APELAÇÃO CÍVEL Nº 5016892-27.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA CREUSA RIBEIRO LEITE |
ADVOGADO | : | GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. COISA JULGADA. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. DESCONTINUIDADE. SOMA DE TEMPO ANTIGO COM O PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. POSSIBILIDADE. TUTELA ESPECÍFICA. IMPLANTAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Tratando-se de aposentadoria rural por idade, a formação de coisa julgada material se dá somente sobre o interregno de tempo de serviço analisado, e não sobre o próprio direito ao benefício, que pode ser pleiteado em nova ação, desde se tenha como causa de pedir período de tempo de serviço que não foi objeto de rejeição na ação anterior.
2. Procede o pedido de aposentadoria rural por idade quando atendidos os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei nº 8.213/1991.
3. Comprovado o implemento da idade mínima (60 anos para homens e 55 anos para mulheres), e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, é devido o benefício de aposentadoria rural por idade à parte autora.
4. Considera-se comprovado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, sendo dispensável o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício.
5. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC.
6. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 20 de junho de 2018.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9405344v6 e, se solicitado, do código CRC 33C36618. | |
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| Signatário (a): | Luiz Fernando Wowk Penteado |
| Data e Hora: | 21/06/2018 18:16 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5016892-27.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA CREUSA RIBEIRO LEITE |
ADVOGADO | : | GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI |
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria rural por idade, em face do exercício de atividades rurais na condição de boia-fria.
Sentenciando em 08/02/2017, o MM. Juiz julgou procedente o pedido inicial, condenando o INSS a conceder aposentadoria rural por idade a partir da DER (07/07/2016) e ao pagamento das parcelas vencidas. O INSS foi ainda condenado ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação. Sentença submetida à remessa necessária.
Irresignado, o INSS apela. Em sede de preliminar, suscita a ocorrência de coisa julgada sobre o objeto da presente ação em relação a período anterior a 2013 . Aduz que a parte autora não comprovou efetivamente o exercício da atividade rural no período de carência, havendo provas de que a família sobrevivia da renda do trabalho urbano do esposo da autora.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Peço dia.
VOTO
REMESSA NECESSÁRIA
Em relação à remessa necessária, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça dirimiu a controvérsia e firmou o entendimento, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.101.727/PR, no sentido de que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público (Código de Processo Civil, artigo 475, parágrafo 2º). Em conformidade com esse entendimento, o STJ editou a súmula Nº 490: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
Contudo, § 3º, I, do art. 496, do novo Código de Processo Civil, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
A despeito da orientação firmada sob a égide do antigo Código de Processo Civil, de submeter ao reexame necessário as sentenças ilíquidas, é pouco provável que a condenação nas lides previdenciárias, na quase totalidade dos feitos, ultrapassem o valor limite de mil salários mínimos. E isso fica evidente especialmente nas hipóteses em que possível mensurar o proveito econômico por mero cálculo aritmético.
Nesta linha, e com base no § 3º, I, do art. 496, do CPC, deixo de conhecer da remessa necessária.
PRELIMINAR
Consoante dispunha o art. 301, § 2º, do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época do ajuizamento da ação e da sentença, uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. Há coisa julgada quando se repete ação já transitada em julgado.
O INSS suscita coisa julgada em relação aos autos que tramitaram nesta Corte sob o número 0012500-37.2014.404.9999. Confira-se a ementa do julgado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. BOIA-FRIA. PROVA EM NOME DO CÔNJUGE QUE PASSOU A EXERCER ATIVIDADE URBANA. REQUISITOS NÃO CUMPRIDOS. AVERBAÇÃO.
1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Declaração emitida por sindicato de trabalhadores rurais, sem a devida homologação do INSS, bem assim as declarações de terceiros não constituem início de prova material do exercício de atividade rurícola, pois extemporâneas aos fatos narrados, equivalendo apenas a meros testemunhos reduzidos a termo. (STJ, AgRg no Resp nº 416.971, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, T6, U. DJ 27-03-06, p. 349).
3. Consoante recentes decisões exaradas pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp 1.304.479-SP e do Resp n. 1.321.493-PR, recebidos pela Corte como recursos representativos da controvérsia, não há possibilidade de estender a prova material em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
4. Não comprovada a carência suficiente à concessão da aposentadoria pleiteada, o período reconhecido como rural deve ser averbado para futura concessão de benefício previdenciário.
Tem-se, portanto, que a parte autora já trouxe à análise do Judiciário pedido de aposentadoria rural por idade, que foi rejeitado, com enfrentamento do mérito. Nesse caso, inegável a formação de coisa julgada material.
