APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000551-85.2011.4.04.7104/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | IVO BEBER |
ADVOGADO | : | HENRIQUE OLTRAMARI |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. REVISÃO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE A ADMINISTRAÇÃO REVISAR SEUS ATOS. NÃO OCORRÊNCIA. OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CÔMPUTO DE CONTRIBUIÇÕES. INOBSERVÂNCIA DA ESCALA DE SALÁRIOS-BASE. RESTABELECIMENTO DO VALOR ORIGINAL. IMPOSSIBILIDADE. RECEBIMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Inocorrente a decadência do direito de a administração revisar o ato concessivo da aposentadoria do segurado se o benefício, concedido antes do advento da Lei n.º 9.784, de 29 de janeiro de 1999, tem, como termo inicial do prazo decadencial de dez anos, a data de vigência da norma que o estabeleceu, ou seja, 01-02-1999. Uma vez iniciado o processo revisional antes do decurso do prazo legal, possível o ajuste realizado na RMI do benefício do autor.
2. Não há ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa pelo fato de ser realizada a revisão da RMI antes de findo o processo administrativo, desde que propiciado ao autor a possibilidade de se defender, verificada no caso dos autos.
3. De acordo com a legislação previdenciária em vigor por ocasião do requerimento administrativo do benefício, o salário-de-contribuição do segurado empresário era o salário-base (artigo 29 da Lei n. 8.212/91), cuja escala não foi observada pelo demandante, refletindo na revisão administrativa que culminou com a redução da RMI de sua aposentadoria.
4. Tendo havido pagamento indevido de valores a título de benefício previdenciário, sem que o segurado tenha concorrido com má-fé, incabível a restituição.
5. Não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento da impossibilidade de devolução ou desconto de valores indevidamente percebidos. A hipótese é de não incidência do dispositivo legal, porque não concretizado o seu suporte fático. Precedentes do STF (ARE 734199, Rel Min. Rosa Weber).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS, à apelação do autor e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de junho de 2016.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8303822v18 e, se solicitado, do código CRC 5A0D432D. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
| Data e Hora: | 23/06/2016 14:32 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000551-85.2011.4.04.7104/RS
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | IVO BEBER |
ADVOGADO | : | HENRIQUE OLTRAMARI |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária, com pedido de tutela antecipada, ajuizada por Ivo Beber contra o INSS, objetivando o restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de serviço, conforme a concessão original, ocorrida em 02-10-98, invalidando-se o ato administrativo que reduziu o valor de seu benefício. Alega a ocorrência de decadência do direito do INSS em revisar o ato concessivo da sua aposentadoria e a impossibilidade de ser condenado à restituição dos valores eventualmente recebidos a maior, pois agiu todo o tempo com lisura e boa-fé.
A tutela antecipada foi deferida para suspender os efeitos da revisão da renda mensal e determinar ao INSS que, em 10 dias, restabelecesse o valor do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição n° 107.861.281-9 (evento 4).
Sentenciando, o magistrado singular revogou a antecipação de tutela deferida no evento 4 e julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a inexistência de direito do autor ao restabelecimento do valor do benefício no patamar em que vinha sendo pago inicialmente e assegurar ao autor o direito à não devolução ao Erário dos valores que foram pagos a maior, em virtude da sua boa-fé na percepção. Em razão da revogação da antecipação de tutela, determinou ao INSS que, já para a competência 12/2012, passe a fazer o pagamento da renda mensal de acordo com a revisão administrativa realizada. Considerando as partes iguais e reciprocamente sucumbentes e sopesando os critérios dos §§3º e 4º do art. 20 do CPC, fixou a verba honorária em R$ 8.000,00, condenando cada parte ao pagamento ao procurador da outra o valor de R$ 4.000,00, quantias que se compensam na forma do art. 21 do CPC (para cuja compensação não é óbice o benefício de assistência judiciária). O feito é isento de custas (art. 4º, I e II, Lei nº 9.289/96).
O autor recorre reiterando a decadência do direito do INSS em revisar o ato concessivo de sua aposentadoria, pois alega que entre o deferimento do benefício, em 02-10-98, e a revisão, ocorrida em 07-12-2010, passaram-se mais de 12 anos. Reitera, também, a inobservância do devido processo legal e da ampla defesa, pois primeiro seu benefício foi reduzido e só depois foi possibilitado que se defendesse. No mérito, refere que efetivamente trabalhou na empresa COTRAMAR, na condição de diretor/presidente, e os salários-de-contribuição usados no cálculo de sua aposentadoria foram exatamente os recebidos, não podendo ser prejudicado por eventual ausência de recolhimento das contribuições. Como desempenhou o labor, sustenta que tem direito ao cômputo dos períodos respectivos. Por fim, postula que os honorários sejam majorados ao patamar de 10% sobre o valor da condenação, nos termos da Súmula n. 111 do STJ.
