Apelação Cível Nº 5011647-70.2015.4.04.7100/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | MAIRE JOSE DE ABREU LOPES |
ADVOGADO | : | CRISTIANO OHLWEILER FERREIRA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ACUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA EXCEPCIONAL DE ANISTIADO. POSSIBILIDADE.
1. A aposentadoria excepcional de anistiado político, prevista pelo art. 8º do ADCT e regulamentada pela Lei nº 10.559/2002, de cunho indenizatório, pode ser cumulada com o benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, decorrente da condição de segurado. Isso porque as referidas prestações possuem fato gerador diverso: uma, a perseguição política; a outra, o risco social. Tal entendimento não afronta o disposto no art. 16 da Lei nº 10.559/2002, que veda a cumulação de benefícios com o mesmo fundamento, tampouco o art. 124 da Lei nº 8.213/91, que se refere a duas prestações de cunho previdenciário.
2. Esta Corte já decidiu que O parágrafo único do art. 150 da Lei 8.213/91, na sua redação original - que veda o recebimento concomitante da aposentadoria excepcional de anistiado com aposentadoria por invalidez, por tempo de serviço ou por idade -, não merece vigência ante a normativa aplicável à matéria, não só porque traz limitações ao art. 8º do ADCT que não encontram respaldo na Carta Política, como também porque chancela incongruência entre o cunho reparatório que inspirou a instituição de uma benesse aos perseguidos pelo Estado e a índole contributiva do sistema previdenciário. (AC 2001.71.00.013226-0, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, DJ 09/08/2006)
3. As normas que versam sobre correção monetária e juros possuem natureza eminentemente processual, e, portanto, as alterações legislativas referentes à forma de atualização monetária e de aplicação de juros, devem ser observadas de forma imediata a todas as ações em curso, incluindo aquelas que se encontram na fase de execução.
4. Visando não impedir o regular trâmite dos processos de conhecimento, firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público, a forma como será apurada a atualização do débito deve ser diferida (postergada) para a fase de execução, observada a norma legal em vigor.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de setembro de 2016.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8536255v7 e, se solicitado, do código CRC 4158D353. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 16/09/2016 18:28 |
Apelação Cível Nº 5011647-70.2015.4.04.7100/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | MAIRE JOSE DE ABREU LOPES |
ADVOGADO | : | CRISTIANO OHLWEILER FERREIRA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação de rito ordinário proposta por MAIRE JOSE DE ABREU LOPES contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (espécie 42), desde a DER (14/03/2012), bem como o reconhecimento do direito à cumulação do referido benefício com a aposentadoria excepcional de anistiado (espécie 58) que já recebe, sustentando que esta tem natureza indenizatória e a cumulação foi expressamente reconhecida pela decisão judicial que concedeu a prestação (processo nº 2000.71.00.003021-5).
Sentenciando, o juízo "a quo" julgou improcedente o pedido, sob os seguintes fundamentos:
"(...)
Pois bem, a regra do parágrafo único do artigo 150 da LBPS expressamente veda a cumulação da aposentadoria excepcional do anistiado político com os benefícios tipicamente previdenciários, porque previu a transformação do benefício atual em aposentadoria excepcional ou pensão por morte de anistiado, se mais vantajosas, ou seja, a substituição da prestação previdenciária pelo benefício excepcional do anistiado, não a cumulação entre ambos.
E essa transformação era coerente com o ADCT, que também não previa a cumulação dos benefícios.
No presente caso concreto, quando do requerimento administrativo de aposentadoria por tempo de contribuição, em 14/03/2012, o autor recebia a aposentadoria excepcional de anistiado, logo foi correto o indeferimento administrativo.
Apenas no curso deste processo, após encerrada a instrução e aguardando-se a sentença, veio a notícia da publicação da Portaria do Ministro da Justiça n° 2.022, de 03/12/2015, estabelecendo a
(...) substituição da aposentadoria excepcional de anistiado político, sob NB 58/149.272.110-4, nos mesmos valores que vem percebendo do INSS, pelo regime de reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação mensal, permanente e continuada, sem efeitos financeiros retroativos, nos termos do artigo 1º, incisos I e II, c/c artigo 19, da Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002.
