| D.E. Publicado em 05/04/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007997-36.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NOELI LOURDES SCHROEDER |
ADVOGADO | : | Nei Pasqual Soligo |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 2A VARA DA COMARCA DE TRES PASSOS/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. SÚMULA 149 DO STJ. TUTELA ESPECÍFICA. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA.
. Fixada pelo STJ a obrigatoriedade do reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público na REsp 1101727/PR, a previsão do art. 475 do CPC/1973 torna-se regra, admitido o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos.
. Satisfeitos os requisitos legais de idade mínima e prova do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, é devida a aposentadoria rural por idade.
. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento das custas, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015.
. Em se tratando de benefício já concedido em sede de antecipação de tutela na sentença ou em agravo de instrumento, dada a provisoriedade do provimento, é de torná-lo definitivo desde logo, em face do seu caráter alimentar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, mantendo-se a determinação da imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 28 de março de 2017.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8861791v2 e, se solicitado, do código CRC FDB44D19. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 28/03/2017 19:43 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007997-36.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NOELI LOURDES SCHROEDER |
ADVOGADO | : | Nei Pasqual Soligo |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 2A VARA DA COMARCA DE TRES PASSOS/RS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação e remessa oficial contra sentença que julgou procedente o pedido para conceder aposentadoria por idade rural à parte autora, desde a data do requerimento administrativo, condenando o INSS a pagar as parcelas devidas a partir do vencimento de cada uma. A contar da vigência da Lei nº 11.960, em 1º-7-2009, foi determinada a incidência, de uma só vez, de atualização monetária e juros pelos índices oficiais aplicados à caderneta de poupança. Arcará a autarquia, também, com o pagamento das despesas processuais, e honorários advocatícios, de 10% sobre o valor total da condenação, excluídas as prestações vincendas. Foi deferida a antecipação dos efeitos da tutela, determinando a implantação do benefício no prazo de 05 dias.
Em suas razões, sustenta a entidade previdenciária que não foi provada a atividade rural no período de carência por meio de início de prova material, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal. Alega que a autora reside no Paraguai com seu esposo, inclusive possuindo título de eleitor naquele país, onde também mora seu filho.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (preferências legais), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a concessão de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.
Quanto à carência, há regra de transição para os segurados obrigatórios previstos no art. 11, I,"a", IV ou VII: (a) o art. 143 da Lei de Benefícios assegurou "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício"; b) o art. 142 previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".
Assim, àqueles filiados à Previdência quando da edição da Lei nº 8.213/91 que implementarem o requisito idade até quinze anos após a vigência desse dispositivo legal (24-7-2006), não se lhes aplica o disposto no art. 25, II, mas a regra de transição antes referida.
Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).
Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Caso o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-8-1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou a redação original do art. 143 referido, posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n° 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado; ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
O benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação, conforme modulação contida no julgamento do RE 631.240.
Da comprovação do tempo de atividade rural
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, salvo caso fortuito ou força maior. Tudo conforme o art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91 e reafirmado na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Nesse contexto probatório: (a) a lista dos meios de comprovação do exercício da atividade rural (art. 106 da Lei de Benefícios) é exemplificativa, em face do princípio da proteção social adequada, decorrente do art. 194 da Constituição da República de 1988; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido; (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 980.065/SP, DJU, Seção 1, 17-12-2007; REsp n.º 637.437/PB, DJU, Seção 1, de 13-09-2004; REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.); (d) quanto à contemporaneidade da prova material, inexiste justificativa legal, portanto, para que se exija tal prova contemporânea ao período de carência, por implicar exigência administrativa indevida, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.
As certidões da vida civil, documentos admitidos de modo uníssono pela jurisprudência como início probatório de atividade rural, no mais das vezes, registram fatos muito anteriores à implementação da idade de 55 ou 60 anos, e fora dos prazos constantes do art. 142 da Lei 8.213/91. O período de carência, em se tratando de aposentadoria por idade rural, correspondente a estágio da vida do trabalhador em que os atos da vida passíveis de registro cartorário, tais como casar, ter filhos, prestar serviço militar, ou inscrever-se como eleitor, foram praticados muito antes do início do marco para a contagem da carência prevista para tal benefício.