O INSS, por sua vez, recorre postulando que o autor seja condenado a devolver aos cofres públicos os valores percebidos a maior, sob pena de enriquecimento ilícito, com base no disposto no artigo 115 da Lei n. 8.213/91, plenamente em vigor.
Com contrarrazões, e por força do reexame necessário, subiram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
À revisão.
VOTO
REEXAME NECESSÁRIO
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido, quando publicada, a sentença destes autos estava sujeita a reexame obrigatório.
A superveniência dos novos parâmetros para remessa necessária (NCPC, art. 496, § 3º), entretanto, permitiria a interpretação de que houve fato superveniente à remessa, que suprimiu o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o conhecimento da remessa.
No entanto, em precedente sucessivamente repetido, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, impõe-se que a possibilidade de conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observe os parâmetros do CPC de 1973.
No caso dos autos, ademais, incide o disposto na Súmula 490 do STJ, segundo a qual, a dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas, situação aqui configurada, razão pela qual conheço da remessa oficial.
Mérito
A questão controversa diz respeito à possibilidade de restabelecimento da aposentadoria por tempo de serviço do autor, nos termos em que originalmente concedida em 02-10-98, invalidando-se o ato administrativo que reduziu o valor de seu benefício, bem como à necessidade ou não de restituição aos cofres públicos dos valores eventualmente recebidos a maior.
A r. sentença proferida pelo Exmo. Juiz Federal Substituto Rodrigo Becker Pinto bem analisou a demanda, merecendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:
"(...)2. Da apuração de irregularidade.
O documento PROCADM1 do E22 demonstra que o autor requereu o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB 107.861.281-9 em 02/10/1998, o qual lhe foi deferido, computados 35 anos, 10 meses e 13 dias de tempo de contribuição.
Em 01/06/2007, a Comissão de Controle Interno da Gerência Executiva do INSS em Passo Fundo expediu decisão no processo administrativo de concessão do benefício do autor, expondo a necessidade de reavaliação da documentação que embasou a referida concessão. Assim, solicitou o comparecimento do segurado na agência para a realização de entrevista rural e a apresentação de documentos (E22, PROCADM13, fl. 7).
Em 13/03/2008, foi expedido um Relatório Individual de Constatações, no qual foi confirmado o período de atividade rural exercida pelo autor. No entanto, na análise da documentação levada pelo segurado, constatou-se que o seu vínculo com a Cooperativa de Transportes de Bens de Marau Ltda ('Cotramar') não era de empregado, mas de diretor-presidente (contribuinte individual). Verificou-se que, no período de 10/1995 a 09/1998, constavam recolhimentos efetuados em classes diferentes das informadas e computadas no período básico de cálculo. A irregularidade encontrada foi descrita nos seguintes termos (E22, PROCADM28, fl. 3):
Tendo em vista divergências dos valores informados e computados no Período Base de Cálculo (PBC), na condição de contribuinte individual, referentes aos meses de 10/1995 a 09/1998, como se recolhidos entre Classe 8 a 10, onde os mesmos foram informados de forma incorreta, pois conforme verifica-se, o segurado recolheu na Classe 3. Com isto os valores informados na Renda Mensal Inicial (RMI), serão revistos e novamente enquadrados, para apurar nova renda mensal, após revisão.
Em face disso, na mesma data, foi encaminhado ao segurado o Ofício nº 004/2008 - MOB, comunicando-o da irregularidade constatada e possibilitando a apresentação de defesa no prazo de 10 dias (E22, PROCADM28, fl. 4).
Em 27/03/2008, o autor apresentou defesa perante a autarquia, juntando documentos (E22, PROCADM29-PROCADM39), porém esta foi considerada insuficiente no mérito (E22, PROCADM40).
Em 13/12/2010, foi expedido o Ofício nº 41/2010 - MOB, comunicando o autor do não acolhimento da sua defesa e a consequente revisão do seu benefício para menos, bem como realizando cobrança dos valores recebidos indevidamente. Possibilitou-se, ainda, a interposição de recurso à Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social, no prazo de 30 dias a contar do recebimento do ofício, o que ocorreu em 16/12/2010 (E22, PROCADM43, fl. 7, e PROCADM44).
