APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000661-80.2013.4.04.7212/SC
RELATOR | : | JORGE ANTONIO MAURIQUE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ADELINO DEMEDA |
ADVOGADO | : | DARCISIO ANTONIO MULLER |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE ATIVIDADE RURAL.
1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Somados mais de 35 anos de contribuição, a parte tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2018.
Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9389088v3 e, se solicitado, do código CRC F5376DF4. | |
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| Signatário (a): | Jorge Antonio Maurique |
| Data e Hora: | 21/05/2018 20:32 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000661-80.2013.4.04.7212/SC
RELATOR | : | JORGE ANTONIO MAURIQUE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ADELINO DEMEDA |
ADVOGADO | : | DARCISIO ANTONIO MULLER |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença, publicada em 2014, que julgou parcialmente procedente pedido de aposentadoria por tempo de contribuição com reconhecimento de atividade rural e de parte do tempo de atividade especial apontado. Não houve concessão de aposentadoria. A parte autora não apelou.
O INSS apela alegando:
a) quanto ao período entre 01/08/2005 e 16/05/2008, haveria informação - no PPP - de uso de EPI eficaz contra ruído e umidade;
b) violação do princípio do custeio.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Remessa oficial
Considero interposta a remessa necessária, visto que sua dispensa apenas tem lugar quando a sentença líquida veicular condenação não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (STJ, Súmula 490, EREsp 600.596, Corte Especial, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 23/11/2009).
Saliente-se, por oportuno, que não incide o limite de 1.000 (mil) salários mínimos previsto no art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC, porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Atividade rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Acresce-se que o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.
De outra parte, afigura-se possível o reconhecimento de atividade rural para fins previdenciários no período dos 12 a 14 anos de idade. A jurisprudência deste Tribunal, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal é pacífica nesse sentido (TRF4ªR - 3ª Seção, EI 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 12/03/2003; STJ - AgRg no RESP 419601/SC, 6ª T, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 18/04/2005, p. 399 e RESP 541103/RS, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 01/07/2004, p. 260; STF - AI 529694/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. em 15.02.2005).
As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
Na hipótese vertente, a prova material anexada aos autos foi a seguinte:
- Declaração de exercício de atividade rural firmada pelo representante sindical Jandir Antônio Martini, elaborada com base na declaração de Guerino Deitos, referente ao período rural de 1968 a 1974 (ev. 1, PROCADM4, fl. 13)
- Certidão emitida pelo Delegado da 16ª Delegacia de Serviço Militar, onde consta que, ao alistar-se na Junta de Serviço Militar em 1974, o autor declarou que exercia a profissão de agricultor (ev. 1, PROCADM4, fl. 14).
- Declaração do Sr. Guerino Deitos de que o autor trabalhou como arrendatário no período de janeiro de 1968 a dezembro de 1974 (ev. 1, PROCADM4, fl. 15).
- Histórico Escolar da Escola Isolada Linha Caçador referente aos anos de 1966 a 1969 (ev. 1, PROCADM4, fl. 16).
- Entrevista rural do autor, realizada em 01/06/2011 (ev. 1, PROCADM4, fl. 17).
Foi realizada justificação administrativa, com a oitiva das testemunhas Dejair Paludo, Osmar Bordignon e Stanislau Dias de Almeida. A testemunha Dejair Paludo assim respondeu:
'(...) QUE o justificante trabalhou na agricultura juntamente com a família do Sr. Guerino Deitos até 1976 quando foi trabalhar em emprego urbano, não sabendo afirmar onde; Que não sabe informar se antes disso tenha trabalhado em atividade urbana; Que pelo que lembra o justificante exerceu, nestes períodos, exclusivamente atividade rural não exercendo atividades urbanas concomitantemente.' (ev. 1, PROCADM4, fl. 25).
A testemunha Osmar Bordignon, respondeu:
'(...) QUE o justificante trabalhou na agricultura juntamente com a família do Sr. Guerino Deitos até 1976 quando foi trabalhar em emprego urbano, não sabendo informar onde, mas pelo que recorda foi trabalhar na Sadia em Concórdia - SC; QUE não sabe informar se antes disso tenha trabalhado em atividade urbana; QUE pelo que lembra o justificante exerceu, nestes períodos, exclusivamente atividade rural não exercendo atividades urbanas concomitantemente.' (ev. 1, PROCADM4, fl. 26).
