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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. LABOR ANTES DOS 12 ...

Data da publicação: 03/05/2023, 11:01:21

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. LABOR ANTES DOS 12 ANOS DE IDADE. 1.em que pese a possibilidade teórica de reconhecimento de atividade rural anterior aos 12 anos de idade, não há indicativos de que esse período possa ser considerado como tempo de contribuição para fins previdenciários no presente caso. Ainda que se saiba que os filhos de agricultores tivessem, à época, contato com o trabalho dos pais, não há como presumir que, neste caso, o demandante efetivamente exercesse as atividades de um jovem ou um adulto, de modo a configurar a mútua dependência característica do regime de economia familiar. Certamente a criança não possui a mesma aptidão física ao trabalho braçal no campo de um adolescente e, muito menos, de um adulto, de forma a contribuir de forma efetiva e sensível na atividade produtiva. 2. Para a comprovação do trabalho rural é mister a prova material corroborada por prova testemunhal, a qual, no presente caso foi dispensada em razão da autodeclaração da autora. Auto declaração essa que tem valor probatório equivalente à prova testemunhal. (TRF4, AC 5037107-83.2020.4.04.7100, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator ANA CRISTINA FERRO BLASI, juntado aos autos em 25/04/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5037107-83.2020.4.04.7100/RS

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

APELANTE: REJANE MOSCHEN (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

REJANE MOSCHEN propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, postulando a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento do desempenho de atividades em regime de economia familiar rural e em condições especiais nos períodos de 16/04/1996 a 12/10/1997, 16/12/1998 a 29/03/2000 e 09/07/2001 a 28/06/2019. Pediu, sucessivamente, reafirmação da DER.

Sobreveio sentença (evento 47, SENT1), que julgou o pedido formulado na inicial nos seguintes termos:

Ante o exposto:

1. Revogo o benefício de justiça gratuita que havia sido deferido à parte autora no evento 8. Anote-se;

2. Preliminarmente, extingo o feito, sem resolução do mérito:

a) quanto ao pedido de reconhecimento do período rural de 01/11/1991 a 12/11/1994, por falta de interesse de agir, visto que já reconhecido na via administrativa pelo INSS, a teor do disposto no art. 485, VI do CPC;

b) quanto ao pedido de reconhecimento do período rural de 13/11/1994 a 15/04/1996, por ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, nos termos do art. 485, IV do CPC, conforme fundamentação;

3. Julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de:

a) reconhecer como tempo especial, a ser convertido em tempo comum pelo fator 1,2, os períodos de 16/04/1996 a 12/10/1997, 16/12/1998 a 29/03/2000 e 09/07/2001 a 28/06/2019;

b) determinar que o INSS promova a averbação dos períodos acima reconhecidos;

c) condenar o INSS a:

c.1) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde 28/06/2019 (DER do NB 42/189.529.304-6), a ser calculado de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 86 pontos (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. II, incluído pela Lei 13.183/2015);

c.2) efetuar o pagamento das parcelas vencidas e vincendas, desde 28/06/2019 (DER do NB 42/189.529.304-6), sendo as vencidas atualizadas monetariamente e com juros de mora, conforme a fundamentação.

Considerando a sucumbência mínima da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios do patrono da parte autora, fixados em 10% (dez por cento) do valor das parcelas vencidas até a sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ.

Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação.

Em suas razões (evento 52, APELAÇÃO1), sustenta ter havido cerceamento de defesa pela não-realização de audiência de instrução e julgamento para comprovação do labor campesino. No mérito, aduz que acostou provas documentais para provar a lide rural laborado junto dos pais e requer o reconhecimento do tempo rural de 08/09/1972 a 06/09/1984 (desde o nascimento) ou também no período de 08/09/1980 à (sic) 06/09/1984 (desde os 8 anos de idade) ou, ainda, 08/09/1972 a 06/09/1984 e de 01/11/1991 a 15/04/1996, este último período através de emissão de guia de GPS para fins de computo de carência e tempo de contribuição. Pretende, também, a reafirmação de DER.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Cerceamento de defesa

O art. 38-B, § 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 instituiu um novo sistema de prova da atividade rural, que pode dispensar a oitiva de testemunhas. A autodeclaração, tal como disciplinada internamente pelo INSS em obediência à LBPS, pode fornecer elementos que se combinam com a prova material e com as informações constantes de cadastros públicos, de modo a comprovar o alegado pelo segurado.