3. Do devido processo legal administrativo
O fundamento de inobservância do devido processo legal e ampla defesa no processo administrativo que culminou na redução do valor do benefício sustenta-se no fato de que a autarquia o teria reduzido antes de haver uma decisão definitiva na via administrativa.
O poder-dever de anulação de atos ilegais vem bem descrito na Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal:
A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
Como visto, o INSS apurou que o valor da aposentadoria concedida ao autor estava incorreto, pois foram utilizados salários de contribuição no período básico de cálculo em desconformidade com os efetivamente recolhidos.
Tal conclusão não se deu por mera alteração de interpretação sobre a prova, mas pela análise objetiva dos valores efetivamente recolhidos e dos que foram lançados para a apuração do salário-de-benefício.Portanto, trata-se de ilegalidade originária que afasta qualquer suposição de que estaria ocorrendo uma alteração de entendimento ou de revogação por conveniência ou oportunidade.
Todavia, conquanto não exsurjam direitos desses atos ilegais, é imperiosa a observância, pela Administração, dos princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal quando da anulação de atos administrativos que atinjam a esfera subjetiva dos administrados.
Pela narrativa do processo administrativo, vê-se que a renda mensal do benefício foi reduzida antes de uma decisão definitiva na via administrativa.
Ainda que não se possa olvidar da autoexecutoriedade ínsita aos atos administrativos, também é inolvidável que a Constituição Federal assegura, aos litigantes em processo judicial e administrativo, o contraditório e a ampla defesa 'com os meios e recursos a ela inerentes' (art. 5º, LV), isto é, o recurso administrativo insere-se na amplitude defensiva sem a qual não se pode ter como observada a garantia e esgotado o procedimento.
No caso dos autos, verifico que, constatada a irregularidade, o INSS possibilitou defesa ao segurado e somente reduziu o valor do benefício depois de apresentada e analisada a manifestação defensiva.
O art. 61 da Lei nº 9.784/99 tem como regra a ausência de efeito suspensivo aos recursos; o Decreto nº 3.048/99 somente atribui esse efeito ope legis aos recursos tempestivos contra decisões das Juntas de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social (art. 308).
Porém, o próprio parágrafo único do art. 61 estabelece que 'havendo justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação decorrente da execução, a autoridade recorrida ou a imediatamente superior poderá, de ofício ou a pedido, dar efeito suspensivo ao recurso', ou seja, o legislador conferiu ao administrador um poder de cautela para resguardar a esfera jurídica do administrado no trâmite do processo administrativo. E, é bom dizer, parece evidente esse receio de prejuízo em se tratando de redução do valor de benefício previdenciário.
Entretanto, o autor sequer se utilizou do recurso administrativo cabível, o qual permitia inclusive pedido de atribuição de efeito suspensivo, por expressa previsão legal.
É fato que o anúncio da redução da renda mensal foi dado antes mesmo de transcorrido o prazo para recurso à Junta de Recursos da Previdência Social. Entretanto, esvaído o prazo, o segurado não apresentou o referido recurso administrativamente, de forma que, assim, procedendo, causou o encerramento da discussão na via administrativa. Tal preclusão acarretou, portanto, uma decisão administrativa definitiva e desfavorável.
Desse modo, não pode ser acolhido o argumento de inobservância do devido processo legal.
4. Da decadência do direito da Administração Pública de revisar o ato administrativo de concessão
Sempre foi inequívoco o poder-dever da administração pública de anular ou revogar seus próprios atos, desde que apresentassem vícios de ilegalidade, conforme a Súmula nº 473 do STF, já anteriormente referida.
No entanto, ressalvada a hipótese de má-fé ou fraude na concessão, esse direito da Administração deve ser exercido dentro de um prazo decadencial, observando-se a segurança pela consolidação de uma situação jurídica.
Relativamente à questão da má-fé como elemento impeditivo do efeito decadencial, deve-se pontuar que em momento algum a Administração comprovou que o segurado comportou-se com má-fé. O apontamento da irregularidade na via administrativa foi estritamente objetivo: os valores utilizados no período básico de cálculo do salário de benefício, relativamente às competências de 10/1995 a 09/1998, foram inadequados, pois maiores do que os efetivamente recolhidos ao RGPS (E22, PROCADM43, fl. 7). Ou seja, a Administração deu trato objetivo à irregularidade, não descendo a qualquer minúcia sobre estado de má-fé do segurado.
