APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5050168-20.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LINDAURA LEIRIAS DE ALMEIDA ZINI |
ADVOGADO | : | ANA GRACIELI ANTONIAZZI TERLECKI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SEGURADO TRABALHADOR RURAL. TEMPO DE ATIVIDADE ANTERIOR À LEI Nº 8.213/1991. RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL. COMPROVAÇÃO DE PARTE DO PERÍODO REQUERIDO. ATIVIDADE URBANA INTERCALADA COM RURAL. DOCUMENTOS EM NOME DE TERCEIROS. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PROVA ORAL HARMÔNICA E COERENTE. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência.
2. Estão abrangidos pelo disposto no § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 todos os beneficiários do antigo PRORURAL: segurado especial, empregado, avulso e eventual rurais, além dos membros do grupo familiar incluídos na categoria de segurado especial, nos termos do art. 11, inciso VII, da mesma Lei.
3. Para a comprovação do tempo de serviço rural, o § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 exige início de prova material, não admitindo prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. Súmula nº 149 e Tema nº 297 do STJ.
4. O início de prova material não está restrito ao rol de documentos contido no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, cujo cárater é meramente exemplificativo. Os documentos públicos nos quais consta a qualificação do declarante como agricultor possuem o mesmo valor probante dos meios de prova previstos na Lei nº 8.213/1991, sobretudo quando forem contemporâneos do período requerido.
5. Desde que os elementos documentais evidenciem o exercício do labor rural, não é necessário que se refiram a todo o período, ano por ano. A informalidade do trabalho no campo, quando realizado em regime de economia familiar, justifica a mitigação da exigência de prova documental.
6. É possível a ampliação da eficácia probatória do início de prova material, para alcançar período anterior ou posterior aos documentos apresentados, se a prova testemunhal for favorável ao segurado. Súmula nº 577 do STJ.
7. Aceitam-se como início de prova material os documentos apresentados em nome de terceiros, desde que integrem o mesmo núcleo familiar. Entendimento consolidado na Súmula 73 desta Corte.
8. Havendo vínculos urbanos intercalados com períodos rurais, não é possível presumir a continuidade da atividade rural. É imperioso apresentar documentos demonstrando o efetivo exercício do labor rurícola, após cada período de atividade urbana.
9. A qualificação de lavrador do marido é extensível à esposa, diante da realidade e das condições em que são exercidas as atividades rurais.
10. As provas existentes nos autos, tanto a documental como a oral, demonstram que a parte autora não exerceu a atividade rural em regime de economia familiar em todo o lapso temporal pleiteado. Em relação à parte do período requerido, o conjunto probatório está alicerçado em razoável início de prova material, complementado por prova testemunhal firme e coerente, hábil a produzir o convencimento quanto ao efetivo exercício do labor rural, na condição de segurado especial.
11. Foram preenchidos os requisitos para a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regra transitória da EC nº 20/1998).
12. A Corte Suprema, no julgamento do RE 870.947/SE (Tema nº 810), realizado em 20/09/2017, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que determina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública pelos mesmos índices de remuneração oficial da caderneta de poupança.
13. A correção monetária das prestações vencidas deve observar a variação do IPCA-E, a partir de 30/06/2009.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária e, de ofício, determinar a correção monetária das parcelas vencidas pelo IPCA-E, a partir de 30/06/2009, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 14 de novembro de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9213368v9 e, se solicitado, do código CRC 169CEFD. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5050168-20.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LINDAURA LEIRIAS DE ALMEIDA ZINI |
ADVOGADO | : | ANA GRACIELI ANTONIAZZI TERLECKI |
RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente o pedido para o fim de: a) reconhecer o trabalho rural da autora, em regime de economia familiar, nos períodos de 15/04/1968 a 31/07/1977 e de 31/01/1982 a 14/02/1988; b) condenar o INSS a conceder à autora o benefício da aposentadoria integral por tempo de contribuicão, a partir do requerimento administrativo (27/03/2009), observando-se o lapso prescricional, com correção monetária pelo INPC e juros de mora a contar da citação no percentual de 1% ao mês e, a partir de 30/06/2009, no mesmo índice aplicado à caderneta de poupança.
