APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001706-69.2010.4.04.7004/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | NELSON PEREIRA DIAS |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL COMO SEGURADO ESPECIAL. TEMPO URBANO. REQUISITOS CUMPRIDOS. AVERBAÇÃO.
1. Comprovado o exercício de atividade rural, na qualidade de segurado especial, mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea e também o labor urbano.
2. Não comprovado tempo de serviço/contribuição suficiente à concessão da aposentadoria pleiteada, os períodos reconhecidos devem ser averbados para futura concessão de benefício previdenciário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento à remessa oficial, determinando a averbação dos períodos reconhecidos, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de outubro de 2015.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7829297v10 e, se solicitado, do código CRC 9152A189. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
| Data e Hora: | 22/10/2015 11:55 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001706-69.2010.4.04.7004/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | NELSON PEREIRA DIAS |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença em que o magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição à parte autora, não reconhecendo o exercício do labor rural como segurado especial (em regime de economia familiar, nos períodos entre 31/10/66 a 31/12/74 e 01/01/79 a 14/07/91), mas reconhecendo e determinando a averbação dos períodos de trabalho urbano (15/05/1976 a 10/06/1976, 23/06/1976 a 01/10/76 e 01/04/93 e 03/06/08).
A parte autora recorre sustentando, em síntese: quanto ao labor rural, (a) que a extensão do imóvel rural, bem como o enquadramento do pai do autor como empregador rural nos comprovantes do ITR (empregado rural II-B e II-C) não descaracterizam o regime de economia familiar, consideradas a legislação de regência e a jurisprudência; (b) que o período de labor entre 01/01/1979 e 14/07/1991 deu-se após o requerente haver contraído matrimônio, com a esposa e filhos, época na qual os óbices apontados em sentença não mais persistiam.
Quanto ao labor urbano, que o magistrado a quo desconsiderou a declaração emitida pela Prefeitura Municipal de Ivaté (período entre 01/04/1993 e 17/01/1994), que deve ser computado para fins de concessão do benefício.
Regularmente processados, e também em função de remessa oficial, subiram os autos a esta Corte.
É o sucinto relatório.
VOTO
Remessa oficial
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR, em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Do tempo rural
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da carência
A carência exigida no caso de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição é de 180 contribuições. Entretanto, para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à tabela constante do art. 142 da Lei 8.213/91, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
Da dispensa do recolhimento de contribuições. Labor anterior à Lei 8.213/91.
Sobre a matéria, dispõe a Lei n.º 8.213/91, ipsis literis:
Art. 55, §2.º - O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
Já o art. 96, que regula os critérios dentro dos quais a contagem recíproca é admitida, consigna em seu inciso IV:
(...) IV- O tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de 0,5% ao mês, capitalizados anualmente, e multa de 10%". (redação dada pela MP nº 2.022-17, de 23-05-2000, atual MP nº 2.187-13, de 24-08-2001)
O correto alcance e aplicação dos dispositivos referidos foi objeto de julgamento nos Tribunais Superiores, onde restou consignado (1) que o tempo de serviço rural anterior à vigência da Lei n.º 8.213/91 pode ser computado para a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, sem recolhimento de contribuições, por expressa ressalva do § 2.º do art. 55, acima transcrito, salvo para carência (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 1465931/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 09-12-2014; AR 3902/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 07-05-2013), e (2) que não cabe indenização das exações correspondentes ao interregno de trabalho rural (constante do inciso IV do art. 96, também transcrito) nos períodos nos quais o trabalhador rural estava desobrigado de contribuir ao Regime Geral de Previdência Social, justificando-se a imposição da indenização apenas em relação à contagem recíproca de tempo de serviço público (AgRg no REsp 1413730/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, 2.ª Turma, DJe de 09-12-2013; REsp 1266143/SP, Rel. Jorge Mussi, 5.ª Turma, DJe de 09-10-2014).
Por fim, ressalte-se que o tempo de serviço rural sem o recolhimento das contribuições, em se tratando de regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família como aos demais dependentes do grupo familiar que com ele laboram (STJ - REsp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 07-10-03 e REsp n.º 603.202, Rel. Min. Jorge Scartezzini, decisão de 06-05-04).