Por não se presumir, a má-fé do segurado deveria ter sido comprovada (e não foi), não sendo decorrência natural ou lógica do fato de o benefício ter sido implementado pela então servidora Lúcia Tibola (porque essa 'decorrência' seria uma 'presunção').
Com efeito, não há qualquer elemento que minimamente indique uma postura de má-fé no encaminhamento do benefício, até porque os valores dos salários de contribuição utilizados no PBC (de 09/1995 a 09/1998) foram os efetivamente indicados como remuneração do autor no período, conforme as cópias dos livros diários da Cooperativa de Transporte de Bens de Marau Ltda juntadas aos autos (E22, PROCADM32-PROCADM38). De antemão, observo que essa indicação dos valores como remuneração não é suficiente, por si, para que o segurado tivesse direito ao cálculo do benefício com base neles, pois, no seu caso, impunha-se a observância de classes e o efetivo recolhimento da contribuição. Abaixo haverá fundamentação específica sobre esse aspecto.
Portanto, não havendo má-fé do segurado a obstar o prazo decadencial, impõe-se averiguar se efetivamente ocorreu a decadência do direito da Administração de revisar o benefício.
Antes de 29/01/1999, não havia regra positivada quanto ao prazo decadencial para a Administração revisar o ato concessório do benefício.
A lacuna legislativa perdurou até a entrada em vigor da Lei nº 9.784, de 29/01/1999, que expressamente estipulou a decadência de cinco anos no seu artigo 54, conforme segue:
Art. 54. O direito da administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Mais tarde, foi incluído o artigo 103-A à Lei nº 8.213/91, pela MP 138/2003, convertida na Lei nº 10.839/04, que estipulou ser de dez anos esse prazo decadencial em favor da Previdência Social:
Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004)
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004)
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato. (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004)
A controvérsia repousa, então, sobre qual situação jurídica se aplica aos benefícios deferidos anteriormente à edição da Lei nº 9.784/99.
Ao analisar o Recurso Especial nº 1.114.938/AL, sob o rito do art. 543-C do CPC, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que aos benefícios concedidos antes da Lei nº 9.784/99, como no caso, poderia a Administração revê-los a qualquer tempo, por inexistir normal legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. O prazo decadencial de cinco anos passaria a incidir somente após a Lei 9.784/99, tendo como termo inicial a data de sua vigência, em 1º de fevereiro de 1999.
Prosseguiu aquela Corte argumentando que, antes de decorridos os cinco anos da Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de 19/11/2003, convertida na Lei nº 10.839/04, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91, fixando em 10 anos o prazo decadencial. Frente a essa situação, entendeu que se aplica o prazo decadencial da lei nova (qual seja, a MP 138 / Lei 10.839/04, de 10 anos), mas se computando o tempo já transcorrido desde a entrada em vigor da lei antiga (Lei 9.784/99, com vigência a partir de 01/02/1999).
Segue a ementa do referido julgado, de 02/08/2010:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9.787/99. PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA DA LEI 9.784/99. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA LEI 8.213/91, ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI 10.839/2004. AUMENTO DO PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO.
1. A colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos praticados antes da Lei 9.784/99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por inexistir norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99 incide o prazo decadencial de 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua vigência (01.02.99). Ressalva do ponto de vista do Relator.
2. Antes de decorridos 5 anos da Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus benefíciários.
3. Tendo o benefício do autor sido concedido em 30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de 2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato.
4. Recurso Especial do INSS provido para afastar a incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos ao TRF da 5ª Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor.
Portanto, tratando-se o STJ do intérprete máximo da legislação federal infraconstitucional, firma-se a análise à luz do art. 103-A da Lei nº 8.213/91, computando-se o prazo decadencial de 10 anos, mas com termo inicial em 01/02/1999, data em que entrou em vigor a Lei nº 9.784/99. Assim, o direito da Administração de revisar o ato concessório decaiu em 01/02/2009.
Nos termos do § 2º do art. 103-A da Lei nº 8.213/91, 'considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato'.
No caso dos autos, ainda em 01/06/2007 a Comissão de Controle Interno da Gerência Executiva do INSS em Passo Fundo expediu decisão no processo administrativo de concessão do benefício do autor, expondo a necessidade de reavaliação da documentação que embasou a referida concessão (E22, PROCADM13, fl. 7).
