Apelação Cível Nº 5022609-83.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: ALFREDO NOVICKI
ADVOGADO: ALCESTE JOÃO THEOBALD
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
ALFREDO NOVICKI propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 15/10/2010, postulando o reconhecimento e a averbação dos períodos trabalhados na agricultura, de 23/04/1954 a 23/04/1956 e, por consequência, a revisão da renda mensal inicial do benefício previdenciário por tempo de contribuição desde a data do requerimento administrativo (05/04/1997), respeitada a prescrição.
Em 12/06/2018 sobreveio sentença (ev. 3 - SENT24) que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, nesses termos:
Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente demanda ajuizada por ALFREDO NOVICKI em face do INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, com resolução de mérito, forte no art. 487, I, do Código de Processo Civil e nos termos da fundamentação retro.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono da parte demandada, os quais arbitro em R$ 1.000,00 (um mil reais), considerando, para tanto, a natureza da matéria submetida à análise judicial, aliado à existência de dilação probatória (CPC, art. 85, §§ 29 e 89). Suspendo, entretanto, a sua exigibilidade, em razão da assistência judiciária gratuita concedida ao autor, na forma e prazo da Lei ng 1.060/50 e do art. 98 do CPC.
Em caso de interposição de recurso (art. 1.012, CPC):
1. Verifique a escrivania se o recurso versa unicamente sobre a fixação de honorários sucumbenciais em favor do(s) apeIante(s), sendo o caso, o pagamento das custas ocorrerá no final do processo (art. 13, §2°, Lei 14.634/2014);
2. |ntime(m)-se a(s) parte(s) apelada(s) para contrarrazões, no prazo de 15 dias (art. 1.010, §1º, CPC);
3. Apresentadas as contrarrazões, verifique a escrivania a ocorrência da hipótese de suscitação de preliminar nas contrarrazões, referentes a decisão anterior do Juízo que não comportou agravo de instrumento (art. 1.009, §29, CPC);
4. Na hipótese supra, intime(m)-se o(s) apelante(s) para manifestação acerca das preliminares, em 15 dias (art. 1.009, §29, CPC);
5. Tudo cumprido, ou em caso de não apresentação de contrarrazões, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 4§ Região (art. 1.010, §39, CPC). Com o trânsito em julgado, e nada sendo requerido, arquive-se com baixa.
Inconformada a parte autora interpôs recurso de apelação (ev. 3 - APELAÇÃO25), requerendo a anulação da sentença, uma vez que a coisa julgada, que culminou com a improcedência do pedido na instância inicial, já foi analisada e superada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça.
Sem contrarrazões ao recurso, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Recebimento do recurso
Importa referir que a apelação da parte autora deve ser recebida, por ser própria, regular e tempestiva.
Da coisa julgada
Cinge-se a questão em analisar se está caracterizada a coisa julgada em decorrência do trânsito em julgado da ação nº 5.715/381 em que a parte autora postulou reconhecimento do período laboral rural, em regime de economia familiar, compreendido entre 23/04/1956 até 31/12/1965, bem como o período de 01/01/1966 até 30/06/1966, referente à atividade urbana, determinando a computação na contagem de tempo de serviço para revisão do benefício n° 101.356.989-7.
A ocorrência de coisa julgada, sob o argumento de que a parte autora pretende a rediscussão do mérito da decisão prolatada nos autos do processo n° 5.715/381, foi alegada pelo INSS na contestação (ev. 3-CONTESTE/IMPUG9), tendo sida reconhecida em sentença, a qual julgou o feito extinto, nos termos do art. 267. V, do CPC (ev. 3-DESPADEC13). A parte autora interpôs recurso de apelação (ev. 3 - PET14), ao qual foi dado provimento (ev. 3 - ACOR15), nesses termos:
No que pertine à coisa julgada, dispõe o Código de Processo Civil:
Art. 267 - Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (...)
V - quando o juiz acolher a alegação de perempção, litispendência ou de coisa julgada; (...)
Art. 301 - (...)
§ 1º - Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.
§ 2º - Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
§ 3º - Há litispendência, quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso.
