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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PR...

Data da publicação: 13/10/2022, 16:46:30

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. REGRA 85/95. 1. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, que foi corroborado pela prova oral, a parte autora faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço e à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto preenchidos os demais requisitos. 2. A autora tem garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, uma vez que a pontuação totalizada é superior a 85 pontos e o tempo mínimo de contribuição foi observado. (TRF4, AC 5023489-70.2021.4.04.9999, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 01/09/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5023489-70.2021.4.04.9999/SC

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001043-61.2019.8.24.0167/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: ANA DE SOUZA GULARTE PEREIRA

ADVOGADO: LUCIANA TEREZA GULARTE (OAB SC024269)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de demanda na qual a parte autora postula o reconhecimento de labor rural que alega ter exercido em regime de economia familiar no período de abril de 1974 (12 anos de idade) até abril de 1993, a servir no cômputo para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

O dispositivo da sentença (evento 34) tem o seguinte teor:

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado pela autora ANA DE SOUZA GULARTE PEREIRA contra o INSS concernente ao reconhecimento de atividade rurícola em regime de economia familiar "a partir de 04/1968 - data em que a Autora completou 06 anos de idade, a abril de 1993" . Consequentemente, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição segundo a regra do art. 29-C, inciso II da Lei 8.213/91 porque não implementados os requisitos legais na DER 17/12/2018 do requerimento administrativo NB 191.632.496-4, nos termos da fundamentação. CONDENO a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais fixados em R$1.500,00, salientando que a exigibilidade do ônus sucumbencial está suspensa por força da justiça gratuita deferida sem impugnação (despacho/evento 3).

Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC.

EXTINGO a ação com resolução do mérito, nos moldes do art. 487, I, do CPC.

Transitada e cumpridas as pendências legais, dê-se baixa.

Local e data lançados na assinatura digital.

P. R.I.

Em suas razões (evento 40), a autora alega, em síntese, que há nos autos documentos hábeis para início de prova material, corroborados por prova testemunhal, sendo possível o reconhecimento do labor pretendido no período de abril de 1968 (6 anos de idade) a abril de 1993, seja na DER, ou na data da DER reafirmada.

Com contrarrazões (evento 45), vieram os autos a este Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Da delimitação da controvérsia

Inicialmente, não conheço do pedido de cômputo do labor rural anteriormente a abril de 1974, formulado em sede de apelação (e, anteriormente, nas alegações finais), uma vez que se trata de pleito inovatório em relação àquele formulado na petição inicial.

Da atividade rural

O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.

Acresce-se que o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).

O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.

Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.

De outra parte, afigura-se possível o reconhecimento de atividade rural para fins previdenciários no período dos 12 a 14 anos de idade. A jurisprudência deste Tribunal, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal é pacífica nesse sentido (TRF4ªR - 3ª Seção, EI 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 12/03/2003; STJ - AgRg no RESP 419601/SC, 6ª T, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 18/04/2005, p. 399 e RESP 541103/RS, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 01/07/2004, p. 260; STF - AI 529694/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. em 15.02.2005).

As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).

Enfatize-se que 'a descontinuidade da prova documental não impede o reconhecimento de todo o período de tempo de serviço rural postulado, uma vez que a declaração do tempo de serviço rural envolve, mais do que o reconhecimento do exercício de atividade agrícola, o reconhecimento da condição de lavrador, na qual está intrínseca a idéia de continuidade e não de eventualidade. Não há necessidade de comprovação do trabalho rural mês a mês, ano a ano, bastando que o conjunto probatório permita ao Julgador, formar convicção acerca da efetiva prestação laboral rurícola. A Jurisprudência tem entendido que a qualificação de agricultor em atos do registro civil constitui início razoável de prova material para fins de comprovação da atividade rural' (in TRF 4ª Região, AC 96.04.58708-0/RS, 6ª Turma, Rel. Dês. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon, DJ 24/05/2000).

