempo de serviço rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 - independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência - está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99. Quando exercido em regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Pode o exercício do labor rural ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo; ademais, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas um documento que, juntamente com a prova oral, criando um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilite um juízo de valor seguro.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016) que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Observa-se que as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
De outro lado, nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Em relação aos boias-frias, cujo trabalho rural é caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal. Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do REsp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte.
No regime de economia familiar (§1º do art. 11 da Lei de Benefícios) em que os membros da família trabalham "em condições de mútua dependência e colaboração", os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
No tocante ao trabalho do segurado especial em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade de seu cômputo, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo a questão maiores digressões.
Do caso concreto - atividade rural
Na hipótese, o INSS suscita preliminar de falta de interesse processual, por não ter dado andamento ao pedido administrativo. Com efeito, a fls. 95 consta carta de exigência endereçada à demandante, solicitando sua presença na agência 19-022.010 para dar andamento à justificação administrativa. Entretanto, na referida correspondência consta a condição de "anuir expressamente a realização da J.A. para os períodos de 29/09/1968 a 31/12/1972 e de 01/06/1979 a 31/12/1979, indeferido, de plano, os lapsos restantes. Desse modo, havendo resistência do INSS ao pleito administrativo, ainda que de modo parcial, resta configurada o interesse de agir da parte autora, razão porque passo ao exame da matéria.
Para a comprovação do trabalho rural nos períodos de 29/09/1968 a 03/02/1977, e de 01/06/1979 a 31/01/1981, foram apresentados os seguintes documentos pela autora, nascida em 29/09/1956 (RG, fls. 05):
- certidão de casamento dos pais da requerente, realizado em 17/12/1955, em que o cônjuge varão está qualificado como agricultor (fls. 271);
- atestado escolar emitido pela prefeitura municipal de Carlos Barbosa, dando conta de que entre 1964 a 1970, a autora, filha de agricultor, freqüentou escolas municipais (fls. 14);
- certidão expedida pela prefeitura municipal de Carlos Barbosa, dando conta de que o pai da requerente pagou taxa de rodágio de terras localizadas em Forromeco, nos anos de 1961 a 1966 (fls. 32);
- declaração da Cooperativa Santa Clara de que o pai da autora entregou produção naquele local entre 1965 a 1969 (fls. 33/38);
- ficha de associado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Carlos Barbosa, emitida em nome do pai da requerente, admitido em 25/04/1967 (fls. 343);
- notas fiscais de produtor em nome do pai da autora de 1975, 1976, 1977 (fls. 39/44);
- certidão do INCRA referente a propriedade de terras rurais do pai da autora no período de 1965 a 1992 (fls. 90);
- notas fiscais de produtor rural, emitidas em nome do marido da requerente, datadas de 1978, 1979, 1980, 1981, 1982, 1983, 1984, 1986, 1987, 1989 (fls. 287/288, 290/291, 297/310).
A extensa prova oral corrobora a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em confirmar que a parte autora trabalhava nas lides rurais, inicialmente junto dos pais, ainda criança e, após, com o marido. Em ambas as fases o labor agrícola era exercido em regime de economia familiar, sem ajuda de empregados, plantando milho, feijão e outros produtos, tais como leite e batatinha, cujo excedente era comercializado. A íntegra dos depoimentos estão degravados nos seguinte termos (fls. 480/483).
TESTEMUNHA: Francisca Maria Halbert Menzen,
Juíza: A senhora conhece ela desde quando?
Testemunha: Desde menina.
J: Desde a época que ela morava com os pais?
T: Sim. A gente era vizinhas.
J: E aonde é que os pais dela moravam?
T: Em Santo Antônio do Forromeco.
J: Mesmo lugar que a senhora mora ainda?
T: Mesmo lugar.
J: E era o que? Interior?
T: É interior de Carlos Barbosa.
J: E os pais dela faziam o que? Qual era a atividade deles na época que ela era pequena?
T: Eles trabalhavam na agricultura, na roça.
J: E ela chegou a trabalhar com os pais também?
T: Sim. Ajudava sempre.
J: Até quando ela ajudou os pais na agricultura?