Tem-se, assim, uma importante mudança no quadro fático, pois alterado o benefício de anistiado do autor, mas cujas consequências não podem ser sindicadas na presente lide, em virtude da ausência de prévio requerimento administrativo e da formação de contraditório e ampla defesa especificamente quanto a esse novo contexto.
Note-se que a improcedência do pedido é manifesta, porquanto no requerimento administrativo e nos anos que se seguiram, inclusive durante quase todo o processamento desta ação, havia óbice legal à cumulação da aposentadoria por tempo contribuição com a aposentadoria excepcional de anistiado.
Agora, tendo o autor obtido a substituição do benefício para o do regime de reparação econômica da Lei n° 10.559/2002, cumpre a ele formular o necessário requerimento administrativo, inclusive para caracterizar o interesse de agir em face do INSS, segundo decidiu o STF em sede de repercussão geral, afinal a decisão depende "da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração" (item 4 da ementa do RE 631240, Relator Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, DJe 07/11/2014).
(...)"
A sentença condenou, ainda, a parte autora "ao pagamento dos honorários aos advogados públicos no percentual mínimo de cada uma das faixas de valor no § 3° do artigo 85 do CPC 2015, contada a pretensão máxima deduzida na petição inicial e as prestações vencidas até a presente data, mas a exigibilidade da verba fica suspensa em virtude da AJG (CPC 2015, art. 98, § 3°)."
Inconformado, o autor interpôs apelação, aduzindo que a aposentadoria de anistiado político possui caráter indenizatório, podendo ser cumulada com qualquer outro benefício previdenciário. Sustenta que o art. 16 da Lei nº 10.559/02, quando regulamentou o art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), determinou que os direitos expressos naquela lei não excluiriam os conferidos por outras normas legais ou constitucionais, vedando apenas a acumulação de quaisquer pagamentos ou benefícios ou indenização com o mesmo fundamento. Informa que a concessão de sua aposentadoria excepcional de anistiado se deu através de determinação judicial no processo nº 2000.71.00.003021-5 e que o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ora postulado possui fundamentos legais e requisitos objetivos diversos da aposentadoria de anistiado político, motivo esse que ampara o presente pleito. Afirma que até 14/03/2012 possui 35 anos de tempo de serviço, o que restou comprovado nestes autos pelas anotações em sua CTPS. Salienta, por fim, que juntou cópia da "Portaria N. 2.022, de 3 de Dezembro de 2015, do Ministério da Justiça, que reconhece à parte autora o direito à condição de anistiado político, e concede a substituição da aposentadoria excepcional de anistiado político, sob NB 58/149.272.110-4, nos mesmos valores que vem percebendo do INSS, pelo regime de reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação mensal, permanente e continuada, sem efeitos financeiros retroativos, nos termos do artigo 1º, incisos I e II, c/c artigo 19, da Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002."
Sem contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
APOSENTADORIA EXCEPCIONAL DE ANISTIADO
A Lei nº 6.683, de 28/08/1979, concedeu anistia àqueles que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores públicos, militares e dirigentes e representantes sindicais punidos com fundamento em atos institucionais, no período compreendido entre 02/09/1961 e 15/08/1979. Aos servidores civis e militares que foram demitidos, postos em disponibilidade, aposentados, transferidos para a reserva ou reformados, foi assegurado o direito de requererem o retorno ou a reversão ao serviço ativo. Em não havendo requerimento, ou em caso de indeferimento do pedido, eram eles considerados aposentados, transferidos para a reserva ou reformados.
A Emenda Constitucional nº 26/85, manteve a anistia nos termos daquela lei, mas assegurou o direito às promoções, na aposentadoria ou reserva, ao cargo, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem os servidores civis ou militares no serviço ativo, dispondo, em seu art. 4º, § 6º, que "Excluem-se das presentes disposições os servidores civis ou militares que já se encontravam aposentados, na reserva ou reformados, quando atingidos pelas medidas constantes do "caput" deste artigo."
O art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), por sua vez, ampliou o lapso temporal da anistia, para alcançar aqueles que foram atingidos em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nº 864, de 12 de setembro de 1969, no período de 18/09/1946 a 05/10/1988, assegurando as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, com efeitos financeiros a partir da promulgação da Carta, vedada a remuneração de qualquer espécie em caráter retroativo.