Ademais, acaso demonstrado que o pai ou mãe da parte autora possuiu um vínculo urbano, ainda que tal emprego tenha sido negado pelo autor e por suas testemunhas, faz-se imperioso analisar se o sustento do demandante já era extraído primordialmente da lavoura enquanto ele ainda residia com seus genitores, ou, caso contrário, se a subsistência do grupo familiar era garantida majoritariamente pelo(s) salário(s) do(s) integrante(s) do grupo familiar que mantinha(m) emprego(s) urbano(s):

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS. CARÊNCIA. COMERCIALIZAÇÃO. CÔNJUGE. APOSENTADORIA. SUBSISTÊNCIA DA FAMÍLIA. 1. Para fins de concessão da aposentadoria rural em regime especial de economia familiar, deve ser comprovada atividade rural no período equivalente à carência imediatamente anterior à data de implementação da idade ou à DER, ainda que de forma descontínua. 2. Também é necessário demonstrar que a produção agrícola se mostra indispensável à subsistência da família, gerando algum excedente apto à regular comercialização e consequente apoio financeiro ao grupo familiar. 3. Por si só, o mero fato da existência de renda própria por parte de algum integrante da família não tem o condão de descaracterizar, quanto aos demais, a condição de rurícola em regime de economia familiar, desde que a renda auferida não se mostre bastante à subsistência da família. 4. A suficiência da renda adicional deve ser verificada caso a caso, conforme a prova dos autos. 5. Divergência não demonstrada. 6. Recurso não conhecido. (5004366-05.2011.404.7003, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Giovani Bigolin, juntado aos autos em 29/04/2015) (grifou-se)

Outrossim, a jurisprudência deste Regional já afirmou que o afastamento das atividades agrícolas - sempre por um curto período de tempo -não descaracteriza a condição de trabalhador rural. Nesse sentido e "mutatis mutandis":

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME DE RECURSO. ART. 543-C, § 7º, II, DO CPC. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. POSSIBILIDADE DA EXTENSÃO DA PROVA EM NOME DO CÔNJUGE DESDE QUE CONTEMPORÂNEA AO PERÍODO DE CARÊNCIA. 1. In casu, a matéria controvertida diz respeito à impossibilidade da extensão da prova material da atividade rural de um membro do núcleo familiar a outro, quando o titular dos documentos passa a exercer atividade incompatível com a rural, como o trabalho urbano. 2. No julgamento do Recurso Especial representativo de controvérsia (REsp n. 1.304.479-SP), o STJ entendeu restar prejudicada a extensão da prova material de um integrante do grupo familiar a outro, quando o titular passa a desempenhar atividade incompatível com a rural. Todavia, o recurso não foi provido, porquanto, na hipótese, verificou-se que a recorrida havia juntado documentos em nome próprio, atendendo à exigência de início de prova material. 3. No caso concreto, todavia, verifico que o esposo da embargada esteve afastado das atividades agrícolas por um curto período de tempo (aproximadamente 08 meses), não descaracterizando, portanto, este período a sua condição de trabalhador rural. Por esse motivo, entendo que a documentação em nome do cônjuge da embargada, com anotação de sua profissão como lavrador, pode ser estendida à mesma para fins de comprovação da atividade rural no período de carência. 4. Mantida a decisão da Turma, que, por unanimidade, negou provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, determinando o retorno dos autos à Vice-Presidência desta Corte para exame de admissibilidade do recurso especial, nos termos do § 8º do art. 543-C do Código de Processo Civil. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001072-92.2013.404.9999, 3ª SEÇÃO, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 04/05/2015, PUBLICAÇÃO EM 05/05/2015) -grifei.

Por fim, cabe registrar que de acordo com a jurisprudência do STJ, o exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial, só não se considerando segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014). Ademais, o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (AgRg no AREsp 327.119/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015).

Período de abril de 1974 (12 anos de idade) até abril de 1993

Colhe-se da sentença:

Com efeito, inexiste nos autos início de prova material do efetivo desempenho de atividade agrícola ou agropecuária pela autora para fins de subsistência própria ou mesmo mínimos indícios de despesas suas relacionadas a essas atividades, como a aquisição de insumos, ferramentas, ao longo do período alegado, isto é, "a partir de 04/1968 - data em que a Autora completou 06 anos de idade, a abril de 1993".

Outrossim, o fato de que o pai da autora era lavrador e adquiriu imóveis rurais (matrículas 15.429 e 15.430) dos quais recolhia ITR e posteriormente veio a doar essas terras ao filho Nivaldo Euclides Gularte, agricultor, conforme averbações nas respectivas matrículas, não tem o condão de comprovar o exercício da agricultura em regime de economia familiar pela autora no período discutido nesta ação. A qualificação de lavrador do esposo Alécio Licínio Pereira também é incapaz de revestir a autora da qualidade de segurada especial. Tampouco a propriedade do sogro da autora, Lícinio Pereira relativamente ao imóvel rural matrícula 4.038 relacionado ao ITR declarado nos anos de 2007 e 2011 (anexos 27 e 28 do evento 1) é capaz de caracterizar a demandante como trabalhadora rural em regime de economia familiar.

