APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008386-33.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | PAULO RODRIGUES PEREIRA |
ADVOGADO | : | MICHEL CASARI BIUSSI |
: | CARLOS ALBERTO DOS SANTOS | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SEGURADO TRABALHADOR RURAL. TEMPO DE ATIVIDADE ANTERIOR À LEI Nº 8.213/1991. LIMITE DE IDADE. RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA ORAL HARMÔNICA E COERENTE. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência.
2. Estão abrangidos pelo disposto no § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 todos os beneficiários do antigo PRORURAL: segurado especial, empregado, avulso e eventual rurais, além dos membros do grupo familiar incluídos na categoria de segurado especial, nos termos do art. 11, inciso VII, da mesma Lei.
3. Até o advento da Lei nº 8.213/1991, pode ser reconhecida a prestação de serviço rural por menor a partir de doze anos de idade.
4. Para a comprovação do tempo de serviço rural, o § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 exige início de prova material, não admitindo prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. Súmula nº 149 e Tema nº 297 do STJ.
5. O início de prova material não está restrito ao rol de documentos contido no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, cujo cárater é meramente exemplificativo. Os documentos públicos nos quais consta a qualificação do declarante como agricultor possuem o mesmo valor probante dos meios de prova previstos na Lei nº 8.213/1991, sobretudo quando forem contemporâneos do período requerido.
6. A informalidade do trabalho no campo justifica a mitigação da exigência de prova documental, presumindo-se a continuidade do exercício da atividade rural nos intervalos próximos ao período efetivamente documentado.
7. O certificado de dispensa de incorporação conforma o lastro probatório mínimo exigido para a comprovação do tempo de serviço rural. O fato de a anotação relativa à atividade profissional de lavrador ter sido escrita a lápis não retira a sua força probante, visto que o registro foi realizado na época da expedição do documento.
8. É possível a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, para alcançar período anterior ou posterior aos documentos apresentados, se a prova testemunhal for favorável ao segurado. Súmula nº 577 do STJ.
9. A prova oral complementa os subsídios colhidos dos elementos materiais de prova, devendo formar um conjunto probatório coerente, sem indício de desempenho de atividade laboral urbana no período.
10. Foram preenchidos os requisitos para a aposentadoria integral por tempo de contribuição, conforme a regra permanente do art. 201, § 7º, da Constituição.
11. A Corte Suprema, no julgamento do RE 870.947/SE (Tema nº 810), reconheceu a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que determina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública pelos mesmos índices de remuneração oficial da caderneta de poupança.
12. São aplicáveis as disposições do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, no tocante à taxa de juros de mora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 17 de outubro de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008386-33.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | PAULO RODRIGUES PEREIRA |
ADVOGADO | : | MICHEL CASARI BIUSSI |
: | CARLOS ALBERTO DOS SANTOS | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de reconhecimento do tempo de serviço rural desenvolvido pelo autor no período de 24/05/1972 a 31/05/1980 e de condenação do INSS a conceder a aposentadoria por tempo de contribuição a partir do requerimento administrativo (05/03/2013) e a pagar as verbas em atraso.
O autor alega que foi apresentado início de prova material (certidão de nascimento em que o seu pai é qualificado como lavrador; certificado de dispensa de incorporação expedido em 1978, constando a profissão de lavrador; carteira de trabalho com primeiro registro em 1980 na fazenda pertencente à família Garbelini; carteira do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Santo Antônio da Platina/PR; certidão de nascimento dos filhos; certidão de casamento em que é qualificado como tratorista rural). Menciona jurisprudência admitindo a validade da anotação de atividade profissional feita a lápis no certificado de reservista, bem como a juntada de provas documentais durante a instrução processual e até mesmo na fase recursal. Defende a possibilidade de reconhecimento do labor rural a partir dos doze anos de idade. Aduz que as testemunhas confirmaram o trabalho do autor na lavoura no período requerido, de modo coeso e firme. Sustenta que a prova testemunhal deve ser avaliada em conjunto com a prova material.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório. Peço dia.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008386-33.2015.4.04.9999/PR
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VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/1991
Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Não obstante o marco final estabelecido seja a entrada em vigor da Lei nº 8.213/1991, o Decreto nº 3.048/1999, no art. 127, inciso V, estendeu a possibilidade de aproveitamento do tempo rural até 31/10/1991.