O art. 150 da Lei nº 8.213/91 assim tratou da matéria, verbis:
Art. 150. Os segurados da Previdência Social, anistiados pela Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979, ou pela Emenda Constitucional nº 26, de 27 de novembro de 1985, ou ainda pelo art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal terão direito à aposentadoria em regime excepcional, observado o disposto no Regulamento.
Parágrafo único. O segurado anistiado já aposentado por invalidez, por tempo de serviço ou por idade, bem como seus dependentes em gozo de pensão por morte, podem requerer a revisão do seu benefício para transformação em aposentadoria excepcional ou pensão por morte de anistiado, se mais vantajosa. (grifei)
Os Decretos nº 357/91, nº 611/92 e nº 2.172/97, ao regulamentarem a matéria, estabeleceram critérios específicos para a concessão, cálculo da RMI e reajustamento do benefício, garantindo ao segurado anistiado já aposentado por invalidez, por tempo de serviço ou por idade, bem como a seus dependentes em gozo de pensão por morte, a possibilidade de requerer a revisão do benefício para transformação em aposentadoria excepcional ou pensão por morte de anistiado, se mais vantajosa (arts. 135, 135 e 127, respectivamente).
O regulamento atualmente vigente, Decreto nº 3.048/99, deixou de estabelecer regras específicas em relação à aposentadoria excepcional de anistiado, dispondo, em seu art. 181, parágrafo único, que "Aos beneficiários de que trata o art. 150 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, aplicam-se as disposições previstas neste Regulamento, vedada a adoção de critérios diferenciados para a concessão de benefícios."
A questão, porém, ganhou nova disciplina com o advento da Medida Provisória nº 2.151, de 31/05/2001 (a qual foi reeditada duas vezes). Posteriormente, a Medida Provisória nº 65, de 28/08/2002, revogando a MP nº 2.151-2/01, dispôs novamente sobre a matéria, tendo sido convertida na Lei nº 10.559, de 13/11/2002, atualmente vigente.
Portanto, atualmente os benefícios dos anistiados estão sob a égide da Lei nº 10.559/02, que expressamente assegura a concessão de benefício calculado com base em valor igual ao que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, com reajustamento permanente e continuado, observada a data de alteração da remuneração que o anistiado político estaria recebendo se estivesse em serviço ativo, respeitado o limite do teto estabelecido no art. 37, XI e §9º, da CF.
A Lei referida, em seu art. 19, normatiza que os pagamentos dos benefícios relativos aos já anistiados, que vêm sendo feito pelo INSS e demais entidades públicas, bem como por empresas mediante convênio com o referido instituto, serão mantidos, sem solução de continuidade, até a sua substituição pelo regime de prestação mensal, permanente e continuada, instituído pela mesma lei, dispondo o parágrafo único que os recursos necessários ao pagamento das reparações econômicas de caráter indenizatório terão rubrica própria no Orçamento Geral da União e serão determinadas pelo Ministério da Justiça.
Diz, ainda, em seu art. 16, verbis:
Art. 16. Os direitos expressos nesta Lei não excluem os conferidos por outras normas legais ou constitucionais, vedada a acumulação de quaisquer pagamentos ou benefícios ou indenização com o mesmo fundamento, facultando-se a opção mais favorável. (grifei)
Vê-se, pois, que a lei veda a acumulação de quaisquer pagamentos ou benefícios ou indenização calcados no mesmo fundamento, qual seja a reparação, pelo Estado, dos prejuízos advindos da prática de atos de exceção pelo poder público, ressalvada aos beneficiários a opção pela prestação mais vantajosa.
Ademais, a partir da previsão do benefício de reparação econômica mensal, permanente e continuada, que veio a substituir a aposentadoria excepcional de que tratava o artigo 150 da Lei nº 8.213/91 (revogado expressamente pela Lei nº 10.559/02), restou claro que não há falar em cumulação de aposentadorias, já que de aposentadoria não se trata a referida indenização paga excepcionalmente ao anistiado.