Dessa forma, não transcorreu o prazo decadencial de que a Administração dispunha para revisar o ato concessório do benefício do autor, seja considerando-se a data da vigência da Lei nº 9.784/99 (01/02/1999), seja considerando-se a data da própria concessão do benefício (02/10/1998).
5. Da irredutibilidade do valor dos benefícios
A irredutibilidade do valor dos benefícios, objetivo constitucional aplicável à Seguridade Social (art. 194, parágrafo único, IV, CF), refere-se à preservação do valor real dos benefícios basicamente no que tange ao seu reajustamento. Assim, não se aplica ao presente caso, no qual a redução da renda mensal da aposentadoria ocorreu por controle de legalidade administrativa.
6. Da irregularidade no ato concessório do benefício
Para exposição dos exatos termos da irregularidade constatada pela autarquia no benefício do autor, transcrevo trecho do Relatório Individual de Constatações expedido pela Gerência Executiva do INSS em Passo Fundo em 13/03/2008 (E22, PROCADM28, fls. 2-3).
[...]
Após analisadas as peças que compõem o processo, verificou-se a necessidade de realizarmos nova conferência dos documentos constantes. Sendo assim, o segurado foi convocado através de carta (fls. 80, 81 e 90), onde o mesmo compareceu para a apresentação dos documentos solicitados e faltantes, sendo que neste ato foi realizado entrevista rural a fim de verificarmos a real atividade de segurado especial, onde após a realização da entrevista, ficou comprovado o exercício da atividade de segurado especial do período já computado (fls. 82 e 83). Anexamos também, pesquisas realizadas nos sistemas corporativos do INSS (CNIS), onde após criteriosa verificação, constatou-se que o vínculo do segurado com a Cooperativa de Transportes de Bens de Marau Ltda 'COTRAMAR', não é de empregado, como foi informado no extrato de tempo de serviço, mas sim, foi eleito através de assembleia, diretor-presidente (fls. 91 a 129), sendo portanto considerado contribuinte individual e não empregado da referida empresa. A fim de corroborar as devidas contribuições do segurado, anexamos consultas dos recolhimentos inscrição nº 1.111.038.032-6, 1.170.804.973-2 e 10949991055, onde constam recolhimentos efetuados em classes diferentes daquelas informadas e computadas no Período Base de Cálculo (PBC), (fls. 130 a 137). Também informo que o segurado apresentou cópias autenticadas de GRPS, referentes à Cooperativa de Transportes de Bens de Marau Ltda, período de 05/1996 a 10/1998, sendo que informo tratar-se de recolhimentos da parte patronal e não de recolhimentos referentes ao segurado (fls. 141 a 174). Sendo assim e tendo em vista que o segurado, no ato do requerimento do presente benefício, estava inscrito como contribuinte individual, passamos a analisar o cumprimento do interstício na escala de salário base. Todos os carnês foram verificados e a partir da análise dos mesmos, juntamente com os dados constantes no sistema CNIS, verificou-se que o segurado recolheu suas contribuições, com as inscrições 1.111.038.032-6, 1.170.804.973-2 e 10949991055, conforme a tabela a seguir relacionada:
PERÍODO DE CONTRIBUIÇÃO | CLASSE | Nº de meses necessários | Nº de meses cumpridos |
06/1975 a 07/1976 | 1 | 12 | 14 |
10/1980 a 04/1984 | 3 | 12 | 42 |
05/1984 a 03/1994 | 2 | 12 | 118 |
04/1994 a 08/1998 | 3 | 12 | 52 |
4. Portanto, a irregularidade consiste em: Tendo em vista divergências dos valores informados e computados no Período Base de Cálculo (PBC), na condição de contribuinte individual, referentes aos meses de 10/1995 a 09/1998, como se recolhidos entre Classe 8 a 10, onde os mesmos foram informados de forma incorreta, pois conforme verifica-se, o segurado recolheu na Classe 3. Com isto os valores informados na Renda Mensal Inicial (RMI), serão revistos e novamente enquadrados, para apurar nova renda mensal, após revisão. (grifei)
Não há controvérsia de que, de 10/1995 a 09/1998, o autor era Presidente da Cooperativa de Transporte de Bens de Marau Ltda, o que é inclusive afirmado na inicial e comprovado pelos documentos do E22 (PROCADM20, por exemplo).
Assim, sua atividade enquadrava-se na categoria de segurado empresário, conforme a redação original do art. 12, III, da Lei nº 8.212/91:
Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
[...]