T: Até os vinte, vinte e um anos. Quando ela casou, ela saiu.
J: Quando ela casou ela saiu ali da casa dos pais?
T: Saiu.
J: O que eles plantavam lá na casa dos pais dela?
T: Aipim, batata, milho, feijão, tinha umas vacas de leite.
J: Eles vendiam alguma coisa?
T: Vendiam.
J: O sustento da família era disso ou tinha algum outra fonte de renda?
T: Não. Era da roça mesmo.
J: E as terras eram de propriedade dos pais dela ou de terceiros?
T: Sim. Era do pai dela.
J: Tinham empregados também?
T: Não. Não.
J: Máquinas agrícolas?
T: Também não.
J: Pela parte autora?
Procuradora demandante: Nada.
J: Nada mais.
TESTEMUNHA: Antonio Bertolo
Testemunha: Nós morava bem pertinho.
Juíza: Que época isso? Que idade ela tinha? Se era pequena/
T: Eu me lembro desde pequena que eles moravam ali. Nós morava para o lado de lá e eles pelo lado de cá. Nós enxergava sempre. Desde pequeno, nós éramos vizinhos perto. Não morava longe.
J: E ela morava com os pais?
T: Sim.
J: Como era o nome da localidade que eles moravam?
T: Santo Antônio do Forromeco.
J: É aonde o senhor ainda mora?
T: Sim.
J: E as terras eram de quem aonde que ela morava?
T: As terras era deles.
J: Dos pais dela?
T: É dos pais dela.
J: E o que os pais dela plantavam nas terras?
T: Plantavam milho, feijão, semeava trigo, batatinha, batata doce, aipim. Mercadoria assim que se precisava, eles semeavam. Eles tinham umas vacas de leite.
J: E eles vendiam alguma coisa?
T: Vendiam o leite e o que sobrava do gasto deles eles vendiam né.
J: E a família tinham o sustento ali da terra ou de alguma outra fonte de renda?
T: O leite e da roça eu sei que eles viviam. O sustento deles é isso daí.
J: E a Clarice também trabalhava?
T: Trabalhava.
J: Desde quando ela começou a trabalhar na roça?
T: Desde pequena. Tinha o que uns dez anos, menos até, que ela ia sempre junto com a mãe dela na roça. De manhã ia no colégio ou de tarde que tinham e depois ia na roça junto com a mãe e o pai.
J: E até quando ela ficou lá na casa do pai dela?
T: Até os vinte, vinte e um me parece. Vinte e um ano. A gente não se lembra, mas
J: E por que ela saiu, sabe?
T: Só depois que ela casou né.
J: Quando ela casou, ela saiu da casa dos pais?
T: Sim.
J: E até ela casar ela trabalhava na roça?
T: Sempre. Sempre trabalhava na roça junto com os pais
J: Tinham empregados também ali na propriedade?
T: Não. Era só a família deles que trabalhava.
J: Tinha máquinas agrícolas?
T: Esses anos não tinham máquina. Era tudo assim.
J: Manual, o serviço?
T: É. Tudo na mão. Se tinha que colher, não tinha máquinas.
J: Pela parte autora?
Procuradora demandante: Nada.
J: Nada mais.
TESTEMUNHA: Osmar Wartha
Juíza: O senhor conhece a dona Clarice desde quando?
Testemunha: Olha depois que ela casou ela morava lá perto. Perto dela. A casa deles confrontavam com as terras minhas.
J: Com quem que ela casou, o senhor sabe?
T: Sim, com o (...)
J: Tá e depois que ela casou, ela foi morar ali com o marido perto do senhor?
T: Dá para dizer que em linha reta dá uns dois quilômetros, nem, agora pela estrada é um pouco mais.
J: Sabe qual é a localidade que ela morava nessa época, qual era o nome da localidade?
T: Olha, dá para dizer que nem nome não tem, eu acho.
J: E o que ela fazia com o marido ali? Qual era a atividade deles?
T: Olha, eles trabalhavam na lavoura.
J: Os dois?
T: Sim.
J: O que eles plantavam, o senhor sabe?
T: Olha eles confrontavam com terras minhas. Plantavam batatinha, milho.