A substituição da anterior aposentadoria excepcional de anistiado pelo reparação mensal foi facultada a todos anistiados, mantendo-se a primeira até que fosse transformada no novo benefício, como consignou o artigo 19 da Lei nº 10.559/2002, in verbis:
Art. 19. O pagamento de aposentadoria ou pensão excepcional relativa aos já anistiados políticos, que vem sendo efetuado pelo INSS e demais entidades públicas, bem como por empresas, mediante convênio com o referido instituto, será mantido, sem solução de continuidade, até a sua substituição pelo regime de prestação mensal, permanente e continuada, instituído por esta Lei, obedecido o que determina o art. 11.
Parágrafo único. Os recursos necessários ao pagamento das reparações econômicas de caráter indenizatório terão rubrica própria no Orçamento Geral da União e serão determinados pelo Ministério da Justiça, com destinação específica para civis (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão) e militares (Ministério da Defesa).
Art. 11. Todos os processos de anistia política, deferidos ou não, inclusive os que estão arquivados, bem como os respectivos atos informatizados que se encontram em outros Ministérios, ou em outros órgãos da Administração Pública direta ou indireta, serão transferidos para o Ministério da Justiça, no prazo de noventa dias contados da publicação desta Lei.
Parágrafo único. O anistiado político ou seu dependente poderá solicitar, a qualquer tempo, a revisão do valor da correspondente prestação mensal, permanente e continuada, toda vez que esta não esteja de acordo com os arts. 6o, 7o, 8o e 9o desta Lei.
Acresça-se que a demora na regulamentação do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), ocorrida apenas a partir da edição da Medida Provisória nº 2.151, de 31/05/2001, bem como a transformação de sua denominação em benefício de reparação econômica mensal, permanente e continuada, não desnaturam o caráter indenizatório da aposentadoria excepcional de anistiado.
Ademais, esta Corte já decidiu que O parágrafo único do art. 150 da Lei 8.213/91, na sua redação original - que veda o recebimento concomitante da aposentadoria excepcional de anistiado com aposentadoria por invalidez, por tempo de serviço ou por idade -, não merece vigência ante a normativa aplicável à matéria, não só porque traz limitações ao art. 8º do ADCT que não encontram respaldo na Carta Política, como também porque chancela incongruência entre o cunho reparatório que inspirou a instituição de uma benesse aos perseguidos pelo Estado e a índole contributiva do sistema previdenciário. (TRF4, AC 2001.71.00.013226-0, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, DJ 09/08/2006)
Extrai-se do voto condutor do referido acórdão:
"(...) É intuitivo, portanto, que não obstante de benefício previdenciário não se cuidasse a aposentadoria excepcional de anistiado, ela encontrou regramento no seio da legislação própria do RGPS. E essa legislação, como se vê, não só previa o direito à aposentadoria de anistiado (art. 150, caput, da Lei de Benefícios), como também estabelecia os requisitos para a referida concessão (art. 122 do Decreto 2.172/97) e, na hipótese em que o segurado que já era agraciado, como no caso dos autos, por jubilamento por invalidez, estipulava que ele poderia requerer a revisão desse benefício ou a sua transformação em aposentadoria excepcional de anistiado, se ela fosse mais vantajosa (art. 150, parágrafo único, Lei 8.213/91). Disso se verifica que, de acordo com o que consignado no parágrafo único citado, tinha-se uma impossibilidade de recebimento simultâneo de aposentadoria por invalidez e do benefício de anistiado, já que, nos termos em que determinado legalmente, o segurado que já estivesse no gozo da primeira poderia requerer-lhe a transformação no último, se mais vantajoso. Em que pese não estipulado textualmente, do teor do dispositivo em comento depreende-se claramente a não cumulatividade ora impugnada pelo demandante, restando de se perquirir sobre a sua vigência ante o panorama normativo que à questão foi conferido.