III - como empresário: o titular de firma individual urbana ou rural, o diretor não empregado, o membro de conselho de administração de sociedade anônima, o sócio solidário, o sócio de indústria e o sócio cotista que participe da gestão ou receba remuneração decorrente de seu trabalho em empresa urbana ou rural; [grifei]
A respeito da contribuição devida pelo segurado empresário, a Lei nº 8.212/91 trazia a seguinte regra no art. 21:
Art. 21. A alíquota de contribuição dos segurados empresário, facultativo, trabalhador autônomo e equiparados, aplicada sobre o respectivo salário-de-contribuição, será de:
I - 10% (dez por cento) para os salários-de-contribuição de valor igual ou inferior Cr$51.000,00 (cinqüenta e um mil cruzeiros);
II - 20 % (vinte por cento) para os demais salários-de-contribuição
Parágrafo único. Os valores do salário-de-contribuição serão reajustados, a partir da data de entrada em vigor desta lei, na mesma época e com os mesmos índices que os do reajustamento dos benefícios de prestação continuada da Previdência Social.
Por sua vez, o art. 28, III, definia que o salário de contribuição do segurado empresário era o salário-base, conforme o art. 29 do mesmo diploma.
Assim, até a vigência da Lei nº 9.876/99, o segurado empresário contribuía de acordo com a escala de salários-base. Posteriormente a ela, passou a ser a remuneração auferida pelo exercício de sua atividade por conta própria durante o mês, observado o limite máximo do salário de contribuição (art. 28, III, Lei nº 8.213/91, com redação pela Lei nº 9.876/99). A escala de salários-base se manteve provisoriamente (art. 4º da Lei nº 9.876/99) até a MP nº 83/2002, quando definitivamente extinta.
Na vigência da escala de salários-base, impunha-se o cumprimento de interstícios, que eram o número mínimo de meses de permanência em cada classe. As classes variavam de 1 a 10 e, para cada uma delas, havia um determinado salário-base (sobre o qual se fazia a contribuição) e interstício.
O §§ 11 do art. 29 dispunha que 'cumprido o interstício, o segurado pode permanecer na classe em que se encontra, mas em nenhuma hipótese isto ensejará o acesso a outra classe que não a imediatamente superior, quando ele desejar progredir na escala'.
No caso dos autos, os salários de contribuição originalmente utilizados para a concessão do benefício do autor estão listados no E22, PROCADM1, fl. 3:
- De 09/1995 a 02/1996: R$ 700,00;
- De 03/1996 a 05/1996: R$ 800,00;
- De 06/1996 a 05/1997: R$ 896,00;
- De 06/1997 a 02/1998: R$ 960,00;
- De 03/1998 a 09/1998: R$ 1.280,00.
Tais valores correspondem à remuneração indicada como auferida pelo autor como Presidente da Cotramar, conforme demonstram as cópias dos livros diários da Cooperativa juntadas aos autos (E22, PROCADM32-PROCADM38).
No entanto, como visto, a legislação da época não permitia ao segurado empresário a simples contribuição correspondente ao valor da sua remuneração; era necessário respeitar a escala de salários-base prevista no art. 29.
Conforme a análise feita pela autarquia sobre as guias de recolhimento de contribuições do autor, bem como sobre os dados contidos no Cadastro Nacional de Informações Sociais, as contribuições do autor na modalidade de salários-base ocorreu da seguinte forma: de 06/1975 a 07/1976, na classe 1; de 10/1980 a 04/1984 na classe 3; de 05/1984 a 03/1994, na classe 2; de 04/1994 a 08/1998 na classe 3.
Também nos termos das informações do processo administrativo, os valores da remuneração recebida pelo autor de 05/1996 a 10/1998 correspondiam às classes 8 a 10.
Portanto, (a) não restou demonstrado que o autor tenha feito recolhimento de contribuições nessas classes e (b) isso nem poderia acontecer, pois, somando cerca de 58 contribuições na classe 3 em 10/1995 (conforme a tabela acima), conseguiria, no máximo, avançar à classe 4 nessa data e, cumprido o interstício de 24 contribuições, à classe 5 em 10/1997.
Dessa forma, uma vez que o autor somente recolheu contribuições na classe 3 durante todo o período básico de cálculo, foi incorreta a inclusão dos valores de R$ 700,00 a R$ 1.280,00 como salários de contribuição do benefício original.