Do recolhimento de contribuições após a Lei 8.213/91
O cômputo do tempo de serviço prestado na atividade rural posterior à vigência da Lei n° 8.213/91, para fins de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, fica condicionado ao pagamento das contribuições correspondentes.
No mesmo sentido o enunciado da súmula 272 do STJ, verbis:
"O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas."
Como já dito, a teor do disposto no art. 55, §2°, da Lei n° 8.213/91 c/c os arts. 123 e 127, V, ambos do Decreto 3.048/99, para fins de aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição, o trabalhador rural poderá computar o tempo de serviço prestado sem o recolhimento de contribuições até a competência de outubro de 1991, exceto para efeito de carência.
O art. 39, inc. II, da Lei n° 8.213/91, condicionou o reconhecimento do tempo rural posterior à referida Lei, para fins de aposentadoria por tempo de serviço, ao recolhimento, pelo segurado, das contribuições previdenciárias, na condição de facultativo.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do caso concreto
No caso concreto é controvertido o labor rural no período de 31/10/1966 a 31/12/1974, em regime de economia familiar, juntamente com os pais e 01/01/1979 a 14/07/1991, em regime de economia familiar, juntamente com a esposa e filhos.
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:
a) Escritura de compra e venda referente aos lotes nºs 69 e 74, em Ivaté/PR, adquirido pelo pai do autor no ano de 1961 (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 15) e transmitido ao autor e demais herdeiros em 1993, consoante formal de partilha (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 19);
b) Certidão de nascimento de filho, do ano de 1988, constando a profissão do autor como "lavrador" (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 24);
c) Notas fiscais de comercialização de produtos agrícolas, dos anos de 1992 e 1993, em nome do autor (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 25 e 26);
d) declaração fornecida pela secretaria municipal de Ivaté/PR atestando que o autor cursou o ensino fundamental no período de 1967 a 1970, na escola rural localizada na Estrada Recanto no município de Ivaté/PR (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 122);
e) notificação do ITR, do ano de 1986, em nome do pai do requerente (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 124);
f) ITR do ano de 1974, em nome do pai do requerente (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 125);
g) notificação do ITR - exercício 1984, 1986 e 1988, em nome do pai do requerente (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 126 e seguintes);
h) certificado de cadastro no INCRA de 1972, 1973, 1976, 1982 1985, 1986, 1987, 1988, 1989, em nome do pai do requerente (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 129 e seguintes);
i) certificado de cadastro no INCRA - exercício 1976 (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 130);
j) certidão de casamento celebrado em 1974, em que o autor foi qualificado como lavrador (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 143);
k) Carteira e contribuições ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Umuara, dos anos de 1988 e 1989 (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 145);
Tais documentos correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento do benefício de aposentadoria rural por idade.
Buscando corroborar a prova material inicial, foram ouvidas testemunhas, em justificação administrativa, nos seguintes termos (Evento 2, 'Pet14', fl. 13 e seguintes):
Sr. Benedito Aparecido Lopes:
"Conhece requerente Nelson Pereira Dias desde 1973 e o conhecimento se deu pelo fato de vir morar na estrada Recanto em Ivaté onde seu pai tinha adquirido uma propriedade e na ocasião o requerente já residia ali na mesma estrada num sitio que pertencia ao pai do requerente; que os dois eram solteiros; que o pai do requerente possuía duas propriedades que ficavam distante uns dois quilômetros de onde residiam e uma delas era formada por dois lotes juntos; que a família do requerente residiu num sítio de dez alqueires que ficava mais retirado de onde o declarante residia; que na época o sogro do declarante (João Rodrigues) trabalhava no lote da família e não sabe dizer em qual condição, só sabe que trabalhava ali e ali ficou até 1994, quando a família vendeu a propriedade; que o declarante se casou no ano de 1974 e foi trabalhar na chácara que possui até hoje; que quase não ia na casa do justificante e depois passaram a ter mais contato; que o requerente também se casou na mesma época e foi para Curitiba e ficou cerca de quatro anos e voltou para o sitio e então passaram a ter mais contato; que a família cultiva café, sem auxilio de terceiros e haviam mais casas, sendo ocupadas por cunhados e irmãos e cada um tocava uma parte de café; que alguns irmãos se mudaram para Curitiba; que acha que nenhum filho dele nasceu ali no sítio; que via o requerente trabalhando pois residia bem perto e se lembra que por último também colheram mandioca; que o requerente permaneceu ali até 1994 quando se mudou para Ivaté e ainda fez alguns serviços rurais e depois passou a trabalhar só na cidade; que o pai dele faleceu por volta de 1994 e venderam o sítio que o sogro do declarante trabalhava e depois venderam o outro sítio."