O parágrafo único do art. 150 da Lei 8.213/91, na sua redação original, não merece vigência, a meu ver, ante a normativa de regência. Isso porque não só traz limitações ao art. 8º do ADCT que não encontram respaldo na Carta Política - afastando a sua incidência quando o segurado for beneficiário de aposentadoria por invalidez, por tempo de serviço ou por idade, ou prejudicando o recebimento desses benefícios quando o segurado for agraciado com a aposentadoria excepcional -, como também chancela incongruência entre o cunho reparatório que inspirou a dicção do art. 8º do ADCT e a índole contributiva do sistema previdenciário. De fato, não há justificativa razoável para impedir-se a percepção concomitante dos dois benefícios, dado que cada um deles foi criado com propósitos próprios e é implementado mediante requisitos próprios. Se os julgados devem se pautar pelo princípio da razoabilidade como modo de sanar conjunturas à toda evidência despropositadas e injustas - em muitos casos verdadeiros desvarios legislativos -, a incoerência com que ora se está a deparar - vale dizer, o embate entre uma norma que confere uma benesse reparatória de um dano causado institucionalmente e outra que tolhe, ou, pelo menos, limita sobremaneira essa benesse - pode ser erradicada também como corolário da aplicação, na hipótese dos autos, de um paradigma tal.
Tanto é assim que, quando o art. 8º do ADCT recebeu regulamentação legal específica, através das Medidas Provisórias nº 2.151-3/2001 e 65/2002, esta última convertida na Lei 10.559/2002, o art. 150, caput e parágrafo único, foram expressamente ab-rogados, sendo que a limitação nele imposta quedou-se substancialmente restringida, como se verifica da leitura do art. 16 da Lei 10.559/2002:
Art. 16. Os direitos expressos nesta Lei não excluem os conferidos por outras normas legais ou constitucionais, vedada a acumulação de quaisquer pagamentos ou benefícios ou indenização com o mesmo fundamento, facultando-se a opção mais favorável.
Essa disposição, invocada pelo recorrente para balizar a negativa à cumulação pretendida, nada mais estipula do que a impossibilidade de percepção conjunta de benefícios em virtude do mesmo fundamento, ou seja, a inviabilidade de que a perseguição que, verificada durante período de exceção, repercuta no direito a duas ou mais reparações estatais. No caso do pleito deduzido em juízo não estão em jogo benefícios conquistados em razão de um mesmo fundamento, mas direitos que, em realidade, nada têm em comum. O que resulta manifesto, nesse diapasão, é que o art. 16 invocado não só ratifica a pretensão do recorrido como depõe diametralmente contra a tese do INSS, na medida em que consubstancia norma que derroga a disposição que baliza o indeferimento do pleito do autor.
(...)" (grifei)
Conclui-se, pois, que não há falar em vedação à cumulação de aposentadoria excepcional de anistiado com benefício previdenciário, decorrentes de fundamentos diversos, mesmo antes da regulamentação do art. 8º do ADCT. Viabilizada, portanto, a cumulação dos referidos benefícios, independentemente da transformação da aposentadoria excepcional em benefício de reparação econômica mensal, permanente e continuada.
EXAME DO CASO CONCRETO
No caso dos autos, tem-se que o demandante obteve em, sede judicial (processo 2000.71.00.003021-5, acórdão transitado em julgado em 14/01/2010), o reconhecimento de seu direito à aposentadoria excepcional de anistiado (NB 58/149.272.110-4) com data de início fixada em 05/10/1988, observada a prescrição.
Ao requerer aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (NB 42/159.292.023-0, DER: 14/03/2012), o INSS reconheceu-lhe 35 anos, 2 meses e 6 dias de tempo de serviço (PROCADM1, EVENTO13, fl. 18), porém indeferiu seu pedido, sob o seguinte fundamento (PROCADM1, EVENTO13, fl. 58):
Em atenção ao seu pedido de Aposentadoria por Tempo de Contribuição apresentado em 14/03/2012, informamos que, após análise de documentação apresentada não foi reconhecido o direito ao benefício, tendo em vista que o requerente está recebendo benefício no âmbito da Seguridade Social, sob o nº 149.272.110-4, desde 05/10/1988.
Tal entendimento adotado pela Administração não deve prosperar.
Com efeito, como acima explicitado, o benefício de aposentadoria excepcional de anistiado (posteriormente denominado de reparação econômica) tem caráter indenizatório, em nada se confundindo com o benefício previdenciário, decorrente da condição de segurado. Dito de outra forma: o benefício de aposentadoria de anistiado e o benefício de aposentadoria previdenciário possuem fatos geradores diversos; o primeiro, tem como fato gerador a perseguição política; o segundo, o risco social.