O INSS alega que não há início de prova material idôneo a demonstrar o efetivo labor na condição de segurado especial no período pretendido. Aponta que a parte autora juntou nos autos do processo administrativo, dentre outros documentos, a certidão de casamento, lavrada em 26/04/1980, constando sua profissão como professora, e a certidão de tempo de serviço expedida em 2008 pela Prefeitura Municipal de Catanduvas. Aduz que a autora, no depoimento pessoal, afirmou haver exercido atividade rural, junto com os pais e os irmãos, desde os 10 anos de idade, permanecendo com a família até os 13 ou 14 anos e, após esse período, deixou de trabalhar na roça para estudar e retornou às lides campesinas quando tinha uns 22 ou 23 anos, mas não em período integral, pois exercia também o ofício de professora; declarou a autora ainda que abandonou a profissão em 2000, passando a laborar na fazenda do Sr. Gelson, como empregada registrada. Sustenta que a presunção de continuidade do labor rural não pode prevalecer quando há lacuna de vários anos entre as provas materiais carreadas aos autos. Esgrime que o início de prova material deve observar o disposto no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, sendo necessário apresentar a declaração sindical do exercício da atividade rural. Argumenta que, havendo outras fontes de renda além da atividade rural, descaracterizado está o regime de economia familiar. Por fim, pede que seja determinada a aplicação da Lei nº 11.960/2009, com a incidência da TR para fins de correção monetária, asseverando que a declaração de inconstitucionalidade nas ADI 4.357 e 4.425 dizem respeito apenas ao índice de correção dos créditos no período de trâmite constitucional do precatório.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte, ainda, por força da remessa necessária, nos termos do art. 475, inciso I, do antigo CPC.
É o relatório. Peço dia.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9213366v17 e, se solicitado, do código CRC 604A9EB2. | |
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VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/1991
Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Não obstante o marco final estabelecido seja a entrada em vigor da Lei nº 8.213/1991, o Decreto nº 3.048/1999, no art. 127, inciso V, estendeu a possibilidade de aproveitamento do tempo rural até 31/10/1991.
O legislador ordinário não concedeu uma benesse aos trabalhadores rurais, ao permitir o cômputo de serviço anterior à Lei nº 8.213/1991, mesmo sem o recolhimento de contribuições previdenciárias; apenas concretizou a norma do inciso II do parágrafo único do art. 194 da Constituição de 1988, que assegurou a uniformidade e a equivalência dos benefícios e serviços aos trabalhadores urbanos e rurais. No regime anterior à Lei nº 8.213/1991, os trabalhadores rurais contavam somente com o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL) instituído pela Lei Complementar nº 11/1971. Os beneficiários do PRORURAL, além do trabalhador rural que exercia a atividade individualmente ou em regime de economia familiar, eram o empregado rural (contratado por produtor rural pessoa física ou jurídica), o avulso rural (contratado mediante a intermediação de sindicato ou órgão gestor de mão de obra) e o trabalhador rural eventual (volante, diarista ou boia-fria). Os benefícios oferecidos pelo PRORURAL não requeriam o pagamento de contribuições, porém eram limitados e tipicamente assistenciais, não prevendo a aposentadoria por tempo de serviço. A regra do § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991, assim, objetiva conciliar a substancial diferença entre o velho e o novo regime previdenciário, no tocante à contagem de tempo de serviço.
Além de todos os beneficiários do antigo PRORURAL, o § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 abarca os membros do grupo familiar, visto que o art. 11, inciso VII, da Lei de Benefícios, define como segurado especial não só o produtor rural que exerce suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, mas também o cônjuge ou companheiro e filhos maiores de dezesseis anos ou a ele equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
A idade mínima de dezesseis anos referida no inciso VII do art. 11 da Lei de Benefícios considera a redação do inciso XXXIII do art. 7º da Constituição, dada pela Emenda Constitucional nº 20/1998. Em relação ao período anterior à Lei nº 8.213/1991, a jurisprudência admite o reconhecimento da atividade rural, em regime de economia familiar, exercida por menor a partir dos doze anos, pois as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para não prejudicá-lo. Colaciono julgado do STJ amparando esse entendimento:
AGRAVO INTERNO. PREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INOVAÇÃO NO ÂMBITO DO AGRAVO INTERNO. IMPOSSIBILIDADE. RURÍCOLA. LABOR DE MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
(...)