Além disso, o fato dos pais da autora terem sido associados ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Paulo Lopes (anexos 12 e 17 do evento 1) por si só também não empresta a qualidade de trabalhadora rural à filha ora demandante.

As certidões de nascimento da autora e de seus irmãos Laudeci e Nivaldo corroboram que o seu genitor era lavrador, condição pessoal que a autora não logrou êxito em demonstrar relativamente ao interregno alegado nesta ação.

Ao arremate, malgrado a qualificação do esposo da autora como lavrador, também não há comprovação de que o mesmo exerceu a agricultura em regime de economia familiar durante a constância do casamento, por exemplo, através notas fiscais de aquisição de insumos relacionados a atividade ou notas de comercialização da produção.

Portanto, os documentos carreados ao feito são inservíveis para os fins do art. 11, inciso VII, alínea a), item 1 e §1º do mesmo dispositivo legal, restando inviável o reconhecimento do exercício de agricultura em regime de economia familiar "a partir de 04/1968 - data em que a Autora completou 06 anos de idade, a abril de 1993" (alegações finais). A propósito, neste contexto a autora teria iniciado no labor rurícola aos 6 anos de idade!

Inobstante o posicionamento jurisprudencial a favor do reconhecimento da atividade rurícola em casos tais, é penosa a comprovação disso por meio da prova material. O reconhecimento do trabalho prestado por crianças ou adolescentes depende de uma análise rigorosa, pois é comum que os filhos ajudem seus pais no interior, porém com intervalos para freqüentar a escola e desempenhar outras atividades inerentes à sua condição especial.

Neste sentido: "(...) Na verdade, a maioria dos filhos de agricultores (pequenos proprietários, arrendatários, parceiros, meeiros, entre outros) que atuam em regime de economia familiar, na região Sul do país, ajudam os pais nos serviços da lavoura, exercendo tarefas próprias à sua idade e condição, sendo elas de caráter formativo, ocupacional e complementar aos estudos obrigatórios, realizados normalmente, no meio rural, no período diurno. Essas tarefas não constituem, a rigor, o penoso trabalho rural, que confere direito à aposentadoria com idade reduzida (Lei 8.213/91, art. 48, § 1º). Confira-se, a propósito, a lição de Fábio Ulhoa Coelho, professor titular da PUC/SP, quanto ao direito de os pais exigirem a prestação de serviços pelos filhos, inerente ao poder familiar (CC, art. 1.634, VII, parte final) (...)" (Voto do Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti no julgamento da Apelação Cível n. 2002.04.01.046337-6, de Campos Novos/SC).

No entanto, a questão deve ser analisada sob o aspecto do efetivo desempenho da atividade na condição de rurícola, em regime de economia familiar. Neste contexto, torna-se imperiosa a comprovação, a cargo do autor, sobre o exercício da atividade, condições físicas para isso, se era arrimo de família, se o trabalho era diuturno e não esporádico, se trabalhava juntamente com a família. Não basta o mero auxílio casual, sendo necessário o trabalho permanente.

Assim, embora haja precedentes admitindo qualquer espécie de documento para comprovação do início de prova material a respeito da atividade rural, entendo que o rigor na análise da prova é indispensável para assegurar a adequada comprovação do efetivo exercício da atividade rural durante os períodos que a parte autora pretende o reconhecimento. Nessa linha, por exemplo, as notas fiscais de produtor rural, inobstante posicionamento em sentido contrário, devem abranger o período de carência. O abrandamento da análise da prova documental implicou na implementação do cadastro previsto nos arts. 38A e 38B da Lei n. 13.846/2019, objetivando-se a segurança na concessão de benefícios a quem realmente tenha direito. Nestes termos:

"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:...§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento. § 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento."

Dessarte, embora o posicionamento majoritário seja o de que o rol do art. 106 da Lei é meramente exemplificativo, entendo que os documentos juntados pela parte autora não são suficientes para início de prova material em relação ao período controverso, conforme explicitado anteriormente.