Portanto, revela-se adequado o procedimento da autarquia de recalcular o salário de benefício, alterar a RMI e a renda mensal do benefício, com a utilização dos valores relativos à classe e às contribuições efetivamente vertidas.
7. Da necessidade de devolução dos valores auferidos a maior
O autor alega a desnecessidade de devolução dos valores recebidos com base na sua boa-fé ao receber a prestação nos termos em que foi concedida, bem como no caráter alimentar do benefício. Em caso de necessidade, que se observe a prescrição qüinqüenal.
Conforme já apontado no item 2 desta sentença, não se vislumbrou estado de má-fé no encaminhamento do pedido do benefício, nem na sua percepção.
Este Juízo vinha entendendo que o estado de boa-fé e o caráter alimentar dos benefícios previdenciários não eram motivos suficientes para obstar a devolução ao Erário do que foi pago indevidamente.
Entretanto, a jurisprudência do STJ e do TRF da 4ª. Região prestigiam tais fatores e deixam a hipótese de repetição para os casos de percepção de má-fé. Cito, a respeito, os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.528/97. CUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA. IMPOSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE PELO SEGURADO POR ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. (...) 3. Não cabe descontos, no benefício previdenciário, a título de restituição de valores pagos aos segurados por erro administrativo, cujo recebimento deu-se de boa-fé, face ao princípio da irrepetibilidade ou da não devolução dos alimentos. Precedentes do STJ.
(6ª. Turma do TRF4. APELREEX 00249205120084047100. Rel. Des. Fed. CELSO KIPPER. DE 14/05/2010)
RESTITUIÇÃO DE BENEFÍCIO. BENEFICIÁRIO DE BOA-FÉ. CARÁTER ALIMENTAR DAS PARCELAS. Não cabe a restituição dos valores recebidos de boa-fé por beneficiário da Previdência Social, dado o caráter alimentar dos benefícios previdenciários, afastada a aplicação, em caso assim, de normas conducentes à restituição de valores indevidos.
(5ª. Turma do TRF4. AC 200771990084072. Rel. Des. Fed. RÔMULO PIZZOLATTI. DE 15/03/2010)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PAGO A MAIOR. ERRO ADMINISTRATIVO. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. NATUREZA ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO INDEVIDA. 1. Em face do caráter social das demandas de natureza previdenciária, associada à presença da boa-fé do beneficiário, afasta-se a devolução de parcelas pagas a maior, mormente na hipótese de erro administrativo. 2. Agravo regimental improvido.
5ª. Turma do STJ. AGA 201001092581. Rel. Min. JORGE MUSSI. DJE 13/12/2010
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. INEXIGIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL POSTERIORMENTE MODIFICADA. INAPLICABILIDADE, NO CASO, DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. 1. Em face da boa-fé do segurado que recebeu o aumento do valor do seu benefício por força de decisão judicial, bem como em virtude do caráter alimentar dessa verba, mostra-se inviável impor ao beneficiário a restituição das diferenças recebidas, por haver a decisão sido reformada ou por outra razão perdido a sua eficácia. 2. Não há que se falar em declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, uma vez que, no caso, apenas foi dado ao texto desse dispositivo interpretação diversa da pretendida pelo INSS. 3. Agravo Regimental do INSS desprovido.
(5ª. Turma do STJ - AGRESP 200800990510. Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO. DJE 13/04/2009)
Portanto, presente a boa-fé do segurado e à vista do caráter alimentar do benefício previdenciário, tenho que os valores liquidados como de pagamento a maior em razão de erro administrativo não são passíveis de restituição, ficando prejudicada a alegação de observância do prazo prescricional para a apuração de valores.(...)"
Como se observa dos autos e de acordo com as bem lançadas razões do decisum, não há falar em inobservância do devido processo legal e do contraditório por parte da Autarquia Previdenciária. Isso porque, como bem demonstrado na sentença, ao apurar a irregularidade no cálculo da RMI da aposentadoria do demandante, o INSS abriu prazo para que se defendesse, enviando ofício ao segurado na mesma data em que elaborado o Relatório Individual de Constatações (evento 22 - procadm28 - fl. 2). O recurso foi apresentado, quando poderia ter o demandante requerido que lhe fosse atribuído efeito suspensivo, mas não o fez. Julgado insuficiente no mérito (evento22 - procadm40 - fl. 5), a Autarquia estava respaldada para revisar e, de pronto, ajustar a RMI do autor, sem a necessidade de aguardar o final do processo administrativo.