O legislador ordinário não concedeu uma benesse aos trabalhadores rurais, ao permitir o cômputo de serviço anterior à Lei nº 8.213/1991, mesmo sem o recolhimento de contribuições previdenciárias; apenas concretizou a norma do inciso II do parágrafo único do art. 194 da Constituição de 1988, que assegurou a uniformidade e a equivalência dos benefícios e serviços aos trabalhadores urbanos e rurais. No regime anterior à Lei nº 8.213/1991, os trabalhadores rurais contavam somente com o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL) instituído pela Lei Complementar nº 11/1971. Os beneficiários do PRORURAL, além do trabalhador rural que exercia a atividade individualmente ou em regime de economia familiar, eram o empregado rural (contratado por produtor rural pessoa física ou jurídica), o avulso rural (contratado mediante a intermediação de sindicato ou órgão gestor de mão de obra) e o trabalhador rural eventual (volante, diarista ou boia-fria). Os benefícios oferecidos pelo PRORURAL não requeriam o pagamento de contribuições, porém eram limitados e tipicamente assistenciais, não prevendo a aposentadoria por tempo de serviço. A regra do § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991, assim, objetiva conciliar a substancial diferença entre o velho e o novo regime previdenciário, no tocante à contagem de tempo de serviço.
Além de todos os beneficiários do antigo PRORURAL, o § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 abarca os membros do grupo familiar, visto que o art. 11, inciso VII, da Lei de Benefícios, define como segurado especial não só o produtor rural que exerce suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, mas também o cônjuge ou companheiro e filhos maiores de dezesseis anos ou a ele equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
A idade mínima de dezesseis anos referida no inciso VII do art. 11 da Lei de Benefícios considera a redação do inciso XXXIII do art. 7º da Constituição, dada pela Emenda Constitucional nº 20/1998. Em relação ao período anterior à Lei nº 8.213/1991, a jurisprudência admite o reconhecimento da atividade rural, em regime de economia familiar, exercida por menor a partir dos doze anos, pois as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para não prejudicá-lo. Colaciono julgado do STJ amparando esse entendimento:
AGRAVO INTERNO. PREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INOVAÇÃO NO ÂMBITO DO AGRAVO INTERNO. IMPOSSIBILIDADE. RURÍCOLA. LABOR DE MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
(...)
3. É firme neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido da possibilidade de cômputo do labor rural comprovadamente desempenhado por menor de doze anos de idade.
4. Agravo ao qual se nega provimento.
(AgRg no REsp 1150829/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 14/09/2010, DJe 04/10/2010)
Para a comprovação do tempo de serviço rural, o § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 exige início de prova material, não aceitando prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. A legalidade da norma é corroborada pela jurisprudência do STJ, consoante a Súmula nº 149: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário". Em julgado mais recente, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STJ reafirmou o entendimento no Tema nº 297 (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
Entende-se que a tarifação da prova imposta pelo § 3º do art. 55 da Lei de Benefícios dirige-se apenas à prova exclusivamente testemunhal. Portanto, o início de prova material não está restrito ao rol de documentos contido no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, cujo cárater é meramente exemplificativo. Qualquer meio material que evidencie a ocorrência de um fato, aceito no processo judicial, é hábil à demonstração do exercício da atividade rural. Dessa forma, os documentos públicos nos quais consta a qualificação do declarante como agricultor possuem o mesmo valor probante dos meios de prova previstos na Lei nº 8.213/1991, sobretudo quando forem contemporâneos do período requerido. Assim, representam início de prova material as certidões de casamento, nascimento, alistamento no serviço militar, do registro de imóveis e do INCRA, escritura de propriedade rural, histórico escolar, declaração da Secretaria de Educação, entre outros documentos públicos.
Desde que os elementos documentais evidenciem o exercício do labor rural, não é necessário que se refiram a todo o período, ano por ano. A informalidade do trabalho no campo justifica a mitigação da exigência de prova documental, presumindo-se a continuidade do exercício da atividade rural nos intervalos próximos ao período efetivamente documentado, até porque ocorre normalmente a migração do meio rural para o urbano e não o inverso. A extensão da validade do início da prova material foi objeto da Súmula nº 577 do STJ, in verbis: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". Não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de atividade rural, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória, tanto de forma retrospectiva como prospectiva.