Ressalto que a hipótese de coisa julgada formal nas ações em que o direito à averbação de tempo de serviço rural não é reconhecido por ausência de prova material, admitida atualmente pela jurisprudência, não se confunde com afastamento da coisa julgada material regularmente formada em ação anterior. O ordenamento jurídico rechaça expressamente esta possibilidade, como se observa do art. 474 do Código de Processo Civil de 1973 e art. 508 do atual, ainda que a nova ação venha embasada em provas diversas. A desconstituição de um julgado exige ação rescisória, nas hipóteses previstas pelo ordenamento jurídico.
Assim, razão assiste à Autarquia no que diz respeito à ocorrência de coisa julgada.
No entanto, o fato da parte ter uma ação de aposentadoria julgada improcedente não significa que jamais poderá pleitear o benefício em juízo novamente. O preenchimento do requisito faltante pode vir a ocorrer com o decurso do tempo. O que a coisa julgada veda é somente a nova tentativa de averbação de período não reconhecido na ação anterior.
No caso em exame se faz presente o instituto da coisa julgada, vez que o período de tempo até 2013 já foi analisado em demanda anteriormente proposta. Importante destacar, que foi determinada a averbação do período de 28/09/1974 a 03/07/1989 - consoante decisão judicial transitada em julgado em 17/03/2016.
Desse modo, em razão da coisa julgada material, fica vedado na presente ação o reconhecimento de atividade rural no interregno de 1998 a 2013.
A situação permite a análise do mérito do pedido inicial, cabendo verificar se, observada esta vedação, a parte autora ainda preenche a carência exigida para a concessão de aposentadoria rural por idade.
MÉRITO
CONSIDERAÇÕES GERAIS
A concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91), deve observar os seguintes requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 anos para mulheres); e (b) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que de forma descontínua, independentemente do recolhimento de contribuições (art. 48, §§ 1º e 2º, 25, II, 26, III, e 39, I, da Lei nº 8.213/91).
Quanto à carência, o art. 143 da Lei nº 8.213/91, estabeleceu regra de transição para os trabalhadores rurais que passaram a ser enquadrados como segurados obrigatórios, na forma do art. 11, I, "a", IV ou VII, assegurando "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício".
Já o art. 142 da Lei de Benefícios previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".
Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).
Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Outrossim, nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, por meio da qual foi alterada a redação original do referido art. 143 (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, por um período de 5 anos (60 meses) anterior ao requerimento administrativo, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/91, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser relativizada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido.
Em qualquer dos casos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação, conforme modulação contida no julgamento do RE 631.240.
Registre-se que o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia).
Ainda, quanto à questão da prova, cabe ressaltar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovaçãabout:newtabo do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
CASO CONCRETO
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário em 17/11/2009 e formulou o requerimento administrativo em 08/07/2016. Dessa forma, conforme tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991, deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 168 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou 180 meses imediatamente anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora instruiu o processo com os seguintes documentos:
1) Certidão de casamento da autora, datada de 28/09/1974, atestando a profissão de agricultor do seu cônjuge;
2) Certidões de nascimento dos filhos, nascidos nos anos de 1991, 1985, 1981, 1977 e 1975, contendo a profissão de agricultor do seu cônjuge;
3) Declarações de terceiros afirmando que conhecem a autora há mais de 20 anos e que a mesma trabalhou durante toda sua vida como bóia-fria, diarista, recebendo por dia ou empreitada;
4) Certidão emitida pela Justiça Eleitoral informando sua profissão de trabalhadora rural ;
5) Ficha Geral de atendimento, prontuário médico da autora, emitido pela Secretaria de Saúde Municipalde Mangueirinha, constando sua profissão de agricultora, residente no interior do município, na Estância Covó , com registros de consultas desde 1995 até 2014;
6) Contrato de compra e venda de imóvel rural realizado pela autora e seu marido, ambos qualificados como agricultores, de Lote Ruralsituado no Covó , com 2.909,75m² de extensão, em 06/09/2005.
7)Decisão judicial reconhecendo o exercício e atividade rural desenvolvido pela autora durante o período de 28/09/1974 a 03/07/1989.