Desse modo, não se trata, em absoluto, no caso concreto, de permitir a cumulação de benefícios com o mesmo fundamento, como restou vedado pelo art. 16 da Lei nº 10.559/2002. Tampouco se está a falar de dois benefícios de caráter previdenciário cuja cumulação está expressamente vedada no art. 124, da Lei nº 8.213/91. Somente em tais hipóteses é que se imporia a opção, pelo beneficiário, entre uma das duas prestações.
Ademais, equivocado o juízo a quo ao entender pela improcedência manifesta do pedido, já que, ao contrário do que afirmou, na data em que requerida a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (14/03/2012), não havia o mencionado óbice legal à sua cumulação com a aposentadoria excepcional de anistiado, visto que o art. 150 da Lei nº 8.213/91, restou expressamente revogado pela Lei nº 10.559, de 13/11/2002, vigente há mais de nove anos na DER.
Assim, considerando-se que não há falar em vedação à cumulação de aposentadoria excepcional de anistiado com benefício previdenciário, decorrentes de fundamentos diversos, mesmo antes da regulamentação do art. 8º do ADCT, desimporta se apenas em 12/2015 o autor obteve a transformação de seu benefício de aposentadoria excepcional de anistiado em benefício de reparação econômica mensal. Deve ser julgado procedente o pedido.
Portanto, resta reconhecido o direito do autor (1) à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição (NB 42/159.292.023-0), desde a DER (14/03/2012), considerando-se que implementados os reuiqistos tempo de serviço (35 anos, 2 meses e 6 dias) e carência (180 contribuições); (2) à cumulação com o benefício de aposentadoria excepcional de anistiado/reparação econômica mensal (NB 58/149.272.110-4); (3) ao pagamento das prestações vencidas, corrigidas monetariamente e com a incidência de jurosmoratórios a contar da citação.
CONSECTÁRIOS E PROVIMENTOS FINAIS
Juros Moratórios e Correção Monetária.
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei nº 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014 - grifei).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01/06/2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, não prevalecendo os índices eventualmente fixados na fase de conhecimento, ocasião em que provavelmente já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos juros e correção monetária.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS, à taxa 10% sobre as prestações vencidas até a data da presente decisão de procedência , nos termos das Súmulas n.º 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96).
Tutela específica - implantação do benefício
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Seção deste Tribunal, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que, confirmada a sentença de procedência ou reformada para julgar procedente, o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, portanto sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte (TRF4, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7, 3ª SEÇÃO, Des. Federal Celso Kipper, por maioria, D.E. 01/10/2007, publicação em 02/10/2007). Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente ao cumprimento de obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo dispôs de forma similar à prevista no Código/1973, razão pela qual o entendimento firmado pela Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Nesses termos, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB 159.292.023-0), a ser efetivada em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, bem como por se tratar de prazo razoável para que a autarquia previdenciária adote as providências necessárias tendentes a efetivar a medida. Saliento, contudo, que o referido prazo inicia-se a contar da intimação desta decisão, independentemente de interposição de embargos de declaração, face à ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).
CONCLUSÃO
Provido o apelo do autor para julgar procedente a demanda.
Diferida, para a fase de execução, a forma de cálculo dos juros e da correção monetária incidentes sobre o montante da condenação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do autor e determinar a implantação do benefício, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/09/2016
Apelação Cível Nº 5011647-70.2015.4.04.7100/RS
ORIGEM: RS 50116477020154047100
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Paulo Gilberto Cogo Leivas |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | Presencial - DR. CRISTIANO OHLWEILER FERREIRA |
APELANTE | : | MAIRE JOSE DE ABREU LOPES |
ADVOGADO | : | CRISTIANO OHLWEILER FERREIRA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/09/2016, na seqüência 409, disponibilizada no DE de 22/08/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS | |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Sustentação Oral - Processo Pautado
Comentário em 08/09/2016 15:32:36 (Gab. Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ)
acompanho o Relator
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8585900v1 e, se solicitado, do código CRC 910D76D3. | |
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