Sr. Mário Cangussu Borborema:
"Conhece o requerente NELSON PEREIRA DIAS desde 1984 quando comprou um sitio na estrada Recanto em Ivaté que ficava perto do sítio do pai de declarante; que o mesmo já era casado e residia numa das casas que haviam no sítio de quinze alqueires; que o requerente não possuía propriedade e trabalhava junto com o pai e mais um irmão que na época era solteiro e também trabalhava ali, onde cultivavam café e pasto, não se lembra a quantidade de café; que o requerente já tinha três filhos que acha nasceram ali; que não tem conhecimento se sua família possuía mais propriedades e só via o justificante trabalhando ali e sempre visitava o pai do requerente e sempre presenciava a família trabalhando em lavoura de café e nunca viu ninguém de fora trabalhando no lote; que não tem conhecimento se havia separação das áreas, via todos trabalhando juntos; que nas colheitas os vizinhos ajudavam trocando dias; que o requerente permaneceu no lote até 1994 e sabe que o pai dele ainda ficou ali e faleceu no local e depois é que venderam a propriedade; que não tem conhecimento se o Sr. Nelson teve alguma propriedade rural; que o pai do requerente nunca comentou que tinha outra propriedade além da que residiam; que o declarante ainda possui o lote e se mudou para a cidade de Ivaté há pouco mais de um ano."
Conclusão
Com relação ao período entre 31/10/1966 a 31/12/1974, é de ser mantida a sentença que não reconheceu a condição do autor como segurado especial, em regime de economia familiar.
Tal não se dá, entretanto, em função da extensão do imóvel paterno.
A consideração da extensão da propriedade rural só passou a ser requisito à configuração da condição de segurado especial a partir da vigência da Lei n. 11.718, de 20-06-2008, que deu nova redação ao inc. VII do art. 11 da Lei de Benefícios da Previdência Social. Anteriormente, não havia previsão legal que condicionasse a qualidade de segurado especial à dimensão do imóvel rural.
Reconheço que o período vindicado como de exercício de atividades agrícolas é anterior à novel legislação, inaplicável, portanto, ao caso concreto, de forma que a extensão da propriedade é apenas mais um aspecto a ser analisado juntamente com o restante do conjunto probatório, não constituindo, por si só, óbice ao reconhecimento da condição de segurado especial, salvo nas hipóteses em que a área do imóvel seja de tal monta que inviabilize a sua exploração apenas pelo grupo familiar. (Neste sentido, o EIAC n. 2000.04.01.043853-1/RS, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, unânime, DJU de 11-02-2004).
Entretanto, em justificação administrativa o requerente declarou (Evento 2, 'Pet 14', fl. 15) que em um dos imóveis havia empregados, que lá residiam, e alternância entre estes, a indiciar que a utilização de mão de obra não foi eventual, prolongando-se no tempo.
A contratação de empregados permanentes afasta a qualidade de segurada especial, conforme a especificação da Lei n. 8.213/91, presente desde a redação original, verbis:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
§ 1o Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008) (grifei)
Já com relação ao período entre 01/01/1979 a 14/07/1991, quando a parte autora regressou de Curitiba, a prova trazida aos autos, material (notificações de ITR, certificados de cadastro no INCRA) e testemunhal, dá conta de que o requerente estabeleceu-se com esposa e filhos em parte do imóvel dos pais, e que então trabalharam no cultivo de café, sem ajuda de empregados.
Neste sentido o depoimento do autor, segundo o qual "retornou para o mesmo sítio em 1979 e continuo a trabalhar juntamente com o pai e os irmãos, dividiram áreas de café e cada irmão cultivava a sua parte; que nessa propriedade não haviam empregados e ali trabalhou até 1994, se mudando para a cidade e que a propriedade foi vendida posteriormente".
