APELAÇÃO CÍVEL Nº 5032604-57.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | IVANILDA CORAZZA GODOY |
ADVOGADO | : | MÁRCIA ZUFFO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE URBANA REMUNERADA EXERCIDA POR MEMBRO DA FAMÍLIA. IMPROCEDÊNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS
1. O fato de haver membro da família exercendo atividade não rural com proventos suficientes para a subsistência familiar descaracteriza a condição de segurado especial do trabalhador rural que exerce suas atividades agrícolas nos regimes de economia individual e de economia familiar.
2. Desconsideração do tempo de atividade rural comprovado para fins de carência necessária para concessão de aposentadoria rural por idade em função da perda da condição de segurado especial devido ao largo tempo de exercício de atividades urbanas.
3. Mantida a sentença com o indeferimento do pedido de aposentadoria por tempo de atividade rural.
4. Uma vez que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC), aplica-se a majoração prevista no art. 85, §11, desse diploma, observados os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. Suspensa a exigibilidade em função da gratuidade judiciária concedida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de abril de 2018.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9349928v8 e, se solicitado, do código CRC 2C7E4640. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5032604-57.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | IVANILDA CORAZZA GODOY |
ADVOGADO | : | MÁRCIA ZUFFO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada na justiça estadual por IVANILDA CORAZZA GODOY (nascida em 25/03/1958) contra o INSS em 23/10/2014, pretendendo concessão de aposentadoria rural por idade.
Em sua petição inicial (Evento 3 - INIC2), a parte autora requereu o reconhecimento e a averbação - com a consequente concessão de aposentadoria rural por idade - dos seguintes períodos de atividade rural: de 26/03/1970 a 31/01/1981 - exercidos em conjunto com os seus pais - e de 18/04/2005 a 01/01/2014 - exercidos em conjunto com o seu esposo.
A sentença (Evento 3 - SENT20), datada de 29/03/2017, julgou improcedente o pedido da inicial. Fundamentou a decisão (1) no fato de a parte autora haver abandonado as lides rurais por mais de 24 anos (no qual exerceu atividades urbanas), motivo pelo qual não poderia ser computado para fins de carência o período mais remoto e (2) nos vínculos urbanos do marido da parte autora, que indicariam que a renda auferida pelas atividades rurais seria complementar, sendo a atividade urbana do marido que daria sustento à família, situação esta que descaracterizaria a condição de segurada especial da parte autora. Diante da sua sucumbência, condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador do réu, estes fixados em R$ 800,00 (oitocentos reais). A exigibilidade de tais encargos foi suspensa diante da gratuidade judiciária que lhe foi concedida.
Apelou a parte autora (Evento 3 - APELAÇÃO21) insurgindo-se contra o não reconhecimento do tempo de atividade rural pleiteado. Em apoio ao pedido, alegou que possui direito adquirido em relação ao tempo de labor rural devidamente comprovado nos autos, motivo pelo qual possuiria o direito da sua averbação. Afirmou ainda que após o último vínculo de emprego urbano voltou a laborar na agricultura, não se afastando mais do labor até a data do requerimento administrativo. Em relação à atividade urbana do marido, alegou que o fato de um dos membros do grupo familiar exercer atividade incompatível com o regime de economia familiar não descaracteriza, por si só, a atividade agrícola dos demais componentes. Argumentou ainda que, mesmo com a renda obtida pelo marido, a atividade rural segue sendo essencial para a subsistência da família. Suscitou, finalmente, o prequestionamento dos dispositivos legais mencionados no recurso.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
VOTO
DO REEXAME NECESSÁRIO
A sentença não foi submetida à remessa oficial.
DA APLICAÇÃO DO CPC/2015
Conforme o art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Logo, serão examinados segundo as normas do CPC/2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Tendo em vista que a sentença foi publicada posteriormente a esta data, o recurso será analisado em conformidade com o CPC/2015.