J: E eles vendiam também alguma coisa?
T: Isso eu não sei. Eu acho que mais era para o consumo deles.
J: E como é que eles se sustentavam?
T: Olha eu creio que (...).
J: Mas algum deles trabalhava fora?
T: Olha que eu sei não.
J: E eles continuam morando ali?
T: É eles ficaram lá uns sete ou oito anos e depois eles se transferiram.
J: Não moram mais lá então?
T: Não. Depois voltaram ainda. Hoje estão por lá de novo.
J: Pela parte autora?
Procuradora demandante: Nada Excelência.
J: Nada mais.
TESTEMUNHA: Nilo Neis
Juíza: O senhor conhece ela da onde, ou desde quando?
Testemunha: Eu conhecia desde solteira de casa né, assim, de vista. Depois então que morava lá.
J: Aonde?
T: Em São Vendelino. Aquela vez era Barbosa, mas São Vendelino era o município.
J: Mas daí ela estava casada?
T: Casada. Depois que casou né.
J: Sabe quem é o marido dela, o nome?
T: O Ademir Zimmer.
J: O que eles faziam ali aonde eles moravam? Ele tinham alguma atividade?
T: Trabalhava na roça. Era colono.
J: Era interior? Área rural?
T: Era. Era anterior. Não era área rural.
J: Sim, mas era casa só ou tinha área para plantar?
T: Tinha uma área de terra para plantar sim.
J: E eles plantavam alguma coisa?
T: Plantavam para viver. Milho, feijão, essas coisas.
J: E eles vendiam alguma coisa?
T: Se sobrava, eles vendiam. Se não.
J: Do que eles tiravam o sustento?
T: Isso é. Eles tinham uma vaca de leite né, vendiam um pouco de leite. Isso daí. Então colônia lá no nosso lugar era assim, vivia com tudo o que colhia da roça né. Pouca festa a gente ia por que não tinha dinheiro.
J: E quanto tempo que eles ficaram morando lá, o senhor sabe?
T: Olha, eu acho que foi sete para oito anos, mais ou menos que eles ficaram morando lá.
J: Pela parte autora?
Procuradora demandante: Nada.
J: Nada mais.
TESTEMUNHA: Maria Teonila Haas
Juíza: A senhora conhece ela desde quando?
Testemunha: Quando ela casou ela veio morar perto lá.
J: Da onde a senhora mora?
T: É. Por que tem um arroio no meio e ela morava lá e eu morava neste lado.
J: Era aonde isso?
T: São Vendelino.
J: Sabe o nome do marido dela?
T: Ademir.
J: E logo que ela casou ela foi morar lá, é isso?
T: Sim. Sim.
J: O que eles faziam lá de atividade?
T: Eles tinham feijão, milho, ela tinha umas vaquinhas e assim foi indo sabe, trabalhando.
J: Na colônia isso?
T: Sim.
J: Eles vendiam alguma coisa?
T: Sim. Vendia leite, as vezes milho, soja.
J: E o sustento era da agricultura?
T: Sim. Tudo lá.
J: E até quando eles ficaram lá, a senhora sabe?
T: Eu sei que a menina dela tinha sete ou oito anos né quando ela saiu de lá para vir para Farroupilha né.
J: Sim. Daí ela veio morar na cidade?
T: Aqui em Farroupilha.
J: Pela parte autora?
Procurador demandante: Pergunta se eles tinham empregados.
T: Não. Não.
P DTE: Nada mais.
J: Nada mais.
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material, para o que, reitere-se, consideradas as peculiaridades do trabalho na agricultura, não se pode exigir que sejam apenas por si mesmos conclusivos ou suficientes para a formação de juízo de convicção. É aceitável que a prova contenha ao menos uma indicação segura de que o fato alegado efetivamente ocorreu, vindo daí a necessidade de sua complementação pela prova oral, a qual, como se viu, confirmou de modo coerente e preciso o trabalho rural da parte autora nos períodos postulados.
