APELAÇÃO CÍVEL Nº 5034663-18.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | JOSE ALFERES |
ADVOGADO | : | MARCELO MARTINS DE SOUZA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPENSAÇÃO. DATA INICIAL DO BENEFÍCIO. DATA DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. RE 631240/MG.
1. É devido o benefício de aposentadoria rural por idade, nos termos dos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/1991, independentemente do recolhimento de contribuições quando comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e cinquenta e cinco anos para a mulher) e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, mediante início de prova material complementada por prova testemunhal idônea.
2. Hipótese em que a parte autora preencheu os requisitos necessários à concessão do benefício.
3. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário n. 631.240/MG em sede de repercussão geral, assentou entendimento no sentido de ser necessário, como regra geral, o requerimento administrativo antes do ajuizamento de ações de concessão de benefícios previdenciários.
4. No voto condutor do acórdão, foi apresentada fórmula de transição em relação às ações ajuizadas antes da conclusão do referido julgamento que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, nos seguintes termos: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito. Isto porque os Juizados Itinerantes são iniciativas organizadas do Poder Público para promover o acesso à Justiça em comunidades usualmente remotas, com dificuldade de acesso aos serviços públicos em geral. Assim, extinguir as ações já ajuizadas nesse contexto frustraria as expectativas dos jurisdicionados e desperdiçaria um enorme esforço logístico. Para os Juizados Itinerantes futuros essa ressalva não é necessária, porque o INSS tem encaminhado às comunidades um posto móvel de atendimento antes da efetiva realização do Juizado Itinerante, assegurando o acesso prévio à via administrativa; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão. Em razão das oscilações jurisprudenciais na matéria, essa solução se justifica para os processos já ajuizados e não ocasionará prejuízo às partes, uma vez que preserva o contraditório e permite ao juiz decidir a causa tendo ciência dos motivos pelos quais o INSS se opõe ao pedido. Também não deve prevalecer a exigência do requerimento administrativo quando o indeferimento do INSS for notório, bem como nos casos de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício; e (iii) as demais ações que não de enquadrem nos itens (i) e (ii) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse de agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, o dobro do prazo legal (art. 41-A, §5º, da Lei nº 8.213/1991), em razão do volume de casos acumulados. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente (e.g., não comparecimento a perícia ou a entrevista administrativa), extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. Em qualquer caso, a análise quanto à subsistência da necessidade do provimento jurisdicional deverá ser feita pelo juiz.
5. Em todos os casos, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de outubro de 2017.
Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5034663-18.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | JOSE ALFERES |
ADVOGADO | : | MARCELO MARTINS DE SOUZA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
JOSÉ ALFERES ajuizou ação ordinária contra o INSS em 23/05/2008, visando à concessão da aposentadoria rural por idade. Requereu o benefício em sede administrativa em 2015, que restou indeferido. Sustenta ter trabalhado por toda sua vida com atividades rurais, em regime de economia familiar.
O INSS apresentou contestação alegando ausência de interesse de agir, requerendo, assim, a extinção do feito, em razão do pedido não ter sido apreciado em sede administrativa.
Foi apresentada impugnação à contestação.
Proferida sentença, a qual julgou extinta a ação com fulcro no artigo 267, inciso VI do CPC, pela ausência do requerimento administrativo.
Inconformada a parte autora interpôs recurso. Este egrégio Tribunal Federal da Quarta Região, determinou o prosseguimento do feito.
Realizada audiência de instrução e julgamento, ocasião em que foram inquiridas duas testemunhas arroladas pela parte autora.
Sobreveio sentença (evento 01 - SENT51), julgando procedente o pedido formulado em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, nos seguintes termos:
Isso posto, JULGO PROCEDENTE o pedido para CONDENAR o INSS a implantar ao autor o benefício da aposentadoria por idade, com fulcro art. 48 e ss. da Lei n. 8.213/91, no valor de um salário mínimo por mês, com DIB em 23.05.2008 (data da propositura da ação), bem como ao pagamento dos respectivos valores atrasados e dos abonos anuais, acrescidos de correção monetária pelo INPC a partir de cada parcela em atraso e de juros de mora a partir da citação, havendo a incidência, urna única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado a caderneta de poupança (Consoante entendimento firmado pelo STJ a partir do julgamento do RESP 1.270.439, Mm. Eliana Calmon, após a julgamento das ADINs 4.357 e 4425 que por arrastamento, declarou inconstitucional o art. 1°-F da Lei n o 9.494, com a redação dada pelo art. 5°da Lei no 11.960, de 29.07.2009).