Nesse sentido, a consideração de certidões é fixada expressamente como orientação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, 3ª Seção, REsp 1.321.493-PR, procedimento dos recurso repetitivos, j.10/10/2012). Concluiu-se imprescindível a prova material para fins previdenciários, ainda que o labor tenha sido exercido à margem da formalidade, cabendo às instâncias ordinárias a verificação da condição de trabalhador:
"E, nesse aspecto, por mais que o trabalho seja informal, é assente na jurisprudência desta Corte que há incontáveis possibilidades probatórias de natureza material. Por exemplo, ainda que o trabalho tenha sido informal, constatando-se que o segurado tem filhos ou é casado, devem ser juntadas certidões de casamento e de nascimento, o que deve ser averiguado pelas instâncias ordinárias."
De todo o exposto, consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, é dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Registre-se, por fim, que, em se tratando de aposentadoria por idade rural, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16.04.94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, ocorre após a comprovação junto à entidade pública das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta ao segurado demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial. Se a parte autora tivesse CIC expedida em seu nome não necessitaria postular o benefício em juízo, pois com base nesse documento é de supor-se que o próprio INSS já o concederia administrativamente, porque assim prevê a Lei de Benefícios.
Da prova da atividade rural prestada como boia-fria
No caso de exercício de trabalho rural caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal.
Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte. Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.
Cumpre salientar, também, que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se optar pelas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório.
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Do tempo rural do segurado especial a partir dos 12 anos de idade
No tocante à possibilidade do cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo recentemente a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo tal questão maiores digressões.
Do caso concreto
Neste feito, o exame recursal abrange a apelação cível e a remessa oficial, expressamente interpostas diante da sentença recorrida (fls. 203/205).
Nessas circunstâncias, havendo recurso de apelação por parte do INSS, onde suscitados os tópicos indicados no relatório, tenho que quanto aos demais fundamentos de mérito a sentença deve ser confirmada por suas próprias razões, uma vez que lançada conforme a legislação aplicável. Tanto que a autarquia previdenciária deles teve expressa ciência e resolveu não se insurgir.
A parte autora, nascida em 26/02/1955 (fls. 13), implementou o requisito etário em 26/02/2010 e requereu o benefício na via administrativa em 05/04/2010 (fls. 16). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 174 meses anteriores à implementação da idade (26/08/1995 - 26/02/2010) ou nos 174 meses que antecederam o requerimento administrativo (05/10/1995 - 05/04/2010); ou,ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Para a comprovação do trabalho rural, foram apresentados os seguintes documentos:
- Certidão de casamento, ocorrido em 31/05/1975, datada de 13/07/2006, na qual o cônjuge da autora foi qualificado como agricultor (fls. 14);
- Escritura pública de doação com reserva de usufruto vitalício, registrada junto ao Registro de Imóveis de Comarca de Três Passos, datada de 31/05/1989, em favor do cônjuge da autora (fls. 17/20);
- Notas fiscais de entrada/produtor rural, emitidas em nome do cônjuge da autora, datadas de 19/10/1976, 21/05/1977, 10/02/1978, 25/05/1979, 29/05/1980, 07/05/1981, 08/02/1982, 16/06/1983, 09/11/1984, 13/06/1985, 03/07/1986, 17/06/1987, 17/08/1988, 03/11/1989, 30/04/1990, 15/05/1991, 28/10/1992, 15/10/1993, (fls. 24/41);
Notas fiscais de entrada/produtor rural, emitidas em nome da autora e do seu cônjuge, datadas de 30/06/1994, 07/06/1995, 21/11/1996, 04/03/1997, 01/04/1998, 15/08/2005, 20/08/2006, 12/03/2007, 10/11/2008, 28/03/2009, 07/04/2010, 22/03/2011, 30/12/2011, 02/01/2012, 08/05/2012, 10/09/2012 (fls. 42/46, 49/71);
- Recibo emitido em nome do cônjuge da autora pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Esperança do Sul, datado de 27/06/2000 (fls. 47);
- Declaração de propriedade rural, firmada pela autora, datada de 28/04/2010 (fls. 95);
- Informações de benefício, emitida em 29/04/2010, na qual consta que o cônjuge da autora recebeu auxílio doença como trabalhador rural, na qualidade de segurado especial, no período de 16/06/1993 a 30/09/1993 (fls. 138);
- Resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição, emitido em 29/04/2010, no qual o INSS reconhece o exercício de atividade rural pela autora no período de 27/10/1989 a 16/03/1998, totalizando 102 meses (fls. 145/146);
- Contrato particular de parceria agrícola, firmado pelo cônjuge da autora, datado de 30/11/2012 e com validade até 30/11/2014 (fls. 154/155).