A testemunha Benedito Aparecido Lopes, quanto ao ponto, declarou que "o requerente também se casou na mesma época e foi para Curitiba e ficou cerca de quatro anos e voltou para o sitio e então passaram a ter mais contato; que a família cultiva café, sem auxilio de terceiros e haviam mais casas, sendo ocupadas por cunhados e irmãos e cada um tocava uma parte de café".
Portanto, o período entre 01/01/1979 a 14/07/1991 deverá ser averbado pelo INSS e considerado quanto ao pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, resultando no acréscimo de 12 anos e 06 meses e 14 dias, devendo ser reformada a sentença, no ponto.
Da atividade urbana
A comprovação de tempo de atividade urbana deve obedecer a inteligência do artigo 55 da LBPS, parágrafo 3º, o qual dispõe que: "A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Nesse sentido, entende-se como início de prova material a existência de documentos que demonstrem o trabalho exercido pela parte requerente, tais como anotações existentes na CTPS, fichas de empregados, livro de frequência, recibos de pagamento.
Ainda, com relação às anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social, estas constituem prova plena, para todos os efeitos, dos vínculos empregatícios ali registrados, porquanto gozam de presunção iuris tantum de veracidade (Decreto 3.048/99, arts. 19 e 62, § 2º, I), ilidida apenas quando da existência de suspeitas objetivas e razoavelmente fundadas acerca dos assentos contidos do documento.
Nessa esteira, reputando a CTPS como documento hábil a comprovar os períodos de trabalho nela lançados, salvo nas hipóteses acima elencadas, os seguintes precedentes desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. SEGURADO EMPREGADO. CTPS. AVERBAÇÃO. ATIVIDADE RURAL. TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. APOSENTADORIA POR IDADE, NOS TERMOS DO § 3º DO ART. 48 DA LEI N.º 8.213/91, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N.º 11.718/2008. REQUISITOS PREENCHIDOS. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Havendo prova plena do labor urbano, através de anotação idônea, constante da CTPS da autora, que goza da presunção de veracidade juris tantum, deve ser reconhecido o tempo de serviço prestado nos períodos a que se refere.
(...)(TRF4, Sexta Turma, AC. nº 0010587-20.2014.404.9999, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 26/08/2014).
PREVIDENCIÁRIO.APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. ANOTAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO EM CTPS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. REVISÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. CONDUTA LEGAL. AUSÊNCIA DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.
1. Os registros constantes na CTPS possuem presunção juris tantum, somente podendo ser infirmados por provas robustas em sentido contrário.
(...)(TRF4, Quinta Turma, AC nº 5007974-75.2011.404.7208, Relator Desembargador Federal Rogério Favreto, D.E. 07/08/2014).
Cabe referir ainda, que mesmo a ausência de recolhimentos previdenciários correspondentes, os quais estavam a cargo do empregador, não pode obstar o reconhecimento do labor prestado pelo segurado como tempo de serviço para fins previdenciários, especialmente quando o interregno vem regularmente anotado em CTPS, respeitando a ordem cronológica.
Do caso concreto
São incontroversos os períodos 15/05/1976 a 10/06/1976, 23/06/1976 a 01/10/1976 e 17/02/1994 a 03/06/2008 (DER), reconhecidos pelo INSS (Evento 2, 'Anexos Pet4', fls. 148 até 155) e por sentença.
Controvertido é o período entre 01/04/1993 a 17/01/1994, em que a parte autora prestou serviços à Prefeitura Municipal de Ivaté.
Tenho que o documento apresentado (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 121), certidão da prefeitura municipal de Ivaté, assinada pelo prefeito, é suficiente para comprovar o labor. É de se observar, inclusive, que os demais períodos trabalhados na prefeitura, cujos recibos foram juntados no presente processo (e que foram averbados pelo INSS), referem as parcelas deduzidas para o regime geral de previdência.
Se a Prefeitura de Ivaté deixou de ter regime próprio de previdência, tanto que a partir de 17/02/1994 e até 09/2008 são relacionados no CNIS as respectivas contribuições ao RGPS (Evento 2, 'Anexos Pet4', fls. 154 e 155), o interregno controverso, entre 01/04/1993 a 17/01/1994, também deve ser averbado pela autarquia previdenciária, com a questão relacionada às contribuições previdenciárias devendo ser resolvida com a compensação entre os respectivos regimes.