O fato de o pai da requerente possuir inscrição como contribuinte individual no período de 1974 a 1977, não afasta o direito invocado pela autora, tendo em vista que referido vínculo previdenciário não é incompatível com atividade rural comprovadamente praticada pelo grupo familiar. Tal labor resultou inequívoco nos autos, à vista da prova robusta indicando a profissão de agricultor do genitor da demandante, especialmente pela posse de terras agricultáveis em seu nome, assim como as várias notas fiscais de produtor rural juntadas aos autos.
Além disso, o legislador, quando elaborou os dispositivos que regem o tratamento previdenciário ao trabalhador rural, encontrou no campo espécies diversificadas de agricultores, lá não existindo apenas as figuras de patrão e empregado, mas também trabalhadores que refugiam à classificação tradicional de Direito do Trabalho, que labutavam autonomamente. Ao verificar a natureza destes últimos, encontrou, além do produtor, familiares que o auxiliavam, que se agregavam à atividade produtiva. Daí porque contemplou, também, aqueles cuja atividade gravitava em torno do chefe da unidade familiar. Mas não deixou de registrar o termo "individualmente", conforme está no art. 11, inc. VII, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 11.718/2008 :
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (...)
O regime de economia familiar existe, portanto, para que os demais membros da família não restem à margem. No tocante, todavia, ao chefe da unidade familiar, pode ele estar trabalhando individualmente ou em regime de economia familiar, ou seja, com ou sem o auxílio de familiares. A descaracterização do regime de economia familiar, portanto, não afeta aquele que tem a iniciativa da produção, aquele que a dirige, aquele que vende o produto; somente se cogita de economia familiar em relação ao familiar que auxilia na atividade agrícola. Contrario sensu, ter-se-ia marginalizado o trabalhador que lidasse sozinho, que não possuísse família; e esta, evidentemente, não foi a vontade do legislador. Apenas em relação ao regime de economia familiar é que se exige exclusividade de fonte de renda. Ao trabalhador rural individualmente considerado não se lhe veda a concomitância de outro qualquer ganho. O legislador deixa claro, no § 2º do art. 11 supracitado que "todo aquele que exercer, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada sujeita ao Regime Geral de Previdência Social é obrigatoriamente filiado em relação a cada uma delas". É de toda evidência que possível para o trabalhador rural ter mais de uma fonte de renda; a restrição alcança apenas àquele familiar que trabalha agregado; e o pressuposto fático de guardar uma única fonte de renda dimana da dificuldade de demonstração do exercício do trabalho em família (as notas de compra de insumo e de venda de mercadorias estão, em regra geral, em nome do chefe da unidade familiar), tornando-se menos nítida tal participação quando o cônjuge ou parente detém fonte autônoma de subsistência.
No que tange às notas fiscais emitidas em nome do marido da autora, não admitidas pelo juízo monocrático por serem emitidas em datas não coincidentes com os períodos postulados, consigno não ser necessário que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213. Tal exigência implicaria introdução indevida em limites não estabelecidos pelo legislador, e que devem ser de pronto afastados.
Consigno, por fim, que para o presente julgamento foram desconsideradas as notas fiscais com os nºs 24500, 7853, 6211, 6225, 29395, 29398 (fls. 289, 292/296), em face de irregularidades devidamente apuradas e processadas (fls. 100/332).
Conclusão: Tenho por comprovados os períodos de 29/09/1968 a 03/02/1977, e de 01/06/1979 a 31/01/1981, os quais deverão ser averbados pelo INSS, independentemente de contribuição previdenciária.
Do tempo de serviço urbano
A pretensão do INSS é de reforma da sentença quanto reconhecimento de atividade urbana como empregada doméstica nas competências de maio a julho/2008, e de janeiro a abril/2009, sob o fundamento de que a questão não foi analisada pela autarquia.
Tal argumento não deve prosperar, porque esse pedido foi devidamente deduzido pela parte autora no âmbito administrativo; se a análise que incumbia ao INSS fazer não foi procedida, negando a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição de plano (fl. 97), é certo que sua negligência não pode vir em seu benefício, e muito menos em prejuízo do segurado.
Em face disso, passo ao exame da matéria.
O tempo de serviço urbano pode ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, salvo por motivo de força maior ou caso fortuito, a teor do previsto no artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91.