CONDENO o INSS, observada a justiça gratuita, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro em R$ 800,00 (oitocentos reais), considerando que se trata de causa de extrema simplicidade, consoante art. 20, § 4°, do CPC, e Súmula 178 do STJ.
Apelou o requerente pedindo majoração dos honorários advocatícios (evento 01 - PET53).
Por esta Corte foi dado parcial provimento à remessa oficial para anular a sentença, determinando o retorno dos autos ao Juízo de primeiro grau, para que intimasse a parte autora a dar entrada no pedido administrativo em ate 30 (trinta) dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse de agir, restando prejudicado o recurso do autor (evento 01 - OUT56).
O autor então fez o requerimento em sede administrativa, em 04/11/2015, o qual foi indeferido (evento 01 - OUT62).
Sobreveio nova sentença, publicada em 15/02/2017 (evento 13), com o seguinte dispositivo:
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para CONDENAR o INSS a implantar ao autor o benefício da aposentadoria por idade a trabalhador rural, no valor de um salário mínimo por mês, com DIB em 23/05/2008, bem como, ao pagamento dos respectivos valores atrasados, devidamente acrescidos de atualização monetária a partir do vencimento de cada prestação (Súmula 148 do STJ) pela média dos índices INPC/IBGE e IGP-DI/FGV (art. 1º do Decreto n.º 1.544/95) até 30/06/2009 e, a partir dessa data até 24/03/2015, na forma do art. 1º-F da Lei 9.494/97. A partir de 25/03/2015, em razão do julgamento pelo STF das ADIs 4357 e 4425 e modulação dos efeitos do acórdão que declarou, por arrastamento, a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/97, deverá ser adotado o índice IPCA-E, consoante entendimento firmado pelo STJ a partir do julgamento do REsp n.º 1.270.439. Juros de mora na forma do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (índice oficial aplicado à caderneta de poupança) com incidência única, até o efetivo pagamento), uma vez que, a inconstitucionalidade por arrastamento declarada nas mencionadas ADIs se referem apenas à atualização monetária, prevalecendo vigente a norma em relação aos juros moratórios.
Ainda, CONDENO o INSS ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes os quais arbitro em 10% sobre o valor das parcelas em atraso até a data da publicação da sentença (súmula nº 111 do STJ), considerando que se trata de causa repetitiva e de extrema simplicidade, consoante art. 20, § 3º, do CPC/73, e Súmula 178 do STJ.
Apela o INSS (ev. 19), sustentando que deve ser modificada a DIB, pois deve corresponder à DER; que o recorrido não apresentou prova material apta e contemporânea ao período controvertido necessária para a concessão do benefício em questão; que o recorrido recebe benefício assistencial da LOAS desde 2010. Por fim, pede que seja integralmente aplicado, quanto à correção monetária e juros, o art. 1º-F da Lei 9494/97. Pede provimento.
Foram apresentadas contrarrazões (ev. 27).
É o relatório.
VOTO
Trata-se de demanda previdenciária objetivando a concessão de APOSENTADORIA POR IDADE RURAL, prevista no artigo 48, § 1º e seguintes, da Lei 8.213/91.