3. É firme neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido da possibilidade de cômputo do labor rural comprovadamente desempenhado por menor de doze anos de idade.
4. Agravo ao qual se nega provimento.
(AgRg no REsp 1150829/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 14/09/2010, DJe 04/10/2010)
Para a comprovação do tempo de serviço rural, o § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 exige início de prova material, não aceitando prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. A legalidade da norma é corroborada pela jurisprudência do STJ, consoante a Súmula nº 149: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário". Em julgado mais recente, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STJ reafirmou o entendimento no Tema nº 297 (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
Entende-se que a tarifação da prova imposta pelo § 3º do art. 55 da Lei de Benefícios dirige-se apenas à prova exclusivamente testemunhal. Portanto, o início de prova material não está restrito ao rol de documentos contido no art. 106 da Lei nº 8.213/1991, cujo cárater é meramente exemplificativo. Qualquer meio material que evidencie a ocorrência de um fato, aceito no processo judicial, é hábil à demonstração do exercício da atividade rural. Dessa forma, os documentos públicos nos quais consta a qualificação do declarante como agricultor possuem o mesmo valor probante dos meios de prova previstos na Lei nº 8.213/1991, sobretudo quando forem contemporâneos do período requerido. Assim, representam início de prova material as certidões de casamento, nascimento, alistamento no serviço militar, do registro de imóveis e do INCRA, escritura de propriedade rural, histórico escolar, declaração da Secretaria de Educação, entre outros documentos públicos.
Desde que os elementos documentais evidenciem o exercício do labor rural, não é necessário que se refiram a todo o período, ano por ano. A informalidade do trabalho no campo justifica a mitigação da exigência de prova documental, presumindo-se a continuidade do exercício da atividade rural nos intervalos próximos ao período efetivamente documentado, até porque ocorre normalmente a migração do meio rural para o urbano e não o inverso. A extensão da validade do início da prova material foi objeto da Súmula nº 577 do STJ, in verbis: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". Não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de atividade rural, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória, tanto de forma retrospectiva como prospectiva.
É bem de ver que, para os trabalhadores eventuais, a comprovação do exercício de atividade rural é extremamente dificultosa, justamente porque o vínculo com o contratante dos serviços caracteriza-se pela não habitualidade. Executam as tarefas por curto período de tempo, normalmente um dia, razão pela qual são chamados volantes, diaristas ou boias-frias. São recrutados por agenciadores de mão de obra rural, os "gatos", muitas vezes sequer constituídos como pessoa jurídica. Compreende-se, então, que a escassez do início de prova material é mais um elemento distintivo das relações informais de trabalho do diarista rural. Dada sua peculiar circunstância e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de trabalhador rural diarista, o Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012), fixou a seguinte tese, relativamente ao trabalhador rural boia-fria:
TEMA 554: Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
No que diz respeito à comprovação do tempo de serviço rural prestado em regime de economia familiar, aceitam-se como início de prova material os documentos apresentados em nome de terceiros, desde que integrem o mesmo núcleo familiar. Eis o teor da Súmula 73 desta Corte: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Em suma, o exercício da atividade rural no período anterior à Lei nº 8.213/1991 pode ser comprovado por qualquer meio documental idôneo que propicie a formação de convencimento do julgador, não se exigindo a demonstração exaustiva dos fatos por todo o período requerido. O sistema de persuasão racional permite a livre valoração das provas, mas impõe ao juízo que examine a qualidade e a força probante do acervo colhido no processo, com base nas normas legais, motivando, assim, as razões pelas quais entendeu ou não comprovados os fatos. Nessa senda, a prova oral representa importante subsídio complementar ao início de prova material, devendo formar um conjunto probatório firme e coerente, sem indício de desempenho de atividade laboral urbana no período.
Caso concreto
A sentença acolheu o pedido de averbação do tempo de serviço exercido pela parte autora nos períodos de 15/04/1968 a 31/07/1977 e de 31/01/1982 a 14/02/1988, por estar demonstrada a atividade rural em regime de economia familiar. Transcrevo a parte da sentença que analisa os elementos de prova juntados aos autos:
No caso do presente feito, há provas de que o exercício da atividade rural se desenvolvia pelo regime de economia familiar.