As anotações constantes na CTPS gozam de presunção juris tantum de veracidade (Súmula 12 do TST, Decreto 3.048/99, art. 19), dos vínculos empregatícios ali registrados, presumindo-se a existência de relação jurídica válida e perfeita entre empregado e empregador, salvo eventual fraude, do que não se cuida na espécie. Não obsta o reconhecimento do tempo de serviço assim comprovado a falta de recolhimento das contribuições previdenciárias, porquanto o encargo incumbe ao empregador, nos termos do art. 30, inc. I, alíneas a e b, da Lei nº 8.212/91; não se pode prejudicar o trabalhador pela desídia de seu dirigente laboral em honrar seus compromissos junto à Previdência Social, competindo à autarquia previdenciária o dever de fiscalizar e exigir o cumprimento dessa obrigação legal.
A propósito:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CTPS. PROVA PLENA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E FGTS. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. TRABALHO DESEMPENHADO POR FILHO NA EMPRESA DO PAI. RECONHECIMENTO PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. EXISTÊNCIA DE RASURAS NAS ANOTAÇÕES DA CTPS. UTILIZAÇÃO DOS DADOS RELATIVOS A FÉRIAS E ALTERAÇÕES SALARIAIS, CONSTANTES DA CARTEIRA DE TRABALHO. 1. As anotações constantes de CTPS, salvo prova de fraude, constituem prova plena para efeitos de contagem de tempo de serviço. 2. Irrelevante, para o cômputo do tempo de serviço, o fato de não terem sido recolhidas as devidas contribuições previdenciárias e os valores relativos ao FGTS, uma vez que tais obrigações tocavam apenas ao empregador, conforme a legislação vigente à época da prestação dos serviços. (...)
(TRF4, EINF 0005094-08.2005.404.7112, Terceira Seção, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 30/01/2012)
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO COMO EMPREGADO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. BOIA FRIA. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. 1. O tempo de serviço como empregado pode ser comprovado por início de prova material ou por meio de CTPS, desde que não haja prova de fraude, e deve ser reconhecido independente da demonstração do recolhimento das contribuições, visto que de responsabilidade do empregador.
(...)
(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015700-57.2011.404.9999, 5ª Turma, Des. Federal ROGERIO FAVRETO, D.E. 25/04/2014, PUBLICAÇÃO EM 28/04/2014)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. ANOTAÇÕES CONSTANTES DE CTPS. RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. 1. As anotações constantes de CTPS, salvo prova de fraude, constituem prova plena para efeitos de contagem de tempo de serviço. 2. A assinatura da carteira de trabalho e o recolhimento das contribuições previdenciárias são de responsabilidade do empregador - sendo atribuição do INSS a sua fiscalização -, de maneira que a ausência de registro das contribuições nesse período não pode vir a prejudicar o reconhecimento da qualidade de segurado do falecido. 3. No caso dos autos, a parte autora tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, porquanto implementados os requisitos para sua concessão. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2007.72.00.009150-0, 6ª TURMA, Des. Federal NÉFI CORDEIRO, POR UNANIMIDADE, D.E. 17/01/2014, PUBLICAÇÃO EM 20/01/2014)
Ainda que não se verifique no CNIS o recolhimento de contribuições previdenciárias relativas a vínculos constantes da CTPS, o art. 32 do Decreto 3.048/99 autoriza que estes sejam considerados como período contributivo, definindo como tal o "conjunto de meses em que houve ou deveria ter havido contribuição em razão do exercício de atividade remunerada sujeita a filiação obrigatória ao regime de que trata este Regulamento" ( § 22, I).
In casu, deve ser confirmada a sentença que bem analisou a prova quanto aos períodos de 05/2008 a 07/2008 e 01/1009 a 04/2009, cujos fundamentos transcrevo a seguir para evitar tautologia.
