APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007983-64.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | NAIR CARNEIRO |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. NÃO COMPROVADO TRABALHO RURAL NO PERÍODO CORRESPONDENTE À CARÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. Improcede o pedido de aposentadoria rural por idade quando não atendidos os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/1991.
2. Não comprovado tempo de serviço rural no período correspondente à carência, a parte autora não tem direito à aposentadoria rural por idade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 04 de agosto de 2015.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7498355v9 e, se solicitado, do código CRC 7DA14B9D. | |
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| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 05/08/2015 15:18 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007983-64.2015.404.9999/PR
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | NAIR CARNEIRO |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria rural por idade em razão do desenvolvimento de atividades rurais na condição de boia-fria.
O INSS interpôs agravo retido contra a decisão que deixou de reconhecer a inépcia da inicial (evento31).
Sentenciando, o MM. Juiz assim decidiu:
Ante o exposto, com fulcro no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para o fim de CONDENAR o INSS a averbar o período rural reconhecido e conceder em favor da autora o benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural, bem como a lhe pagar as parcelas devidas mensalmente (DIB) a partir da DER (11.02.2013, seq. 1.6), totalizando R$ 14.628,81, conforme cálculo em anexo que faz parte integrante da presente sentença. As parcelas vencidas foram acrescidas de atualização monetária a partir do respectivo vencimento e juros a partir da citação, nos termos da Súmula n. 3 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e Súmula n. 204 do Superior Tribunal de Justiça. A atualização monetária, incidindo a contar do vencimento de cada prestação, deve-se dar, no período de 05/1996 a 03/2006, pelo IGP-DI (art. 10 da Lei n. 9.711/98, c/c o art. 20, §§ 5º e 6º, da Lei n. 8.880/94), e, de 04/2006 a 06/2009, pelo INPC (art. 31 da Lei n. 10.741/03, c/c a Lei n. 11.430/06, precedida da MP n. 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 410-A à Lei n. 8.213/91, e REsp. n. 1.103.122/PR). Nesses períodos, os juros de mora devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no art. 32 do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte. A partir de 01.07.2009 - data em que passou a viger a Lei n. 11.960 de 29.06.2009, que alterou o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 -, para fins de juros haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados a caderneta de poupança (ou seja, TR + 05% ao mês).7 Segundo recente entendimento do TRF da 48 Região, a correção monetária do montante devido incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e jurisprudencialmente aceitos (INPC), não sendo aplicáveis, todavia, no que toca à correção monetária, os critérios previstos na Lei nº 11.960/2009, que modificou a redação do art. 1S-F da Lei nº 9.494/97, por conta de decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, que apreciou a constitucionalidade do artigo 100 da CF, com a redação que lhe foi dada pela EC 62/2006, tendo tal decisão efeito erga omnes e eficácia vinculante. Outrossim, à vista do preenchimento dos requisitos relacionados no art. 273 do CPC, principalmente a prova inequívoca do direito alegado, demonstrada nesta sentença, bem como a existência de perigo irreparável ou de difícil reparação, acaso não usufrua em breve espaço de tempo do benefício aqui reconhecido, em face do caráter alimentar da verba, tudo cumulado com a verossimilhança das alegações, que se pode observar no cotejo das provas, defiro a tutela antecipada pleiteada na inicial e determino que o réu implante, no prazo máximo de 30 dias, a contar da intimação desta sentença, em favor da parte autora, a aposentadoria aqui reconhecida, comprovando nos autos em até 45 dias. Por conseguinte, CONDENO o INSS ao pagamento das custas judiciais, despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas devidamente atualizadas, na forma do artigo 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil, totalizando R$ 1.462,88. Considerando que a condenação é de valor certo não excedente a 60 salários mínimos, a causa não está sujeita à remessa necessária (artigo 475, §2º, do Código de Processo Civil).