Analiso, pois, a possibilidade de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Estes os períodos que integrarão a presente análise:
a) Urbano com registro em Carteira de Trabalho, de 15/03/1977 e 02/06/1977 (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 121);
b) Rural como segurado especial entre 01/01/1979 a 14/07/1991, reconhecido neste julgamento;
c) Urbano correspondente aos apontamentos no CNIS, reconhecidos por sentença e confirmados neste julgamento entre 15/05/1976 a 10/06/1976, 23/06/1976 a 01/10/1976 e 17/02/1994 a 03/06/2008 - DER (Evento 2, 'Anexos Pet4', fls. 148 até 155);
d) Urbano reconhecido neste julgamento, entre 01/04/1993 a 17/01/1994 (Evento 2, 'Anexos Pet4', fl. 121).
Considerando-se tais períodos, e tendo-se em vista a data do protocolo do requerimento administrativo, resta analisar o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria pleiteada frente às regras dispostas pela Emenda Constitucional nº 20, em vigor desde 16-12-1998.
Tem-se, pois, as seguintes possibilidades:
(a) concessão de aposentadoria por tempo de serviço proporcional ou integral, com o cômputo do tempo de serviço até a data da Emenda Constitucional nº 20, de 16-12-1998, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei nº 8.213/91: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de serviço mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado (art. 52 da Lei de Benefícios), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 6% (seis por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (art. 53, I e II da LBPS);
(b) concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral, com o cômputo do tempo de contribuição até 28-11-1999, dia anterior à edição da Lei que instituiu o fator previdenciário, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei nº 8.213/91: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de contribuição mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado, e a idade mínima de 48 anos para a mulher e 53 anos para o homem, além, se for o caso, do pedágio de 40% do tempo que, em 16-12-1998, faltava para atingir aquele mínimo necessário à outorga do benefício (art. 9.º, § 1.º, I, "a" e "b", da Emenda Constitucional nº 20, de 1998), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 5% (cinco por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (inciso II da norma legal antes citada); contudo, se o segurado obtiver tempo suficiente para a concessão do benefício de forma integral até 28-11-1999, ou seja, 35 anos para homem e 30 anos para mulher, o requisito etário e o pedágio não lhe podem ser exigidos;
(c) concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral, com o cômputo do tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo, quando posterior às datas dispostas nas alíneas acima referidas: exige-se o implemento da carência (art. 142 da Lei nº 8.213/91) e do tempo de serviço mínimo de 30 anos para a segurada e 35 anos para o segurado (art. 201, § 7.º, I, da Constituição Federal de 1988), que corresponderá a 100% do salário de benefício, a ser calculado nos termos do inciso I do art. 29 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99.
No caso concreto, o resultado da soma do tempo de serviço/contribuição reconhecido pela administração previdenciária, com o tempo de serviço/contribuição reconhecido judicialmente demonstra que:
(a) Em 16/12/1998, a parte autora possuía 18 anos, 08 meses e 24 dias, não tendo direito à aposentadoria por tempo de serviço.
(b) Em 28/11/1999, a parte autora possuía 19 anos, 08 meses e 06 dias, não tendo direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
(c) Em 03/06/2008 (DER), a parte autora possuía 28 anos, 02 meses e 11 dias, não tendo direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
Portanto, o autor não implementou os requisitos necessários à concessão da aposentadoria proporcional ou integral por tempo de serviço ou contribuição, no entanto, o segurado faz jus à averbação do período rural (01/01/1979 a 14/07/1991) e urbano (01/04/1993 a 17/01/1994) ora reconhecidos, para fins de futura obtenção de aposentadoria.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento à remessa oficial, determinando a averbação dos períodos reconhecidos.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/10/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001706-69.2010.4.04.7004/PR
ORIGEM: PR 50017066920104047004
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | NELSON PEREIRA DIAS |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/10/2015, na seqüência 244, disponibilizada no DE de 06/10/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, DETERMINANDO A AVERBAÇÃO DOS PERÍODOS RECONHECIDOS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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