DA APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
Economia familiar - considerações gerais
O benefício de aposentadoria por idade do trabalhador rural qualificado como segurado especial individualmente ou em regime de economia familiar (inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991), é informado pelo disposto nos §§ 1º e 2º do art. 48, no inc. II do art. 25, no inc. III do art. 26 e no inc. I do art. 39, tudo da Lei 8.213/1991. São requisitos para obter o benefício:
1) implementação da idade mínima (cinquenta e cinco anos para mulheres, e sessenta anos para homens);
2) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondente à carência exigida, ainda que a atividade seja descontínua.
Não se exige prova do recolhimento de contribuições (TRF4, Terceira Seção, EINF 0016396-93.2011.404.9999, rel. Celso Kipper, D.E. 16/04/2013; TRF4, EINF 2007.70.99.004133-2, Terceira Seção, rel. Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, D.E. 23/04/2011).
A renovação do Regime Geral de Previdência Social da Lei 8.213/1991 previu regra de transição em favor do trabalhador rural, no art. 143:
Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Complementando o art. 143 na disciplina da transição de regimes, o art. 142 da Lei 8.213/1991 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a uma tabela de redução de prazos de carência no período de 1991 a 2010, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
O ano de referência de aplicação da tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991 será aquele em que o segurado completou a idade mínima para haver o benefício, desde que, até então, já disponha de tempo rural correspondente aos prazos de carência previstos. É irrelevante que o requerimento de benefício seja apresentado em anos posteriores ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, devendo ser preservado o direito adquirido quando preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos (§ 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido, observada a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991. Nesse caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao cumprimento da carência equivalente para obter o benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, mas sim nos anos subsequentes, de acordo com a tabela mencionada, com exigências progressivas.
Ressalvam-se os casos em que o requerimento administrativo e a implementação da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994 (vigência da MP 598/1994, convertida na Lei 9.063/1995, que alterou o art. 143 da Lei 8.213/1991), nos quais o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural anterior ao requerimento por um período de cinco anos (sessenta meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991.
A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213/1991, exigindo que a atividade rural deva ser comprovada em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada a favor do segurado. A regra atende às situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente comprovar trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no § 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991 e, principalmente, em proteção ao direito adquirido. Se o requerimento datar de tempo consideravelmente posterior à implementação das condições, e a prova for feita, é admissível a concessão do benefício.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, Plenário, RE 631240/MG, rel. Roberto Barroso, j. 03/09/2014).
O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da Lei 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28/04/2004, DJ 07/06/2004, p. 277).
Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do Imposto Territorial Rural (ITR) ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:
[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]
(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10out.2012, DJe 19/12/2012)
Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu este Tribunal que: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/08/2015).
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, já que o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar o exercido pelos membros da família "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais são formalizados em nome do pater familias, que representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, em geral entre os trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental", e já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).
Importante, ainda, ressaltar que o fato de um dos membros da família exercer atividade outra que não a rural também não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício. A hipótese fática do inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ.
(TRF4, Terceira Seção, EINF 5009250-46.2012.404.7002, rel. Rogerio Favreto, juntado aos autos em 12/02/2015)
O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. No caso de haver conflito entre as provas colhidas na via administrativa e as tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, uma vez que produzidas com as cautelas legais, garantindo-se o contraditório: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25jun.2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 373 do CPC2015 (inc. II do art. 333 do CPC1973).
DO CASO CONCRETO
O requisito etário, cinquenta e cinco anos, cumpriu-se em 25/03/2013, (nascimento em 25/03/1958). O requerimento administrativo deu entrada em 02/01/2014. Deve-se comprovar, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991, o exercício de atividade rural nos cento e oitenta meses imediatamente anteriores ao cumprimento do requisito etário ou ao requerimento administrativo.
A sentença assim fundamentou o entendimento pela improcedência do pedido:
(...) "No caso, segundo se lê da decisão administrativa de fl. 82, foi indeferido o pedido porque a atividade da agricultura não era indispensável à subsistência.