E, a testemunha Stanislau Dias de Almeida respondeu:
'(...) QUE pelo que lembra o mesmo trabalhou por três anos na agricultura quando foi trabalhar algum tempo no Frigorífico Seara e retornou por mais três anos na agricultura com o Sr. Deitos; QUE o justificante trabalhou na agricultura juntamente com a família do Sr. Guerino Deitos até aproximadamente 1976 quando foi trabalhar em emprego urbano, não sabendo afirmar onde, mas pelo que recorda foi trabalhar na Sadia em Concórdia - SC; QUE pelo que lembra o justificante exerceu, nestes períodos, exclusivamente atividade rural não exercendo atividades urbanas concomitantemente.'(ev. 1, PROCADM4, fl. 27).
O INSS, após a justificação administrativa, procedeu ao cômputo do interregno de 01/01/1974 a 11/02/1974 como laborado em regime de economia familiar, baseado na certidão referente à ficha de alistamento militar da parte autora.
Os documentos juntados pela parte autora, à exceção do Histórico Escolar da Escola Isolada Linha Caçador referente aos anos de 1966 a 1969 e da Certidão emitida pelo Delegado da 16ª Delegacia de Serviço Militar, não são capazes de gerar convencimento do Juízo, posto que se tratam de declarações do sindicado (baseado na declaração do empregador), declaração do empregador e Entrevista rural do autor.
Foi oportunizado judicialmente à parte autora a apresentação de todos os elementos materiais disponíveis para a comprovação da atividade rural (ev. 3, DESP1), informando aquela que não possuía outros documentos além dos anexados ao processo (ev. 15, PET1).
Apesar das testemunhas ouvidas na justificação administrativa afirmarem o exercício da atividade rural, não foram elas precisas quanto ao período laborado pela parte autora. As duas primeiras ouvidas afirmaram que a atividade rural foi desempenhada até 1976. Já, a testemunha Stanislau Dias de Almeida afirmou que a parte autora trabalhou por três anos na agricultura, algum tempo na atividade urbana, retornando por mais três anos na agricultura até aproximadamente 1976.
De acordo com os registros constantes na CTPS da parte autora, nos períodos de 12/02/1974 a 24/07/1974 e 13/05/1976 a 28/03/1977, trabalhou na empresa Frigorífico Seara S/A, (ev. 1, PROCADM4, fl. 31). Não restou comprovado documentalmente o retorno à atividade rural após o ingresso da parte autora na atividade urbana.
Considera-se comprovado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea de 09/06/1968 a 31/12/1973.
Assim, mantenho a sentença no ponto.
Atividade especial
A natureza da atividade é qualificada pela lei vigente à época da prestação do serviço, sem aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto (RE nº 174.150-3/RJ, Relator Ministro Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000). Também por força do princípio tempus regit actum, o modo de comprovação da atividade especial é orientado pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço. A partir dessa premissa geral, articulam-se as seguintes diretrizes para o presente julgado:
a) Para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento à determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo do trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula nº 198 do extinto TFR).
b) Após a vigência da Lei nº 9.032/95, em 29/04/1995, a concessão da aposentadoria especial pressupõe a comprovação, pelo segurado, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (Lei nº 8.213/91, art. 57, § 3º). Sem embargo, para a caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada (salvo exceções, v.g., periculosidade) (TRF4, EINF nº 0010314-72.2009.404.7200, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
c) Para as atividades desempenhadas a partir de 06/03/1997, com a vigência do Decreto nº 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (Lei nº 8.213/91, art. 58, §1º) (TRF4, AC nº 2002.71.07.001611-3, Quinta Turma, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/07/2008).
d) A extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, Terceira Seção, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
e) A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (STJ, EDcl no RESP nº 1.310.034/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJ 02/02/2015, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C). Dessa forma, é possível a conversão do tempo especial em comum mesmo para as atividades exercidas anteriormente à vigência da Lei nº 6.887/80, ao passo que a conversão do tempo comum em especial é apenas possível para o segurado que cumpriu os requisitos para aposentadoria especial até a vigência da Lei nº 9.032/95;
f) O STJ, em sede de Recurso Repetitivo Representativo de Controvérsia, já decidiu que "à luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)" (REsp 1306113/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013).
g) o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP previsto no art. 58, § 4º, da Lei nº. 8.213/91 e elaborado segundo as exigências legais supre a juntada aos autos do laudo técnico para fins de comprovação de atividade em condições especiais (TRF4, AG 5014651-46.2013.404.0000, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 09/08/2013);
h) o fator de conversão do tempo especial para comum é 1,4 para homens e 1,2 para mulheres, pois o Decreto nº. 4.827/2003, ao incluir o § 2º no art. 70 do Decreto nº. 3.048/99, estendeu ao trabalho desempenhado em qualquer período a mesma regra de conversão (STJ, AgRg no REsp 1270996/PR, Rel. Ministro OG Fernandes, 6ª Turma, DJe 01/08/2012).