Tempo de serviço rural: premissas
Quanto ao reconhecimento do tempo de serviço rural, as premissas são as seguintes:
a) a possibilidade de extensão da prova material para período anterior ao documento mais antigo (Súmula nº 577 do STJ: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.");
b) A presunção de continuidade do tempo de serviço rural no período compreendido entre os documentos indicativos do trabalho rural no período abrangido pela carência. Neste sentido, Moacyr Amaral Santos faz referência à teoria de Fitting, segundo a qual presume-se a permanência de um estado preexistente, se não for alegada a sua alteração, ou, se alegada, não tiver sido feita a devida prova desta. Amaral Santos, citando Soares de Faria na síntese dos resultados obtidos por Fitting, pontifica que "só a afirmação de uma mudança de um estado anterior necessita de prova, que não a permanência do mesmo: affirmanti non neganti incumbit probatio" (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983. v. 1, p. 102);
c) A ampliação da abrangência do início de prova material pertinente ao período de carência a períodos anteriores ou posteriores à sua datação, desde que complementado por robusta prova testemunhal, uma vez que "não há exigência de que o início de prova material se refira a todo o período de carência, para fins de aposentadoria por idade do trabalhador rural" (AgRg no AREsp 194.962/MT), bem como que "basta o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória" (AgRg no AREsp 286.515/MG), entendimentos esses citados com destaque no voto condutor do acórdão do REsp nº 1349633 - representativo de controvérsia que consagrou a possibilidade da retroação dos efeitos do documento tomado como início de prova material, desde que embasado em prova testemunhal. Vide Súmula nº 577 do STJ (supracitada) e recentes julgados da Terceira Seção: AR 4.507/SP, AR 3.567/SP, EREsp 1171565/SP, AR 3.990/SP e AR 4.094/SP;
d) a inviabilidade de comprovação do labor rural através de prova exclusivamente testemunhal (REsp 1133863/RN, Rel. Ministro CELSO LIMONGI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011);
e) segundo a jurisprudência da 3ª Seção deste Regional, a utilização de maquinário e eventual de diaristas não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente. (TRF4, EINF 5023877-32.2010.404.7000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 18/08/2015);
f) a admissão, como início de prova material e nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, de documentos de terceiros, membros do grupo parental;
g) o fato de que o tamanho da propriedade rural não é, sozinho, elemento que possa descaracterizar o regime de economia familiar desde que preenchidos os demais requisitos (REsp 1403506/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013);
h) segundo a Lei nº 12.873/2013, que alterou, entre outros, o art. 11 da LB, "o grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que trata a alínea g do inciso V do caput, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o período de afastamento em decorrência da percepção de auxílio-doença". Deixou-se de exigir, assim, que a contratação ocorresse apenas em épocas de safra (ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JR., José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. São Paulo: Altas, 2015, p. 63);
i) de acordo com a jurisprudência do STJ, o exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial. No entanto, não se considera segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014);
j) o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (AgRg no AREsp 327.119/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015);
l) no que tange ao trabalho do boia-fria, o STJ, por meio, entre outros, do REsp 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, abrandou as exigências quanto ao início de prova material da atividade rural, desde que complementada através de idônea prova testemunhal;
m) o segurado especial tem de estar trabalhando no campo quando completar a idade mínima para obter a aposentadoria rural por idade, momento em que poderá requerer seu benefício, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, já preencheu de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos - carência e idade. (STJ, REsp 1354908, 1ª Seção, Tema 642/recurso repetitivo).
Caso concreto
O autor atingiu o requisito etário (60 anos) em 25/09/2002, já que nascido em 25/09/1942 e formulou requerimento de aposentadoria por idade rural em 04/11/2015. Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 126 meses imediatamente anteriores a setembro de 2002.
Para comprovar o trabalho rural, a parte autora apresentou, a título de prova documental, a seguinte documentação:
a) Certidão de casamento de 1963, que consta como profissão lavrador (movimento 1.4);
b) Certidão de nascimento da filha de 1970, constando como profissão lavrador (movimento 1.4);
c) Registro em CTPS entre fevereiro de 1987 a dezembro de 1992 e julho de 1999 a agosto de 1999, em que consta como trabalhador rural (movimento 1.4);
Em audiência, tanto a testemunha Sebastião Lemes da Silva quanto Reinaldo Reis Teixeira afirmaram que conhecem o autor há mais de 25 anos e que ele nunca se afastou da lide rural (evento 01 - SENT51):
[...]
Sebastião Lemes da Silva (fl. 125) atestou que conhece o autor há 25 anos, sendo que às vezes trabalhavam juntos como diarista. Afirmou que o autor nunca se afastou da atividade rural e informou que tem conhecimento que o autor não está trabalhando ultimamente por apresentar problemas de saúde.