Do contrário, bastaria a qualquer trabalhador urbano ter uma horta no quintal de casa ou criar algum animal para extração de leite, por exemplo, comprovando com qualquer nota ou início de prova material a referida atividade doméstica, que no caso seria "rural", para fazer jus ao benefício da aposentadoria rural, tornando letra morta o disposto no art. 48, § 3º, da Lei n. 8.213/91.

No caso dos autos, há consistente prova material corroborada pela testemunhal que indicam o exercício do labor rural pela parte autora.

Dos documentos juntados pela autora, destacam-se os seguintes:

  • Comprovantes do pagamento do Imposto Territorial Rural (ITR) dos anos de 1970 e 1972 (evento 1, ANEXO11) referente a propriedade categoria minifúndio n. 530302103001 em nome do Sr. Euclides Souza Gularte, pai da autora.
  • Ficha de cadastro no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Paulo Lopes do genitor da autora (evento 1, ANEXO12), datada de 11/01/1972.
  • Cópia de certidão de escritura de cessão de herança (evento 1, ANEXO13), em nome do Sr. Euclides Souza Gularte (pai da autora), qualificado como lavrador, datada de 18/05/1976.
  • Certidão de matrícula do imóvel 15.430 expedida em 18/02/2016 pelo Registro de Imóveis de Palhoça (evento 1, ANEXO15) informa que o imóvel rural com área de 123.192,60m² de propriedade do Sr. Euclides de Souza Gularte, lavrador (pai da autora) foi doado mediante escritura pública lavrada em 18/01/1984 a Alamir de Souza Goulart, lavrador. E, por escritura pública de compra e venda lavrada em 24/02/2000 o imóvel foi vendido a Nivaldo Euclides Gularte (irmão da autora), agricultor.
  • Certidão de matrícula do imóvel 15.429 expedida em 18/02/2016 pelo Registro de Imóveis de Palhoça (evento 1, ANEXO15) informa que o imóvel rural com área de 123.192,60m de propriedade do Sr. Euclides de Souza Gularte, lavrador (pai da autora) foi doado mediante escritura pública lavrada em 18/01/1984 a Nivaldo Euclides Goulart (irmão da autora), lavrador.
  • Certidão de casamento (evento 1, CERTCAS5), datada de 07/08/1987, da autora com o Sr. Alécio Licínio Pereira, qualificado como lavrador.

Os documentos acima listados são todos contemporâneos do fato como prevê a Lei de Benefícios. O único documento contemporâneo ao período em que a autora estava casada é a certidão de casamento. Os demais documentos juntados em nome do sogro, não são contemporâneos, porém servem para identificar a profissão do sogro da autora: lavrador.

A propósito, confira-se:

PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO E NASCIMENTO.
1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 2. A jurisprudência do STJ admite como início de prova material, certidões de casamento e nascimento dos filhos, desde que o exercício da atividade rural seja corroborada por idônea e robusta prova testemunhal. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1611758/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/09/2016, DJe 06/10/2016)

Dos depoimentos (evento 29, VIDEO1) destacam-se os seguintes trechos:

Volnei Adolfo Zanela ​​​​​​ afirma que conhece a autora desde que ela tinha 3, 4 anos de idade. Que os pais da autora eram lavradores e trabalhavam com farinha, cana, milho, mandioca, fumo. Que os pais não tinham empregados e toda a família trabalhava na lavoura. Que desde pequeno os filhos ajudavam os pais. Que após o casamento a autora permaneceu trabalhando na agricultura juntamente com o marido e os sogros. Que os sogros tinham o mesmo tipo de produção que os pais da autora.

Maria de Fátima de Souza Cargnin afirma que os pais da autora eram lavradores. Que a autora ia para roça já aos 4 anos para semear. Que após casar a autora continuou trabalhando na agricultura com o marido e os sogros.

Maria Borges Pies afirma que conhece a autora desde a infância, que os pais da autora trabalhavam na roça e que toda a família trabalhava na roça. Que à época todos começavam a trabalhar desde os 5, 6 anos. Que após o casamento a autora continuou na mesma função de lavradora com o marido e os sogros.

Bento Pedro Cardoso afirma que conheceu a autora quando ela tinha entre 6, 7 anos trabalhando com os pais na lavoura. Que após o casamento a autora continuou na agricultura com o marido e os sogros.

Adilio Antolino Ramos afirma que os pais da autora eram agricultores e produziam fumo, milho, farinha. Que as crianças, à época, iam para a roça com 5, 6 anos. Que após o casamento a autora continuou na agricultura juntamente com o marido e os sogros.