Para complementar a instrução foram ouvidas três testemunhas. Eis o teor dos depoimentos, conforme consta em sentença:
Nesse sentido, a testemunha Joaquim de Oliveira, declara:
"(...) que não tem nenhum grau de parentesco com a requerente, que conhece a requerente há 30 (trinta) anos; que a autora sempre trabalhou na roça, na condição de boia - fria; que a requerente desenvolvia atividades agrícolas como como carpir, roçar, entre outras atividades rurícolas, sempre trabalhando por dia de serviço, conheceu ela no trabalho, sempre trabalhando na roça, que ela nunca trabalhou para ele, que ela hoje mora no Covó. Afirmou que ela não é proprietária de terras, que ela trabalha carpindo, trabalha sempre fazendo serviço de roça, que a parte sempre trabalhou para os outros, que ela trabalhava por empreita por dia. Que os caminhões pegavam os peões, quem a levava era o Sr. Valdomiro Mello. Que não se recorda de ter visto ela trabalhar na cidade, que ela desempenhava qualquer trabalho na agricultura, carpir, roçar, que o marido dela é aposentado, mas que o dinheiro da aposentadoria vai todo em remédio pois ele é doente, por isso ela ainda precisa trabalhar, que ela não tem outra fonte de renda que não seja a lavoura (...)."
Ainda, a testemunhaKeli Cristina Kobeski asseverou:
"(...) que não tem nenhum grau de parentesco com a requerente, afirmou que conhece a requerente há 19 (dezenove) anos; que a profissão da requerente é boia - fria, colhendo milho, arrancando feijão. Declarou ainda a testemunha que trabalhou juntamente com a requerente nas propriedades rurais dos senhores Valdir Mello, Silvio Junco e Pila,que ela trabalha até hoje, que sempre alguém vem pegar ela, sempre trabalhando na 13 de maio, na conquista, sempre pela redondeza, que tem conhecimento que ela sempre trabalhou na roça, que ela não tem outra renda que não seja a lavoura (...)."
A autora em seu depoimento pessoal declara que:
(...) Trabalhou desde pequena, sempre viveu da roça, nunca foi proprietária de terras, trabalhou sempre como boia-fria desde os sete anos, somente na roça. Casou tem aproximadamente 42 anos, as atividades que realiza é as de boia - fria, por dia, trabalhando para os outros, trabalhou para diversas pessoas. Ultimamente trabalhou para o Plínio, Silvio e também para o Pila do Covó que trabalha até hoje. Que trabalha na Roça até hoje, que o último trabalho foi para o Pila, que cultiva feijão, que trabalhou por dois anos desempenando trabalho urbano, que se obrigou porque o trabalho na roça estava fraco e precisava sustentar os filhos depois que o marido adoeceu. Que trabalha até hoje e que as pessoas vão atrás dela, que retira em torno de cinquenta, sessenta reais por dia. Disse que precisa trabalhar uma vez que o marido é doente.
Não há dúvidas quanto ao exercício de atividade rural no período compreendido entre o marco final do interregno da coisa julgada, 2013 e o requerimento administrativo de 2016, até porque o INSS não impugna o seu reconhecimento na apelação. Com efeito, há farta documentação, corroborada pelo convincente depoimento das testemunhas.
Entretanto, este período é insuficiente para o preenchimento da carência exigida. Não há óbice, contudo, que se inclua na contagem o período rural remoto, já averbado judicialmente que compreende o período de 28/09/1974 a 03/07/1989 anterior ao marco inicial do interregno da coisa julgada (1998). Esta Corte admite tal hipótese, desde que o segurado demonstre a ligação com as lides campesinas na época do requerimento administrativo, o que se observa no caso. Confira-se o precedente da 3ª Seção:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. DESCONTINUIDADE. SOMA DE TEMPO ANTIGO COM O PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. POSSIBILIDADE. O artigo 145 da IN 45/2010, do INSS, estabelece tão somente dois pressupostos para a concessão de aposentadoria por idade rural no caso de comprovação de desempenho de atividade urbana entre períodos de atividade rural, com ou sem perda da qualidade de segurado: (a) completar o número de meses igual ao período de carência exigido para a concessão do benefício e (b) esteja em efetivo exercício da atividade rural à época do requerimento administrativo. (TRF4, EINF 0021018-50.2013.404.9999, TERCEIRA SEÇÃO, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 08/11/2016)
O início de prova material conta com certidões de nascimento e casamento que se referem ao período mais remoto.
Compulsando os autos, todavia, observo que a sentença da ação anterior juntada pelo INSS reproduz os depoimentos colhidos naqueles autos. As três testemunhas ouvidas na ocasião afirmaram conhecer a autora há cerca de 30 anos e relataram ter presenciado o seu labor rural na região de Mangueirinha/PR. Uma deles afirmou que a autora trabalha com ele nas colheitas, que leva a autora juntamente com outras trinta ou quarenta pessoas, qua trabalham para todos os lavoureiros da região. O acórdão, também juntado aos autos, consigna que:
" Não comprovada a carência suficiente à concessão da aposentadoria pleiteada, o período reconhecido como rural deve ser averbado para futura concessão de benefício previdenciário."
