APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5040493-33.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | CLAUDEMIR APARECIDO BELGAMO |
ADVOGADO | : | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
: | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SEGURADO TRABALHADOR RURAL. TEMPO DE ATIVIDADE ANTERIOR À LEI Nº 8.213/1991. LIMITE DE IDADE. RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DOCUMENTOS EM NOME DE TERCEIROS. PROVA ORAL HARMÔNICA E COERENTE. CÁLCULO DO SALÁRIO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADES CONCOMITANTES. AVERBAÇÃO NO CNIS. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência.
2. Estão abrangidos pelo disposto no § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 todos os beneficiários do antigo PRORURAL: segurado especial, empregado, avulso e eventual rurais, além dos membros do grupo familiar incluídos na categoria de segurado especial, nos termos do art. 11, inciso VII, da mesma Lei.
3. Até o advento da Lei nº 8.213/1991, pode ser reconhecida a prestação de serviço rural por menor a partir de doze anos de idade.
4. Para a comprovação do tempo de serviço rural, o § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 exige início de prova material, não admitindo prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. Súmula nº 149 e Tema nº 297 do STJ.
5. O início de prova material não está restrito ao rol de documentos contido no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, cujo cárater é meramente exemplificativo. Os documentos públicos nos quais consta a qualificação do declarante como agricultor possuem o mesmo valor probante dos meios de prova previstos na Lei nº 8.213/1991, sobretudo quando forem contemporâneos do período requerido.
6. Desde que os elementos documentais evidenciem o exercício do labor rural, não é necessário que se refiram a todo o período, ano por ano. A informalidade do trabalho no campo, quando realizado em regime de economia familiar, justifica a mitigação da exigência de prova documental.
7. É possível a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, para alcançar período anterior ou posterior aos documentos apresentados, se a prova testemunhal for favorável ao segurado. Súmula nº 577 do STJ.
8. Aceitam-se como início de prova material os documentos apresentados em nome de terceiros, desde que integrem o mesmo núcleo familiar. Entendimento consolidado na Súmula 73 desta Corte.
9. A prova oral complementa os subsídios colhidos dos elementos materiais de prova, devendo formar um conjunto probatório coerente, sem indício de desempenho de atividade laboral urbana no período.
10. Foram preenchidos os requisitos para a concessão de aposentadoria integral por tempo de contribuição, de acordo com a regra permanente do art. 201, § 7º, da Constituição Federal.
11. O art. 32 da Lei nº 8.213/1991 não trata da hipótese em que o segurado não satisfaz os requisitos para a concessão do benefício em nenhuma das atividades concomitantes. Diante da lacuna legal, deve ser adotado critério que reflita a realidade contributiva do segurado em todo o período considerado para a aposentadoria, calculando-se o salário de benefício com base nos salários de contribuição da atividade principal, assim considerada aquela que proporcionar maior proveito econômico no cálculo da renda mensal inicial, e somando-se a essa parcela o percentual da média dos salários de contribuição da atividade secundária.
12. É infundado o argumento de insuficiência da anotação na carteira de trabalho para efeito de averbação no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, visto que, na época, o segurado ocupava cargos públicos, sequer existindo anotação do vínculo na carteira de trabalho.
13. A Corte Suprema, no julgamento do RE 870.947/SE (Tema nº 810), realizado em 20/09/2017, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que determina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública pelos mesmos índices de remuneração oficial da caderneta de poupança.