Não obstante a tese de defesa do INSS seja a inexistência de documentos a corroborar o labor rural, veja-se que a autora juntou ao processo sua certidão de casamento com Fiorindo Zini, em data de 26.04.1980, na qual ele foi qualificado como agricultor e ela como professora (evento 40.2); certidão de tempo de serviço expedida pela Prefeitura Municipal de Catanduvas, em nome da autora, na qual constam vínculos na função de professora nos períodos de 01.08.1977 a 30.01.1982, 15.02.1988 a 18.04.1993 e 19.04.1993 a 05.02.2001 (evento 40.2); boletim escolar em nome da autora, dos anos de 1963, 1964, 1965, 1966, 1967, 1968 nos quais consta o pai da autora como lavrador/agricultor (evento 40.3); notas fiscais de produtor rural em nome do marido da autora, Fiorindo Zini, dos anos de 1983, 1984, 1985,1989, 1990, 1991 e 1992 (evento 40.3 e seguintes); notas fiscais de produtor rural em nome do sogro da autora, Afonso Zini, dos anos de 1986, 1989, 1994, 1998 (evento 40.4 e seguintes); comprovante de luz em nome do marido da autora, no endereço "Região Tibagi", dos anos de 1987, 1988, 1989 (evento 40.4); carteira de identidade de beneficiário da autora, como trabalhadora rural, referente aos anos de 1988, 1989 e 1990 (evento 40.4); planejamento individual da propriedade em nome do sogro da autora (evento 40.4); recibo de empresa de serviços de mecanizações, em nome do marido da autora, do ano de 1990 (evento 40.4); contrato de arrendamento agrícola firmado entre o sogro da autora e o marido da autora, no periodo de 18.04.1990 a 30.06.1995 (evnto 40,4); nota de crédito rural em nome do marido da autora, com data de 08.09.1999 (evento 40.5); matrícula de imóvel rural em nome do sogro da autora, do ano de 1977 (evento 40.5).
Portanto, a alegação de inexistência de início de prova material é órfã, haja vista os documentos apresentados.
Além disso, a informante e testemunha inquiridas durante a instrução corroboraram o início de prova, confirmando que a autora trabalhou na agricultura e tendo como uma das fontes de renda o trabalho rurícola para os períodos que pretende o reconhecimento.
Em seu depoimento pessoal a autora Lindaura Leirias de Almeida Zini, afirmou: "que está com 59 anos; que começou a trabalhar na zona rural com uns 9 ou 10 anos; que estudava e também já trabalhava na roça; que estudava no período da manhã e trabalhava na parte da tarde na roça; que os terrenos que trabalhavam eram em Santa Catarina; que seu pai arrendava terrenos de 6 a 7 alqueires em média; que trabalhavam ela, seus pais e 16 irmãos; que ela ficou trabalhando com seu pai até os 13 ou 14 anos; que nas terras que seu pai arrendava não havia maquinários nem empregados; que depois foi só estudar; que retornou ao trabalho rural com uns 22 ou 23 anos; que casou com 23 anos, e daí dava aula e trabalhava meio período na roça; que começou a trabalhar como professora em 1977, e meio período trabalhava na roça; que trabalhava na terra do seu falecido sogro, Afonso Zini; que plantava em um terreno de 2 alqueires e meio, com seu ex-marido, Fiorino Zini; que não tinham empregados nem maquinários; que plantavam para o sustento e o que sobrava vendiam; que ficou trabalhando nesta situação, como agricultora e professora, de 1977 até 2000; que depois mudou para uma fazenda e abandonou o trabalho na escola; que continuou trabalhando na agricultura, com leite, horta, nesta fazenda que era de Gelson; que neste periodo que trabalhou na fazenda era registrada, foi uns 3 ou 4 anos; que ficou nesta fazenda até 2007; que em 2007 foi morar na vila onde reside até hoje, mas não desenvolve mais trabalho de agricultura; que continua trabalhando, mas com outra atividade".