Com efeito, da análise dos autos, verifica-se que o autor pretende o reconhecimento de tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 23/04/1954 a 23/04/1956. Na ação 5.715/381, examinada na AC 2001.04.01.017276-6, por sua vez, o autor postulou o reconhecimento do período de atividade rurícola compreendido entre 23/04/1956 e 31/12/1965.
Assim, considerando que os pedidos das ações são diversos, não há coisa julgada, devendo retornar os autos para julgamento do pedido, afastada a extinção sem julgamento do mérito.
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação para anular a sentença e determinar a remessa dos autos à vara de origem.
Nesse contexto, afastada a ocorrência de coisa julgada, deve-se analisar as provas do período de tempo rural que a parte autora pretende ver averbado para fins de revisão de aposentadoria.
Da análise da possibilidade formar juízo de mérito em grau de recurso sobre matéria não resolvida na sentença segundo o artigo 1.013 do novo CPC
O Art. 1.013 do CPC trata, especialmente no seu § 3º, de quando o Tribunal pode decidir desde logo o mérito do apelo:
Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
§ 1o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado.
§ 2o Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais.
§ 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:
I - reformar sentença fundada no art. 485;
II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir;
III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo;
IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.
§ 4o Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau.
§ 5o O capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória é impugnável na apelação. (Grifo meu)
Conclui-se que, em princípio, em grau de recurso pode ser analisado o mérito da ação naqueles pontos em que o juízo de origem não o tenha feito, o que é caso dos presentes autos no que diz respeito à análise das provas de tempo rural apresentadas pela parte autora. Porém, o caput do § 3º impõe uma condição para tanto: o processo deve estar "em condições de imediato julgamento".
Neste sentido, percebe-se que o juízo de origem determinou a abertura de prazo, durante a tramitação da ação na justiça estadual, para que as partes apresentassem as provas que considerassem necessárias para o deslinde da ação (ev. 3 - DEPADEC17). Em resposta ao despacho, a parte autora ora apelante requereu a produção de prova oral (ev. 3 - PET18) e o INSS considerou que não havia a necessidade da apresentação de novas provas (ev. 3 - PET19). Assim, tendo em vista que foi respeitado o contraditório e que foi esgotada a fase de instrução, entendo que a presente ação, no seu estado atual, está em condições de ser julgada imediatamente. Passo, portanto, à análise do requerimento de averbação de tempo rural da parte autora.
Atividade rural
Para a comprovação do tempo de atividade rural com vista à obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal (artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91 e Súmula 149 do STJ).
A respeito do assunto, encontra-se longe de mais alguma discussão, no âmbito dos tribunais, a necessidade de que o período de tempo de atividade seja evidenciado por documentos que informem, a cada ano civil, o seu exercício (TRF4: AC 2003.04.01.009616-5, 3ª Seção, Relator Desembargador Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. de 19/11/2009; EAC 2002.04.01.025744-2, 3ª Seção, Relator para o Acórdão Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 14/6/2007; EAC 2000.04.01.031228-6, 3ª Seção, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU de 9/11/2005). Também já está fora de qualquer dúvida, a possibilidade de que os documentos civis, como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, em que consta a qualificação, como agricultor, do parte autora da ação, assim como de seu cônjuge ou de seus pais (Súmula 73 deste Tribunal), constituem início de prova material (STJ, AR 1166/SP, 3ª Seção, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 26/2/2007; TRF4: AC 2003.71.08.009120-3/RS, 5ª Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. de 20/5/2008; AMS 2005.70.01.002060-3, 6ª Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, DJ de 31/5/2006).
A prova material, conforme o caso, pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade rural, bastando, para exemplificar, a existência de registro contemporâneo em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS de contrato de trabalho como empregado rural. Em tal situação, em tese, não haveria necessidade de inquirir testemunhas para a comprovação do período registrado.
Na maioria dos casos, porém, a documentação apresentada é insuficiente à comprovação do tempo de atividade rural, do que resulta a habitual complementação por meio do depoimento de testemunhas.