14. A correção monetária das prestações vencidas deve observar a variação do IPCA-E, a partir de 30/06/2009.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária e dar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 14 de novembro de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9215128v8 e, se solicitado, do código CRC 81052AD7. | |
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APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de apelações interpostas contra sentença que julgou procedente o pedido para: a) reconhecer e determinar a averbação do período de trabalho rural exercido pelo autor entre 30/05/1970 a 29/05/1972; b) condenar o INSS a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição a partir da DER (31/05/2011), com a adoção dos critérios legais previstos no artigo 32, incisos II e III, da Lei nº 8.213/1991, a fim de compor o salário de benefício do segurado, considerando os oito anos de trabalho concomitante, incidindo uma única vez o fator previdenciário; c) condenar a autarquia a integrar ao CNIS as informações dos salários de contribuição de 01/01/1999 a 31/05/2002; d) condenar o INSS a pagar as parcelas vencidas até a data da implantação do benefício, com atualização monetária pelos índices oficiais e juros de mora a partir da citação, à taxa de 1% ao mês, devendo, a partir de 30/06/2009, os juros e a correção monetária ser calculados na forma do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997.
O autor pede a reforma da sentença, para que, no cálculo do salário de benefício, seja considerada principal a atividade que resultar em maior proveito econômico e acrescido o percentual correspondente à atividade secundária, nos termos do art. 32, incisos II e III, da Lei nº 8.213/1991, com aplicação do fator previdenciário uma única vez, após a soma das parcelas relativas à atividade principal e à secundária. Aduz, ainda, que o INSS deve observar o disposto no art. 29, incisos I e II, da Lei nº 8.213/1991, excluindo as 20% menores contribuições no cálculo do salário de benefício da atividade concomitante. Sustenta que a aplicação da TR na correção monetária do débito é inconstitucional, devendo incidir o INPC.
O INSS alega que a sentença reconheceu o exercício de atividade rural pela parte autora, apesar da inexistência de prova material apta e suficiente para a comprovação do tempo de serviço rural. Sustenta que devem ser apresentados documentos que possam servir como início razoável de prova material, nos termos dos artigos 55, § 3º, e 106 da Lei nº 8.213/1991. Aduz que somente se admite a prova testemunhal para fins de comprovação de tempo de serviço, quando corroborada por documentos contemporâneos aos fatos alegados. Além disso, deve haver início de prova material para a localidade e o grupo familiar ao qual pertenceu o requerente. No tocante à averbação dos salários de contribuição do período de 01/01/1999 a 31/05/2002 no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, esgrime que qualquer vínculo ou informação que, embora conste na CTPS, não esteja registrado no CNIS, somente pode ser considerado mediante comprovação documental, visto que a anotação em carteira de trabalho não constitui prova plena do exercício de atividade em relação à Previdência Social. Por fim, entende que não pode ser afastada a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009.
Com contrarrazões de ambas as partes, vieram os autos a esta Corte, ainda, por força da remessa necessária, nos termos do art. 475, inciso I, do antigo CPC.
É o relatório. Peço dia.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9215126v11 e, se solicitado, do código CRC AF29D780. | |
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APELADO | : | OS MESMOS |
VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/1991
Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Não obstante o marco final estabelecido seja a entrada em vigor da Lei nº 8.213/1991, o Decreto nº 3.048/1999, no art. 127, inciso V, estendeu a possibilidade de aproveitamento do tempo rural até 31/10/1991.
O legislador ordinário não concedeu uma benesse aos trabalhadores rurais, ao permitir o cômputo de serviço anterior à Lei nº 8.213/1991, mesmo sem o recolhimento de contribuições previdenciárias; apenas concretizou a norma do inciso II do parágrafo único do art. 194 da Constituição de 1988, que assegurou a uniformidade e a equivalência dos benefícios e serviços aos trabalhadores urbanos e rurais. No regime anterior à Lei nº 8.213/1991, os trabalhadores rurais contavam somente com o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL) instituído pela Lei Complementar nº 11/1971. Os beneficiários do PRORURAL, além do trabalhador rural que exercia a atividade individualmente ou em regime de economia familiar, eram o empregado rural (contratado por produtor rural pessoa física ou jurídica), o avulso rural (contratado mediante a intermediação de sindicato ou órgão gestor de mão de obra) e o trabalhador rural eventual (volante, diarista ou boia-fria). Os benefícios oferecidos pelo PRORURAL não requeriam o pagamento de contribuições, porém eram limitados e tipicamente assistenciais, não prevendo a aposentadoria por tempo de serviço. A regra do § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991, assim, objetiva conciliar a substancial diferença entre o velho e o novo regime previdenciário, no tocante à contagem de tempo de serviço.