Foi o que ocorreu no caso concreto. Tendo a parte autora apresentado autodeclaração, que consta dos autos em dois documentos: fl. 38 evento 1, PROCADM8 (cuja cópia consta do ev. 32) e fl. 37 do evento 1, PROCADM6, foi tida como produzida a prova testemunhal.

Afasto a preliminar.

Atividade Rural em Regime de Economia Familiar

A autora, nascida em 07/09/1972, filha de Jacir Moschen e Olga Madalena Moschen (evento 1, RG5), pleiteia o reconhecimento do exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar: i) desde que nasceu, em 08/09/1972 a 06/09/1984, ou ii) de 08/09/1980, com 8 anos de idade, a 06/09/1984, ou, ainda, iii) 01/11/1991 a 30/11/1992 e iv) de 01/11/1991 a 15/04/1996.

A insurgência recursal da parte autora diz com o não-reconhecimento do trabalho rural anterior a 12 anos.

Sobre a idade mínima permitida para fins de reconhecimento do tempo de serviço rural, convém salientar ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam essa idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC 2001.04.01.025230-0/RS, Relator Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12/3/2003; STF, AI 529694/RS, Relator Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU 11/3/2005).

Por outro lado, na Ação Civil Pública 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, proposta pelo Ministério Público Federal em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), estabeleceu-se ser possível o cômputo de período de trabalho rural realizado antes dos 12 anos de idade, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11, da Lei 8.213/91, em maior amplitude, sem a fixação de requisito etário (TRF4, AC 5017267-34.2013.4.04.7100, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Des. Salise Monteiro Sanchotene, julgado em 09/04/2018). O acórdão foi assim ementado:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARA AFASTAR A IDADE MÍNIMA PREVISTA NO ART. 11 DA LEI 8.213/91 PARA FINS DE RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO E DE CONTRIBUIÇÃO. INTERESSE DE AGIR DO MPF. RECONHECIMENTO. EFEITOS JURÍDICOS DA SENTENÇA. ABRANGÊNCIA NACIONAL DA DECISÃO PROLATADA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ART. 16 DA LEI. 7.347/85. INTERPRETAÇÃO DO ART. 7º, XXXIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TRABALHO INFANTIL X PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REALIDADE FÁTICA BRASILEIRA. INDISPENSABILIDADE DE PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA ÀS CRIANÇAS. POSSIBILIDADE DE SER COMPUTADO PERÍODO DE TRABALHO SEM LIMITAÇÃO DE IDADE MÍNIMA. ACP INTEGRALMENTE PROCEDENTE. JULGAMENTO PELO COLEGIADO AMPLIADO. ART. 942 DO CPC. RECURSO DO MPF PROVIDO. APELO DO INSS DESPROVIDO.