A autora não foi ouvida em Juízo. Em sede de justificação administrativa, foram ouvidas três testemunhas (fls. 79/82).
A prova testemunhal corrobora a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas foram uníssonas em confirmar que a parte autora trabalhava nas lides rurais.
A testemunha Olívio Arnaldo Woschnack declarou que conhece a autora desde 1975, pois reside na Linha Lara, que se localiza a 1.500 metros da Linha Açoita a Cabalo, onde reside a autora, sendo que ambas pertencem ao município de Três Passos. Afirmou que a autora e seu marido são agricultores, e na época tinham o usufruto de uma área de 15,4 hectares, da propriedade dos pais do cônjuge da autora, onde residiam junto com dois filhos. Disse que a autora e o esposo viviam e ainda vivem da agricultura, que trabalham em regime de economia familiar, sem empregados, peões ou terceiros, que o trabalho é executado de forma manual, com a utilização de arado de bois, plantadeiras péc-péc, enxada, foice, roçadeira e outros implementos agrícolas manuais. Referiu que plantavam e colhiam milho, feijão, soja, trigo, mandioca, batata doce, batatinha inglesa, produtos de horta, criavam porcos de engorde, e semoventes. Assinalou que parte da produção ia para o consumo do grupo familiar e que as sobras eram vendidas em comércios locais e outros. Relatou que venderam a propriedade em 2010, e arrendaram 2 hectares de Vitor Stroehacer, cujas terras se localizam a 800 metros da propriedade do depoente. Ressaltou que a autora e o marido residem nessas terras onde plantam, e que possuem contrato de arrendamento, pois entregam terça parte da produção ao proprietário. Observou que o filho da autora mora no Paraguai, onde possui terras, e que a filha da autora mora na região da Grande Porto Alegre. Informou que a autora nunca se afastou do meio rural, que conhece bem o grupo familiar da autora, e que às vezes o casal visita os filhos. Mencionou que a autora e o marido, enquanto moravam nas terras herdadas do sogro da autora, nunca arrendaram para terceiros. Disse que o irmão da autora também é agricultor e é vizinho do depoente, mas ele e a autora não são próximos. Afirmou que desde que a autora se casou e passou a residir na propriedade dos sogros, ela e o marido sempre trabalharam na agricultura, e viviam do labor rural, e que o cônjuge da autora sempre trabalhou, mesmo tendo problemas de saúde, inclusive haviam comprado um trator e tiveram que vender. Declarou que a autora e o marido nunca moraram no Paraguai ou na Grande Porto Alegre, e que a autora exerce atividade rural até a presente data.
A testemunha Ivo Forster, por sua vez, relatou que conhece a autora desde 1975, pois a família do depoente residia na localidade de Açoita a Cavalo, e a da autora em Árvore Seca, ambas no interior do município de Esperança do Sul. Afirmou que desde essa época a autora trabalhava na agricultura em regime de economia familiar com os pais e irmãos, de onde tiravam o sustento. Declarou que aos 18 anos a autora se casou e foi moram em uma área de 15,4 hectares de propriedade dos sogros da autora, na localidade de Açoita a Cavalo, que posteriormente receberam de herança, pois cuidaram do casal até o óbito. Referiu que é vizinho a uma distância de 1800 metros dessa propriedade, que a autora e o marido tiveram um casal de filhos, que trabalhavam em regime de economia familiar, tirando o sustento da agricultura e vendendo as sobras de produção em comércios locais, principalmente suínos. Assinalou que nunca tiveram empregados, peões ou terceiros, que tiravam da agricultura o sustento do casal, dos filhos e dos sogros da autora, que nunca tiveram outra fonte de renda, que viviam e ainda vivem da agricultura. Mencionou que plantavam e colhiam milho, feijão, trigo, mandioca, batata doce, batatinha inglesa, produtos de horta, e criavam porcos de engorde e galinhas poedeiras, e que possuíam animais como bois, vacas de leite e outros semoventes. Disse que a filha da autora reside no município de Nova Hartz, enquanto o filho da autora reside no Paraguai, onde trabalha como agricultor. Mencionou que a autora e o marido visitam os filhos regularmente, mas que as visitas nunca duram mais de um mês, e que os vizinhos cuidam dos animais nesses períodos. Declarou que conhece o irmão da autora, que era lindeiro da área onde ela reside, mas que tiveram problemas de relacionamento em razão da divisão das terras. Apontou que em 2010 a autora e o marido venderam essas terras e se mudaram para a Localidade de Linha Lara, onde arrendaram 2 hectares de terra de Vitor Stroehacer, onde vivem e trabalham na agricultura, de forma braçal e com tração animal, pois é uma área dobrada. Assinalou que a autora e o marido entregam uma parte da produção ao proprietário das terras, que exercem atividade rural até a presente data, que ali plantam e colhem milho, feijão, mandioca, batata doce, batata inglesa, produtos de horta, e criam porcos e galinhas para consumo, e que não criam mais animais, pois quando precisam para arar a terra tomam emprestados os dos vizinhos. Ressaltou que a autora e o marido sempre foram agricultores.