Além de todos os beneficiários do antigo PRORURAL, o § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 abarca os membros do grupo familiar, visto que o art. 11, inciso VII, da Lei de Benefícios, define como segurado especial não só o produtor rural que exerce suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, mas também o cônjuge ou companheiro e filhos maiores de dezesseis anos ou a ele equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
A idade mínima de dezesseis anos referida no inciso VII do art. 11 da Lei de Benefícios considera a redação do inciso XXXIII do art. 7º da Constituição, dada pela Emenda Constitucional nº 20/1998. Em relação ao período anterior à Lei nº 8.213/1991, a jurisprudência admite o reconhecimento da atividade rural, em regime de economia familiar, exercida por menor a partir dos doze anos, pois as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para não prejudicá-lo. Colaciono julgado do STJ amparando esse entendimento:
AGRAVO INTERNO. PREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INOVAÇÃO NO ÂMBITO DO AGRAVO INTERNO. IMPOSSIBILIDADE. RURÍCOLA. LABOR DE MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
(...)
3. É firme neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido da possibilidade de cômputo do labor rural comprovadamente desempenhado por menor de doze anos de idade.
4. Agravo ao qual se nega provimento.
(AgRg no REsp 1150829/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 14/09/2010, DJe 04/10/2010)
Para a comprovação do tempo de serviço rural, o § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 exige início de prova material, não aceitando prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. A legalidade da norma é corroborada pela jurisprudência do STJ, consoante a Súmula nº 149: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário". Em julgado mais recente, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STJ reafirmou o entendimento no Tema nº 297 (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
Entende-se que a tarifação da prova imposta pelo § 3º do art. 55 da Lei de Benefícios dirige-se apenas à prova exclusivamente testemunhal. Portanto, o início de prova material não está restrito ao rol de documentos contido no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, cujo cárater é meramente exemplificativo. Qualquer meio material que evidencie a ocorrência de um fato, aceito no processo judicial, é hábil à demonstração do exercício da atividade rural. Dessa forma, os documentos públicos nos quais consta a qualificação do declarante como agricultor possuem o mesmo valor probante dos meios de prova previstos na Lei nº 8.213/1991, sobretudo quando forem contemporâneos do período requerido. Assim, representam início de prova material as certidões de casamento, nascimento, alistamento no serviço militar, do registro de imóveis e do INCRA, escritura de propriedade rural, histórico escolar, declaração da Secretaria de Educação, entre outros documentos públicos.
Desde que os elementos documentais evidenciem o exercício do labor rural, não é necessário que se refiram a todo o período, ano por ano. A informalidade do trabalho no campo justifica a mitigação da exigência de prova documental, presumindo-se a continuidade do exercício da atividade rural nos intervalos próximos ao período efetivamente documentado, até porque ocorre normalmente a migração do meio rural para o urbano e não o inverso. A extensão da validade do início da prova material foi objeto da Súmula nº 577 do STJ, in verbis: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". Não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de atividade rural, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória, tanto de forma retrospectiva como prospectiva.