1. O interesse processual do MPF diz respeito à alteração de entendimento da autarquia no tocante às implicações previdenciárias decorrentes do exercício laboral anterior àquele limite etário mínimo, consubstanciadas inclusive na Nota 76/2013. Em que pese efetivamente constitua aquela Nota importante avanço no posicionamento do INSS sobre a questão, não torna ela despicienda a tutela jurisdicional pleiteada, já que admite aquela Nota que, uma vez reconhecida na esfera trabalhista a relação de emprego do menor de 16 anos, possa a autarquia considerá-lo segurado e outorgar efeitos de proteção previdenciária em relação ao mesmo, permanecendo - não bastasse a já referida necessidade prévia de reconhecimento trabalhista - a não admitir a proteção para as demais situações de exercício laboral por menor de 16 anos, referidas na contestação como externadas de forma voluntária. Não bastasse isto, restaria ainda a questão referente à documentação e formalidades exigidas para a comprovação de tal labor, o que evidencia a permanência da necessidade de deliberação e, por consequência, a existência do interesse de agir. 2. Não há falar em restrição dos efeitos da decisão em ação civil pública a limites territoriais, pois não se pode confundir estes com a eficácia subjetiva da coisa julgada, que se estende a todos aqueles que participam da relação jurídica. Isso porque, a imposição de limites territoriais, prevista no art. 16 da LACP, não prejudica a obrigatoriedade jurídica da decisão judicial em relação aos participantes da relação processual. 3. Logo, inexiste violação ao art. 16 da Lei nº 7.347/1985, como aventou o INSS, porquanto não é possível restringir a eficácia da decisão proferida nos autos aos limites geográficos da competência territorial do órgão prolator, sob pena de chancelar a aplicação de normas distintas a pessoas detentoras da mesma condição jurídica. 4. Mérito. A limitação etária imposta pelo INSS e que o Ministério Público Federal quer ver superada tem origem na interpretação que se dá ao art. 7º, XXXIII da Constituição Federal, que veda qualquer trabalho para menores 16 anos, salvo na condição de aprendiz. 5. Efetivamente, a aludida norma limitadora traduz-se em garantia constitucional existente em prol da criança e do adolescente, vale dizer, norma protetiva estabelecida não só na Constituição Federal, mas também na legislação trabalhista, no ECA (Lei 8.079/90) em tratados internacionais (OIT) e nas normas previdenciárias. 6. No entanto, aludidas regras, editadas para proteger pessoas com idade inferior a 16 anos, não podem prejudicá-las naqueles casos em que, não obstante a proibição constitucional e legal, efetivamente, trabalharam durante a infância ou a adolescência. 7. Não obstante as normas protetivas às crianças, o trabalho infantil ainda se faz presente no seio da sociedade. São inúmeras as crianças que desde tenra idade são levadas ao trabalho por seus próprios pais para auxiliarem no sustento da família. Elas são colocadas não só em atividades domésticas, mas também, no meio rural em serviços de agricultura, pecuária, silvicutura, pesca e até mesmo em atividades urbanas (vendas de bens de consumos, artesanatos, entre outros). 8. Além disso, há aquelas que laboram em meios artísticos e publicitários (novelas, filmes, propagandas de marketing, teatros, shows). E o exercício dessas atividades, conforme a previsão do art. 11 da Lei nº 8.213/91, enseja o enquadramento como segurado obrigatório da Previdência Social. 9. É sabido que a idade mínima para fins previdenciários é de 14 anos, desde que na condição de aprendiz. Também é certo que a partir de 16 anos o adolescente pode obter a condição de segurado com seu ingresso no mercado de trabalho oficial e ainda pode lográ-lo como contribuinte facultativo. 