Irresignado, o INSS apela requerendo, preliminarmente, o conhecimento do agravo retido. No mérito, requer a cassação da antecipação de tutela. Sustenta que além de não ter apresentado início razoável de prova material para a comprovação da atividade rural alegada, a autora afirmou que exerceu a profissão de doméstica até 2001, quando se sentiu doente e parou de trabalhar. Alega, também, que a autora não pode se valer da certidão de casamento em que seu marido está qualificado como lavrador porque consta averbação de separação judicial em 29/10/1984. Requer a condenação da autora ao pagamento de multa por litigância de má-fé. Por fim, requer seja determinada a aplicação da regra do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação conferida pela Lei nº 11.960/2009, com aplicação de correção monetária pela TR e juros de mora equivalentes ao de poupança.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
Intimada a parte autora para a juntada de prova documental demonstrando vínculo às lides rurais, não houve manifestação.
É o relatório.
VOTO
Do reexame necessário:
Cabe conhecer da remessa oficial, uma vez que não há condenação em valor certo, afastada, por isso, a incidência do § 2º do art. 475 do Código de Processo Civil.
Do benefício previdenciário para segurado especial, independentemente de contribuições:
O INSS alega a inépcia da petição inicial porque a parte autora não indicou na petição inicial se, a partir de 01/01/2011, exerceu a suposta atividade rural na condição de empregado ou contribuinte individual, tendo em vista a necessidade de observância da Lei 11.718/2008.
Alega que se o trabalhador rural comprovar atividade como autônomo, sem vínculo empregatício, assim como qualquer outro diarista em atividades urbanas (como quem presta serviços em residências, por exemplo), deverá recolher as respectivas contribuições para computá-las para fins de aposentadoria por idade rural.
A Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federal da 4º Região já se manifestou sobre a matéria, no sentido de que, aperfeiçoados os requisitos legais, o segurado especial tem direito à concessão de benefício previdenciário, independentemente do recolhimento de contribuições facultativas, nos termos da seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SEGURADO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÕES FACULTATIVAS. DESNECESSIDADE. ARTIGOS 18, §1º E 39 DA LEI 8.213/1991. ARTIGO 58, II, DA INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES Nº 20/2007.
1. Aperfeiçoados os pressupostos legais, o segurado especial faz jus à concessão de auxílio-acidente independentemente do recolhimento de contribuições facultativas.
2. No âmbito administrativo (artigo 58, II, da IN 20/2007), não se exige o recolhimento de contribuição previdenciária para a concessão do auxílio-acidente ao segurado especial. Se a Administração Previdenciária interpreta a legislação de modo benigno e se o escopo da jurisdição é a pacificação social, não consiste solução mais adequada a criação de controvérsia mediante atuação jurisdicional.
(IUJEF 2007.72.53.001147-6; Relator p/ Acórdão Juiz Federal José Antonio Savaris, DJ de 07/01/2010).
Por outro lado, o regime contributivo do segurado especial foi disposto pelo art. 25, da Lei de Custeio da Seguridade Social (Lei 8.212/91), que prevê o recolhimento facultativo da indigitada contribuição:
"Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do Art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do Art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de:
I - 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;
II - 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho
§ 1º O segurado especial de que trata este artigo, além da contribuição obrigatória referida no caput, poderá contribuir, facultativamente, na forma do Art. 21 desta Lei
§2 - omissis"
Note-se que, o próprio INSS, não exige o recolhimento de contribuições como condição para a concessão de benefício previdenciário a segurado especial, como se vê da Instrução Normativa nº 45 INSS/PRES, de 06 de agosto de 2010, reconhecendo, administrativamente, o direito ao benefício:
INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 45 INSS/PRES, DE 6 DE AGOSTO DE 2010.
Art. 148. Para fins de concessão dos benefícios devidos ao trabalhador rural previstos no inciso I do art. 39 e art. 143, ambos da Lei nº 8.213, de 1991, considera-se como período de carência o tempo de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, correspondente ao número de meses necessários à concessão do benefício requerido, computados os períodos a que se referem os incisos III a VIII do § 5º do art. 7º, observando-se que:
(...)