É bem de ver que, para os trabalhadores eventuais, a comprovação do exercício de atividade rural é extremamente dificultosa, justamente porque o vínculo com o contratante dos serviços caracteriza-se pela não habitualidade. Executam as tarefas por curto período de tempo, normalmente um dia, razão pela qual são chamados volantes, diaristas ou boias-frias. São recrutados por agenciadores de mão de obra rural, os "gatos", muitas vezes sequer constituídos como pessoa jurídica. Compreende-se, então, que a escassez do início de prova material é mais um elemento distintivo das relações informais de trabalho do diarista rural. Dada sua peculiar circunstância e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de trabalhador rural diarista, o Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012), fixou a seguinte tese, relativamente ao trabalhador rural boia-fria:
TEMA 554: Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
No que diz respeito à comprovação do tempo de serviço rural prestado em regime de economia familiar, aceitam-se como início de prova material os documentos apresentados em nome de terceiros, desde que integrem o mesmo núcleo familiar. Eis o teor da Súmula 73 desta Corte: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Em suma, o exercício da atividade rural no período anterior à Lei nº 8.213/1991 pode ser comprovado por qualquer meio documental idôneo que propicie a formação de convencimento do julgador, não se exigindo a demonstração exaustiva dos fatos por todo o período requerido. O sistema de persuasão racional permite a livre valoração das provas, mas impõe ao juízo que examine a qualidade e a força probante do acervo colhido no processo, com base nas normas legais, motivando, assim, as razões pelas quais entendeu ou não comprovados os fatos. Nessa senda, a prova oral representa importante subsídio complementar ao início de prova material, devendo formar um conjunto probatório firme e coerente, sem indício de desempenho de atividade laboral urbana no período.
Caso concreto
A parte autora pleiteou o reconhecimento e a averbação do tempo de atividade rural exercido entre 24/05/1972 a 31/05/1980, em estabelecimento agrícola no Município de Santo Antônio da Platina/PR.
A título de início de prova material, foram juntados aos autos os seguintes documentos:
a) certidão de nascimento do autor em 24/05/1960, em que o pai é qualificado como lavrador (evento 50, out2);
b) certificado de dispensa de incorporação do autor, expedido pelo Ministério do Exército em 16/10/1978, constando a profissão de lavrador e a residência em Santo Antônio da Platina (evento 49, out2);
c) certidão de casamento do autor, ocorrido em 04/09/1982, em que é qualificado como tratorista;
d) certidão de nascimento dos filhos do autor, em 09/07/1985 e 12/06/1990, em que o pai é qualificado como tratorista;
d) carteira do Sindicato de de Trabalhadores Rurais de Santo Antônio da Platina/PR, constando a admissão do autor em 25/04/1985;
e) carteira de trabalho do autor, com anotação de vínculo empregatício na data de 02/06/1981, na Fazenda São Geraldo, pertencente a Antônio Garbelini e outros, situada no Município de Santo Antônio da Platina/PR (o INSS não considerou a data de 01/06/1980, em razão de haver rasura na anotação).
Em juízo, foram ouvidas três testemunhas e colhido o depoimento pessoal do autor. Em síntese, as testemunhas (Nilson Saturnino, Ézio Aparecido Batistute e Cirso Aparecido Bertasse) afirmaram que conheceram o autor na Fazenda São Geraldo; ele começou a trabalhar por volta dos onze, doze anos, no cultivo de café. Os pais do autor eram empregados da fazenda pertencente aos Garbelini e moravam na propriedade. O autor ia trabalhar junto com os pais na lavoura, porém não era registrado como empregado. O pagamento era mensal, mas quem recebia o salário eram os pais, porque a carteira de trabalho dos filhos menores não era assinada. Muitas famílias moravam na fazenda e levavam os filhos para trabalhar na lavoura. O relato do autor, por sua vez, está em consonância com os fatos narrados pelas testemunhas, acrescentando que continuou a morar na fazenda após o casamento e passou a ter registro na carteira de trabalho em torno dessa época.
O certificado de dispensa de incorporação com data de 1978 conforma o lastro probatório mínimo exigido para a comprovação do tempo de serviço rural no período pleiteado. O fato de a anotação relativa à atividade profissional de lavrador ter sido escrita a lápis não retira a sua força probante, visto que o registro foi realizado na época da expedição do documento. Nesse sentido, já decidiu esta Corte (APELREEX 2004.70.00.024176-0, Quinta Turma, Relator João Batista Lazzari, D.E. 17/08/2009). Ademais, mesmo que o documento tenha sido juntado somente em fase recursal, o INSS não apresentou qualquer impugnação, ao oferecer contrarrazões.
Em que pese a inexistência de prova documental relativa a cada ano de atividade rural, é possível a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, visto que as testemunhas, de modo uníssono, relataram que o autor, juntamente com os pais, trabalhou como empregado na Fazenda São Geraldo desde criança, havendo anotação do vínculo empregatício apenas a partir de 02/06/1981. A esse respeito, colho julgado do STJ:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. O Tribunal a quo ao afirmar que não há início razoável de prova material devidamente corroborada pela prova testemunhal, aplicou a jurisprudência do STJ consolidada no sentido de que: 1) a prova testemunhal deve ser conjugada com início de prova material; 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória.