10. Todavia, não há como deixar de considerar os dados oficiais que informam existir uma gama expressiva de pessoas que, nos termos do art. 11 da LBPS, apesar de se enquadrarem como segurados obrigatórios, possuem idade inferior àquela prevista constitucionalmente e não têm a respectiva proteção previdenciária. 11. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) no ano de 2014, o trabalho infantil no Brasil cresceu muito em comparação com os anos anteriores, quando estava em baixa. 12. E, de acordo com o IBGE, no ano de 2014 havia 554 mil crianças de 5 a 13 anos trabalhando. Na atividade agrícola, nesta mesma faixa etária, no ano de 2013 trabalhavam 325 mil crianças, enquanto no ano de 2014 passou a ser de 344 mil, um aumento de 5,8%. Já no ano de 2015, segundo o PNAD (IBGE) houve novamente uma diminuição de 19,8%. No entanto, constatou-se o aumento de 12,3% do 'trabalho infantil na faixa entre 5 a 9 anos'. 13. O Ministério do Trabalho e Previdência Social - MPTS noticia que em mais de sete mil ações fiscais realizadas no ano de 2015, foram encontradas 7.200 crianças em situação de trabalho irregular. Dos 7.200 casos, 32 crianças tinham entre 0 e 4 - todas encontradas no Amazonas. Outras 105 estavam na faixa etária de 5 a 9 anos e foram encontradas, também, no Amazonas (62) e nos estados de Pernambuco (13), Pará (7) Roraima (5), Acre (4) Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul (3 em cada Estado), Bahia e Sergipe (2 em cada Estado). Na Paraíba, Rio de Janeiro, Rondônia e Tocantins encontrou-se uma criança em cada Estado com essa faixa etária de 5 a 9 anos. 14. Insta anotar que a realidade fática revela a existência de trabalho artístico e publicitário com nítido objetivo econômico e comercial realizados com a autorização dos pais, com a anuência do Poder Judiciário, de crianças recém nascidas, outras com 01, 2, 3, 4 e 5 anos de idade. Aliás, é possível a proteção previdenciária nesses casos? No caso de eventual ocorrência de algum acidente relacionado a esse tipo de trabalho, a criança teria direito a algum benefício previdenciário, tal como o auxílio acidente? 15. No campo da seguridade social extrai-se da norma constitucional (art. 194, parágrafo único) o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento que preconiza que a proteção social deve alcançar a todos os trabalhadores do território nacional que dela necessitem. Por corolário lógico, incluem-se nessa proteção social aquelas crianças ou adolescentes que exerceram algum tipo de labor. 16. A despeito de haver previsão legal quanto ao limite etário (art. 13 da Lei 8.213/91, art. 14 da Lei 8.212/91 e arts. 18, § 2º do Decreto 3.048/99) não se pode negar que o trabalho infantil, ainda que prestado à revelia da fiscalização dos órgãos competentes, ou mediante autorização dos pais e autoridades judiciárias (caso do trabalho artístico e publicitário), nos termos dos arts. 2º e 3º da CLT, configura vínculo empregatício e fato gerador do tributo à seguridade, nos termos do inciso I do art. 195 da Constituição Federal. 17. Assim, apesar da limitação constitucional de trabalho do infante (art. 157, IX da CF/46, art. 165, X da CF/67 e art. 7º, XXIII, da CF/88), para fins de proteção previdenciária, não há como fixar também qualquer limite etário, pois a adoção de uma idade mínima ensejaria ao trabalhador dupla punição: a perda da plenitude de sua infância em razão do trabalho realizado e, de outro lado, o não reconhecimento, de parte do INSS, desse trabalho efetivamente ocorrido. 18. Ressalte-se, contudo, que para o reconhecimento do trabalho infantil para fins de cômputo do tempo de serviço é necessário início de prova material, valendo aquelas documentais existentes em nome dos pais, além de prova testemunhal idônea. 19. Desse modo, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei 8.213/91, mostra-se possível ser computado período de trabalho realizado antes dos 12 anos de idade, qual seja sem a fixação de requisito etário. 20. Recurso do INSS desprovido. Apelação do MPF provida.