Analisando a planilha de fl. 72, verifica-se que tal período não foi reconhecido pela autarquia, provavelmente em face da ausência de pagamento da contribuição. Entretanto, tal período consta anotado na CTPS da parte autora, conforme se observa na fl.47. Além disso, a prova oral produzida em juízo comprova a atividade ininterrupta da autora como doméstica na residência de Cristiane Fonseca. Assim, gozando a anotação na CTPS de presunção juris tantum para o período apontado, bem como não havendo prova em sentido contrário de que a autora não exerceu a atividade, deve ser reconhecido o período e acrescidos 7 meses de tempo de serviço àquele já reconhecido pela autarquia.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
A aposentadoria por tempo de serviço, extinta pela Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.1998 e transformada em aposentadoria por tempo de contribuição, foi garantida (art. 3º) aos segurados da previdência social que, até a data da publicação da Emenda, em 16.12.98, tivessem cumprido os requisitos para sua obtenção, com base nos critérios da legislação então vigente (arts. 29, caput, e 52 a 56 da Lei nº 8.213/91, na sua redação original), quais sejam: a) 25 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 30 anos, se homem e b) carência (conforme a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91, inscritos até 24-7-1991, ou conforme o art. 25, II, da Lei, para os inscritos posteriormente). O valor da aposentadoria corresponde a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano para cada ano completo de atividade até o máximo de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de tempo de serviço para as mulheres, e 35 para os homens.
Oportuno enfatizar que o direito adquirido a tal modalidade de benefício exige a satisfação de todos os requisitos até a data da EC nº 20/98, já que, a partir de então, passa a viger a aposentadoria por tempo de contribuição, consoante previsão do art. 201, §7º, da Constituição Federal, para a qual exigem-se 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, se mulher, e carência de 180 contribuições mensais.
Em caráter excepcional, para os segurados filiados até a data da publicação da Emenda, foi estabelecida regra de transição no art. 9º, §1º, possibilitando aposentadoria proporcional quando, o segurado I) contando com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos, se mulher e, atendido o requisito da carência, II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e 25, se mulher; e b) um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a 40% do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional. O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens a e b supra, até o limite de 100%).
De qualquer modo, o disposto no art. 56 do Decreto n.º 3.048/99 (§3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.
Forma de cálculo da renda mensal inicial (RMI)
A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.
Assim, o segurado que completar os requisitos necessários à aposentadoria antes de 29/11/1999 (início da vigência da Lei n.º 9.876/99), terá direito a uma RMI calculada com base na média dos 36 últimos salários-de-contribuição apurados em período não superior a 48 meses (redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91), não se cogitando da aplicação do fator previdenciário, conforme expressamente garantido pelo art. 6º da respectiva lei.
Completando o segurado os requisitos da aposentadoria já na vigência da Lei nº 9.876/99 (em vigor desde 29.11.1999), o período básico do cálculo (PBC) estender-se-á por todo o período contributivo, extraindo-se a média aritmética dos 80% maiores salários-de-contribuição, a qual será multiplicada pelo "fator previdenciário" (Lei n.º 8.213/91, art. 29, I, e §7º).
Do direito à aposentadoria no caso concreto
Considerando-se o presente provimento judicial, a parte autora tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição na DER, em 04/10/2010 (fls. 18), porque atingido o tempo de contribuição necessário de 29 anos, 03 meses e 11 dias, incluído o pedágio de 03 anos e 01 um dia, assim como porque implementada a idade mínima. A carência para o ano de 2010 (174 meses) foi cumprida, tendo em vista que a autora logrou obter 225 contribuições mensais (fls. 73).