II - Para o segurado especial e seus dependentes para os benefícios de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença, auxílio-acidente, pensão por morte, auxílio-reclusão e salário-maternidade, a apuração da atividade rural será em relação aos últimos doze meses ou ao evento, conforme o caso, comprovado na forma do § 3º do art. 115".
Por fim, é oportuna a transcrição de trecho de voto proferido pelo eminente Desembargador Federal Celso Kipper no âmbito da 6ª Turma desta Corte:
Por fim, não há de se cogitar de violação ao princípio erigido no art. 195, § 5º, da Constituição Federal, segundo o qual "nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total". Tal norma constitucional põe em evidência o necessário equilíbrio atuarial entre os benefícios e serviços da seguridade social, de um lado, e as fontes de custeio, de outro. Assim, em um regime previdenciário contributivo, deve haver correlação entre custo e benefício (Ministro CELSO DE MELLO, ADI 2.010 - MC - DF, DJ 12-04-02, p. 51; Ministro MARCO AURÉLIO, ADI 790 - DF, RTJ 147/921-929).
No entanto, o almejado equilíbrio atuarial não significa relação imediata, direta e específica entre determinado benefício previdenciário e as contribuições que supostamente lhe deveriam servir de suporte financeiro. Alguns benefícios previdenciários (pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família, auxílio-acidente; auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente e de doença profissional, ou em casos graves, especificados pelos Ministérios da Saúde, do Trabalho e da Previdência e Assistência Social; aposentadoria por idade e benefício por incapacidade ao segurado especial; salário-maternidade às seguradas empregadas, trabalhadoras avulsas e empregadas domésticas) independem, para a sua concessão, de carência, ou seja, de contribuições (Lei 8.213/91, art. 26), e nem por isso se deve maculá-los de inconstitucionais. Tal assertiva fica ainda mais clara no tocante aos benefícios e serviços da assistência social (aos quais também se aplica o §5º do art. 195 da Constituição Federal), ante a inexistência de suporte financeiro específico para o financiamento de determinada prestação assistencial.
De igual forma, descabida a exigência de que a própria lei que tenha criado, majorado ou estendido benefício ou serviço da seguridade social deva, concomitantemente, criar nova fonte de custeio ou majorar as existentes, ou mesmo apontar a fonte de custeio correspondente, pois inexiste tal mandado ao legislador na Constituição Federal. A não se entender assim, haveria de se ter em conta a advertência de WLADIMIR NOVAES MARTINEZ:
"Aplicado a rigor o princípio constitucional, todo o Plano de Benefícios da Lei n. 8.213/914 resulta praticamente inconstitucional. A ele não correspondeu fonte de custeio capaz de atender ao postulado e às necessidades práticas. O plano de Custeio nada inovou em relação à Lei n. 7.7787/89." (Comentários à lei básica da previdência social, 1997, p. 493) (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5005729-18.2011.404.7200, 6ª TURMA, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 02/03/2012)
Assim, deve ser afastada a alegação da Autarquia relativamente à necessidade do recolhimento de contribuições previdenciárias para que o segurado especial tenha direito ao reconhecimento da aposentadoria por idade. Portanto, nego provimento ao agravo retido.
Considerações gerais sobre a aposentadoria rural por idade:
A apreciação de pretensão de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/1991), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§ 1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei nº 8.213/1991. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, sendo dispensável o recolhimento de contribuições. Neste sentido, o julgamento da APELREEX nº 0008606-53.2014.404.9999, Quinta Turma, de minha relatoria, D.E. 15/08/2014.
Não se pode olvidar, outrossim, que o artigo 143 da Lei nº 8.213/1991, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei nº 8.213/1991 estabeleceu que, para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei nº 8.213/1991, como regra, deverá ser aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que, até então, já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, inciso XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/1991. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios.