A informante Cecília Alexandre dos Santos, disse: "que conhece a autora desde pequena, da região de Água Doce, Santa Catarina; que a autora começou a trabalhar na agricultura com uns 7 ou 8 anos; que a autora trabalhava na terra que o pai dela arrendava; que o pai da autora se chama Leodario; que os terrenos eram de 5 alqueires; que plantavam arroz, feijão e milho; que trabalhavam a autora, os pais e 16 irmãos; que eles não tinham empregados nem maquinários; que a autora ficou trabalhando nestes arrendamentos do pai dela até os 12 anos; que depois ela começou a trabalhar de doméstica; que a autora retornou ao trabalho na agricultura e lecionava; que não sabe informar certo quanto tempo depois; que a escola que a autora lecionava era na roça, ela lecionava meio período e meio período ela trabalhava na roça; que ela trabalhava na terra do sogro, Afonso Zini; que não sabe quantos alqueires tinha o terreno do sogro; que a autora trabalhava na roça com ajuda do marido e filhos; que eles não tinham empregados nem maquinários; que a autora trabalhou na roça até pouco tempo; que hoje em dia a autora trabalhava na vila, mas não está trabalhando na roça".
Por fim a testemunha Fiorindo Luiz Turcatto, disse: "que a autora morava em Catanduvas, e trabalhava na roça na época em que conheceu ela; que acha que a terra era do sogro dela; que a autora plantava milho, feijão; que eles não tinham empregados nem maquinários; que não lembra em que época a autora foi para Catanduvas; que a autora ficou lá até uns 10 anos atrás; que depois a autora se formou e foi dar aula; que a autora tinha ajuda da família dela".
(...)
É possivel reconhecer o labor campesino no período requerido pela autora, uma vez que se encontram anexados ao processo documentos que comprovam que sua família origina-se da agricultura.
Assim, é possivel reconhecer a atividade rural em regime de economia familiar nos períodos de 15/04/1968 a 31/07/1977 e 31/01/1982 a 14/02/1988.
Desse modo, resta devidamente comprovado o trabalho agrícola desenvolvido pela parte autora, em regime de economia familiar, o qual deve ser averbado pelo INSS.
Assiste razão em parte ao INSS. A própria autora, no depoimento pessoal, disse que exerceu a atividade rural com a família até os 13/14 anos e depois passou somente a estudar, retornando ao trabalho rural com 22/23 anos. A informante Cecília Alexandre dos Santos corroborou os fatos narrados pela autora, dizendo que ela ficou laborando na terra arrendada pelo pai até os 12 anos e após ela começou a trabalhar como doméstica; informou, ainda, que a autora voltou a exercer a atividade rural, enquanto lecionava. Considerando que a autora nasceu em 15/04/1956, ela teria deixado as lides rurais em 1968 ou 1969, para dedicar-se somente aos estudos ou, conforme a informante Cecília dos Santos, trabalhar como doméstica. No boletim escolar da autora, consta a informação de que ela deixou de frequentar a Escola Municipal da Linha Santo Antônio, em Água Doce/SC, em 28/05/1968, devido à mudança de residência (evento 40, out3, fl. 09), o que confirma os fatos narrados pela autora e pela informante. Por sua vez, o retorno da autora à atividade rurícola teria ocorrido em 1978 ou 1979, período em que ela já estava empregada como professora no Município de Catanduvas, segundo os dados da certidão de tempo de serviço (evento 40, out2, fl. 06). Portanto, as provas existentes nos autos demonstram que a autora, no período de 15/04/1968 a 31/07/1977, não exercia a atividade rural em regime de economia familiar.
No tocante ao período de 31/01/1982 a 14/02/1988, não merecem vingar os argumentos do INSS. Não há qualquer prova de que, nessa época, a autora e o marido percebiam outras fontes de renda além da atividade rural. Por outro lado, a existência de períodos rurais intercalados com urbanos não constitui óbice, por si só, ao reconhecimento do exercício da atividade rural. Evidentemente, é necessário comprovar, após cada período de atividade urbana, o efetivo exercício das lides rurícolas mediante início de prova material. Verifica-se que há farto início de prova material referente a esse interregno: notas fiscais de produtor rural em nome do marido da autora (1983, 1984, 1985), notas fiscais de produtor rural em nome do sogro da autora (1986), carteira de identificação em nome da autora, como dependente do marido, expedida pelo INPS Rural Catanduvas/PR (1988). A qualificação de lavrador do marido e do sogro nesses documentos é extensível à autora, diante da realidade e das condições em que são exercidas as atividades rurais.