Portanto, o referido acórdão estabelece a possibilidade, em tese, de reconhecimento de atividade rural anterior aos 12 anos de idade, desde que amparada em prova testemunhal idônea, e mediante apresentação de prova material em nome dos pais.

Todavia, em que pese a possibilidade teórica de reconhecimento de atividade rural anterior aos 12 anos de idade, não há indicativos de que esse período possa ser considerado como tempo de contribuição para fins previdenciários no presente caso. Ainda que se saiba que os filhos de agricultores tivessem, à época, contato com o trabalho dos pais, não há como presumir que, neste caso, o demandante efetivamente exercesse as atividades de um jovem ou um adulto, de modo a configurar a mútua dependência característica do regime de economia familiar. Certamente a criança não possui a mesma aptidão física ao trabalho braçal no campo de um adolescente e, muito menos, de um adulto, de forma a contribuir de forma efetiva e sensível na atividade produtiva.

Em suma, para a comprovação do trabalho rural é mister a prova material corroborada por prova testemunhal, a qual, no presente caso foi dispensada em razão da autodeclaração da autora. Autodeclaração essa que tem valor probatório equivalente à prova testemunhal.

No presente caso, quanto aos períodos ainda controversos, a sentença listou adequadamente a prova material. Tenho-a por aqui reproduzida e confiro-lhe o valor de prova dos anos nela constantes:

i) de 08/09/1972, quando a autora nasceu, até 06/09/1984, quando fez 12 anos.

Primeiramente, sobre a prova material, a sentença, a qual me reporto, menciona certidão de casamento dos pais da autora, em 1967, certidões do Incra de 1978 a 1991, matrícula de imóvel rural, em 1976, fichas de associado sindical, histórico escolar da autora, de 1980 a 1983. Portanto, provado o labor campesino dos pais da autora.

Em segunda razão, cabe ressaltar que o pedido desde os 12 anos de idade, apesar de constar já no procedimento administrativo, após sua emenda, como descreve a sentença, não está na autodeclaração feita pela parte autora. Logo, não há provas e não há falar em cerceamento de defesa, repiso. Oportunizou-se a prova, esta foi limitada num período diverso do pedido judicialmente.

Como terceiro argumento, infactível e irrazoável que se considere labor no 1º dia de vida. Ainda que se considere uma infância sacrificada por conta do trabalho na lide rural e dentro de um pensamento garantístico e eficaz quanto à tutela dos direitos subjetivos dos hipossuficientes, inadmissível trabalho infantil em tão tenra idade, sendo despiciendo entrar em maiores digressões sobre o ponto diante da obviedade da impossibilidade de considerar labor rural desde o nascimento de um bebê.

ii) de 08/09/1980, com 8 anos de idade, a 06/09/1984.

Repetem-se todas as argumentações acima sobre a prova material e sobre a autodeclaração. De diverso, apenas cabe não olvidar que a autora passou a frequentar a escola com 8 anos de idade, ou seja, em 1980. Logo, sua eventual lide na terra seria somente no turno em que não estava na escola. Ainda que ocorresse, era em título colaborativo e não de efetiva subsistência.

iii) de 01/11/1991 a 30/11/1992.

Quanto à possível averbação do tempo rural correspondente a períodos posteriores a 01/11/1991, registra-se que, a partir do mencionado marco, a inclusão do tempo de serviço rural ao tempo total contabilizado para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição fica condicionada à prévia comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias ou à respectiva indenização, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei 8.213/1991 c/c artigo 45, §§ 1º, 2º e 4º, da Lei 8.212/1991 e artigo 15, II, da IN 45/2010. Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. NECESSIDADE PARA EFEITO DE CARÊNCIA. 1. Não se tratando de contagem recíproca, a qual diz com o aproveitamento de tempo laborado em um regime de previdência para obtenção de benefício em regime diverso, o art. 55, § 2º., da LBPS permite o cômputo do tempo de serviço rural independentemente de aporte contributivo à Previdência, desde que tenha sido exercido anteriormente à vigência da Lei ou, mais especificamente, em época precedente à competência novembro de 1991, forte no art. 192 do Dec. n. 357/91, repetido nos posteriores Regulamentos da Previdência Social, em obediência ao art. 195, § 6º., da Carta Magna. (TRF4, AC 2009.72.99.000390-3, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 20/05/2010).

Com bem destaca a sentença, para o período posterior a 1991, a parte autora deve indenizar. Mesmo já emitida a guia de recolhimento, há ainda, oportunidade de a parte autora indenizar o referido período.

iv) de 01/11/1991 a 15/04/1996. A sentença asseverou que de 07/09/1984 a 12/11/1994 houve reconhecimento administrativo, facultando-se a indenização após 1991. Ou seja, não há questionamento quando à matéria de fundo, já que houve trabalho rural.