Deve ser observado que nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, § 1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, RExt. nº. 631240/MG, Rel. Ministro Roberto Barroso, Plenário, julgado em 03/09/2014).
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, Súmula nº 149 do STJ e REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia). Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, como o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais da entidade respectiva serão formalizados não individualmente, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Importante, ainda, ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, somente será descaracterizado o regime de economia familiar acaso reste comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
Cumpre salientar que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, pois produzidas com todas as cautelas legais, garantindo-se o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora, mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, a fim de que seja examinada no conjunto do acervo probatório constante dos autos.
Do caso concreto:
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário, 55 (cinquenta e cinco) anos, em 29/01/2012, porquanto nascida em 29/01/1957 (evento1, OUT4). O requerimento administrativo foi efetuado em 11/02/2013 (evento1, OUT5). Dessa forma, a parte autora deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses imediatamente anteriores ao implemento do requisito etário ou 180 meses imediatamente anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora instruiu sua peça inicial com os seguintes documentos:
- certidão de casamento, lavrada em 03/10/1975, em que o cônjuge da autora está qualificado como lavrador, com averbação de separação judicial contenciosa em 29/10/1984 (evento1, OUT5, fl. 08);
- CTPS da autora sem anotações de vínculos de trabalho (evento1, OUT5, fls. 09/10).
Por ocasião da audiência de instrução, em 28/08/2014 (evento 40), foram inquiridas as testemunhas Maria Sebastiana de Paula e Maria Aparecida de Oliveira Cicotosto, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais pela demandante.
A testemunha Maria Sebastiana de Paula relata que conhece a autora, que trabalhavam juntas, que ela sempre trabalhou na lavoura, que trabalhavam juntas direto, que em novembro vai fazer um ano que ela fez uma operação e parou de trabalhar, que trabalharam no Montanha e no Dirceu, que ela nunca trabalhou na cidade, que ela é doente faz tempo, que sempre reclamava, que ela tem problema de coração, que mesmo doente ela trabalhava na diária, que ela começou a trabalhar com uns sete anos de idade, na lavoura, com o pai. Relata que trabalhavam juntas na lavoura, nas verduras, até a operação da autora. Diz que a autora não tem marido, que nunca a viu com marido, que ela mora com a filha que tem uns cinco filhos. Afirma que a autora reclamava de estar doente quando ia trabalhar.
A testemunha Maria Aparecida de Oliveira Cicotosto, por sua vez, esclarece que conhece a autora desde 1985; que moravam em sítios próximos; que a autora fazia serviços gerais na roça, como catar milho e trabalhar com café; que a autora nunca trabalhou na cidade; que até o ano passado elas trabalhavam juntas na horta; que o problema de saúde dela vem de longe, mas que ela seguiu trabalhando até que precisou fazer cirurgia; que também trabalharam juntas na Fazenda Horizonte e na Fazenda Santa Maria; que nos últimos quinze anos ela trabalhou na área rural; que não trabalhou na cidade. Afirma que a autora é separada há uns vinte anos, que moram na casa a autora, a filha e quatro netos. Diz que iam para a roça e a autora reclamava que estava doente, mas tinha que trabalhar.
No caso, embora a prova testemunhal seja convincente do labor rural pela parte autora, os documentos juntados aos autos não constituem início razoável de prova material.
O único documento apresentado pela autora é a certidão de casamento, lavrada em 03/10/1975, em que seu marido está qualificado como lavrador. Ocorre que na certidão consta averbação de separação judicial contenciosa em 29/10/1984 (evento1, OUT5, fl. 08). Ademais, a própria autora, em seu depoimento pessoal, afirma que está separada há trinta anos e que não sabe do ex-cônjuge. Assim, não é possível a extensão de prova material em nome do ex-marido à autora, uma vez que não fora juntada prova material em nome desta em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência.