Exame do tempo especial no caso concreto
O juiz singular bem analisou o caso, "verbis":
(...)
1) EMPRESA EMPREGADORA: Sadia S.A.
2) PERÍODO OBJETO DO PEDIDO DE RECONHECIMENTO: 01/08/2005 a 16/05/2008, pela exposição à agentes físicos ruído e umidade.
Para comprovar suas alegações, foram juntados aos autos os seguintes documentos:
CTPS - Evento 1 (PROCADM5, fl. 04);
PPP - Evento 1 (PROCADM1, fls. 20/22); e
Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho - Evento 64 (OUT2, fls. 14/21).
Assim, em análise da prova produzida, nota-se que o autor efetivamente trabalhou na empresa Sadia S.A., no setor de desossa de perna, cargo/função operador de produção, estando exposto aos seguintes fatores de risco, conforme consta no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) (evento 1, PROCADM5, fl. 20):
Ruído de intensidade de 86,7 dB(A)
Umidade
Restou assentado no PPP a descrição das atividades exercidas pelo autor 'Desossar e refilar pernas de frango, higienizar utensílios, realizar limpeza do piso'.
Consta, ainda, a utilização de equipamento de proteção individual eficaz.
Conforme ofício encaminhado pela BRF - Brasil FOODS (sucessora da empresa Sadia S.A.) (ev. 15, OUT2, fl. 13), 'o laudo Desossa Perna - Utensílios foi tomado com base devido ao agente na limpeza no caso do agente Umidade, e, quanto ao laudo utilizado foi deste posto, já para o agente ruído, o laudo é o desossa Perna - mesa desossa'.
Consta no laudo técnico anexado no ev. 15 (OUT2,fls. 19/20), para a atividade de desossa e refilamento de pernas de frango, a exposição ao nível de ruído de 86,70 dB(A), de forma habitual e permanente. E, para a atividade de higienização o nível de ruído de 91,00 dB(A) e umidade, ambos de forma habitual e permanente.
Considerando-se que em 19/11/03 foi publicado o Decreto n. 4.882/03, que alterou a redação do item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 3.048/99, baixando para 85 dB(A) o nível do ruído que torna nociva a atividade laboral, entendo que a exposição do autor ao nível de ruído entre 86,70 a 91,00 dB(A) excedeu ao limite de tolerância determinado pela legislação, levando-se em consideração ao período laboral postulado como especial.
No que tange à umidade, saliento que tal agente não está mais relacionado nos Decretos n.º 2.172/97 (Anexo IV) e n. 3.048/99 como fator de risco apto a caracterizar a atividade como especial.
Saliento que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (apelação/Reexame necessário n.º 2008.70.11.002289-1, PR, Rel. Celso Kipper, Sexta Turma, D.E de 15/04/2010) e do Superior Tribunal de Justiça (Resp n. 462.858/RS, Relator Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, DJU de 08-05-2003), os equipamentos de proteção individual não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade exercida, a não ser que comprovada a sua real efetividade por meio de perícia técnica especializada e desde que devidamente demonstrado o uso permanente pelo empregado, durante a jornada de trabalho, incidindo, ainda, na espécie, a Súmula 09 da TNU em se tratando de exposição a ruído.
Ante o exposto reconheço o período de 01/08/2005 a 16/05/2008, como atividade especial.
(...)
O INSS sustenta que haveria informação - no PPP - de uso de EPI eficaz contra ruído e umidade.
De início, destaco que o período é o mesmo para a incidência dos dois agentes nocivos. Assim e como para o ruído, a presença de EPI não é relevante, descabe analisar o argumento relativo à umidade. Não há interesse prático.
Mantenho a sentença no ponto.
Considerações específicas do caso
Considera-se especial a atividade desenvolvida com exposição a ruído superior a 80 dB até 05/03/1997, superior a 90 dB entre 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 dB a partir de 19/11/2003.
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998. Para o período posterior, o Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, deixou assentado que O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial (ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015). Firmaram-se as seguintes teses:
1 - o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.