É bem de ver que, para os trabalhadores eventuais, a comprovação do exercício de atividade rural é extremamente dificultosa, justamente porque o vínculo com o contratante dos serviços caracteriza-se pela não habitualidade. Executam as tarefas por curto período de tempo, normalmente um dia, razão pela qual são chamados volantes, diaristas ou boias-frias. São recrutados por agenciadores de mão de obra rural, os "gatos", muitas vezes sequer constituídos como pessoa jurídica. Compreende-se, então, que a escassez do início de prova material é mais um elemento distintivo das relações informais de trabalho do diarista rural. Dada sua peculiar circunstância e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de trabalhador rural diarista, o Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012), fixou a seguinte tese, relativamente ao trabalhador rural boia-fria:
TEMA 554: Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
No que diz respeito à comprovação do tempo de serviço rural prestado em regime de economia familiar, aceitam-se como início de prova material os documentos apresentados em nome de terceiros, desde que integrem o mesmo núcleo familiar. Eis o teor da Súmula 73 desta Corte: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Em suma, o exercício da atividade rural no período anterior à Lei nº 8.213/1991 pode ser comprovado por qualquer meio documental idôneo que propicie a formação de convencimento do julgador, não se exigindo a demonstração exaustiva dos fatos por todo o período requerido. O sistema de persuasão racional permite a livre valoração das provas, mas impõe ao juízo que examine a qualidade e a força probante do acervo colhido no processo, com base nas normas legais, motivando, assim, as razões pelas quais entendeu ou não comprovados os fatos. Nessa senda, a prova oral representa importante subsídio complementar ao início de prova material, devendo formar um conjunto probatório firme e coerente, sem indício de desempenho de atividade laboral urbana no período.
Caso concreto
A sentença acolheu o pedido de averbação do tempo de serviço exercido pelo parte autora no período de 30/05/1970 a 29/05/1972, por estar demonstrada a atividade rural em regime de economia familiar. Transcrevo a parte da sentença que analisa os elementos de prova juntados aos autos:
Com o fito de demonstrar a sua condição de segurado especial, o autor acostou:
a) Contrato Particular de Compromisso em nome de em nome de Orindo Belgamo, pai do requerente, constando aquisição de propriedade rural no ano de 1969;
b) Declarações de Rendimento e Recibos de Entrega de Declaração de Rendimento em nome de em nome de Orindo Belgamo, pai do requerente, referentes aos anos de 1969, 1970, 1971, 1972 e 1973, constando a profissão do mesmo como lavrador/agricultor, bem como consta o autor como seu dependente;
c) Escritura Pública de Compra e Venda em nome de Orindo Belgamo, pai do requerente, constando aquisição de propriedade rural no ano de 1974, bem como consta à profissão do mesmo como lavrador.
Tais documentos indicam o exercício de atividades laborais ligadas ao meio rural.
(...)
Além da prova documental carreada aos autos, a prova testemunhal produzida na instrução processual também corrobora o trabalho rural exercido no período, já que as testemunhas ouvidas confirmaram o labor rural. Ademais, já houve reconhecimento judicial dos períodos rurais laborados pelo autor entre 30/05/1972 a 30/05/1979 e de 15/10/1986 a 31/12/1996, o que demonstra a estrita ligação do autor com o trabalho do campo.
Conclui-se, dessa forma, que a parte Requerente tem direito à averbação do trabalho rural de 30/05/1970 a 29/05/1972, totalizando 01 ano, 11 meses, e 27 dias.
Sem razão o INSS, ao alegar que não existe prova material apta e suficiente para a comprovação do tempo de serviço rural. Em se tratando de trabalho em regime de economia familiar, os documentos em nome dos membros da família são válidos como início de prova material. Além de haver prova documental contemporânea ao período pleiteado, percebe-se a continuidade das lides rurícolas, visto que foi declarado, por sentença transitada em julgado, que o autor exerceu a atividade rural no período posterior (30/05/1972 a 30/05/1979 e 15/10/1986 a 31/12/1996). Cabe registrar que o INSS computou o tempo de serviço até 31/10/1991, já que o autor não recolheu as contribuições previdenciárias devidas após a vigência da Lei nº 8.213/1991.
No caso dos autos, o conjunto probatório está alicerçado em razoável início de prova material, complementado por prova testemunhal firme e coerente, hábil a produzir o convencimento quanto ao efetivo exercício do labor rural, sem interrupção, no período de 30/05/1970 (quando o autor completou doze anos) a 29/05/1972.
Requisitos para a concessão do benefício
O INSS reconheceu, na data do requerimento administrativo (31/05/2011), o tempo de contribuição de 33 anos e 09 dias e a carência de 256 meses.