Cumpre esclarecer que para o período de 13/11/1994 até 15/04/1996, segundo a sentença, não há provas documentais, na medida em que há apenas:

- certidão de óbito do genitor do autor, em 12/04/1987, em que consta a profissão de agricultor (evento 1, PROCADM7, fls. 15)

- CTPS da autora, com primeiro registro de contrato de trabalho, em 16/04/1996 (evento 1, PROCADM6, fl. 19);

Não houve provas em sentido contrário.

Como acima fundamentado, o reconhecimento de trabalho rural nessa idade (antes dos 12 anos) demanda prova indubitável, robusta, forte, a qual não verifico nestes autos.

Inexiste prova testemunhal. E, a prova material acima descrita é inábil a provar o trabalho rural. Nessas condições, tendo em conta as circunstâncias do caso posto à análise, ausência de prova contundente e específica, não é possível o reconhecimento do labor rural anterior aos 12 anos de idade, devendo ser mantida a sentença.

Em suma, mantém-se a sentença. Porém, faculta-se à autora indeizar o período após 1991.

Reafirmação da DER (Tema 995 STJ)

Sobre a matéria, para evitar tautologia, tomo as razões sentenciais:

Nessas condições, em 28/06/2019 (DER), a parte autora tinha direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 86 pontos (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. II, incluído pela Lei 13.183/2015).

Deixo de considerar a hipótese de reafirmação da DER no caso, já que a autora, mesmo que considerado o tempo de contribuição após o pedido administrativo, até a véspera da vigência da Emenda Constitucional 103/2019 (12/11/2019), não alcançaria os 86 pontos necessários para obter o cálculo do benefício sem a incidência do fator previdenciário.

Honorários

Mantida a sentença, tendo-se que foi a parte autora quem recorreu, não há falar em majoração prevista no artigo 85, § 11, do CPC.

Prequestionamento

Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.

Conclusão

Mantida a sentença de parcial procedência.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo.



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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5037107-83.2020.4.04.7100/RS

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

APELANTE: REJANE MOSCHEN (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. labor antes dos 12 anos de idade.

1.em que pese a possibilidade teórica de reconhecimento de atividade rural anterior aos 12 anos de idade, não há indicativos de que esse período possa ser considerado como tempo de contribuição para fins previdenciários no presente caso. Ainda que se saiba que os filhos de agricultores tivessem, à época, contato com o trabalho dos pais, não há como presumir que, neste caso, o demandante efetivamente exercesse as atividades de um jovem ou um adulto, de modo a configurar a mútua dependência característica do regime de economia familiar. Certamente a criança não possui a mesma aptidão física ao trabalho braçal no campo de um adolescente e, muito menos, de um adulto, de forma a contribuir de forma efetiva e sensível na atividade produtiva.

2. Para a comprovação do trabalho rural é mister a prova material corroborada por prova testemunhal, a qual, no presente caso foi dispensada em razão da autodeclaração da autora. Auto declaração essa que tem valor probatório equivalente à prova testemunhal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 18 de abril de 2023.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003807387v5 e do código CRC 30cf2de6.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 11/04/2023 A 18/04/2023

Apelação Cível Nº 5037107-83.2020.4.04.7100/RS

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL

APELANTE: REJANE MOSCHEN (AUTOR)

ADVOGADO(A): TEREZINHA PEREIRA SCHARDOSIM GARCIA (OAB RS060163)

ADVOGADO(A): FERNANDA DILAREZ DOS SANTOS (OAB RS090905)

ADVOGADO(A): ANGELA PIRES MARIAN (OAB RS108382)

ADVOGADO(A): TEREZINHA PEREIRA SCHARDOSIM GARCIA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/04/2023, às 00:00, a 18/04/2023, às 16:00, na sequência 340, disponibilizada no DE de 28/03/2023.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

Votante: Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 03/05/2023 08:01:20.

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