Ainda, alega o INSS, em contestação, que a autora afirmou não exercer nenhuma atividade laborativa, quando do ajuizamento das ações 2006.70.51.004310-4 e 2010.70.51.010776-6, objetivando a concessão de benefício assistencial, que tramitaram no Juizado Especial Federal em Londrina.
Questionada a respeito, em seu depoimento pessoal, a autora afirmou que teve um amparo por nove meses, mas que não trabalhou como doméstica, somente em hortas, sem carteira assinada.
Ao sentenciar o feito, o juízo assim entendeu:
Inicialmente, entendo que as informações contidas nos laudos periciais de seqs. 17.9 e 17.13, que dão conta de que a autora teria trabalhado em atividades urbanas como "doméstica" e "do lar" no período de carência (até 2001) não podem ser sopesadas neste processo porque foram produzidas longe do contraditório.
Trata-se de informações secundárias que supostamente teriam sido prestadas pela autora aos peritos na ocasião dos exames, mas que foram desditas na presente audiência, tanto pela própria autora, como pelas testemunhas ouvidas mediante compromisso legal.
De fato, no laudo médico pericial realizado em 2006 (evento17, OUT9, fl. 01), no processo 2006.70.51.004310-4, no item (história da doença atual), consta: "Diz que trabalhou como doméstica, mas que em função da sua moléstia, não trabalha há aproximadamente 05 anos" e no laudo médico pericial realizado em 2010 (evento17, OUT13, fl. 01), no processo 2010.70.51.010776-6, consta na qualificação da autora: "Profissão declarada: Empregada doméstica (inativa). Histórico ocupacional: Trabalhou na lavoura até os 16 anos de idade. - Até o ano de 2001 trabalhou de Empregada doméstica, porém nunca foi registrada. - Relatou que atualmente somente trabalha na sua casa, porém realiza somente as tarefas mais leves como limpar a casa e lavar as louças".
Ainda que a autora tenha afirmado no depoimento pessoal que sempre exercera atividade rural, diante da ausência de início de prova material da alegação, entendo que não restou comprovada a atividade rural, na condição de boia-fria, dentro do período de carência exigido para a concessão do benefício.
Contudo, indevida a condenação da requerente nas penas decorrentes da litigância de má-fé.
As hipóteses de cabimento de litigância de má-fé estão previstas no art. 17 do CPC, verbis:
Art. 17 - Reputa-se litigante de má-fé aquele que:
I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;
II - alterar a verdade dos fatos;
III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;
IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;
VI - provocar incidentes manifestamente infundados;
VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
No entanto, ainda que se reconheça a existência de legislação regulamentando a hipótese, não se pode certificar, no caso concreto, o intuito da autora de enganar o juízo.
Para aplicação da pena por litigância de má-fé é imprescindível a constatação do dolo ou culpa grave, necessários para afastar a presunção de boa-fé que norteia o comportamento das partes no desenvolvimento da relação processual.
Assim, não configurada quaisquer das hipóteses tratadas pelo art. 17 do CPC, não merece provimento a apelação do INSS no ponto.
Não restando comprovado o exercício de atividades rurícolas pela parte autora no período de carência, deve ser reformada a sentença para julgar improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Dos consectários:
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, no percentual de 10% sobre o valor da causa, e das custas processuais, restando suspensa a exigibilidade de tais verbas em razão de ser beneficiária da justiça gratuita.
Conclusão:
Reforma-se a sentença, dando parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial para julgar improcedente o pedido.
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
Dispositivo:
ANTE O EXPOSTO, voto por negar provimento ao agravo retido, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/06/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007983-64.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00005526420138160138
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dra. Adriana Zawada Melo |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | NAIR CARNEIRO |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/06/2015, na seqüência 450, disponibilizada no DE de 09/06/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
RETIRADO DE PAUTA.
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/08/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007983-64.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00005526420138160138
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Eduardo Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | NAIR CARNEIRO |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/08/2015, na seqüência 439, disponibilizada no DE de 20/07/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT | |
: | Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS |
Lídice Peña Thomaz
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