O art. 372 do Código de Processo Civil dispõe que "o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório." No caso, foi o próprio réu quem juntou a sentença com a transcrição dos depoimentos, de modo que não há óbice à sua utilização.
Analisadas em conjunto, a prova produzida nos dois processos permite concluir que no período que se segue ao seu casamento em 1974 até 1989 a autora exerceu atividades rurícolas na condição de bóia-fria. E de 2013 até a data da sentença na presente demanda, onde não há qualquer indício de trabalho urbano.
Deve-se ressaltar que não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental.
Nesse sentido, precedentes desta Corte, firmando o entendimento de que é prescindível que o início de prova material se refira a todo o período em análise, desde que sua eficácia probatória seja ampliada por robusta prova testemunhal, como no caso dos autos.
Confira-se o seguinte julgado deste Tribunal:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NÃO CONHECIDA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. IDADE MÍNIMA ATINGIDA PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TRABALHO RURAL COMPROVADO.
1. Tratando-se de aposentadoria rural por idade, cujo benefício corresponde ao valor de um salário mínimo, e resultando o número de meses entre a data da DER e a data da sentença em condenação manifestamente inferior a mil salários-mínimos, ainda que com a aplicação dos índices de correção monetária e de juros de mora nas condições estabelecidas em precendentes do Supremo Tribunal Federal, não está a sentença sujeita ao reexame obrigatório, nos termos do disposto no art. 475, § 2º, do Código de Processo Civil. Não conhecida a remessa. 2. Atingida a idade mínima exigida e comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar pelo período exigido em lei, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, a segurada faz jus à aposentadoria rural por idade. 3. A par da inexistência de prova material correspondente a todos os períodos pleiteados, não há necessidade que a prova tenha abrangência sobre todo o período, ano a ano, a fim de comprovar o exercício do trabalho rural. Basta um início de prova material. Uma vez que é presumível a continuidade do labor rural, a prova testemunhal pode complementar os lapsos não abrangidos pela prova documental, como no presente feito. 4. O exercício de labor urbano pelo marido da autora não afasta a sua condição de segurada especial. Comprovado o desempenho de atividade rural, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007214-78.2014.404.9999, 5ª TURMA, (Auxílio Roger) Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ, POR UNANIMIDADE, D.E. 19/06/2017, PUBLICAÇÃO EM 20/06/2017)grifei
O fato do cônjuge possuir vínculo urbano em determinado período de sua vida não descaracteriza o labor rural da autora, vez que esta continuou na lide rural, como boia-fria, durante o período de carência. Os documentos apresentados, corroborados pela prova testemunhal, confirmam a vocação rural da autora.
Considerando os dois períodos de atividade rural, 1974 a 1989 já averbados anteriormente e 2013 a 2016, onde restou demonstrado a permenência no desempenho das atividades rurais, a parte autora preenche a carência exigida para a aposentadoria rural por idade, de modo que não merece reparo a sentença no ponto em que concede o benefício.
CONSECTÁRIOS LEGAIS
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC, a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, nos termos das decisões proferidas pelo STF, no RE nº 870.947, DJE de 20/11/2017 (Tema 810), e pelo STJ, no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20/03/2018 (Tema 905).
JUROS DE MORA
Os juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ) , até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 (Tema 810)
TUTELA ESPECIFICA - IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Seção deste Tribunal, buscando dar efetividade ao estabelecido no seu art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que, confirmada a sentença de procedência ou reformada para julgar procedente, o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, portanto sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte (TRF4, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7, 3ª SEÇÃO, Des. Federal Celso Kipper, por maioria, D.E. 01/10/2007, publicação em 02/10/2007). Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente ao cumprimento de obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo dispôs de forma similar à prevista no Código/1973, razão pela qual o entendimento firmado pela Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Nesses termos, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, a ser efetivada em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, bem como por se tratar de prazo razoável para que a Autarquia Previdenciária adote as providências necessárias tendentes a efetivar a medida. Saliento, contudo, que o referido prazo inicia-se a contar da intimação desta decisão, independentemente de interposição de embargos de declaração, face à ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).
CONCLUSÃO
Apelação do INSS parcialmente provida, para reconhecer a ocorrência de coisa julgada material no que diz respeito ao reconhecimento de atividade rural no interregno de 1998 a 2013.
De ofício, aplicadas, quanto aos consectários legais, as decisões proferidas pelo STF (Tema 810) e STJ (Tema 905).
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/06/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5016892-27.2017.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00014315320168160110
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA CREUSA RIBEIRO LEITE |
ADVOGADO | : | GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/06/2018, na seqüência 147, disponibilizada no DE de 06/06/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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