De outro lado, nada a reparar no que tange à não ocorrência de decadência, uma vez que concedido o benefício em 02-10-98, o início de processo de revisão deu-se antes de decorridos dez anos, em 01-06-2007 (evento 22, procadm13 - fl. 7). A data citada pelo autor, dezembro de 2010, diz respeito ao encaminhamento de ofício comunicando da rejeição de sua defesa, e não à data de início de todo o processo administrativo de revisão.
Quanto às alegações do autor no sentido de defender a consideração do labor junto à COTRAMAR, para o qual houve o recolhimento das contribuições previdenciárias respectivas, não procedem. A remuneração do autor poderia equivaler às classes 8 a 10, como de fato equivaliam, mas isso não gerava o imediato direito de recolher na classe superior, se devia obedecer a escala de salários-base e na qual se encontrava recolhendo na classe 3. A desobediência da previsão legal acarretou, como demonstrado nos autos, na apuração de uma RMI maior do que a efetivamente devida, fato que não pode ser convalidado.
Portanto, correta a manutenção da revisão levada a efeito pelo INSS, administrativamente, reduzindo o valor da RMI do demandante.
Tal fato, no entanto, não obriga à devolução dos valores recebidos a maior desde a DER, como postula a Autarquia em seu apelo, insurgindo-se contra o decidido na sentença.
Isso porque não obstante tenham sido pagos valores indevidamente ao segurado, é incabível a restituição dos valores recebidos a esse título.
Está consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de que em se tratando de valores percebidos de boa-fé pelo segurado, seja por erro da Administração, seja em razão de antecipação de tutela, não é cabível a repetição das parcelas pagas.
Os princípios da razoabilidade, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana, aplicados à hipótese, conduzem à impossibilidade de repetição das verbas previdenciárias. Trata-se de benefício de caráter alimentar, recebido pelo beneficiário de boa-fé.
Deve-se ter por inaplicável o art. 115 da Lei 8.213/91 na hipótese de inexistência de má-fé do segurado. Não se trata de reconhecer a inconstitucionalidade do dispositivo, mas que a sua aplicação ao caso concreto não é compatível com a generalidade e a abstração de seu preceito, o que afasta a necessidade de observância da cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal). Nesse sentido vem decidindo o STF, v.g.: AI 820.685-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie; AI 746.442-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia.
Cito, ainda, precedente de relatoria da Ministra Rosa Weber, firmando orientação jurisprudencial no mesmo sentido:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RECEBIDO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. DEVOLUÇÃO. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ E CARÁTER ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CF. RESERVA DE PLENÁRIO: INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 22.9.2008. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito à repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desconto dos valores indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF, ARE 734199 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 09/09/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-184 DIVULG 22-09-2014 PUBLIC 23-09-2014)."
No caso concreto, tendo o beneficiário agido de boa-fé, a devolução pretendida pelo INSS não tem fundamento. A boa-fé, ademais, é presumida, cabendo ao INSS a prova em contrário.
Portanto, deve ser mantida a sentença para que seja declarada a inexigibilidade dos valores pagos indevidamente a título de benefício previdenciário.
Feitas essas considerações, impõe-se o desprovimento dos recursos nos pontos acima examinados.
Honorários advocatícios
Quanto aos honorários advocatícios, adoto o entendimento constante de precedente do Superior Tribunal de Justiça (REsp 556.741) no sentido de que a norma a reger a sucumbência é aquela vigente na data da publicação da sentença. Assim, para as sentenças publicadas ainda sob a égide do CPC de 1973, aplicável, quanto à sucumbência, aquele regramento.
Os honorários advocatícios foram adequadamente fixados na sentença, tendo sido observados os parâmetros do art. 20, §§3º e 4º, do CPC, em especial a complexidade e a natureza da causa. Não sobressai motivo, frente à manutenção da sentença, para que haja majoração do valor arbitrado pelo magistrado singular, que sopesou corretamente o ônus da sucumbência.
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96).
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes, cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Conclusão
Desprovidos os apelos e a remessa oficial.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo do INSS, à apelação do autor e à remessa oficial.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/06/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000551-85.2011.4.04.7104/RS
ORIGEM: RS 50005518520114047104
RELATOR | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | IVO BEBER |
ADVOGADO | : | HENRIQUE OLTRAMARI |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/06/2016, na seqüência 623, disponibilizada no DE de 01/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS, À APELAÇÃO DO AUTOR E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8404068v1 e, se solicitado, do código CRC E49B5395. | |
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