APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5007282-04.2014.4.04.7004/PR
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | MARIA ROSA FIORI REAL |
ADVOGADO | : | ANDERSON WAGNER MARCONI |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. DESCARACTERIZAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. Improcede o pedido de aposentadoria rural por idade quando não atendidos os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/1991.
2. Pela análise do conjunto probatório presente nos autos, não há como ser reconhecida a qualidade de segurado especial da parte autora, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação da parte autora e dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de março de 2017.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8842188v6 e, se solicitado, do código CRC 9EEED9F7. | |
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| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 16/03/2017 16:37 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5007282-04.2014.4.04.7004/PR
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | MARIA ROSA FIORI REAL |
ADVOGADO | : | ANDERSON WAGNER MARCONI |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria rural por idade em razão do desenvolvimento de atividades rurais em regime de economia familiar.
Sentenciando, o juízo "a quo" julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, ante a ocorrência de coisa julgada, na forma do art. 267, V, do Código de Processo Civil.
Subiram os autos a este Tribunal, com apelação da parte autora.
Na sessão de 15/12/2015, esta 5ª Turma decidiu dar parcial provimento à apelação da parte autora para anular a sentença na parte que reconheceu a existência de coisa julgada no que diz respeito ao exame do labor rural no período de 20/01/2006 a 16/09/2012, determinando a reabertura da instrução processual, com a produção de prova testemunhal para verificação da atividade rural no período posterior a 20/01/2006.
Em nova sentença, o MM. Juiz assim decidiu:
Diante do exposto, JULGO parcialmente procedente o pedido, resolvendo o mérito do litígio, forte no artigo 487, I, do CPC, apenas para o fim de condenar o INSS a proceder à AVERBAÇÃO do trabalho rural exercido pela autora, como segurada especial, no período de 20.01.2006 a 16.09.2010, para que possa gerar, oportunamente, efeitos previdenciários; o pedido de concessão da aposentadoria por idade é improcedente, ante a falta de tempo de carência, nos termos da fundamentação.
Cada parte, autora e ré, foi vencedora e vencida, em proporções que considero equivalentes. De acordo com o CPC/2015, não é possível a compensação (art. 85, § 14). Então, cada uma das partes deve ser condenada a pagar honorários. Como a prestação jurisdicional não reflete proveito econômico imediato e estimável, com fundamento no art. 85, § 8º, do CPC/2015, sopesando os requisitos do § 2º desse mesmo dispositivo, especialmente a natureza da causa e o tempo exigido para o serviço dos advogados, fixo os honorários advocatícios, para cada parte, no valor de R$1.000,00 (um mil reais), a ser atualizado até a data do efetivo pagamento; na atualização, deve ser aplicado o IPCA-e.
Como a parte autora é beneficiária da justiça gratuita (evento 9), a exigibilidade dos honorários, pelo INSS, está sujeita ao disposto no art. 98, § 3º, do CPC.
Sem custas, pois o INSS é isento no foro federal e a parte autora beneficiária da justiça gratuita (Lei nº 9.289/1996, art. 4, I e II).
Sentença sujeita a reexame necessário, tendo em vista o enunciado 490 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
Sentença publicada e registrada eletronicamente, na data do lançamento da fase no Sistema de Processo Eletrônico (e-proc). Intime(m)-se.
Irresignados, o INSS e a autora apelam.
O INSS sustenta a impossibilidade de averbação do período reconhecido na sentença. Alega que foi desconsiderada a significativa extensão de terras do núcleo familiar, além da circunstância de o esposo da autora ter obtido o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição comprovando a qualidade de empregador rural. Argumenta que a autora é grande produtora rural, pois possui criação de mais de 100 cabeças de gado e, ainda, cultivo de milho.
A autora, por sua vez, aduz que juntou no evento 53 cópias de outro processo perante o JEF de Umuarama, em que lhe foi reconhecida a atividade rural e concedido o benefício de auxílio-doença. Alega que sendo reconhecida a atividade rural nesse processo que lhe concedeu o auxílio-doença, não pode subsistir decisão contraditória do próprio Poder Judiciário. Dessa forma, requer seja reconhecido o período de trabalho rural desde 1994, com a concessão da aposentadoria rural por idade. Em caso de manutenção da sentença, requer seja aplicado o disposto pela Lei nº 11.960/2009.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Da ordem cronológica dos processos
O presente feito está sendo levado a julgamento em consonância com a norma do art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que assim dispõe: os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Nessa ordem de julgamento, também são contempladas as situações em que estejam litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei nº 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei nº 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei nº 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Ademais, cumpre registrar que foi lançado ato ordinatório na informação processual deste feito programando o mês de julgamento, com observância cronológica e preferências legais. Esse procedimento vem sendo adotado desde antes (2013) da vigência do novo CPC.