Por fim, a testemunha Noeli Lurdes Chroeder afirmou que conhece a autora desde que ela tinha 10 anos e residia com os pais no interior do município de Esperança do Sul, que na época ainda fazia parte do município de Três Passos. Disse que estudaram juntas na escola da comunidade, que os pais da autora eram proprietários de uma área de 15 hectares, onde trabalhava a autora, seus pais e os seis irmãos, e que todos viviam da agricultura. Declarou que em 1975 a autora se casou e foi morar na localidade de Açoita a Cavalo, nas terras dos sogros, que receberam de herança posteriormente, e que quando os sogros eram vivos, passaram as terras com usufruto para o casal. Informou que a autora teve um casal de filhos, e todos viviam da agricultura, com uso da força braçal e tração animal, sendo que somente o grupo familiar executava limpa, preparo, plantio e colheita de milho, feijão, soja, trigo, mandioca, batata doce, batatinha inglesa, produtos de horta, e que criavam porcos de engorde, galinhas poedeiras e possuíam animais como bois, vacas de leite e outros semoventes. Referiu que a filha da autora foi morar em Nova Hartz, e o filho foi morar no Paraguai, onde é agricultor. Mencionou que a autora e o marido visitam os filhos, mas nunca se mudaram da localidade, nem foram residir com os filhos. Relatou que em 2010 a autora e seu marido venderam a propriedade para o irmão da autora, e arrendaram uma área de dois hectares de terras de Vitor Stroehacer, sendo que o depoente é lindeiro dessa propriedade. Esclareceu que a autora e o marido tiram o sustento da agricultura, comercializam as sobras e entregam terça parte da produção para Vitor. Afirmou que a autora sempre foi agricultora, e exerce atividade rural até a presente data.
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material e que a prova testemunhal é precisa quanto ao exercício da atividade rural no período de carência, razão porque a sentença merece confirmação pela Turma.
O INSS alega que a autora reside no Paraguai, que a própria autora teria afirmado, em entrevista rural, que tem um filho morando naquele país, e que o auxiliaria no cultivo de suas terras. Refere, ainda, que a autora teria título de eleitor cadastrado no Paraguai. O fato de ter havido denúncia anônima de que a autora e marido residem no Paraguai há muitos anos e que a documentação é fraudulenta não foi devidamente comprovado pelo INSS. A autarquia previdenciária não juntou quaisquer documentos que descaracterizem o conjunto probatório trazido pela autora, não afastando, portanto, a sua condição de segurada especial
Das custas
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao pagamento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
Dos honorários
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula nº 76 deste TRF.
Da implantação do benefício
A Terceira Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Em razão disso, sendo procedente o pedido, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 dias, consoante os parâmetros acima definidos, sob pena de multa.
Cumpre esclarecer que, em se tratando de benefício já concedido em sede de antecipação de tutela na sentença ou em agravo de instrumento, dada a provisoriedade do provimento, é de torná-lo definitivo desde logo, em face do seu caráter alimentar.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, mantendo-se a determinação da imediata implantação do benefício.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/03/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007997-36.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00026533120138210075
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | NOELI LOURDES SCHROEDER |
ADVOGADO | : | Nei Pasqual Soligo |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 2A VARA DA COMARCA DE TRES PASSOS/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/03/2017, na seqüência 196, disponibilizada no DE de 09/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, MANTENDO A DETERMINAÇÃO DA IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8909644v1 e, se solicitado, do código CRC 69F65ABF. | |
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