O tempo de atividade rural (30/05/1970 a 29/05/1972) corresponde a 02 anos. A soma do tempo de serviço rural e urbano resulta em 35 anos e 09 dias de tempo de contribuição.
Assim, em 31/05/2011 (DER), a parte autora preencheu os requisitos para a concessão de aposentadoria integral por tempo de contribuição, de acordo com a regra permanente do art. 201, § 7º, da Constituição Federal, com a incidência do fator previdenciário.
Cálculo do salário de benefício - atividades concomitantes
O art. 32 da Lei nº 8.213/1991 estabelece dois critérios de cálculo do salário de benefício, quando o segurado exerceu atividades concomitantes:
Art. 32. O salário-de-benefício do segurado que contribuir em razão de atividades concomitantes será calculado com base na soma dos salários-de-contribuição das atividades exercidas na data do requerimento ou do óbito, ou no período básico de cálculo, observado o disposto no art. 29 e as normas seguintes:
I - quando o segurado satisfizer, em relação a cada atividade, as condições do benefício requerido, o salário-de-beneficio será calculado com base na soma dos respectivos salários-de-contribuição;
II - quando não se verificar a hipótese do inciso anterior, o salário-de-benefício corresponde à soma das seguintes parcelas:
a) o salário-de-benefício calculado com base nos salários-de-contribuição das atividades em relação às quais são atendidas as condições do benefício requerido;
b) um percentual da média do salário-de-contribuição de cada uma das demais atividades, equivalente à relação entre o número de meses completo de contribuição e os do período de carência do benefício requerido;
III - quando se tratar de benefício por tempo de serviço, o percentual da alínea b do inciso II será o resultante da relação entre os anos completos de atividade e o número de anos de serviço considerado para a concessão do benefício.
De acordo com o primeiro critério de cálculo do salário de benefício, os salários de contribuição serão somados, respeitando-se o teto contributivo, caso o segurado tenha reunido todas as condições para a concessão do benefício requerido em ambas as atividades.
Já o segundo critério de cálculo é aplicável quando o segurado preenche os requisitos para a concessão do benefício em relação a uma das atividades. Nesse caso, são calculadas duas parcelas que irão compor o salário de benefício: a primeira, denominada principal, é calculada com base nos salários de contribuição da atividade na qual são atendidos os requisitos legais; a segunda parcela, qualificada como secundária, resulta de um percentual da média dos salários de contribuição da outra atividade concomitante, considerando a proporção entre o número de anos trabalhados nessa atividade e o tempo de serviço exigido, cuidando-se de aposentadoria por tempo de contribuição.
Percebe-se que o dispositivo não trata da hipótese em que o segurado não satisfaz todos os requisitos para o benefício em nenhuma das atividades concomitantes. Embora o INSS considere como preponderante a atividade na qual o segurado tem mais tempo de filiação ou contribuição, esse critério não tem amparo legal. A solução que se mostra consentânea com os princípios que norteiam a relação previdenciária é a que reflete a realidade contributiva do segurado em todo o período considerado para a aposentadoria. Dessa forma, o critério a ser adotado é calcular o salário de benefício com base nos salários de contribuição da atividade principal, assim considerada aquela que proporcionar maior proveito econômico no cálculo da renda mensal inicial, e somar a essa parcela o percentual da média dos salários de contribuição da atividade secundária.
Nesse sentido, colaciono precedente do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÁLCULO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADES CONCOMITANTES. ATIVIDADE PRINCIPAL PARA CÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL. CRITÉRIO DO MAIOR PROVEITO ECONÔMICO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ.
1. O Tribunal a quo, ao interpretar o art. 32 da Lei 8.213/1991, aplicou entendimento no sentido de que a atividade considerada principal é a que resulta em maior proveito econômico ao segurado. Com efeito, o acórdão recorrido se encontra em sintonia com a jurisprudência do STJ.