Remessa necessária
Em relação à remessa necessária, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça dirimiu a controvérsia e firmou o entendimento, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.101.727/PR, no sentido de que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público (Código de Processo Civil, artigo 475, parágrafo 2º). Em conformidade com esse entendimento, o STJ editou a súmula Nº 490: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças iliquidas".
Contudo, § 3º, I, do art. 496, do novo Código de Processo Civil, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
A despeito da orientação firmada sob a égide do antigo Código de Processo Civil, de submeter ao reexame necessário as sentenças ilíquidas, é pouco provável que a condenação nas lides previdenciárias, na quase totalidade dos feitos, ultrapassem o valor limite de mil salários mínimos. E isso fica evidente especialmente nas hipóteses em que possível mensurar o proveito econômico por mero cálculo aritmético.
Assim, se a sentença submetida a reexame necessário condena a Fazenda Pública ao pagamento de valores monetários, impõe-se aferir o proveito econômico assegurado ou o montante da condenação na data em que proferida a decisão, pois é neste momento que é feita a avaliação quanto à obrigatoriedade da remessa. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito.
No caso dos autos, como a sentença condenou o INSS tão-somente à averbação de período rural, não se pode cogitar de condenação em parcelas vencidas até então, nem em resultado econômico da demanda. Tem-se, pois, que não se trata de hipótese de sentença ilíquida, mas de decisão cujos efeitos não se produzem diretamente por força do processo, dependentes que estão, para terem reflexos econômicos, de situações futuras e incertas.
Em tais condições, resta afastada, por imposição lógica, a necessidade da remessa necessária.
Nesse caso, portanto, não conheço da remessa necessária.
Por fim, na hipótese de impugnação específica sobre o ponto, fica a parte inconformada, desde já, autorizada a instruir o respectivo recurso contra a presente decisão com memória de cálculo do montante que entender devido, o qual será considerado apenas para a análise do cabimento ou não da remessa necessária.
Considerações gerais sobre a aposentadoria rural por idade:
A apreciação de pretensão de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/1991), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§ 1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei nº 8.213/1991. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, sendo dispensável o recolhimento de contribuições. Neste sentido, o julgamento da APELREEX nº 0008606-53.2014.404.9999, Quinta Turma, de minha relatoria, D.E. 15/08/2014.
Não se pode olvidar, outrossim, que o artigo 143 da Lei nº 8.213/1991, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei nº 8.213/1991 estabeleceu que, para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei nº 8.213/1991, como regra, deverá ser aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que, até então, já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, inciso XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/1991. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios.
Deve ser observado que nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, § 1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, RExt. nº. 631240/MG, Rel. Ministro Roberto Barroso, Plenário, julgado em 03/09/2014).
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, Súmula nº 149 do STJ e REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia). Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016) que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório."
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, como o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais da entidade respectiva serão formalizados não individualmente, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Importante, ainda, ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, somente será descaracterizado o regime de economia familiar acaso reste comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
Cumpre salientar que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, pois produzidas com todas as cautelas legais, garantindo-se o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora, mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, a fim de que seja examinada no conjunto do acervo probatório constante dos autos.