Em razão disso, a qualidade do início de prova material não pode ser isoladamente avaliada sem que seja compreendido o contexto probatório, a que se aduz, em regra, a produção da prova oral. Decorre dessa orientação, que a diversidade de documentos que podem constituir início de prova material impõe conclusões judiciais igualmente distintas, sem que para tanto deva existam premissas invariáveis como, aparentemente, poderia constituir a obrigatoriedade de presença nos autos de documentos relacionados ao começo do período a ser comprovado, ou, ainda, a retroação da eficácia temporal, de modo fixo, a um número restrito de anos.
A irradiação temporal dos efeitos do início de prova material dependerá do tipo de documento, das informações nele contidas (havendo distinções conforme digam respeito ao próprio parte autora da ação, ou a terceiros) e das circunstâncias que envolvem o quadro fático descrito no processo.
Registre-se que os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando relacionados à respectiva titularidade dos pais ou do cônjuge, consubstanciam admitido início de prova material do trabalho rural.
Com efeito, como o artigo 11, §1º, da Lei 8.213/1991, define regime de economia familiar como a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes, deverá ser cauteloso o exame da prova, na medida em que, no mais das vezes, os atos negociais do grupo parental são formalizados, não individualmente, mas em nome do pai da família ou cônjuge masculino, que naturalmente representa a todos.
Essa compreensão está sintetizada na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Por fim, a respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
No referido julgamento, o STJ manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, havendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Conquanto o acórdão acima transcrito aprecie benefício diverso do postulado na presente demanda, as diretrizes fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça em relação ao início de prova material também devem ser observadas para os casos de cômputo de tempo rural como boia-fria para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
A parte autora, nascida em 23/04/1942, filho de Estevão Novicki e Regina Novicki (ev. 3 - ANEXOS PET4), buscou o reconhecimento do exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, no período compreendido entre 23/04/1954 a 23/04/1956.
Para comprovar o efetivo trabalho agrícola, foram trazidos aos autos alguns documentos, dentre os quais se destacam (ev. 3 - ANEXOS PET4):
- certidão de nascimento, com profissão do pai como agricultor;
- Certificado de alistamento militar, de 1960, na qual consta a profissão de agricultor;
- certidão de casamento dos pais, de 1942, com profissão do pai como agricultor;
- certidão do registro de imóveis e oficio dos registros públicos, certificando a transcrição de aquisição de imóvel rural em nome do genitor, em 1952, estando qualificado como agricultor;
- certidão do INCRA, certificando o cadastro de imóvel rural, com área de 50,0 hectares, localizado em Guarani das Missões, RS, no período de 1966 a 1978, em nome do genitor;
-certidão da prefeitura municipal de Guarani das Missões, certificando o pagamento de taxas incidentes sobre propriedades rurais no período de 1953 a 1980, em nome do genitor;
- Atestado de escolaridade, comprovando que o autor frequentou escola municipal de ensino fundamental INC/São Pedro da Linha Bom Asilo, interior do município de Guarani das Missões;
- Certidão de nascimento de sua irmã Irene, ocorrido no ano de 1951, indicando a profissão do pai como agricultor;
- Certidão de batismo;
- Certidões de nascimento de irmão Artur, ocorrido no dia 23 de abril de 1942, indicando a profissão do pai como agricultor e o histórico escolar do mesmo;
- Cópia da petição inicial, documentos, sentença e acórdão do processo n° 5.715/381, da Comarca de Porto Xavier.
No que se refere à prova oral, na esfera judicial (ev. 7) foram ouvidas três testemunhas, de cujos depoimentos se extrai, em suma, o seguinte:
Que o autor trabalhou na agricultura, nas com a família, começando a trabalhar antes dos 12 anos, que tinha irmãos, que estudou na comunidade, que a família vivia só da agricultura, não possuindo outra fonte de renda; não haviam empregados; não arrendavam as terras; plantavam milho, soja, feijão e criação de animais; a produção era para consumo e o excedente era vendido.
Os documentos apresentados constituem início razoável de prova material do labor rural no período indicado porque denotam a vinculação do parte autora e de sua família ao meio rural e, para complementá-los, foram ouvidas testemunhas, cujos depoimentos confirmaram de modo coerente e seguro o desempenho de atividade agrícola, em regime de economia familiar, no lapso temporal em questão.