Reinaldo Reis Teixeira (fl. 126) afirmou que conhece o autor há mais de 25 anos. Acrescentou que o autor trabalha como boia-fria e nunca se afastou da atividade rural, não possuindo outra fonte de renda.
Verifica-se, assim, que as testemunhas foram coesas e harmônicas em suas declarações, corroborando a condição de trabalhador rural do autor durante o período de carência.
[...]
No presente caso, os documentos juntados aos autos constituem início de prova material. A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente do exercício de atividade rural pela parte autora no período de carência legalmente exigido.
Ainda, quanto ao fato de ter recebido benefício assistencial previsto na LOAS, desde 15.03.2010 (evento 01 - OUT65 e OUT66), por ser idoso e declarar ter rendimento mensal de R$ 100,00 (cem reais), basta que haja a compensação de valores, eis que não podem ambos os benefícios ser recebidos de forma cumulativa, por expressa determinação legal. Com efeito, a teor do disposto no art. 20 da Lei nº 8.742/93, "o benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória".
Assim, devem ser compensados os valores devidos a título de aposentadoria por idade rural, com os valores já pagos a título de benefício assistencial previsto na LOAS, observadas as regras de prescrição aplicáveis.
Nessa linha de raciocínio o precedente desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EXCESSO NÃO CONFIGURADO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPENSAÇÃO. ARTIGO 20, § 4º, DA LEI Nº 8.742/93. BOA-FÉ. PRESCRIÇÃO. - Não é permitido o recebimento cumulativo de benefícios cuja acumulação não é permitida em virtude de expressa determinação legal. A teor do disposto no caput e no parágrafo 4º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93, "o benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória". - O instituto da prescrição quinquenal deve incidir sobre o direito do apelante à compensação de valores pagos a título de benefício não cumulativo quando há boa-fé do segurado no gozo do benefício irregular. - É aplicável a norma do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, que estabelece prazo prescricional de 5 (cinco) anos, contados da data do ato ou do fato do qual se originaram, para a cobrança de créditos contra a Fazenda Federal, (TRF4 5019890-36.2015.404.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 10/08/2017)
Desse modo, estando comprovada a atividade rural no período referente à carência, o autor faz jus à aposentadoria rural, devendo ser mantida a sentença que concedeu o benefício de aposentadoria rural por idade à parte autora, porém, devem ser compensados os valores devidos a título de aposentadoria com os já pagos a título de benefício assistencial, por ser expressamente vedada a cumulação.
Data inicial do benefício
Quanto à data de início do benefício, observa-se que a parte autora inicialmente ajuizou ação, em maio de 2008, sem que tivesse efetuado requerimento no INSS. Após, apresentou requerimento administrativo no INSS, na data de 04/11/2015, tendo sido ele indeferido.
No julgamento do Recurso Extraordinário 631.240/MG, em regime de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal assentou entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, não sendo necessário, contudo, o exaurimento da esfera administrativa.
Nos termos do voto do Relator Ministro Luís Roberto Barroso, restou decidido que nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240 (03/09/2014), que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, como no caso dos autos, será observado o seguinte:
a) nas ações ajuizadas no âmbito de Juizado Itinerante, a falta do prévio requerimento administrativo não implicará extinção do feito sem julgamento de mérito;
b) nas ações em que o INSS tiver apresentado contestação de mérito, estará caracterizado o interesse de agir pela resistência à pretensão, implicando a possibilidade de julgamento do mérito, independentemente do prévio requerimento administrativo;
c) nas demais ações em que ausente o requerimento administrativo, o feito será baixado em diligência ao Juízo de primeiro grau, onde permanecerá sobrestado, a fim de intimar a parte autora a dar entrada no pedido administrativo em até 30 (trinta) dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse de agir. Comprovada a postulação administrativa, o Juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 (noventa) dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente (ex: não comparecimento à perícia ou à entrevista), extingue-se a ação. Por outro lado, se negado o pedido, estará caracterizado o interesse de agir e o feito deverá prosseguir. Em qualquer caso, a análise quanto à subsistência da necessidade do provimento jurisdicional deverá ser feita pelo Juiz.