2 - na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
Como se vê, considerado o período a partir de 02 de junho de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade, em decorrência do uso de EPIs, é admissível desde que haja prova hábil (leia-se: laudo técnico) afirmando inequivocamente que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou. Para tanto, não basta o mero preenchimento dos campos específicos no PPP, onde simplesmente são respondidas as perguntas "EPI eficaz?" e "EPC eficaz?", sem qualquer detalhamento acerca da total elisão ou neutralização do agente nocivo.
Com efeito, o simples fornecimento do EPI pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e peridiocidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador.
Na situação em apreço, não foi evidenciado que a parte autora, efetivamente, tenha-os utilizado no desempenho de suas atividades laborais.
Por fim, destaco que - por se tratar de ruído - a discussão não se amolda ao objeto do INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (SEÇÃO) Nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, isso porque o STF, na ARE 664.335, excluiu o ruído da sua primeira tese (se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial). Isso foi reafirmado no julgamento do IRDR Tema 15 neste Regional.
Fonte de custeio
Não prospera o argumento da suposta ausência de contribuição adicional como óbice ao reconhecimento da atividade especial, isso porque inexiste correlação com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).
É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Pouco importa, em verdade, se a empresa entendeu ou não caracterizada determinada atividade como especial. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.
O que importa é que a atividade é, na realidade, especial. Abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entender devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais não implicará, jamais, a negação da realidade, mas um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.
De outro lado, consubstancia grave equívoco hermenêutico condicionar-se o reconhecimento de um direito previdenciário à existência de uma específica contribuição previdenciária. Mais precisamente, inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).
Note-se, quanto ao particular, que a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. E isso pelo simples motivo de que ela decorre, dita proteção à saúde do trabalhador, da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. O que faz disparar a proteção previdenciária é a realidade de ofensa à saúde do trabalhador, verificada no caso concreto, e não a existência de uma determinada regra de custeio. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio da precedência do custeio.
Cálculo do benefício
Computando-se o tempo de serviço rural e especial reconhecido através da presente com o tempo de serviço/contribuição averbado pelo INSS na esfera administrativa, verifica-se que a parte autora alcançou 23 anos, 11 meses e 06 dias de tempo de serviço em 16/12/1998, tempo insuficiente para a aposentação naquela assentada, de acordo com as regras pretéritas (arts. 52 e 53 da Lei 8.213/91).
Computando-se o tempo de serviço rural e especial reconhecido através da presente com o tempo de serviço/contribuição averbado pelo INSS na esfera administrativa, verifica-se que a parte autora alcançou 23 anos, 11 meses e 06 dias de tempo de contribuição em 28/11/1999, tempo insuficiente para a aposentação naquela assentada, de acordo com a regra de transição da Lei 9876/99 (art. 6º).
Computando-se o tempo de serviço rural e especial reconhecido através da presente com o tempo de serviço/contribuição averbado pelo INSS na esfera administrativa, verifica-se que a parte autora alcançou 29 anos, 07 meses e 20 dias de tempo de contribuição em 24/03/2011, tempo insuficiente para a aposentação com proventos integrais naquela assentada, de acordo com as regras permanentes (art. 201, § 7º da CRFB/1988, com a redação dada pela EC n. 20/98). Outrossim, não faz jus à concessão de aposentaria proporcional, consoante as regras transitórias (art. 9º da EC 20/98), pois não havia implementado, na ocasião, o pedágio necessário ao deferimento do benefício (adicional de 40% do tempo que, na data da publicação da EC 20/98, faltava para atingir os 30 anos), que no caso do autor equivale a 2 anos, 05 meses e 03 dias.
Destarte, improcede o pedido de aposentação.
Aplica-se o CPC anterior. Considerando a sucumbência recíproca equivalente, razoável que as partes arquem, por metade, com o pagamento de R$ 1.000,00 (mil reais) a título de honorários advocatícios, diante da natureza da ação, da ausência de instrução probatória e do reduzido tempo de tramitação do processo. As verbas ficam compensadas (art. 21 do CPC e Súmula 306 do STJ).
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial.
Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2018
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000661-80.2013.4.04.7212/SC
ORIGEM: SC 50006618020134047212
RELATOR | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ADELINO DEMEDA |
ADVOGADO | : | DARCISIO ANTONIO MULLER |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2018, na seqüência 505, disponibilizada no DE de 02/05/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal CELSO KIPPER |
Ana Carolina Gamba Bernardes
Secretária
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