2. A revisão do entendimento firmado pelo Tribunal a quo, que afirmou a inexistência de um conjunto probatório harmônico acerca do efetivo exercício de atividade rural, encontra óbice na Súmula 7/STJ.
3. Consoante jurisprudência do STJ, a análise do dissídio jurisprudencial fica prejudicada em razão da aplicação da Súmula 7/STJ, porquanto não é possível encontrar similitude fática entre o acórdão combatido e os arestos paradigmas, uma vez que as suas conclusões díspares ocorreram, não em razão de entendimentos diversos sobre uma mesma questão legal, mas, sim, em razão de fundamentações baseadas em fatos, provas e circunstâncias específicas de cada processo.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014)
No caso dos autos, os elementos documentais, aliados à prova testemunhal firme e coerente, produzem o convencimento quanto ao efetivo exercício do labor rural pelo autor. Por conseguinte, reconheço o tempo de atividade rural no período de 24/05/1972 (quando o autor completou doze anos) a 31/05/1980 e determino a sua averbação para o fim de concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Requisitos para a concessão do benefício
O INSS reconheceu no processo administrativo o tempo de contribuição correspondente a 30 anos, 09 meses e 19 dias e a carência de 373 meses.
O tempo de atividade rural do autor (24/05/1972 a 31/05/1980) perfaz 08 anos e 08 dias. A soma do tempo de serviço rural e urbano resulta em 38 anos, 09 meses e 27 dias de tempo de contribuição.
Nessas condições, a parte autora, em 16/12/1998, não tinha direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não preenchia o tempo mínimo de serviço (30 anos). Posteriormente, em 28/11/1999, não atendia o tempo mínimo de contribuição (30 anos), a idade (53 anos) e o pedágio (1 ano, 11 meses e 11 dias).
Por fim, na data do requerimento administrativo (05/03/2013), o autor preencheu os requisitos para a aposentadoria integral por tempo de contribuição, conforme a regra permanente do art. 201, § 7º, da Constituição, com a incidência do fator previdenciário instituído pela Lei nº 9.876/1999.
Consectários legais
O Plenário do STF concluiu o julgamento do Tema 810, fixando as seguintes teses sobre a questão, consoante acompanhamento processual do RE 870.947 no Portal do STF:
"Ao final, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio,fixou as seguintes teses, nos termos do voto do Relator:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º,caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 20.9.2017. "
Como se pode observar, o Pretório Excelso não efetuou qualquer modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, em relação à correção monetária.
Assim, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos pela jurisprudência:
- INPC, de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei nº 10.741/2003, combinado com a Lei nº 11.430/2006, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei nº 8.213/91;
- IPCA-E, a partir de 30/06/2009, conforme a decisão no RE 870.947, julgado em 20/09/2017.
Os juros de mora são contados a partir da citação (Súmula 204 do STJ), no percentual de 1% ao mês, não capitalizado, até 29/06/2009. Desde 30/06/2009, são aplicáveis as disposições do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, utilizando-se a taxa de juros da caderneta de poupança.
Conclusão
Dou provimento à apelação do autor para: a) reconhecer o tempo de atividade rural no período de 24/05/1972 a 31/05/1980 e determinar a sua averbação para o fim de obtenção de benefício previdenciário; b) condenar o INSS a conceder ao autor a aposentadoria integral por tempo de contribuição, a partir de 05/03/2013, e a pagar as prestações vencidas com atualização monetária e juros de mora, na forma da fundamentação.
Restando o INSS sucumbente na lide, deve arcar com as custas processuais e os honorários advocatícios, fixados em conformidade com o artigo 85 do CPC, aplicáveis em grau mínimo os percentuais estabelecidos no parágrafo 3º desse artigo. A verba honorária deve incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, nos termos da Súmula n° 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula n° 76 deste TRF.
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento à apelação do autor.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/10/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008386-33.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00026446720138160153
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. João Heliofar Villar |
APELANTE | : | PAULO RODRIGUES PEREIRA |
ADVOGADO | : | MICHEL CASARI BIUSSI |
: | CARLOS ALBERTO DOS SANTOS | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/10/2017, na seqüência 244, disponibilizada no DE de 28/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Suzana Roessing, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9213533v1 e, se solicitado, do código CRC 57F602B2. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Suzana Roessing |
| Data e Hora: | 18/10/2017 15:41 |