Dessa forma, considerando-se que a presente ação foi ajuizada antes do julgamento da repercussão geral e que após o requerimento o benefício foi negado, restou caracterizado o interesse de agir.
Também, no precedente foi definido que 'tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data da entrada do requerimento, para todos os efeitos legais'.
Desta forma, fixo a data da concessão do benefício a partir de 23/05/2008, data do ajuizamento da presente ação.
CONSECTÁRIOS E PROVIMENTOS FINAIS
Sistemática de atualização do passivo
Juros de mora e correção monetária
A controvérsia relativa à sistemática de atualização do passivo do benefício restou superada a partir do julgamento do RE nº 870.947/SE, pelo excelso STF, submetido ao rito da repercussão geral e de cuja ata de julgamento, publicada no DJe de 25-9-2017, emerge a síntese da tese acolhida pelo plenário para o Tema nº 810 daquela Corte.
E nesse particular aspecto, vale anotar ser uníssono o entendimento das turmas do STF no sentido de que possam - devam - as demais instâncias aplicar a tese já firmada, não obstante a ausência de trânsito em julgado da decisão paradigmática. Nesse sentido: RE 1.006.958 AgR-ED-ED, Relator o Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe de 18-09-2017 e ARE nº 909.527/RS-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJe de 30-5-2016. Essa, ademais, a letra do artigo 1.030, inciso I, e do artigo 1.035, § 11, ambos do CPC.
Em face disso, assim como do intrínseco efeito expansivo de decisões desta natureza, deve a sua eficácia incidir ao caso ora sob exame.
Nessa linha, a atualização do débito previdenciário, até o dia 29-6-2009, deverá observar a metodologia constante no Manual para Orientação e Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal. E, após essa data, ou seja, a contar de 30-6-2009, coincidente com o início da vigência do artigo 5º da Lei nº 11.960/2009, pelo qual conferida nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, deverá ser utilizada a metodologia ali prevista para os juros de mora; e, a título de correção monetária, será aplicado o IPCA-E.
Convém registrar que a Corte Suprema abordou e solveu a questão da atualização monetária em perfeita sintonia com o que já havia sintetizado em seu Tema nº 96, o qual tratava da atualização da conta objeto de precatórios e requisições de pequeno valor, estabelecendo jurídica isonomia entre essas situações.
Logo, no caso concreto, observar-se-á a sistemática do aludido manual, até 29-6-2009. A partir dessa data até 24/03/2015, como a sentença fixa a correção na forma do art. 1º-F da Lei 9.494/97, e o recurso é da autarquia, deve ser mantida, sob pena de reformatio in pejus. Após, a sentença estabeleu o IPCA-E, o que deve ser corroborado. E, no tocante aos juros, observar-se-á a sistemática do manual, até 29-6-2009. Após, os juros de mora incidirão conforme estabelece o artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação que lhe foi dada pelo artigo 5º da Lei nº 11.960/09, como já estabelecido na sentença.
Da sucumbência
Mantenho a sucumbência como estabelecida na sentença, porquanto o apelo da autarquia foi provido em parte mínima.
Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
CONCLUSÃO
Quanto ao deferimento do benefício de aposentadoria por idade rural, a sentença resta mantida, sendo devida à parte autora a aposentadoria. Quanto à data inicial do benefício, é 23/05/2008, data do ajuizamento da presente ação, conforme determinado pelo STF, em repercussão geral, no RE 631240/MG, logo, ratificada a sentença também neste ponto. Por fim, quanto ao fato de ter recebido benefício assistencial previsto na LOAS desde 2010, deve haver a compensação de valores, por ser indevido o recebimento do benefício em questão, de forma cumulativa, com a aposentadoria.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
Juiz Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal LUIZ CARLOS CANALLI, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9169031v14 e, se solicitado, do código CRC C12BD9D0. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/10/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5034663-18.2017.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00007600720088160176
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Mercante |
APELANTE | : | JOSE ALFERES |
ADVOGADO | : | MARCELO MARTINS DE SOUZA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/10/2017, na seqüência 579, disponibilizada no DE de 29/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO | |
: | Juíza Federal LUCIANE MERLIN CLEVE KRAVETZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9212002v1 e, se solicitado, do código CRC 4F35956B. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 17/10/2017 17:41 |