Do caso concreto:
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário, 55 (cinquenta e cinco) anos, em 09/01/2006, porquanto nascida em 09/01/1951 (evento 1, PROCADM2, p.4). O requerimento administrativo foi efetuado em 16/09/2010 (evento 1, PROCADM2). Dessa forma, a parte autora deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 150 meses imediatamente anteriores ao implemento do requisito etário ou 174 meses imediatamente anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora instruiu sua peça inicial com os seguintes documentos:
- matrícula 13.390 do registro de imóveis de Umuarama, acerca de imóvel rural no município de Maria Helena/PR, com 24,20 hectares, adquirido em 1982 pelo marido da autora, em condomínio com outros 3 familiares (evento 1, PROCADM3, p.21);
- certidão do registro de imóveis de Umuarama, acerca de dois lotes rurais (nºs 11 e 12), com 30,7 e 23,296 alqueires respectivamente, adquirido em 1962 pelo marido da autora, em condomínio com outros 3 familiares (evento 1, PROCADM3, p.2/3);
- certidão do registro de imóveis de Umuarama, acerca de lote rural (nº 11-A), com 9,296 alqueires respectivamente, adquirido em 1963 pelo marido da autora, em condomínio com outros 3 familiares (evento 1, PROCADM3, p.8/9);
- certificado de cadastro de imóvel rural (CCIR) em nome do cônjuge da autora, dos anos de 1996/1997 e 1998/1999, de imóvel rural com 153,2 hectares - Fazenda Alamo (evento 1, PROCADM4, p.3/4);
- certificado de cadastro de imóvel rural (CCIR) em nome do cônjuge da autora, dos anos de 1998/1999, 2000/2001/2002, 2003/2004/2005 e 2006/2007/2008/2009, de imóvel rural com 93,4 hectares - Sítio Real (evento 1, PROCADM4, p.5/7 e evento 7, PROCADM3, p. 9);
- notas fiscais de compra/venda em nome do cônjuge, abrangendo os anos de 1990/2004, 2006/2008 e 2010 (evento 1, PROCADM4, p.8/10, PROCADM5, p. 1/10 e PROCADM6, p. 1/5 e evento 7, PROCADM3, p. 13/27).
- informação CNIS acerca de registro no CAFIR do Sítio São Luiz em Rolândia/PR, com 26,20 hectares, no nome do cônjuge da autora a partir de 31/12/2006 (evento 1, PROCADM6, p. 16);
- informação CNIS acerca de registro no CAFIR da Fazenda Álamo em Maria Helena/PR, com 153,20 hectares, no nome do cônjuge da autora a partir de 31/12/1993 a 01/01/1999 (evento 1, PROCADM7, p. 1);
- informação CNIS acerca de registro no CAFIR da Chácara do Recanto em Maria Helena/PR, com 6,50 hectares, no nome do cônjuge da autora a partir de 31/12/1993 a 01/01/1999 (evento 1, PROCADM7, p. 2);
- matrícula 12.082 do registro de imóveis de Umuarama, acerca de imóvel rural no município de Maria Helena/PR, com 93,36 hectares, decorrente da divisão legal das propriedades em condomínio do cônjuge (lotes nºs 11 e 12 e remanescentes) em 1994 pelo marido da autora (evento 7, PROCADM3, p.5/6);
- ofício do INCRA acerca dos imóveis rurais em nome do cônjuge da autora (evento 7, PROCADM7, p.11).
Por ocasião da audiência de instrução, em 02/08/2016 (evento 51), foram inquiridas as testemunhas Sebastião Sacoman, Luiz Trombella e Mario de Moura Peres, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais pela parte demandante.
A testemunha Sebastião Sacoman relata:
Que conhece o casal desde o ano de 1975, pois são vizinhos, que eles moram no Km 4 e a propriedade do depoente é no Km 5, com cerca de 1.000 metros de diferença, que eles moraram na propriedade até pouco tempo atrás, porque a autora teve um problema de saúde; que eles saíram de lá em 2015, que a produção é de gado (bovinos), tinha gado de corte e algumas cabeças de gado leiteiro para consumo próprio; que eles criam, engordam e vendem para o frigorífico; que o tamanho da propriedade é de 38 alqueires; que no passado, quando o depoente veio morar no local, o cônjuge tomava conta de uma propriedade maior, que era da família, em torno de 80 alqueires; que depois houve a divisão entre os irmãos e o marido da autora comprou a parte de um dos irmãos, ficando com 38 alqueires; que acredita que a divisão e a compra da parte do irmão foi em 1995; que acha que tem mais de 20 anos essa divisão, que antes da divisão, não eram os irmãos quem trabalhavam na propriedade, porque eles sempre moravam no Município de Rolândia/PR; que quem cuidava do gado era o marido, a autora e os filhos; que eles cuidavam de todo o gado; que o casal que morava no sítio; e só tinha uma casa no sítio; que nunca teve retireiro ou caseiro; que quem ajudava o casal lá no passado eram os filhos e com o passar dos anos, só o casal ficou trabalhando no sítio; que eles davam conta de cerca de 80 cabeças; que não era muito gado; que o casal sobrevivia da renda do sítio.