Ou seja, o implemento do requisito etário é incontroverso, já que a autora é nascida em 25/03/1958.
O ponto controvertido da lide, portanto, repousa sobre a efetiva prova de exercício de atividade rural em regime de economia familiar no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício - 180 meses - .
Ou seja, tendo a parte autora completado a idade mínima em 2012, deve comprovar o exercício nas lides campesinas, em regime de economia familiar, por um período mínimo de 180 meses, sendo este imediatamente anterior ao requerimento do benefício.
Todavia, a parte autora não comprovou o preenchimento de tais requisitos.
(...)
No caso, pela consulta do CNIS verifica-se a existência de diversos vínculos de natureza urbana, antes e durante o período de carência (fl. 159).
Resta demonstrado que a parte autora, como por ela próprio alegado, laborou na agricultura de 1970 a 1981, somente retornando em 2005, o que é corroborado pelos documentos aportados com a inicial e oitiva de testemunhas na seara administrativa.
Neste passo, ainda que a parte autora tenha retornado ao meio rural, não existe a possibilidade de reconhecer os períodos rurais, mesmo que de forma descontínua, considerando que manteve vínculos urbanos por aproximadamente 24 (vinte e quatro) anos.
Ora, é sabido e consabido que a lei previdenciária garante ao segurado especial períodos de afastamentos sem que perca a qualidade de segurado.
Todavia, no caso, verifica-se que o afastamento da parte autora perdurou por aproximadamente 24 (vinte e quatro) anos.
Diante do longínquo período, tenho que este não pode ser abrangido pelo conceito de descontinuidade previsto no art. 143 da Lei nº 8.213/911.
Houve, pois, perda da qualidade de segurada especial, até porque os períodos de atividades em décadas remotas não podem ser computados para fins de carência.
Se não bastasse isso, verifica-se que o cônjuge da parte autora possui diversos vínculos de natureza urbana durante o período de carência, consoante se haure do CNIS da fl. 160, o que foi corroborado pela declaração da própria parte autora e testemunhas ouvidas na seara administrativa, descaracterizando o requisito atinente a indispensabilidade do labor rural para a subsistência da família.
Por fim, a autora não comprovou a carência de 180 meses imediatamente anteriores a DER, nos termos da Súmula nº 54 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, considerando que, como acima dito, se afastou do meio rural no ano de 1981, retornando somente no ano de 2005.
Em seu apelo, a parte autora defende as seguintes teses: (1) a possibilidade da descontinuidade temporal do período de labor rural a ser comprovado para fins de carência e (2) o fato de um dos membros da família exercer atividade estranha ao labor rural não afasta, por si só, a condição de segurado especial do trabalhador rural que exercer sua atividade no regime de economia familiar. Ambas teses já foram descritas no tópico anterior que tratou das condições gerais para a concessão de aposentadoria rural por idade.
Em relação ao período de afastamento da parte autora, alega a sentença - como pode ser visto na reprodução acima - que, devido a sua larga duração - cerca de 24 anos - não seria possível aplicar o conceito da descontinuidade. Já no que diz respeito à atividade urbana do marido da parte autora, considerou que tal atividade afastaria a condição de segurada especial da parte autora, uma vez que a sua remuneração garantiria o sustento da família, sendo a atividade rural apenas complementar.
Entendo que deve ser mantido o entendimento da sentença. Não como aplicar-se a hipótese da descontinuidade no presente caso tendo em vista o largo período que a parte autora se afastou do labor agrícola para exercer atividades urbanas. Ainda que, por hipótese, se aplicasse a tese da descontinuidade para o caso concreto, a renda auferida pelo marido da parte autora descaracteriza a sua condição de segurada especial e, por conseguinte, impede a concessão do benefício pleiteado, como se verá a seguir.