Enir José Cardoso afirma que a autora trabalhava com o marido e os sogros na lavoura.

Tem-se, a partir desse conjunto probatório, que a autora caracteriza-se como segurada especial na forma do artigo 11, VII da Lei 8.213/91.

Portanto, merece reforma a sentença para reconhecer o período de labor rural de 06/04/1974 a 30/04/1993 exercido em regime de economia familiar.

Contagem do tempo e Concessão do benefício

Na contagem do tempo, verificou-se que ainda que reconhecido todo o período pleiteado pela autora, apenas contabilizando o período de 06/04/1974 a 31/10/1991 - período que não necessita de indenização -, o tempo mínimo de 30 anos é atingido.

Portanto, somando o período de labor rural sem necessidade de indenização (17 anos, 6 meses e 25 dias) e o período como servidora pública (25 anos, 7 meses e 14 dias), a autora conta com 43 anos, 2 meses e 9 dias de tempo de serviço/contribuição, o que garante a concessão do benefício da aposentadoria integral sem a incidência do fator previdenciário (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. II, incluído pela Lei 13.183/2015), caso mais vantajoso, já que, na DER (17/12/2018), a autora contava com 99.8889 pontos.

Assim, a parte autora tem direito à concessão do benefício da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.

Correção Monetária e Juros de Mora

A atualização monetária (que fluirá desde a data de vencimento de cada prestação) e os juros de mora (que fluirão desde a data da citação) seguirão:

a) até 08/12/2021, os parâmetros estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema repetitivo nº 905, para as condenações judiciais de natureza previdenciária, os quais estão assim enunciados na tese então firmada:

3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.

(...)

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

b) a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), acumulado mensalmente (artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, que entrou em vigor na data de sua publicação).

Honorários advocatícios

Condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a pagar honorários advocatícios, observando-se o seguinte:

a) sua base de cálculo corresponderá ao valor da condenação, observado o enunciado da súmula nº 76, deste Tribunal ("Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência");

b) será aplicado o percentual mínimo estabelecido para cada uma das faixas de valores previstas no parágrafo 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil;

c) quando mais de uma faixa de valores for aplicável, será observado o disposto no artigo 85, § 5º, do mesmo Código.

Custas processuais na Justiça Estadual de Santa Catarina

O INSS está isento do pagamento das custas e emolumentos, nos termos do artigo 33, § 1º, da Lei Complementar nº 156/97, do Estado de Santa Catarina, na redação dada pela Lei Complementar nº 729/2018.

Tutela específica

A 3ª Seção deste Tribunal firmou o entendimento no sentido de que, esgotadas as instâncias ordinárias, faz-se possível determinar o cumprimento da parcela do julgado relativa à obrigação de fazer, que consiste na revisão do benefício concedido ou restabelecido, para tal fim não havendo necessidade de requerimento do segurado ou dependente ao qual a medida aproveita (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007).

Louvando-me no referido precedente e nas disposições do artigo 497 do Código de Processo Civil, determino a concessão do benefício no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, na porção conhecida, e determinar a implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003409442v23 e do código CRC 1348133b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 1/9/2022, às 14:15:7


5023489-70.2021.4.04.9999
40003409442.V23


Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:46:30.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5023489-70.2021.4.04.9999/SC

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001043-61.2019.8.24.0167/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: ANA DE SOUZA GULARTE PEREIRA

ADVOGADO: LUCIANA TEREZA GULARTE (OAB SC024269)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL corroborada pela PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. regra 85/95.

1. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, que foi corroborado pela prova oral, a parte autora faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço e à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto preenchidos os demais requisitos.

2. A autora tem garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, uma vez que a pontuação totalizada é superior a 85 pontos e o tempo mínimo de contribuição foi observado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, na porção conhecida, e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 31 de agosto de 2022.



Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003409443v9 e do código CRC e1ce775d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 1/9/2022, às 14:15:7


5023489-70.2021.4.04.9999
40003409443 .V9


Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:46:30.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 31/08/2022

Apelação Cível Nº 5023489-70.2021.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: ANA DE SOUZA GULARTE PEREIRA

ADVOGADO: LUCIANA TEREZA GULARTE (OAB SC024269)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 31/08/2022, na sequência 134, disponibilizada no DE de 09/08/2022.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NA PORÇÃO CONHECIDA, E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:46:30.

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