A testemunha Luiz Trombella, por sua vez, esclarece:
Que o depoente é vizinho da autora desde 1973; que a propriedade fica em Maria Helena/PR, cerca de 5 km de distância, que hoje a propriedade deles é de 38 alqueires, que eles cultivam pastagem para bovinos, que antes a propriedade era maior, porque havia a parte de 4 irmãos; que no ano de 1993, o depoente comprou uma das partes e ficou vizinho de cerca da autora e do marido dela; que o cônjuge da autora ficou com duas partes, de 38 alqueires; que só o casal tomava conta, que a autora trabalhava, ajudava a fazer cerca, a cuidar do gado; o que precisava fazer na propriedade, que eles estavam sempre em dois; que eles não tinham empregados nem retireiro; que só tem uma casa no sítio e um paiol (rancho), mas não mora ninguém nesse paiol; que dentro da área de 38 alqueires existe uma área de 5 ou 6 alqueires que é de reserva próxima ao rio; que não se cultiva os 38 alqueires; tem que descontar a reserva; que na propriedade, cabe, em média, cerca de 80 cabeças bovinas.
Por fim, a testemunha Mario de Moura Peres confirma as demais inquirições:
Que conhece a autora e o Sr. Geraldino há uns 27/30 anos, que topava com eles na estrada próxima à propriedade do depoente; que o tamanho da propriedade com 30 e pouco alqueires, não sabe bem certo; que antes, a propriedade era de vários irmãos e tinha cerca de 70 ou 80 alqueires; que o depoente chegou a comprar parte da propriedade de um dos irmãos; que a divisão da propriedade tem mais de 20 anos, que também comprou esse pedaço há mais de 20 anos e já vendeu; que eles tem poucas vacas leiteiras, porque a autora adoeceu; que eles tem é mais gado de corte, que via a autora e o marido trabalhando, que via a autora tocando o gado, carpindo e ajudando a tirar leite, que avistava da propriedade do depoente, que até 1 ano, 1 ano e pouco eles tiravam mais leite.
Afirma a parte autora que juntou decisão do JEF da Subseção de Umuarama, onde no feito nº 5003041-50.2015.4.04.7004/PR, foi reconhecida a sua atividade rural e lhe foi concedido o benefício de auxílio-doença por incapacidade em decorrência de um AVC sofrido em 2015. Alega que a situação é de flagrante erro do Poder Judiciário passível da QUERELA NULLITATIS, pois as decisões são antagônicas, devendo ser reconhecido o labor rural no período anterior a 20/01/2006, ou seja de 1994 em diante.
Todavia, não merece provimento a apelação da parte autora. Em primeiro lugar, registre-se que carência no caso do auxílio-doença era de 12 meses à época da sua concessão para a autora, o que significa dizer que era necessária a comprovação do trabalho rural apenas no período de um ano, não podendo se presumir que em decorrência a autora tenha exercido 15 anos de atividade rural.
Em segundo, porquanto tal argumentação afronta a coisa julgada relativa ao primeiro julgamento neste Tribunal que, por sua vez, considerou já existir coisa julgada quanto ao interregno anterior a 20/01/2006, o qual não pode ser objeto de nova discussão.
Transcrevo trecho do pertinente julgamento neste Tribunal relativo ao presente caso:
No caso em exame, a parte autora completou 55 anos de idade em 09/01/2006 e ajuizou a presente ação pretendendo a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, desde o novo requerimento administrativo (DER 16/09/2012, evento1, PROCADM2, fl. 01), mediante o cômputo do tempo de serviço rural.
Com efeito, a parte autora ajuizou ação anterior, sob nº 2006.70.04.003654-0 (Recurso Cível nº 2007.70.95.011969-3), a qual tramitou no Juizado Especial Cível da 3ª Vara Federal de Umuarama/PR, que também postulava a concessão de aposentadoria rural por idade, porém desde 20/01/2006 (data do 1º requerimento administrativo do benefício). A prova produzida naqueles autos foi examinada, tendo sido julgado improcedente o pedido formulado pela demandante, tendo o magistrado assim se manifestado:
(....)
A sentença transitou em julgado em 14/12/2007.
De fato, a demanda ajuizada sob o n° 2006.70.04.003654-0 envolve as mesmas partes e pedido, sendo certo que a primeira já se encontra arquivada em face do trânsito em julgado. O Magistrado de 1º Grau julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, ante a ocorrência de coisa julgada, na forma do art. 267, V, do Código de Processo Civil.