2. Deve ser considerada como atividade principal, para fins de apuração do salário de benefício, aquela que gerará maior proveito econômico no cálculo da renda mensal inicial, tratando-se de hipótese em que o segurado não completou tempo de serviço suficiente para se aposentar em nenhuma das atividades concomitantes. Isto porque, diante da lacuna deixada pelo artigo 32 da Lei 8.213/1991, que não prevê, de forma expressa, a fórmula de cálculo dessa situação jurídica, devem ser observados os princípios que envolvem a ordem econômica e social previstas na Constituição, ambas fundadas na valorização e no primado do trabalho humano e na livre iniciativa, a fim de assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social.
3. Recurso Especial não provido.
(REsp 1664015/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 29/06/2017)
Cabe ressaltar, por fim, que o cálculo do salário de benefício de cada atividade concomitante deve resultar da média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inciso I, da Lei nº 8.213/1991, incidindo o fator previdenciário uma única vez, após a soma das parcelas relativas à atividade principal e à secundária.
Uma vez que o autor não preencheu as condições para a concessão do benefício em relação a nenhuma das atividades concomitantes, merece provimento o apelo, para que seja considerada como principal a atividade que resultar em maior proveito econômico, acrescida do percentual correspondente à atividade secundária, para o fim de cálculo do salário de benefício.
Registro dos salários de contribuição no CNIS
É infundado o argumento, vertido pelo INSS, de insuficiência da anotação na carteira de trabalho para efeito de averbação no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS.
No período cujo registro no CNIS foi determinado pela sentença (01/01/1999 a 31/05/2002), o autor pertencia ao quadro de servidores da Prefeitura do Município de Sabáudia/PR, inicialmente em cargo de provimento em comissão e após em cargo de provimento efetivo (evento 1, out17 e out18). Tratando-se de cargos públicos, sequer existe anotação do vínculo na carteira de trabalho. Outrossim, as fichas financeiras da Prefeitura em nome do autor, relativas aos anos de 1999 a 2002, comprovam o recolhimento de contribuições ao Regime Próprio de Previdência Social do Município e ao Regime Geral de Previdência Social, a partir de 01/06/2002. Portanto, nada a reparar na sentença.
Consectários legais
O juízo a quo determinou a aplicação dos índices de correção monetária e juros estabelecidos no art. 5º da Lei nº 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, a partir de 30/06/2009.
O Plenário do STF concluiu o julgamento do Tema 810, fixando as seguintes teses sobre a questão, consoante acompanhamento processual do RE 870.947 no Portal do STF:
"Ao final, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio, fixou as seguintes teses, nos termos do voto do Relator:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º,caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 20.9.2017. "
Como se pode observar, o Pretório Excelso não efetuou qualquer modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, em relação à correção monetária.
Assim, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos pela jurisprudência:
- INPC, de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei nº 10.741/2003, combinado com a Lei nº 11.430/2006, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei nº 8.213/91;
- IPCA-E, a partir de 30/06/2009, conforme a decisão no RE 870.947, julgado em 20/09/2017.
Os juros de mora são contados a partir da citação (Súmula 204 do STJ), no percentual de 1% ao mês, não capitalizado, até 29/06/2009. Desde 30/06/2009, são aplicáveis as disposições do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, utilizando-se a taxa de juros da caderneta de poupança.
Conclusão
Nego provimento à apelação do INSS e à remessa necessária.
Dou provimento à apelação do autor para: a) determinar que o INSS, no cálculo do salário de benefício da aposentadoria, considere como principal a atividade que resultar em maior proveito econômico, acrescida do percentual correspondente à atividade secundária; b) afastar a aplicação da TR na correção monetária das parcelas vencidas, devendo incidir o IPCA-E a partir de 30/06/2009.
Mantenho a condenação do INSS ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas (Súmula nº 111 do STJ).
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária e dar provimento à apelação do autor.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/11/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5040493-33.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00055298720138160045
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. João Heliofar Villar |
APELANTE | : | CLAUDEMIR APARECIDO BELGAMO |
ADVOGADO | : | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
: | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/11/2017, na seqüência 411, disponibilizada no DE de 30/10/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA NECESSÁRIA E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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