RECONHECIDO NA FASE ADMINISTRATIVA | Anos | Meses | Dias | |||
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | (Resumo, fls. 314) | 7 | 5 | 20 | |
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | (Resumo, fls. 316) | 8 | 5 | 2 | |
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 04/10/2010 | (Resumo, fls. 72) | 18 | 8 | 4 | |
RECONHECIDO NA FASE JUDICIAL | ||||||
Obs. | Data Inicial | Data Final | Mult. | Anos | Meses | Dias |
T. Rural | 29/09/1968 | 03/02/1977 | 1,0 | 8 | 4 | 5 |
T. Rural | 01/06/1979 | 31/01/1981 | 1,0 | 1 | 8 | 1 |
T. Comum | 01/05/2008 | 31/07/2008 | 1,0 | 0 | 3 | 1 |
T. Comum | 01/01/2009 | 30/04/2009 | 1,0 | 0 | 4 | 0 |
Subtotal | 10 | 7 | 7 | |||
SOMATÓRIO (FASE ADM. + FASE JUDICIAL) | Modalidade: | Coef.: | Anos | Meses | Dias | |
Contagem até a Emenda Constitucional nº 20/98: | 16/12/1998 | Tempo Insuficiente | - | 17 | 5 | 26 |
Contagem até a Lei nº 9.876 - Fator Previdenciário: | 28/11/1999 | Tempo insuficiente | - | 18 | 5 | 8 |
Contagem até a Data de Entrada do Requerimento: | 04/10/2010 | Proporcional | 75% | 29 | 3 | 11 |
Pedágio a ser cumprido (Art. 9º EC 20/98): | 3 | 0 | 1 | |||
Data de Nascimento: | 29/09/1956 | |||||
Idade na DPL: | 43 anos | |||||
Idade na DER: | 54 anos |
Por conseguinte, assegura-se à parte autora o direito à aposentadoria, devendo ser implantada, se for o caso, a RMI mais favorável, de acordo com o que for apurado oportunamente em liquidação de sentença, esclarecendo-se que não se trata de decisão condicional, visto que o comando é único, qual seja, determinar que o INSS conceda o benefício ao segurado com o cálculo que lhe for mais vantajoso, conforme os critérios que estão claramente definidos, a contar da data do requerimento administrativo.
Correção Monetária e Juros de mora
Segundo o art. 491 do NCPC, "na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso". Todavia, as recentes controvérsias acerca dos índices de correção monetária e juros de mora devidos pela Fazenda Pública, atualmente previstos na Lei n.º 11.960/2009, originadas após o julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 (inconstitucionalidade da TR como índice de correção monetária dos precatórios) pelo Supremo Tribunal Federal têm inviabilizado a aplicação do dispositivo. Isso porque ainda pende de julgamento o Recurso Extraordinário n.º 870.947 (tema 810), no qual a Suprema Corte irá decidir sobre a constitucionalidade dos índices também em relação aos momentos anteriores à expedição dos precatórios.
Nesse contexto, a controvérsia jurisprudencial a respeito do tema, de natureza acessória, tem impedido o trânsito em julgado das ações previdenciárias, considerando os recursos interpostos pelas partes aos Tribunais Superiores, fadados ao sobrestamento até que haja solução definitiva. Diante disso, as Turmas integrantes das 2ª e 3ª Seções desta Corte passaram a diferir para a fase de cumprimento do julgado a definição dos índices aplicáveis, os quais devem seguir a legislação vigente ao tempo de cada período em que ocorreu a mora da Fazenda Pública. Tal sistemática já foi adotada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do MS n.º 14.741/DF, relator Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 15/10/2014. Assim, a conclusão da fase de conhecimento do litígio não deve ser obstada por discussão que envolve tema acessório, de aplicação pertinente justamente à execução do julgado, mormente quando existente significativa controvérsia judicial sobre a questão, pendente de solução pela Suprema Corte.
Sendo assim, fica diferida para a fase de cumprimento do julgado a estipulação dos índices de juros e correção monetária legalmente estabelecidos para cada período.
Custas no RS
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao pagamento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula nº 76 deste TRF.
Implantação do benefício
A Terceira Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Em razão disso, sendo procedente o pedido, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 dias, consoante os parâmetros acima definidos, sob pena de multa.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Conclusão
A sentença resta parcialmente reformada para o fim de reconhecer o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, em maior extensão, e para conceder aposentadoria por tempo de contribuição à parte autora.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora, e negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, determinando a imediata implantação do benefício.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 29/11/2016 15:35 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/11/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0022463-06.2013.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00068980620128210048
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | CLARICE MARIA ZIMMER |
ADVOGADO | : | Reciâni Ereno Sansonowicz |
APELADO | : | (Os mesmos) |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 3A VARA DA COMARCA DE FARROUPILHA/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/11/2016, na seqüência 983, disponibilizada no DE de 16/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, DETERMINANDO A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8740128v1 e, se solicitado, do código CRC 7593996. | |
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