Assim, tem-se que o labor rural no período de entre 1970 e 20/01/2006 não pode ser rediscutido. Cabe aferir, nestes autos, o direito à aposentadoria por idade rural na 2ª DER (16/09/2012), mediante o exame do período de atividade rural posterior a 20/01/2006, que não foi analisado naqueles autos e quanto ao qual não ocorreu a coisa julgada.
Tampouco há falar em eficácia preclusiva da coisa julgada, visto que a previsão do art. 474 do Código de Processo Civil ("Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.") visa coibir a rediscussão do mesmo pedido em outra ação, fundado em novos argumentos, hipótese diversa da ora examinada.
Diante do exposto, deve ser anulada a sentença a sentença que reconheceu a existência de coisa julgada no que diz respeito ao exame do labor rural no período de 20/01/2006 a 16/09/2012, devendo ser reaberta a instrução processual, com a produção de prova testemunhal para verificação da atividade rural no período posterior a 20/01/2006.
Restringe-se, portanto, a discussão nos presentes autos ao interregno entre 20/01/2006 a 16/09/2010, sendo incabível análise quanto ao período anterior.
No caso, os documentos apresentados constituem início razoável de prova material. A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente do labor rural pela parte autora no período entre 20/01/2006 a 16/09/2010.
Todavia, a autora e seu marido possuem significativa extensão de terras, 93,4 hectares (Sítio Real resultante da divisão de terras exploradas anteriormente entre irmãos) durante o período em discussão.
Assim, a dimensão da propriedade atual supera o limite imposto pela lei, uma vez que 93,4 hectares equivalem a 4,24 módulos fiscais, considerando que o módulo fiscal em Maria Helena/PR é de 22 hectares (vide sítio www.incra.gov.br), ultrapassando o limite legal previsto na Lei 8.213/91, em seu art. 11, V "a" e VII, "a", I (04 módulos fiscais).
Conquanto o tamanho da propriedade por si só já pudesse representar obstáculo ao reconhecimento da condição de segurada especial, o domínio sobre significativa extensão de terras é ainda indício a ser ponderado em conjunto com os demais elementos de convicção carreados aos autos, todos igualmente a afastar a condição de segurada especial da autora.
Segundo consta do processo administrativo o cônjuge foi aposentado como empregador rural (evento 7, PROCADM7). Além disso, segundo o depoimento testemunhal e notas fiscais consta que na propriedade havia exploração de gado de corte e de leite, em torno de 80 a 100 cabeças.
Logo, a extensão da propriedade, somada ao fato de o marido ter sido aposentado como empregador por ter havido o registro de empregados no imóvel até 1999 (ofício do INCRA no evento 7, PROCADM7, p.11), aliado à produção comercial de carne e leite, são elementos suficientes para descaracterizar o trabalho rural em regime de economia familiar desempenhado pela autora, permitindo concluir que, levando em conta o patrimônio do grupo familiar, possuía recursos financeiros suficientes para que pudesse providenciar o recolhimento de contribuições previdenciárias a fim de lhe garantir a cobertura pelo Regime Geral da Previdência.
É importante esclarecer que a aposentadoria rural por idade concedida aos segurados especiais consiste numa exceção ao sistema da Previdência Social, devendo ser concedida unicamente àqueles que preencham os estritos requisitos para tanto. O art. 11, VII, e § 1º, da Lei 8.213/91 exige, para a caracterização do exercício de atividade rural em regime de economia familiar, que a atividade agrícola seja indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar, devendo ser exercida em condições de mútua dependência e colaboração, sem o auxílio de empregados permanentes.
Assim, não restando comprovado o cumprimento dos requisitos necessários nos termos da lei, deve ser reformada a sentença para julgar improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Invertidos os ônus sucumbenciais, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, estes fixados em R$ 4.000,00, suspensa a exigibilidade por força do benefício da justiça gratuita (evento 9).
Conclusão:
Reforma-se a sentença, dando provimento à apelação do INSS para afastar o reconhecimento do tempo de serviço rural e a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade.
Nega-se provimento à apelação da parte autora.
Invertidos os ônus de sucumbência.
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
Dispositivo:
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação da parte autora e dar provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/03/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5007282-04.2014.4.04.7004/PR
ORIGEM: PR 50072820420144047004
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | MARIA ROSA FIORI REAL |
ADVOGADO | : | ANDERSON WAGNER MARCONI |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 14/03/2017, na seqüência 931, disponibilizada no DE de 01/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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