Registro que não há que se falar em recolhimento de contribuições para tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei nº 8.213/91, pois há expressa determinação legal nesse sentido - art. 55, § 2º da LOPS:
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
Relativamente à averbação do período de atividade rural, importa referir que a idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Relator Ministro Gilson Dipp, terceira seção, julgado em 28/8/2002, DJ 23/9/2002). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC 2001.04.01.025230-0/RS, Relator Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12/3/2003; STF, AI 529694/RS, Relator Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU 11/3/2005).
Concluindo o tópico, julgo comprovado o exercício da atividade rural no período de 23/04/1954 a 23/04/1956, com acréscimo ao tempo de contribuição da autor.
Desse modo, assegura-se à parte autora o direito à revisão da aposentadoria, considerando-se o tempo rural reconhecido, na forma da fundamentação, devendo ser implantada, se for o caso, a RMI mais favorável, de acordo com o que for apurado oportunamente em liquidação de sentença, esclarecendo-se que não se trata de decisão condicional, visto que o comando é único, qual seja, determinar que o INSS revise o benefício ao segurado com o cálculo que lhe for mais vantajoso, de acordo com os critérios que estão claramente definidos, a contar da data da DER, observada a prescrição quinquenal.
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A 5ª Turma desta Corte, nos termos do julgamento do RE nº 870.947/SE (Tema 810), pelo STF, em 20/9/2017, entendia pertinente adotar como consectários legais, o IPCA-E para fins de correção monetária dos débitos da Fazenda Pública, e os juros moratórios os termos do artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com redação dada pela Lei 11.960/2009.
Nada obstante, com o julgamento do Tema 905 pelo e. Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22/2/2018, DJe 2/3/2018) e a jurisprudência firmada na Seção Previdenciária desta Corte, adotando o entendimento do e. STJ (AR 5018929-22.2015.4.04.0000, Relator Desembargador Osni Cardoso Filho, julgado em 27/06/2018),tenho que as condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006,que incluiu o artigo 41-A na Lei 8.213/1991. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (artigo 1º-F da Lei9.494/1997, com redação dada pela Lei 11.960/2009).
Desse modo, os consectários da condenação devem ser conforme os fatores acima indicados, porquanto trata-se de matéria de ordem pública, podendo ser tratada pelo Tribunal sem necessidade de prévia provocação das partes. Neste sentido RESP 442.979/MG, Ministro João Otávio de Noronha, 2ª Turma, julgado em 15/8/2006, DJ 31/8/2006, p. 301.
Honorários advocatícios e custas processuais
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula 111 do STJ e Súmula 76 deste TRF.
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (artigo 4, inciso I, da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADIN 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual 14.634/2014 (artigo 5º).
Conclusão
Dar provimento à apelação da parte autora quanto ao reconhecimento do exercício de atividade rural, em economia familiar, de 23/04/1954 a 23/04/1956 e a consequente revisão do benefício, desde a DER, observada a prescrição.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5022609-83.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: ALFREDO NOVICKI
ADVOGADO: ALCESTE JOÃO THEOBALD
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. coisa julgada. não ocorrência. processo em condições de julGAmento imediato. POSSIBILIDADE FORMAR JUÍZO DE MÉRITO EM GRAU DE RECURSO SOBRE MATÉRIA NÃO RESOLVIDA NA SENTENÇA. TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Possibilidade de formar juízo de mérito em grau de recurso sobre matéria não resolvida na sentença desde que o processo esteja em condições de julgamento imediato no estado em que se encontra. 2. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. 3. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à revisão da RMI da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, respeitada a prescrição quinquenal.4. As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o artigo 41-A na Lei 8.213/1991. Quanto aos juros demora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (artigo1º-F da Lei 9.494/1997, com redação dada pela Lei 11.960/2009).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de outubro de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/10/2018
Apelação Cível Nº 5022609-83.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: ALFREDO NOVICKI
ADVOGADO: ALCESTE JOÃO THEOBALD
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/10/2018, na sequência 76, disponibilizada no DE de 08/10/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª Turma , por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
Votante: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:39:32.