Quanto às atividades urbanas do esposo da parte autora, informações colhidas nos autos e em pesquisa realizada no CNIS (http://pcnisapr02.prevnet/cnis/faces/) apontam que:
a) há recolhimentos desde 1997 até os dias de hoje, inicialmente como Empresário/Empregador (1997 a 1999), depois como contribuinte individual em alguns meses e como (1999 a 2003), empregado do Município de Alto Alegre (2003 a 2004), novamente como contribuinte individual de 2009 até a data atual constando neste último período a ocupação de professor de física (Ensino Superior), conforme pesquisa realizada no CNIS;
b) a sua empresa teve início de atividade em 28/11/1996 e segue ativa até hoje na Receita Federal, conforme pesquisa no CNIS e Comprovante de Inscrição e de situação cadastral emitido pelo Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (Evento 3 - ANEXOS PET4, p. 20 e 21). A informação de que a empresa do marido da parte autora segue ativa é confirmada em sua entrevista rural (Evento 3 - ANEXOS PET4, p. 20 e 21), realizada em janeiro de 2014, na qual a parte autora informa que "seu marido possui uma empresa no nome em que presta serviço de eletricista. Que a empresa está ativa e o mesmo aufere renda aproximada de três salários mínimos por mês. O serviço na agricultura de seu marido é conciliado com o de eletricista."
Segundo as informações acima, na época da DER o marido da parte autora possuía uma empresa de fornecimento de serviços elétricos e auferia cerca de três salários mínimos por mês de sua atividade empresarial. Além do mais, desde 2009, este recolhe como contribuinte individual qualificado como professor de física, fato que traz indícios de que receberia também por esta atividade. Tais indicações afastam a hipótese de que os ganhos obtidos no meio rural são imprescindíveis para a subsistência do requerente do benefício e/ou da sua família. Apesar de, absolutamente, não ser uma quantia elevada, não há como se dizer que com três salários mínimos (considerando-se apenas o valor da remuneração do marido admitido pela parte autora) não se possa garantir a subsistência mínima da sua família. Assim, os ganhos obtidos com a atividade rural devem ser considerados suplementares e não essenciais para a subsistência do núcleo familiar.
Levando em conta os dados acima, entendo que o conjunto probatório dos autos indica que não resta caracterizada a condição de segurada especial da parte autora, não podendo, assim, o período de atividade rural alegado ser computado para fins de carência para a obtenção do benefício de aposentadoria rural por idade.
Consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso da parte autora.
DOS CONSECTÁRIOS
Honorários advocatícios e custas
A sentença condenou a parte autora ao pagamento de custas e de honorários, estes fixados em R$ 800,00. Porém, uma vez que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC) aplica-se a majoração dos honorários prevista no art. 85, §11, desse diploma, observados os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos.
Assim, majoro a verba honorária para R$ 1.000,00 e mantenho a condenação ao pagamento de custas. Porém, tendo em vista a concessão da gratuidade judiciária, suspendo a exibilidade do pagamento dos valores da condenação
DO PREQUESTIONAMENTO
Em suas razões de apelação, a parte autora suscitou o prequestionamento dos dispositivos legais levantados. Assim, com a finalidade específica de possibilitar o acesso às instâncias superiores, explicito que o presente acórdão, ao equacionar a lide como o fez, não violou nem negou vigência dos dispositivos constitucionais e/ou legais mencionados no recurso, os quais dou por prequestionados.
CONCLUSÃO
Em conformidade com a fundamentação acima, deve-se
1. Negar provimento ao apelo da parte autora, mantendo a sentença no que diz respeito ao seu mérito;
2. Majorar a verba honorária fixada, nos termos do art. 85, §11 do NCPC, e manter a condenação da parte autora ao pagamento de custas, suspendendo a exigibilidade do pagamento dos valores da condenação em função da concessão da gratuidade judiciária.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, voto por negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/04/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5032604-57.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00030963520148210046
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dra. Carmem Elisa Hessel |
APELANTE | : | IVANILDA CORAZZA GODOY |
ADVOGADO | : | MÁRCIA ZUFFO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/04/2018, na seqüência 381, disponibilizada no DE de 05/04/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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