No caso dos autos, o conjunto probatório concernente ao período de 31/01/1982 a 14/02/1988 está alicerçado em razoável início de prova material, complementado por prova testemunhal firme e coerente, hábil a produzir o convencimento quanto ao efetivo exercício do labor rural pela autora, na condição de segurada especial.
Por conseguinte, deve ser reformada a sentença, no ponto em que reconheceu o exercício de atividade rural no período de 15/04/1968 a 31/07/1977, mantida, porém, a condenação do INSS a averbar o interregno de 31/01/1982 a 14/02/1988 como tempo de serviço/contribuição, salvo para efeito de carência.
Requisitos para a concessão do benefício
O INSS reconheceu, na data do requerimento administrativo (27/03/2009), o tempo de contribuição de 21 anos, 07 meses e 21 dias e a carência de 261 meses.
O tempo de atividade rural (31/01/1982 a 14/02/1988) corresponde a 06 anos e 15 dias. A soma do tempo de serviço rural e urbano resulta em 27 anos, 08 meses e 06 dias de tempo de contribuição.
Assim, em 27/03/2009 (DER), a autora não tinha direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, porque não possuía o tempo mínimo de contribuição (30 anos). Entretanto, preencheu os requisitos para a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, conforme a regra de transição do § 1º do art. 9º da Emenda Constitucional nº 20/1998: a) idade (48 anos); b) tempo de contribuição (25 anos); c) período adicional de contribuição (01 ano, 05 meses e 11 dias). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei nº 9.876/1999, com a incidência do fator previdenciário.
Consectários legais
O juízo a quo deixou de aplicar os índices de correção monetária estabelecidos no art. 5º da Lei nº 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997.
O Plenário do STF concluiu o julgamento do Tema 810, fixando as seguintes teses sobre a questão, consoante acompanhamento processual do RE 870.947 no Portal do STF:
"Ao final, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio, fixou as seguintes teses, nos termos do voto do Relator:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º,caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 20.9.2017. "
Como se pode observar, o Pretório Excelso não efetuou qualquer modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, em relação à correção monetária.
Assim, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos pela jurisprudência:
- INPC, de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei nº 10.741/2003, combinado com a Lei nº 11.430/2006, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei nº 8.213/91;
- IPCA-E, a partir de 30/06/2009, conforme a decisão no RE 870.947, julgado em 20/09/2017.
Os juros de mora são contados a partir da citação (Súmula 204 do STJ), no percentual de 1% ao mês, não capitalizado, até 29/06/2009. Desde 30/06/2009, são aplicáveis as disposições do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, utilizando-se a taxa de juros da caderneta de poupança.
Conclusão
Dou parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, para julgar improcedente o pedido de reconhecimento do exercício de atividade rural no período de 15/04/1968 a 31/07/1977 e, por consequência, conceder à autora o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, nos termos do § 1º do art. 9º da Emenda Constitucional nº 20/1998, desde a data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal.
De ofício, determino a correção monetária das parcelas vencidas pelo IPCA-E, a partir de 30/06/2009.
Os honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, devem ser suportados por ambas as partes conforme a sucumbência de cada uma. A autora deve arcar com o percentual de 30% do montante da verba honorária e o INSS com o restante (70%). As custas processuais devem ser distribuídas na mesma proporção entre as partes. Saliento que a exigibilidade das verbas de sucumbência resta suspensa em relação à autora, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária e, de ofício, determinar a correção monetária das parcelas vencidas pelo IPCA-E, a partir de 30/06/2009.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/11/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5050168-20.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00011387220148160104
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. João Heliofar Villar |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LINDAURA LEIRIAS DE ALMEIDA ZINI |
ADVOGADO | : | ANA GRACIELI ANTONIAZZI TERLECKI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/11/2017, na seqüência 412, disponibilizada no DE de 30/10/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA NECESSÁRIA E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A CORREÇÃO MONETÁRIA DAS PARCELAS VENCIDAS PELO IPCA-E, A PARTIR DE 30/06/2009.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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